sexta-feira, 29 de junho de 2018

Guerra intestina, FSP


Decisões desencontradas corroem o que resta de credibilidade ao Supremo Tribunal Federal



Da esquerda para a direita, os ministros do Supremo Tribunal Federal Marco Aurélio Mello, Cármen Lúcia (presidente da corte) e Ricardo Lewandowski
Da esquerda para a direita, os ministros do Supremo Tribunal Federal Marco Aurélio Mello, Cármen Lúcia (presidente da corte) e Ricardo Lewandowski - Pedro Ladeira/Folhapress
Na percepção popular, o Judiciário ainda é o menos avariado dos Poderes da República, mas o STF (Supremo Tribunal Federal) dá a nítida impressão de que está se empenhando em alcançar os outros dois nas avaliações negativas.
Pesquisa Datafolha deste mês mostrou que o Congresso Nacional é objeto de desconfiança de 67% dos brasileiros, seguido da Presidência, que é desprezada por 64%. O Judiciário em geral é reprovado por mais modestos 31%. Considerando apenas o STF, a taxa sobe para 39%.
É difícil até imaginar por que a Justiça ainda goza de certo prestígio. Boa parte das disfuncionalidades do país pode ser ligada a decisões tomadas nos tribunais. Para citar um caso recente, o TST acaba de alterar os termos de um acordo coletivo firmado em 2007 entre a Petrobras e trabalhadores, impondo do nada um prejuízo de mais deR$ 15 bilhões à estatal.
Quaisquer que sejam os motivos por que 67% dos brasileiros ainda confiam muito ou um pouco no Judiciário, a guerra intestina que integrantes do STF travam à vista de todos não ajuda a instituição. As decisões desencontradas de juízes singulares e turmas, tomadas em posicionamentos estratégicos e politicamente motivados, corroem o que resta de credibilidade à corte e minam a ideia de estabilidade jurídica, pela qual o Supremo deveria zelar.
Do jeito que estão as coisas, não são mais as leis e a jurisprudência que definem o destino de réus em casos de corrupção, mas o sorteio. Quem cai com a Primeira Turma se dá mal e quem fica com os ministros da Segunda tira a sorte grande.
Diferenças hermenêuticas e doutrinárias são legítimas, mas só enquanto não há um entendimento do colegiado. Depois que o plenário tomou uma decisão, ela precisa ser seguida por todos. Tentar contornar a posição majoritária recorrendo a estratagemas lembra a atitude de crianças mimadas, não a de juízes da mais alta corte do paísincumbidos de fazer cumprir a Constituição.
Hélio Schwartsman
É bacharel em filosofia e jornalista. Na Folha, ocupou diferentes funções. É articulista e colunista.

Amazônia Bilionário, opinião FSP


Fazer cumprir a lei não é algo que possa depender de doações estrangeiras



Área desmatada na cidade de Novo Progresso, no Pará
Área desmatada na cidade de Novo Progresso, no Pará - Ueslei Marcelino - 11.nov.16/Reuters
Completa dez anos uma iniciativa destinada a promover a conservaçãoda maior floresta tropical do planeta. Iniciado com um aporte de US$ 1,1 bilhão do governo da Noruega, o Fundo Amazônia chegou a US$ 1,2 bilhão (R$ 4,6 bilhões no câmbio atual) com doações da Alemanha e da Petrobras.
O dinheiro é depositado na proporção do sucesso obtido na redução do desmatamento. Quando a devastação cresce, como em 2015 e 2016 (24% e 27% de incremento, respectivamente), o fluxo cai.
As quantias transferidas ficam sob gestão do BNDES. O banco federal de fomento desembolsou até aqui R$ 954 milhões para apoiar cem projetos. Monta a 345 o total de instituições dedicadas a atividades produtivas sustentáveis já atendidas. Entre elas há organizações não governamentais, mas igualmente órgãos públicos.
É o caso do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). A partir de 2016, num período de 12 meses, o órgão recebeu R$ 56 milhões, em meio à aguda restrição orçamentária federal.
Empregou-se a verba para manter e ampliar as operações de combate ao desmatamento. Houve aumento da frota de viaturas e aluguel de helicópteros.
Após o salto de 2016, quando 7.893 km² de floresta amazônica sucumbiram, a taxa de desmatamento voltou a cair. Em 2017 recuou a 6.947 km², uma redução de 12%.
Parece ter sido providencial para reverter a tendência, assim, a contribuição dada pelo Fundo Amazônia. Cabe destacar, contudo, que esse arranjo só se torna aceitável numa situação excepcional como a dos imperativos cortes drásticos nas despesas do governo.
Há pelo menos dois motivos para argumentar que o socorro ao Ibama não deve se prolongar em demasia. Em primeiro lugar, impedir o desmatamento ilegal constitui função precípua do Estado. Fazer cumprir a lei não é algo que possa depender de doações estrangeiras.
Depois, importa assinalar que a fonte de recursos surgiu para fomentar atividades que criem alternativas ao modelo tradicional de ocupação da região. Já passou o tempo de destruir a floresta sem gerar renda e empregos para a maioria de seus habitantes.