sábado, 1 de março de 2025

“Urbanismo” e o poder das palavras, Lucas Chiconi Balteiro, Le Monde Diplomatique

 Lucas Chiconi Balteiro

Não é bem verdade que somos responsáveis somente pelo que falamos e não pelo que os outros entendem. A comunicação se constitui de uma construção ampla, com diálogos, reciprocidade, falhas, equívocos, reconstrução e, principalmente, intenções. Talvez um dos poucos consensos da humanidade seja sobre o poder das palavras. Vemos essa discussão em espaços religiosos e passando por manifestações culturais de toda ordem, assim como no campo econômico e inclusive nos muitos livros que engajam a ideia da “mente milionária”. Na política, então, não há dúvidas de que as palavras são parte consistente e fundamental da construção de planos de governo, sua efetividade e até mesmo das disputas ideológicas, seja entre partidos e suas correntes diversas, seja pelas disputas no âmbito complexo da política cotidiana e suas inúmeras contradições. Em especial, pelas ferramentas da imprensa, desde os veículos da hegemonia até os de âmbito local e regional. Humanizadas, ou não, no trabalho de jornalistas, publicitários e outras profissões.

Painel em colagens lambe-lambe denominado “São Paulo: o cúmulo do samba – Salve o samba paulistano”, na estação Vila Prudente do metrô de São Paulo. Integra o Museu de Arte de Rua de São Paulo (MAR) e foi criado pelo artista Átila Fragozo, com pesquisa do sociólogo e sambista Tadeu Kaçula. Crédito: Lucas Chiconi Balteiro.

O domínio das palavras também é o domínio de certas “narrativas” e a sua difusão na sociedade, pelo poder da persuasão, do convencimento. O trabalho dos influenciadores digitais é um dos exemplos que estão no auge da questão. Aliás, antes do advento digital, alguns já faziam o papel de influenciar opiniões em debates públicos ou de setores específicos. Tatiana Roque é professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro e autora do livro O Dia em que Voltamos de Marte: uma história da ciência e do poder com pistas para um novo presente. Para ela, os experts passaram a ocupar uma lacuna entre o meio acadêmico-científico e a condição de fama ao divulgar informações, mas sem representação junto às instituições de compromisso com o interesse público. Em outras palavras, algumas figuras passaram a ocupar um lugar de fama a respeito de um assunto que, para o público, as tornam especialistas, mas quando na verdade não existe um completo compromisso com as informações transmitidas.

Para Tatiana Roque, a diferença entre o cientista e o expert, é que o primeiro pode fazer divulgação científica à vontade, desde que as ciências em questão não tenham impacto em políticas públicas. Portanto, o expert se caracteriza por fornecer um conhecimento para embasar decisões políticas, que vão impactar em políticas públicas. Assim, já não é mais divulgação científica a questão, mas se trata de recomendação baseada em ciência, que não pode ser feita individualmente, sobretudo pelos interesses políticos e empresariais que dão vazão ao trabalho dos experts.

No programa de Portas Abertas do Flow, Carlos Tramontina perguntou para Astrid Fontenelle sobre a perda de seriedade do jornalismo, onde ambos concordam com a dinâmica que recorre ao caça-clique pela manchete fantasiosa, exagerada e de duplo sentido, em que reforçam a necessidade da responsabilidade com a informação. Podemos relacionar o que os dois jornalistas falaram com o que Tatiana Roque trata a respeito dos experts, que muitas vezes não tem compromisso com o interesse público, espalhando informações falsas que vão influenciar favoravelmente a determinados interesses. Além disso, influenciando, inclusive, com a perda de confiança da população com as instituições científicas, como as universidades. Esse é um dos pontos fortes da investigação de Tatiana Roque, ao explicar que a crise da ciência não se trata do questionamento à fotossíntese ou à física quântica, mas sim da crise das ciências que influenciam nas políticas públicas.

Afinal, quem fala o que fala, fala por quê? Fala de onde?

