MARIANA GAZZONI - ENVIADA ESPECIAL/ SANTA FÉ DO SUL (SP)
07 Junho 2014 | 14h 52
Empresas que criam peixes nos reservatórios de hidrelétricas levam viveiros para áreas mais cheias; perdas chegam a 30% da produção
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A Piscicultura Carbone, produtora de tilápia no reservatório da hidrelétrica de Ilha Solteira, está de mudança. A empresa deslocou 150 tanques-rede cheios de peixe lago adentro por 2 km. O trajeto teve de ser percorrido lentamente e durou cerca de cinco horas. Antes disso, mergulhadores trabalharam por dez dias para cortar os tocos que estavam no caminho e liberar a passagem para os peixes. A medida foi tomada depois que o reservatório atingiu o nível mais baixo desde 1986, provocando uma queda de cerca de 30% na produção de peixes neste ano.
“Paguei pela concessão de uma área de 2 hectares no lago, que não vou mais usar”, lamenta o produtor Oswaldo Carbone Junior. “Tive que gastar R$ 100 mil para transferir os viveiros e começar do zero em outro local. Era isso ou parar de produzir. Essa área vai secar nos próximos meses”, diz, apontando para um lago esvaziado.
Os peixes já estão na “casa nova”, mas a mudança ainda não acabou. Carbone ainda tem de transferir contêineres de ração e atualizar o endereço da empresa na Receita Federal para uma nova sede. O empresário teve de gastar R$ 40 mil no arrendamento de um terreno mais próximo ao novo local dos viveiros para montar a infraestrutura de suporte à produção.
Assim como Carbone, uma série de aquicultores donos de concessões para cultivar peixes em reservatórios de usinas estão transferindo os viveiros para áreas mais profundas. A “mudança” foi autorizada pela primeira vez pelo Ministério da Pesca e Aquicultura no fim de maio. Foi uma medida emergencial para minimizar prejuízos com a redução do volume do reservatório de Ilha Solteira, que encerrou o mês passado operando com 4,6% do volume útil para geração de energia, segundo dados do Operador Nacional do Sistema Elétrico. No lago da usina está o maior polo produtivo de tilápias do País, com produção anual de 25 mil toneladas, cerca de 10% do total nacional, segundo estimativas da ABTilápia, associação do setor.
Os prejuízos aos pescadores são mais uma dentre muitas dores de cabeça ocasionadas pela atual seca, que também encarece a produção de energia e ameaça o abastecimento de água em diversas cidades, especialmente na região Sudeste. Dos 22 maiores reservatórios de hidrelétricas, 19 tiveram queda no volume de água em maio, na comparação com o mesmo período do ano passado, e dez deles operam abaixo de 30% da capacidade (veja quadro abaixo), de acordo com dados do ONS.
Investimento. A seca pegou os aquicultores desprevenidos e reverteu um movimento de expansão da atividade. O cultivo de peixes começou a se desenvolver de forma profissional na região há menos de dez anos e a produção de tilápia no polo de Santa Fé do Sul (SP), município vizinho a hidrelétrica de Ilha Solteira, crescia historicamente cerca de 25% ao ano.
O produtor Fabio Brandão pretendia ampliar de 90 para 240 o número de tanques de criação de tilápias em sua propriedade. Ele já tinha encomendado 80 deles quando viu o reservatório secar, a ponto de não ter espaço na água que restou nem para os tanques em operação – parte deles ficou na parte do lago que secou.
“Suspendi o projeto de ampliação e só vou colocar os tanques na água quando o reservatório subir”, disse Brandão, que estima um prejuízo de cerca de R$ 300 mil no ano com a seca.
Brandão e os demais produtores querem uma sinalização do governo sobre qual, exatamente, é o fundo do poço em Ilha Solteira. A ABTilápia entregou na semana passada um ofício para o Ministério da Pesca pedindo informações. “Precisamos dessa resposta para saber quanto vamos produzir”, disse o produtor Tito Capobianco Junior, presidente da ABTilápia. A perspectiva na região é que o reservatório seque ainda mais, já que o período de secas vai até setembro ou outubro.
A Cesp, dona da concessão da usina, disse, em nota, que a decisão de esvaziar mais ou menos o reservatório é do ONS, mas estima que deve chegar a níveis mais baixos até o fim do período de seca. Já o ONS informou que faz recomendação técnica sobre o volume de operação e a decisão é tomada no Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico, presidido pelo Ministério de Minas e Energia. A próxima reunião será quarta-feira.
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