quinta-feira, 6 de março de 2025

Teto de gastos, palavras e fatos, Bráulio Borges, FSP

 Escrevi, há algumas semanas, um artigo neste espaço argumentando que o teto de gastos criado em 2016 é muito superestimado por diversos analistas. Como seria de esperar, recebi uma enxurrada de críticas. Talvez a mais vocal delas tenha sido aquela do economista Alexandre Schwartsman, em artigo publicado em outro jornal.

Alexandre colocou o debate como se ele estivesse apresentando "fatos" e eu, somente "palavras". Chegou até mesmo a denominar alguns de meus argumentos como "vento". Curioso, já que eu, o "moço de cálculos", apresentei diversos números/fatos em meu artigo anterior.

Vale assinalar que eu não sou contra um teto de gastos; minha crítica sempre foi quanto ao desenho excessivamente simples e à calibragem numérica irrealista (despesa real congelada por dez anos) daquele teto da EC 95/2016, além da ausência de um "plano de voo" para o seu cumprimento entre 2017 e 2026.

Outros "moços de cálculos" —Fábio Giambiagi e Guilherme Tinoco, craques em finanças públicas— sugeriram, ainda em meados de 2019, alterar o teto original, substituindo-o por um novo teto, com reajustes reais positivos e crescentes das despesas. Isso porque quem fez contas com cuidado, como eles, eu e vários outros, constatava que o teto não era exequível, mesmo que fossem implementadas outras reformas nas despesas obrigatórias para além da importantíssima reforma da Previdência aprovada em 2019.

Parlamentares de esquerda comemoram na Câmara a exclusão do Fundeb do arcabouço fiscal - Pedro Ladeira - 22.ago.23/Folhapress

Dito isso, a introdução do teto de fato foi positiva em um primeiro momento, ao "apagar um incêndio" em 2016. Não obstante, a nova regra fiscal passava bem longe de representar uma mudança estrutural na dinâmica das despesas. Já em 2020, com os gastos do Fundeb tendo sido quase triplicados (estavam foram do teto), aquela regra fiscal foi muito enfraquecida, para ao final ter morrido de "morte matada", no final de 2021, com as alterações casuísticas nos precatórios e no indexador, de olhos nas eleições de 2022.

Apontei, em meu artigo anterior, que a relação entre dívida e PIB subiu bastante nos três anos iniciais do teto e acumularia alta de 14 p.p. ao longo de oito anos, segundo as expectativas de consenso formuladas antes da pandemia.

Para que um ajuste fiscal seja bem-sucedido, não basta apenas controlar a despesa; é preciso elevar o resultado primário e, também, que a composição desse ajuste não machuque tanto o crescimento do PIB, para que, no final das contas, a dívida/PIB estabilize ou recue.

Ainda que o teto tenha gerado uma melhoria das expectativas, ele não gerou aumento relevante do resultado primário estrutural (apresentei os números mais recentes da SPE no artigo anterior). Vale destacar que os resultados primários efetivos elevados em 2021 e 2022 foram ajudados por receitas infladas, pela ordem, em 1,4% e 2,2% do PIB, por conta de altas temporárias dos preços das commodities e da inflação muito acima das metas.

Ademais, essa melhora das expectativas gerada pela introdução do teto não foi suficientemente forte para que se materializasse a tão desejada "contração fiscal expansionista": o crescimento médio do PIB no período foi de apenas 1,4% a.a., configurando a recuperação mais lenta após uma recessão já registrada em 40 anos –algo que manteve a inflação em torno do piso da meta durante boa parte do período 2017-19.

Uma economia com inflação muito abaixo da meta central e que operava com excesso enorme de ociosidade, como era nosso caso em 2017-2019, precisava mesmo de juros reais muito baixos para sair daquele estado sub-ótimo.

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