O geógrafo Marcelo Lopes de Souza, em seu livro Mudar a Cidade: Uma Introdução Crítica ao Planejamento e à Gestão Urbanos, bem como em outro livro de sua autoria, Os Conceitos Fundamentais da Pesquisa Sócio-espacial, fornece um extenso e relevante panorama de uma série de palavras comuns a nós, profissionais das políticas públicas urbanas e territoriais (lembrando que o campo e o rural também existem e merecem atenção especial). Dentre os mais variados conteúdos trabalhados por esse autor, um deles é quando explica as diferenças entre os conceitos de planejamento urbano, urbanismo e desenho urbano, sendo o primeiro mais amplo e indissociável da gestão urbana. Urbanismo e desenho urbano são uma parte do planejamento urbano, um campo interdisciplinar e abrangente, em que não podemos tomar uma parte pelo todo, como bem ressalta o autor. Para ele, nem o desenho urbano e o urban design seriam equivalentes pela tradução livre das palavras, em vista dos percursos ideológicos que os constituem, como a insatisfação dos arquitetos “pós-modernos” ou “não-modernistas” com a associação entre o urbanismo e o movimento modernista. Em suma, enquanto o planejamento urbano condiz com os direcionamentos e a utilização dos espaços da cidade, o urbanismo estaria voltado para a aplicação do planejamento e a modelagem formal do espaço urbano mediante a atividade construtiva – o geógrafo tomou como referência o livro alemão “Städtebau: Technische Grundlagen” (Planejamento Urbano: Fundamentos Técnicos) de Martin Korda e Wolfgang Müller.

Nos meandros dos processos de intervenção nas cidades, ao falar sobre o processo de verticalização em cidades brasileiras, Lucas Silva Pamio reforçou a dualidade do processo que sugere progresso e desenvolvimento, enquanto também se trata de uma forma de segregação da sociedade. É frequente a criação de conceitos e categorias que tentam dar conta de processos complexos. Muitas vezes, abstraindo camadas importantes como estratégia de alcance para determinados objetivos. É parte do jogo de palavras, sobretudo no mundo dos negócios. Por exemplo, o que tratamos no texto a respeito das cortinas de fumaça do Urbanismo, em que destacamos o uso do adensamento como adjetivo, quando na verdade é derivado de um verbo: adensar. O mesmo é válido para regular, regulamentar, flexibilizar, privatizar, conceder, urbanizar, preservar e tombar. São ações, portanto, verbos, não adjetivos. A qualidade do processo demanda dos seus resultados e consequências.

Ao longo do tempo, conforme movimentos de mudanças nas sociedades, as palavras sofrem pressão para que caiam em desuso ou para que sejam utilizadas de modo diferente, como em casos de conotação racista ou capacitista. Denegrir e manicômio são bons exemplos nesse sentido.

Normalmente usado para tratar de projetos urbanos em áreas centrais, o verbo revitalizar, bem como seu derivado “revitalização”, é um dos mais criticados por grupos progressistas, pelo argumento de que induz a ideia de trazer de volta à vida um espaço que, em teoria, está morto. Contudo, o argumento parte justamente da motivação de grupos conservadores que demonstram seu interesse em re-ocupar o lugar, mas em muitos casos, por uma lente que abafa a presença e dinâmicas dos grupos mais pobres ali existentes. Não é raro que nesses casos, campos normalmente tidos como opostos, como o planejamento urbano e o patrimônio cultural, sejam mobilizados em conjunto para advogar pela recuperação dos edifícios antigos, geralmente de caráter monumental e capazes de movimentar sentimentos nostálgicos. Porém, os enfrentamentos são frequentes quando novos projetos de dimensões também monumentais, passam a competir com os espaços já construídos, de representações sociais variadas.

