segunda-feira, 31 de janeiro de 2022

Matriz energética de países reduz o ‘efeito verde’ dos carros elétricos, OESP (Fundamental, quadro energético mundo)

 Cleide Silva, O Estado de S. Paulo

31 de janeiro de 2022 | 05h00

Pelo menos 16 milhões de carros elétricos já circulam pelo mundo, dos quais mais de 6 milhões foram vendidos em 2021. Na Conferência Global da ONU sobre o clima, a COP-26, veículos movidos a eletricidade foram escolhidos como um dos principais atores no processo de descarbonização, por não emitirem poluentes.

Parte deles, porém, não pode ser considerada totalmente “verde” porque, dependendo da matriz elétrica dos países onde rodam, a energia de suas baterias vem de fontes não renováveis, como carvão e gás natural, ou nuclear, que é limpa mas não renovável e encontra resistência em várias nações após o vazamento de radiação em Fukushima em 2011

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Renault se unem a parceiros para investir em carros elétricos Foto: Rodolfo Buhrer / Renault / Fotoarena

Mesmo em países com fontes renováveis, há questionamentos em relação às emissões geradas no processo de geração dessa energia e na produção dos automóveis elétricos. Por isso, o acordo da COP-26 envolveu, além de governos, a iniciativa privada nos compromissos de descarbonização nas próximas três décadas.

Em várias regiões do mundo, a eletrificação, num primeiro momento, virá de geração fóssil, mas a tendência é de inserção maior de fontes renováveis nos próximos anos e, dependendo da sinalização de cada matriz, faz sentido apostar nessa tecnologia, afirma Diogo Lisbona, professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV Energia).

Estudo do grupo ambientalista Transport & Environment adotado pela União Europeia indica que carros elétricos superam modelos a diesel e a gasolina em todos os cenários, mesmo em países dependentes de energia fóssil, como a Polônia. Nesse exemplo, um modelo elétrico polui 30% menos que um a combustão, levando-se em conta o ciclo de vida do veículo.

“Não importa a matriz, o carro elétrico sempre supera o convencional pois mesmo que ela seja 100% suja, a emissão de CO2 equivalente no ciclo total ainda assim será 10% menor do que naquele a combustão”, diz Adalberto Maluf, presidente da Associação Brasileira do Veículo Elétrico (ABVE). 

Hoje, 60% da energia produzida no mundo vêm de fontes não renováveis – carvão e gás natural, mas, na opinião de Lisbona, o movimento de eletrificação dos veículos vem junto com a ampliação das energias renováveis na matriz elétrica.

A China, por exemplo, tem mais de 60% de sua geração de energia vinda do carvão, mas tem feito investimentos bilionários em eólicas e hidrelétricas para reduzir essa dependência (veja quadro).

Tarifa

Para o professor da FGV, além da procedência da energia, os países precisam avaliar o período em que os veículos são carregados. Ele cita o caso da Califórnia, que investiu em parques solares, mas a maioria das pessoas carrega os veículos quando chega em casa, no fim do dia, período em que a produção solar diminui, mas a demanda aumenta.

À noite, explica ele, essa energia é recomposta por gás natural, outra fonte local. Ou seja, se o carro elétrico for carregado no momento de maior disponibilidade solar, durante o dia, provavelmente consumirá mais a energia renovável; se for à noite, o risco é de consumir mais a não renovável.

Lisbona defende que a geração distribuída tenha “tarifas inteligentes, mais granulares no tempo e no espaço, que reflitam o custo de se carregar o veículo no horário de ponta”. Além disso, quanto mais rápido é o carregamento, maior é a potência necessária. Significa que, para recargas ultrarrápidas, o custo também deveria refletir o maior impacto na rede de distribuição.

Por ter a maior parcela de sua energia gerada em fontes renováveis, principalmente a hidrelétrica, ele avalia que a eletrificação faria sentido no Brasil, mas o país enfrenta outros desafios, um deles o alto custo dos carros elétricos.

