domingo, 24 de abril de 2016

Dá-se um jeito , Marcelo Rubens Paiva, OESP


Tem-se a ilusão de que o comunismo é um dos maiores problemas do País, e acabar com ele, a salvação. Teme-se a Venezuela, Bolívia, Equador, Cuba, países que não param sozinhos em pé. Tem-se a ilusão de que o povo nas ruas, um juiz de primeira instância e promotores aguerridos acabarão com a corrupção. De que sessões de um Congresso corrupto garantirão um futuro melhor a nossos filhos e netos, que viverão num mundo sem roubalheiras. 
Temos a ilusão de que o poder emana do povo, pelo povo, para o povo. De que a Justiça é cega, que o Brasil, um “pa-tro-pi” abençoado por Deus, em que se plantando tudo dá, é o país do futuro. Sem contar que Deus é brasileiro.
Acreditamos na representatividade democrática, na Constituição, nas leis, que pagamos os impostos que nos cabem, que se o País não é a Dinamarca, é porque gastam mal nosso dinheiro. Acredita-se que os administradores públicos são corruptos e incompetentes, os funcionários públicos são preguiçosos, o Estado é refém da burocracia, e tem que ser mínimo.
Tem-se a esperança de que o craque resolva nossas deficiências táticas, gerenciais, abafem nossos dirigentes corruptos, nossas entidades podres, que o talento nato se sobreponha ao trabalho coletivo, de que surgirá um camisa 10 para nos guiar, um camisa 9 para colocar a bola nas redes, um goleiro salvador, um santo, de que somos eternamente o país do futebol, da natureza exuberante, das florestas, rios, campos e arados, da cordialidade, alegria e tolerância à miscigenação. 
Tem-se a ilusão de que de uma Ilha da Fantasia surgirá outro Guga, outra Maria Ester, que de um campo de várzea virá outro Garrincha, que na favela nascem vários Romários. Que Ademar Ferreira, João do Pulo, Daiane, Clodoaldo, Hortência, Paula, Oscar, Bernardinho e tantos outros apareçam da escuridão dos ginásios, para os holofotes da glória. 
Vamos ganhar um Oscar um dia. Vamos ganhar um Nobel, quem sabe. Vamos patentear a grande descoberta. Vamos criar a vacina salvadora, a cura, temos fé.
Acreditamos que aqui não existe racismo. Que nos tornamos independentes num 7 de setembro, uma República democrática num 15 de novembro, que a escravidão acabou em 1888. Que 13 de maio é o dia de celebrar o fim da escravidão. Que sua tutora é a Princesa Isabel. Acreditamos no Dia do Índio, em Tiradentes, em Aparecida, homenageamos os trabalhadores no Dia do Trabalho, Jesus no Natal, seu renascimento na Páscoa. Despejamos nossa fé em pacotes turísticos ou viagens para praias e montanhas em feriados prolongados, congestionando estradas.
Carregamos colares com miçangas de nossos Orixás para nos protegerem. Rezamos ao santo casamenteiro. Fazem-se promessas para arrumar emprego, curar doença, trazer de volta a pessoa amada. Fazem-se simpatias, ebós, pernas, braços, costelas de gesso, para sanar dores.
Tem-se a ilusão da existência da utopia, do paraíso, do nirvana. Meditar é pensar em nada. Pensar em nada traz paz interior. A esperança é a última que morre. Pensar positivo é um dever constante. Dá-se um jeito. Para tudo tem solução. Aos trancos e barrancos, empurrando com a barriga, o Brasil sobrevive.
Temos a impressão de que o novo estatuto do idoso trouxe conforto aos velhinhos, o do torcedor, paz nos estádios, o da criança, garantias à geração que é o nosso futuro. Que o código florestal protegerá nossas florestas, rios e mananciais. Que a Maria da Penha salvará as mulheres da ira e abusos da classe masculina.
Mas fé, só a fé, não move montanhas. O Brasil não sairá do lugar se acreditar e esperar, sem lutar diariamente, ter disposição para conhecer, debater, pesquisar, aprender, treinar, praticar, repetir, ensaiar, estudar, observar, respeitar. A ilusão é fruto da preguiça. Ela é bela como uma fantasia. É ineficiente como uma neblina.
Porque, no fundo, precisa-se de mais para acabar com a corrupção, ser um país democrático, reformar um Estado, gerar Gugas e Romários, acabar com o racismo, a intolerância, a violência contra crianças e mulheres, ganhar uma Copa do Mundo, um ouro e preservar a natureza. Temos direitos. Precisamos ter deveres. Pensarmos como um elemento de um todo, um ser republicano.