A alcunha de “cidade inteligente” é outro exemplo do vocabulário ligado aos estudos e atividades urbanas, em que uma série de agentes públicos e privados, sob interesses diversos, provocam tanto iniciativas de revisão do planejamento e gestão da cidade, quanto mercados de uma suposta “inteligência” a ser comercializada. Nesse caso, o mercado em questão não está limitado somente ao produto vendido, mas é um componente de uma cadeia maior de competição entre cidades. Não nos referimos às agências de cooperação entre cidades, que realizam trabalhos sérios de intercâmbio, buscando algum equilíbrio e reciprocidade. No entanto, nos faz pensar se o ato de competir, sobretudo pelos contextos tão distintos e desiguais ao redor do mundo, estaria no lugar de uma nova roupagem para as hierarquias da globalização, expressas pelas “cidades globais” e o formato de governança urbana que emergiu ainda nos anos 1970 – a esse respeito, o geógrafo David Harvey utilizou a palavra entrepreneurialism, que Marcelo Lopes de Souza traduziu por “empresarialismo” ou “empreendedorismo”, como qualificação ao estilo de governança urbana caracterizado por uma submissão acrítica aos interesses de mercado e pela obsessão na competição entre cidades, para atração de investimentos. O termo “cidade global” foi colocado por Saskia Sassen no início dos anos 1990, se referindo ao poder concentrado em Nova York, Londres e Tóquio naquele momento. Não poderia escapar das nossas inquietações as variações criadas dentro do campo do urbanismo e seus objetivos, como: urbanismo sustentável, urbanismo verde, urbanismo social, urbanismo vertical, urbanismo tático, urbanismo baseado em evidências e tantas outras. Outros formatos recorrentes: cidade compacta, cidade de 15 minutos, cidade para pessoas, cidade planejada (ou bairro planejado), cidades privadas, cidades responsivas. E claro, o termo “cidade-esponja”, criado basicamente para denominar experiências de execução de áreas verdes permeáveis, a fim de enfrentar inundações. Depois da tragédia no Rio Grande do Sul, foi profundamente utilizado nas eleições municipais de 2024.

Segregar também é um verbo e constitui a ação de separação, de criar divisões. Quando usado no contexto urbano, está vinculado ao zoneamento (zonear), pela separação de funções de um território entre as propostas de uso, ocupação e parcelamento da terra. Em síntese, o que e como construir a depender do terreno e seu território no município. Entretanto, o zoneamento enquanto lei se trata de uma ferramenta, ou de um conjunto delas, uma vez que não é um fim em si mesmo. Ainda nesse contexto, a condição de segregação é constantemente atribuída à separação entre classes sociais por parte dos mais ricos, por uma série de ações técnicas, jurídicas, políticas e ideológicas, materializada por condomínios fechados ou bairros que se distanciam ou se blindam para evitar “gente diferenciada” – o que foi dito entre os anos de 2010 e 2011 por moradores de Higienópolis, um bairro do centro de São Paulo, quando anunciada a construção da Linha 06-Laranja do Metrô, tendo uma das suas extremidades na Brasilândia, bairro periférico da zona norte.

Por essa perspectiva, as palavras têm força de hierarquizar a sociedade e seus espaços, como quando elegem a Avenida Paulista à condição de “ágora” de São Paulo – uma palavra usada na Grécia antiga para caracterizar lugares de intensa vida social em pontos elevados do território na paisagem – me pergunto o que a comunidade negra do Largo do Rosário da Penha pensaria a respeito, com sua igreja no alto do morro voltada ao leste, de costas para a Catedral da Sé; ou os bairros da orla de Santos como uma “Higienópolis à beira-mar” – em referência ao bairro do centro de São Paulo que sofreu um processo de verticalização com a construção de muitos prédios modernos, assinados por arquitetos de renome; ou tratar a Tijuca como “a zona sul na zona norte” – quando na verdade, a história mostra que a elite carioca passou primeiro pela Tijuca, para depois se consolidar nos bairros da zona sul do Rio de Janeiro. É o poder da comunicação e seu emaranhado de controle social, político e econômico, ao influenciar uma construção cultural que torna “centro” ou “central” os lugares que detém poder nos três aspectos mencionados. É daí, portanto, que muitos de nós afirmam que certos lugares são longes demais. Mas afinal, longe do quê ou de quem? Por quê?

Já pensou por que em certos lugares que fotografamos e postamos nas redes sociais, marcamos com o nome da cidade e, em outros, marcamos o nome do bairro ou local exato em que estamos? Por que com a vista dos prédios da área central de São Paulo, ou pela vitrine de prédios corporativos da Marginal do Rio Pinheiros, bem como pelo Parque do Ibirapuera, a chamamos de São Paulo? E qual a razão para que fora da paisagem hegemônica, como nos lugares que detém de outras formas urbanas construídas e seus grupos sociais, atribuímos outras formas de tratamento? O mesmo serve para a zona sul carioca que é tratada como “o Rio de Janeiro”, por meio de uma caricatura de “paraíso tropical”, principalmente pelas imagens do Pão de Açúcar quando aqueles turistas que se hospedaram por lá estão a caminho do Aeroporto Santos Dumont. Enquanto isso, as zonas norte e oeste são relegadas a uma condição de inferioridade, materializada por estereótipos que se misturam com problemas urbanos, como pobreza, violência, mobilidade precária e calor extremo, mas lembradas quando se trata das escolas de samba durante o Carnaval, ou, talvez, pela Avenida Brasil.