O professor também ressalta que o fato de ter o etanol leva ao questionamento se a rota do País seria de fato a eletrificação com veículos 100% elétricos ou se caminharia para modelos híbridos aproveitando o combustível da cana.

Mais eficiente

Flávia Spadafora, líder do setor automotivo da KPMG no Brasil, aponta a dificuldade da indústria brasileira em se pautar na matriz hidrelétrica que, em momentos de crise hídrica, fica fragilizada. Ela diz, contudo, que se o País atingir uma fatia de 20% a 30% de carros elétricos em sua frota até 2030, o impacto no consumo de energia seria de no máximo 1% ou 2% do que já é consumido hoje.

Para a especialista, o País teria condições de atender à demanda e poderia fazer novos investimentos, por exemplo, em geração eólica e solar. O argumento de que a energia no Brasil é cara também deve avaliar o peso da produtividade do carro elétrico. “O quilômetro rodado com carro elétrico vis a vis ao carro a combustão é bem mais eficiente.”

Eleição leva Portugal mais à esquerda e expõe crise da direita democrática, Mathias Alencastro, FSP

 

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Muitos portugueses foram votar neste domingo atravessados pela mesma pergunta que tira o sono de muitos brasileiros: como assegurar a aliança das forças democráticas contra a extrema direita?

A tão esperada ascensão do Chega seria suficiente para colocar o PSD, tradicional partido da centro-direita, face ao dilema que tem devorado a alma dos conservadores ao redor do mundo? Isto é: aliar-se à nova direita, xenófoba, negacionista e antirrepublicana, ou buscar a preservação do pacto democrático por meio de uma aliança com a centro-esquerda? A angústia dos conservadores era hoje visível no rosto de Rui Rio, o apático líder do PSD, que passou a campanha prometendo tudo e o seu contrário.

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Do outro lado, o socialista António Costa parecia não ter vontade nem condições de reeditar a geringonça, como é conhecida a aliança das esquerdas que governou Portugal aliando disciplina fiscal e inserção internacional entre 2015 e 2019.

Apesar do sucesso da empreitada, o Partido Comunista e o Bloco de Esquerda romperam com o Partido Socialista em 2019 e, no final do ano passado, ajudaram a derrubar o seu governo minoritário. Durante a campanha, Costa pareceu cansado e sem ideias, pressionado por novos líderes do seu partido e fragilizado pelo desmonte de um projeto de poder que ele havia desenhado de cabo a rabo.

Nesse contexto moroso, ninguém esperava a vitória triunfal dos socialistas deste domingo e o melhor resultado de Costa em três eleições. Mesmo se os socialistas não conquistassem a maioria absoluta na Assembleia da República, Costa só precisa, em principio, de acordos pontuais com aliados para seguir no comando de Portugal num momento decisivo da sua história: caberá ao próximo governo administrar a chamada "Bazuca", os volumosos fundos europeus destinados à retomada da economia.

O resultado em Portugal também reforça algumas impressões gerais sobre a dinâmica da política na era pós-pandemia. Primeiro, experiência da crise sanitária e a tomada de consciência da crise climática estão reaproximando os eleitores dos partidos comprometidos com o Estado social.

Segundo, o que todos se acostumaram a chamar de crise da democracia pode ser, na realidade, uma crise da direita. Com a confirmação do Chega como terceira força política, fica impossível para a direita democrática portuguesa competir eleitoralmente contra a centro-esquerda. Uma situação subjacente nos Estados Unidos no meio do Partido Republicano, escancarada na França, onde o racha das direitas é ainda mais profundo e, em certa medida, no Brasil, onde o surgimento de Sergio Moro e Jair Bolsonaro colocou a direita democrática em minoria dentro do campo conservador.

Por último, é impossível não destacar a atuação de Rui Tavares, candidato a deputado pelo Livre. Conhecido no Brasil pelo seu podcast "Agora, agora e mais agora", ele mostrou que a melhor forma de combater a baixaria verbal de candidatos mais acostumados às redes sociais do que aos debates eleitorais é a retidão republicana, as propostas inovadoras e o otimismo com o futuro. Uma inspiração para todos os progressistas brasileiros.