A república das bananas 24/04/2016 02h00, Elio Gaspari FSP

elio gaspari
Nascido na Itália, veio ainda criança para o Brasil, onde fez sua carreira jornalística. Recebeu o prêmio de melhor ensaio da ABL em 2003 por 'As Ilusões Armadas'. Escreve às quartas-feiras e domingos.


O Brasil não é uma república de bananas, mas a oligarquia política e empresarial ferida pela Operação Lava Jato precisa que ele seja.
É comum atribuir-se ao príncipe Fabrizio de Salinas, personagem do genial romance "O Leopardo", a frase "algumas coisas precisam mudar para continuar as mesmas." O escritor Tomasi di Lampedusa nunca colocou essa frase na boca de Fabrizio (Burt Lancaster, no filme). Quem disse algo parecido foi seu sobrinho Tancredi (Alain Delon), um jovem oportunista e sedutor.
Salinas, um reacionário fatalista, disse que "tudo isso não deveria poder durar, mas vai durar". A oligarquia brasileira pensa como Salinas, fala como Tancredi e faz qualquer papel para que nada mude.
Dando a impressão de que busca uma mudança, a Câmara dos Deputados votou o afastamento de uma presidente que maquiou as contas públicas, iludiu o eleitorado e conviveu com roubalheiras. Só numa república de bananas esse processo poderia ser conduzido por Eduardo Cunha, réu em processo que tramita no Supremo Tribunal Federal, acusado de corrupção e lavagem de dinheiro. (Isso numa sessão em que algumas dezenas de marmanjos comportaram-se como saltimbancos.)
Fora da jurisdição da república de bananas, 77% dos entrevistados pelo Datafolha querem a cassação de Cunha. 61% esperam que a presidente vá embora e 58% gostariam que o vice Michel Temer fosse junto. Temer foi mencionado duas vezes nas investigações da Lava Jato, sempre no condicional. Ele teria influenciado a nomeação de dois larápios. Um, durante o tucanato, outro, na república petista.
O processo seguiu para o Senado, presidido por Renan Calheiros. O STF mantém em sigilo o processo em que a Procuradoria-Geral da República o acusa de peculato.
Tanto o senador como Cunha estão no índice onomástico de acusados de terem recebido propinas no escândalo exposto pela Lava Jato.
Mais de uma centena de parlamentares respondem a processos no Supremo Tribunal Federal. Um, Paulo Maluf, está na lista de procurados pela Interpol. Há 21 denunciados no rastro da Lava Jato e, deles, 16 votaram pelo impedimento de Dilma Rousseff.
A rua pouco tem a ver com o que sucede em Brasília. As coisas só acontecem no Congresso porque desde 2013 a rua ronca. Mesmo assim, estão longe de ser a mesma coisa. Podem até ir na direção oposta. Na semana passada, surgiu uma informação preocupante: a bancada do PMDB na Câmara teria indicado Alexandre de Moraes, secretário de Segurança de São Paulo, para a Advocacia-Geral da União. Ele teria o apoio do Eduardo Cunha, para quem já advogou com sucesso. (Isso pode ser malvadeza, pois Cunha diz que foi Temer quem lhe apresentou o doutor.)
Num país que confia na Lava Jato, a república de bananas admite a hipótese de se escolher um Advogado-Geral da União antes da escolha do ministro da Justiça.
O cidadão é obrigado a viver em duas realidades. Vai para a rua pedir a saída de Dilma Rousseff e descobre que marchou com um cordão que blinda Eduardo Cunha. Vê que a ciclovia de São Conrado desabou, matando duas pessoas e descobre que a obra ficou com a empreiteira da família do secretário de Turismo da cidade. Custou R$ 44 milhões, oito a mais que o previsto, e teve diversos aditivos. Rapidamente, o cidadão foi da oitava economia do mundo, sede da Olimpíada, para a Terra dos Papagaios, uma república de bananas.
*
BOA IDEIA
Nasceu no PSDB uma ótima ideia: a de só conversar sobre sua participação no governo de Michel Temer quando ele puder mostrar uma planilha identificando a maioria dos nomes de sua equipe.
Num ministério, a companhia vale metade da agenda. Às vezes é melhor ficar só.
REGISTRO