Algo semelhante acontece quando nos referimos à região amazônica somente pelas lentes que moldam um certo imaginário da floresta, que dá corpo ao bioma brasileiro, colocando no esquecimento as muitas cidades que lá estão, suas demandas sociais e econômicas, seus trunfos e problemas urbanos característicos de todo o país. No caso de Salvador, região nordeste, percebemos uma leva de turistas envolvidos em uma trama fetichista que essencializa circuitos e regiões que são eleitos para simbolizar a teia social complexa da metrópole baiana, a exemplo do Centro Histórico e de parte da Orla Atlântica, menosprezando assim as regiões onde vivem a maior parte da população, a exemplo do Miolo e até mesmo do Subúrbio Ferroviário. Não podemos esquecer da redução de Brasília ao seu Plano Piloto e ao universo da política federal, ou quando a mesma é rebaixada em sua urbanidade pelo projeto rodoviarista, como argumento para vilipendiar o projeto moderno expresso em sua arquitetura – um alvo dos grupos conservadores subservientes aos países do norte, sobretudo aos Estados Unidos. Importante assistir ao vídeo produzido pela arquiteta e urbanista Rafaela Simonato Citron, em que evidencia a profundidade do modernismo ao tentar resolver os problemas sociais do seu tempo, enfrentando a exclusividade burguesa do trabalho do arquiteto até então.

No sul do país, onde a maior parte do estado do Rio Grande do Sul se declara branca racialmente, ainda existe um franco desconhecimento sobre a população negra, ao ponto do presidente Lula, em seu terceiro mandato, declarar que desconhecia tamanha quantidade de negros no estado. Janja, sua esposa, o alertou de que esses são principalmente os mais pobres, habitantes das áreas mais arriscadas a sofrerem com tragédias ambientais. Mais uma vez, não por acaso, o Brasil sofreu com a tentativa de embranquecimento da população. A miscigenação brasileira, embora realmente fascinante, tem suas raízes em atos de violência contra mulheres indígenas e negras escravizadas durante a colonização. Imigrantes europeus, muitas vezes em péssimas condições de trabalho, não eram escravizados – condição que tem por essência remover a humanidade de uma pessoa. É de imenso valor referenciar a filósofa Djamila Ribeiro em sua entrevista no programa Roda Viva da TV Cultura. Ao responder o comunicador AD Júnior, que destacou o desconhecimento de nossa elite (branca) em relação ao Brasil, Djamila afirmou que éramos vistos somente como objetos de estudo e não como sujeitos epistemológicos, frente ao pacto narcísico da branquitude e ao projeto colonial que atravessam o espaço acadêmico brasileiro. São dinâmicas frequentes, em que algumas identidades e lugares cristalizados no imaginário popular, ocupam o topo da hierarquia na representação sociocultural de toda uma cidade, estado ou região do país. Aliás, certos lugares são eleitos justamente para representar todo o país. Lugares esses que, em geral, desconhecem o próprio Brasil.

No mesmo percurso, percebemos o uso das palavras no jogo imobiliário, de valorização da terra, em que surgem variações de um ou mais bairros com os adicionais “novo”, “norte” e “sul”, em uma maleta de ferramentas que indicam a expansão da valorização para uma determinada direção. No caso paulistano, nos primórdios da urbanização da metrópole, foi muito comum a diferenciação entre áreas altas e baixas. Diferente do que ocorreu no Rio de Janeiro, onde o morro recebeu o significado de pobreza e marginalidade, devido ao processo de favelização daqueles que foram expulsos do “asfalto”, as áreas baixas, em São Paulo, foi o inverso. Eram mais valorizadas as áreas altas devido suas melhores condições de salubridade, pela ventilação e a insolação. Não foi por acaso que os antigos barões do café ocuparam a Avenida Paulista com seus palacetes, mas justamente por esse ser um dos pontos mais elevados das terras da cidade que se formava naquele período. Posteriormente, muitos bairros da primeira ou segunda onda de expansão da urbanização seguiram o mesmo caminho, como Alto de Santana, Alto do Tatuapé, Alto da Lapa, Alto do Ipiranga, Alto da Mooca, Alto de Pinheiros, como estratégia de se diferenciarem das áreas mais baixas, normalmente de caráter popular, como o Baixo Tatuapé (Parque São Jorge), a Mooca Baixa, o Baixo Pinheiros (Largo da Batata), o Centro de Santana, a Lapa de Baixo ou a parte baixa do Ipiranga, mais suscetível às inundações.

