domingo, 25 de maio de 2025

A censura do Judiciário à divulgação de seus privilégios, Editorial FSP

 

Imagem em primeiro plano mostra mulher negra posando para foto usando uma toga
Iris Helena Medeiros Nogueira, desembargadora do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS) - Divulgação/ TJ-RS

Servidores do Estado, incluindo integrantes do Poder Judiciário, são custeados por recursos públicos e estão sujeitos a críticas e questionamentos a respeito de seu trabalho e sua remuneração, desde que baseados em informações corretas. Esse entendimento singelo parece escapar a tribunais do país.

Por uma publicação de julho de 2023 que divulgava valores pagos em abril daquele ano no Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul (TJ-RS), o jornal Zero Hora e a colunista de política do veículo Rosane de Oliveira foram condenados a pagar a indenização de R$ 600 mil à desembargadora Iris Helena Medeiros Nogueira, então presidente da corte.

Nogueira recebeu à época o rendimento líquido de R$ 662.389,16, valor que inclui pagamentos de natureza indenizatória —os infames penduricalhos, por meio dos quais magistrados e outros profissionais da elite do funcionalismo driblam o teto salarial dos servidores, hoje de generosos R$ 46,4 mil mensais.

O valor exorbitante da indenização imposta representa evidente tentativa de desestimular o trabalho da imprensa na fiscalização do poder público, essencial para a democracia.

Na decisão da Justiça estadual, afirma-se que a reportagem criou um "narrativa enviesada e sensacionalista que associava a autora [a desembargadora] à figura de suposto privilégio imoral ou injustificado, fomentando a incompreensão do público leigo". Note-se que não se mencionam informações erradas no argumento.

Juízes não compõem uma casta isenta de escrutínio. A sociedade tem o direito de tomar conhecimento dos valores que destina ao custeio do Judiciário por meio de impostos, de modo a cotejá-los com o serviço que recebe em troca. Comparações internacionais mostram que o custo do sistema de Justiça no Brasil não tem paralelo entre as principais economias ricas e emergentes.

A despesa com tribunais aqui chega a 1,33% do Produto Interno Bruto, ante uma média de 0,3% do PIB entre 50 países examinados em análise do Tesouro Nacional. A disparidade evidencia salários incompatíveis com a realidade brasileira, dado que cerca de 80% do gasto do Judiciário é destinado a pagamento de pessoal.

Magistrados têm obviamente o direito de reivindicar a remuneração que lhes pareça adequada —embora não o de desrespeitar de modo sorrateiro o limite ora fixado na legislação. Inadmissível, sem dúvida, é que usem seu poder para intimidar veículos de comunicação e profissionais que apenas exercem seu papel de informar com dados públicos.

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