Uma nova maneira de plantar a cana-de-açúcar está reduzindo o custo e aumentando a produtividade da lavoura. Agricultores e cientistas de São Paulo, estado que mais produz cana no Brasil, falaram sobre a novidade.
Cana de açúcar no Brasil é uma atividade que engloba centenas de usinas, milhares de agricultores e trabalhadores e um cultivo que se espalha por 8 milhões de hectares. Para manter essa engrenagem funcionando, todos os anos uma parte dos canaviais brasileiros tem que ser replantada. Isso ocorre porque um cultivo costuma ter boa produtividade durante cinco safras. Depois, a produção tende a cair. É a hora de fazer a chamada reforma ou replantio do canavial.
O replantio da cana-de-açúcar pode ser feito de várias maneiras. Atualmente, o método mais comum é uma operação grandiosa. Um trabalho que envolve máquinas pesadas, tratores, transbordos. Tudo para fazer o transporte e replantio da cana-de-açúcar nas áreas que precisam de reforma.
Na fazenda no munícipio paulista de Motuca o trabalho é feito com plantadeiras, que despejam nos sulcos as mudas, também chamadas de rebolos ou colmos. São pedaços de cana que vão brotar no solo para dar origem a um novo cultivo.
O problema é que o trabalho mecanizado acaba ficando caro, principalmente para os agricultores médios e pequenos. Outro ponto negativo é que as mudas de cana ficam passando de uma máquina para outra sacudindo e batendo, o que reduz a taxa de brotação.
Como menos brotação, os produtores acabam usando uma grande quantidade de mudas por hectare. O que torna a operação ainda mais trabalhosa e cara.
Nos últimos anos, o custo alto da reforma se somou a um momento delicado: a cadeia da cana enfrentou uma crise, com preços baixos, clima desfavorável e endividamento. Com menos dinheiro, agricultores e usinas reduziram o ritmo do replantio.
“Nós ficamos aí com índice de renovação de 12% a 13% nas últimas duas safras. O ideal seria uma reforma de 18% da área colhida anualmente para ter um bom canavial, um canavial equilibrado”, diz o economista Antônio de Pádua Rodrigues.
De uns meses para cá, com a melhoria dos preços do açúcar, a reforma dos canaviais voltou a crescer, mas permanece abaixo da taxa ideal de 18%.
Foi justamente o cenário de crise dos últimos anos que acabou dando impulso para uma nova maneira de replantar os canaviais. O objetivo é reduzir custos e melhorar a eficiência da reforma.
Um dos pilares da mudança é a muda pré-brotada de cana ou MPB. A unidade do Instituto Agronômico de Campinas – IAC em Ribeirão Preto é referência nesse tipo de tecnologia. O agrônomo Marcos landell explicou que a grande mudança é abandonar o plantio baseado em toneladas de colmos e passar a plantar cana com espaçamento preciso, muda por muda.
A produção da MPB não é complicada. No IAC, o primeiro cuidado é obter colmos de qualidade, vindos de cultivos livres doenças. No viveiro, eles são cortados em pedaços pequenos, com apenas uma gema; recebem um tratamento anti-fungos e depois vão para a bandeja para o cultivo em substrato. Tratadas com todo o cuidado, as mudas brotam e crescem rapidamente. Em dois meses estão prontas para o plantio no campo.
As mudas pré-brotadas podem ser usadas no plantio de talhões inteiros de cana. Mas na prática a MPB tem sido mais usada num manejo diferente, chamado meiosi. Um método de replantio dos canaviais que surgiu nos anos 1990 na Universidade Estadual Paulista - Unesp, em Jabotical. Mas só nos últimos começou a ser mais usado por agricultores, principalmente em São Paulo.
O agrônomo Igor Pizzo é diretor técnico da Coplana, cooperativa do norte do estado que abriga 1,2 mil fornecedores de cana e vem estimulando o uso de meiosi em parceira com o IAC. “Meiosi é método inter-rotacional ocorrendo simultaneamente. O objetivo geral é a gente formar o viveiro de mudas dentro da própria área de renovação”, diz.
O método funciona da seguinte maneira: em uma área que será reformada, logo após a colheita, pelos meses de setembro e outubro, os agricultores preparam o terreno e plantam linhas de mudas pré-brotadas. O espaçamento é de 15 metros entre as linhas e 60 centímetros entre plantas. São essas mudas que, mais a frente, vão ser usadas para o replantio de toda a área. No restante do terreno, os agricultores semeiam leguminosas, como soja e amendoim.
Atualmente, esse modelo está sendo utilizado por 32 cooperados da Coplana, como Rogério Bonaccorsi. Ele tem 400 hectares de canaviais no município paulista de Luiz Antônio. Com orientação da cooperativa e do IAC, o agricultor passou a produzir as suas próprias mudas pré-brotadas e formou áreas de meiosi com cana e amendoim.
Segundo Rogério, a primeira vantagem da meiosi é que a cobertura com amendoim aumenta a umidade do solo e protege o terreno contra erosão. Outro benefício de plantar amendoim ou soja nas áreas de reforma é quebrar o ciclo doenças e pragas da cana, como o nematoide.
Seis meses depois do plantio da cana e quatro meses depois do plantio do amendoim, a área de meiosi está com as linhas de cana altas e bem formadas. E o amendoim está verde e forrando bem o solo. Nessa fase começa a colheita.
A colheita do amendoim ocorre entre fevereiro e março e tem duas etapas. Primeiro, esse o implemento arranca as plantas e revira o amendoim que estava embaixo da terra. Depois, outros equipamentos terminam a colheita e despejam o produto em caminhões. Todo o trabalho é feito por empreiteiros que arrendam as terras de Rogério. Eles cuidam do amendoim, desde o plantio até a venda final, e pagam um preço fixo de R$ 1 mil por hectare.
Terminada a colheita, a área que antes estava coberta com amendoim começa a receber a cana-de-açúcar. É a repicagem da cana, etapa final da renovação feita com meiosi.
A fazenda de um cooperado da Coplana em Jaboticabal começou a usar meiosi em 2012. O agrônomo Ismael Perina Júnior cultiva 580 hectares na propriedade. Na área em que o amendoim foi colhido há três dias a repicagem está sendo realizada por oito funcionários da própria fazenda. Eles cortam a cana das fileiras, plantadas com mudas pré-brotadas, e depois levam os colmos para os sulcos. Eles não ficam empilhados, como no plantio convencional, mas alinhados um a após o outro.
“A grande vantagem é que eu utilizo muito menos muda por hectare do que sistema convencional. Então, eu saio do uso de 20 toneladas para algo em torno de 4 a 4,5 toneladas por hectare”, diz o agrônomo.
Essa redução ocorre porque na meiosi a cana usada no plantio foi produzida a partir de mudas pré-brotadas. Um material uniforme, jovem e que, crescendo na própria área, não passa por transbordos ou máquinas pesadas, não sofrendo com batidas e ferimentos típicos do plantio convencional. Por tudo isso, os colmos têm grande capacidade de brotação.
Essa redução ocorre porque na meiosi a cana usada no plantio foi produzida a partir de mudas pré-brotadas. Um material uniforme, jovem e que, crescendo na própria área, não passa por transbordos ou máquinas pesadas, não sofrendo com batidas e ferimentos típicos do plantio convencional. Por tudo isso, os colmos têm grande capacidade de brotação.
Mas afinal, quanto custa fazer a reforma com MPB e meosi? Os valores variam de uma fazenda para outra. Enquanto o replantio convencional fica por cerca de R$ 7,5 mil o hectare, no caso da fazenda de Ismael, a reforma teve um custo médio R$ 4,8 mil por hectare. Isso já incluindo os gastos com mão-de-obra, insumos, mudas pré-brotadas - que ele compra de uma empresa privada – e a renda obtida com amendoim. Houve redução de 36%.
Além de conquistar fornecedores de cana, aos poucos, MPB e meiosi também estão sendo adotadas por algumas usinas de cana de São Paulo. Os pesquisadores do IAC avaliam que as tecnologias devem continuar ganhando espaço nos próximos anos em todo Brasil.
Os agricultores e cientistas ouvidos na reportagem afirmam que os canaviais formados por meiosi são mais vigorosos e produtivos, mas ainda vai precisar de mais tempo de pesquisa para saber qual é o real ganho médio de produtividade provocado por esse modelo de cultivo.
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