Mais tarde, novas formas de diferenciação por palavras foram sendo criadas, como Brooklin Velho e Brooklin Novo, ou as variações construídas por meio de condomínios fechados, como Paraíso ou Retiro do Morumbi, quando a valorização tradicional do bairro de mansões já não dá mais conta de suprir novas aspirações da sociedade de consumo. As palavras também podem criar comparações de modo a evidenciar um problema, em um espaço geográfico diferente daquele relacionado a um nome em particular: como o Jardim Pantanal, que remete ao bioma brasileiro caracterizado pelas planícies alagáveis entre os estados do Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. Então, como modo de alerta para as inundações recorrentes no bairro de condições precárias e vulneráveis às margens do Rio Tietê. Não só de palavras que representam uma ação, um processo, se constituem as cidades, como também palavras que se valem da tentativa de denominação para regiões inteiras, como centro, periferia, subúrbio, centro histórico, periurbano. Já com o bonde andando, outras palavras pegam carona nesses trilhos, como: bairro nobre, zona perigosa, área degradada, bairro decadente, depósitos de gente. A própria “habitação de interesse social” (HIS), supostamente um consenso no campo diante das injustiças socioespaciais, sofre com solavancos no seu significado social, popular e jurídico, ao ponto de cair em valas fraudulentas. Em São Paulo, o Ministério Público levantou suspeitas e pediu à Prefeitura pela suspensão da produção de HIS por meio do mercado imobiliário privado.

Entre transformar lugares pelas dinâmicas de mercado ou pelas necessidades de mitigação de problemas socioespaciais históricos, existe o lugar da preservação, sobretudo do que entendemos como patrimônio que deve ser legado às gerações futuras. Prédios, parques, objetos, acervos, paisagens, conjuntos de construções, manifestações culturais e políticas, saberes tradicionais e recursos naturais. São marcas da história construída até o presente que nos fazem constituir identidades enquanto sujeitos e grupos sociais aos quais pertencemos, bem como aos lugares que habitamos no campo, nas florestas e nas cidades. Preservar pode demandar lutas exaustivas ao longo do seu percurso entre a sociedade civil, as instituições públicas, os interesses privados e as entidades de classe envolvidas nos conselhos deliberativos de preservação – caso de entidades de advogados, engenheiros e arquitetos-urbanistas.

Como um imenso Vale Tudo, de Brasis que mostram as tuas caras, as palavras revelam desejos, estratégias, pactos e ideologias. Não são ditas ao vento ou por acaso. Falamos com propósito. Quando se trata de um contrato de comunicação maior, por parte de entidades vinculadas às disputas de mercado e de trabalho, como as próprias entidades de classe, sobretudo quando uma gestão específica impõe seus valores sobre o seu corpo institucional, devemos estar atentos aos movimentos. Se damos espaço a um determinado tipo de discurso, de comunicação em geral, precisamos pensar nas razões que estão implicadas nesse processo. Em especial, quando se trata de uma relação de comunicação institucional por meio de experts de caráter individual na divulgação de informações. Afinal, quem promove um discurso, promove por quê? Tira recursos de onde?

 

Lucas Chiconi Balteiro é arquiteto e urbanista, mestrando em História e Fundamentos da Arquitetura e do Urbanismo na FAU/USP e membro dos grupos de pesquisa “Cultura, Arquitetura e Cidade na América Latina” (CACAL, FAU/USP) e “Cidade, Arquitetura e Preservação em Perspectiva Histórica” (CAPPH, UNIFESP).


Nenhum comentário: