segunda-feira, 21 de abril de 2014

Avenida Tiradentes: a antiga estrada real cheia de história


Nos 1,8km de extensão, há prédios como a Estação da Luz, o mosteiro idealizado por Frei Galvão e o arco do presídio de Tiradentes

19 de abril de 2014 | 17h 11

Edison Veiga - O Estado de S.Paulo
SÃO PAULO - A avenida homenageia Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, mártir da Independência que viveu de 1746 a 1792. Mas o caminho já existia antes de o personagem histórico ter nascido. Era chamado de "estrada real de Guarepe", ou "Guaré", nome de um pequeno rio que corria na região.
Avenida tem 1,8km e liga a Estação da Luz a Marginal do Tietê - SEGIO CASTRO/ ESTADÃO
SEGIO CASTRO/ ESTADÃO
Avenida tem 1,8km e liga a Estação da Luz a Marginal do Tietê
"Nesse local ocorria criação de gado. Um pouco mais ao norte, havia um pouso de tropeiros", pontua o historiador e arquiteto Benedito Lima de Toledo, professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (USP).
No século 18, a avenida começou a ficar mais movimentada. Foi ali o local escolhido pelo religioso franciscano Antônio de Sant’Anna Galvão, o Frei Galvão (1739- 1822), para erguer um convento, chamado de Mosteiro da Luz. Frei Galvão atuou como arquiteto, mestre de obras, pedreiro e carpinteiro - ele assumiu o trabalho braçal ao lado dos escravos cedidos por famílias nobres para a construção. A técnica aplicada, a taipa de pilão, era comum na época.
Seus dotes de arquiteto resultaram em uma percepção da importância que o caminho, hoje avenida, teria para a cidade. Conforme assinala Toledo no livro Frei Galvão: Arquiteto (Ateliê Editorial), Frei Galvão alterou, durante a obra, a entrada da capela, originalmente com a face voltada para o sul. Foi uma previsão acertada de que a região onde hoje está a avenida seria movimentada. Então, criou novo frontispício, e a face principal da igreja passou a ser daquele lado. É por isso que o altar, cuja disposição original foi mantida, está à esquerda de quem entra - e não à frente, como de praxe.
Ali, antes existia uma ermida, construída em homenagem a Nossa Senhora da Luz, no início do século 17. "As obras para o novo templo devemos a Frei Galvão, que nessa empresa levou 48 anos até sua morte, em 1822. As obras foram iniciadas a 2 de fevereiro de 1774", conclui Toledo.
Acredita-se que a largura da via, excepcional para os padrões da época, seja um sinal da efervescência comercial da região. "Ali ocorriam habitualmente as chamadas ‘ferias de Pilatos’, como era conhecido o governador de São Paulo Melo Castro e Mendonça", pontua o arquiteto e historiador.
Documentos do Arquivo Histórico Municipal mostram que o caminho passou a ser chamado de Tiradentes em 1916. O batismo veio após a obra - a avenida, já com traçado semelhante ao atual, foi construída na gestão do primeiro prefeito de São Paulo, conselheiro Antonio da Silva Prado (1840-1929), que ocupou o cargo de 1899 a 1911.
É pequena, com apenas 1,8 km de extensão. Mas fundamental. Ali estão três estações do Metrô (Luz, Tiradentes e Armênia) e marcos históricos e culturais como a Pinacoteca do Estado, o Jardim da Luz, a Praça Coronel Fernando Prestes, o Museu de Arte Sacra e o já citado Mosteiro da Luz.
E para não dizer que Tiradentes, que era dentista, não está representado, a unidade do Centro Universitário Senac localizada na avenida conta com uma clínica odontológica que atende 600 pacientes por mês. A clínica existe desde 2003.
Marcos. Na Avenida Tiradentes funcionou, por mais de 60 anos, a Escola Politécnica da Universidade de São Paulo - que quando foi transferida à Cidade Universitária, no Butantã, deu lugar a uma unidade da Faculdade de Tecnologia (Fatec).
Também são históricos o prédio-sede da Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota) e o arco remanescente do Presídio Tiradentes. Este funcionou de 1852 a 1972. Durante a Era Vargas, abrigou presos políticos como o escritor Monteiro Lobato (1882-1948). O mesmo aconteceu na ditadura militar, quando até a atual presidente Dilma Rousseff esteve presa ali. O presídio foi demolido em 1985, mas o portal foi preservado "pelo valor simbólico que representa na luta contra o arbítrio e a violência institucionalizadas em nosso País em passado recente", conforme parecer do Condephaat, órgão estadual de proteção ao patrimônio.

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