Passou despercebido um trecho do depoimento do empresário Salim Schahin ao juiz Sergio Moro. Seu banco e sua fornecedora de equipamentos à Petrobras meteram-se nas falcatruas petistas e passaram a colaborar com as autoridades. Ele disse o seguinte:
"Quero pedir perdão à sociedade brasileira pelo delito que eu cometi. Sinceramente, eu me sinto amargurado pelo delito que eu cometi. Isto também me alivia. Este exame de consciência e esta colaboração que eu fiz com os procuradores me alivia um pouco."
Parece nada, mas Schahin foi o primeiro e único magano a se desculpar com a maior vítima dos seus malfeitos. Os demais reconhecem culpas (de olho nas tornozeleiras da Bolsa Angra), acusam outros, mas continuam a manter soberba distancia em relação ao andar de baixo.
ALÔ, PATRULHEIROS
Uma vinheta para patrulheiros que vetam artistas por motivos estranhos às suas competências:
Em breve as notas de cinco dólares terão um retrato da contralto negra Marian Anderson no verso.
Em 1939 a organização "Filhas da Revolução Americana" negou-lhe a sua sala de concertos. Eleanor Roosevelt, mulher do presidente americano, conseguiu-lhe o Lincoln Memorial e uma plateia de 75 mil pessoas.
A grande Eleanor também vai para o verso da nota de cinco.
-
OS GÊNIOS DA VIVO VALEM OURO
Amos Genish preside a Telefônica, empresa-mãe da Vivo. Ela atua em 20 países e no Brasil tem 97 milhões de clientes. O doutor está diante de uma oportunidade para mostrar ao mercado e ao mundo como um grupo de gênios capazes de entender a cabeça de burocratas da república de bananas de Brasília podem atentar contra a marca de uma empresa.
Os gênios da Vivo acharam que tinha chegado a hora de tungar os consumidores brasileiros cobrando mais caro pelas conexões da internet e ameaçando-os com o bloqueio de suas linhas. Tiveram o amparo do presidente da Anatel, doutor João Rezende. Ele anunciou que as operadoras "deseducaram" a patuleia oferecendo conexões ilimitadas: "Foi má educação".
Quem não tem educação é ele, pois desrespeita quem lhe paga o salário. O que as operadoras querem é vender conexões caras e lentas. Se ofereceram terras na Lua, iludiram, não deseducaram. Como já ensinou o conde Francisco Matarazzo, "Mercadoria não tem preço de mercado. Terá preço se tiver quem a compre".
Uma rebelião das redes sociais (#ImpeachmentDaAnatel) virou o jogo. Em menos de uma semana, a Vivo tirou o time de campo e voltou atrás. Tudo ficaria muito bonito se o ministro das Comunicações, André Figueiredo, não tivesse entrado na discussão para dizer absurdos na direção oposta: "Não podemos admitir de forma alguma que em nome de interesses meramente comerciais a gente venha a cercear direitos."
Primeiro, banda larga não é direito. Além disso, sem interesses comerciais jamais haverá empresa vendendo serviço.
Tudo ficaria mais fácil se as operadoras trabalhassem melhor junto à freguesia, concorressem mais e conversassem menos com os burocratas bananeiros de Brasília. 

sexta-feira, 22 de abril de 2016

Metal contra as nuvens. legião urbana

Não sou escravo de ninguém
Ninguém, senhor do meu domínio!
Sei o que devo defender
E por valor eu tenho
E temo o que agora se desfaz

Viajamos sete léguas
Por entre abismos e florestas
Por Deus nunca me vi tão só
É a própria fé o que destrói
Estes são dias desleais

Eu sou metal
Raio, relâmpago e trovão
Eu sou metal
Eu sou o ouro em seu brasão
Eu sou metal
Quem sabe o sopro do dragão

Reconheço meu pesar
Quando tudo é traição
O que venho encontrar
É a virtude em outras mãos.

Minha terra é a terra que é minha
E sempre será
Minha terra
Tem a lua, tem estrelas
E sempre terá

Quase acreditei na tua promessa
E o que vejo é fome e destruição
Perdi a minha sela e a minha espada
Perdi o meu castelo e minha princesa

Quase acreditei, quase acreditei
E, por honra, se existir verdade
Existem os tolos e existe o ladrão
E há quem se alimente do que é roubo.
Mas vou guardar o meu tesouro
Caso você esteja mentindo.

Olha o sopro do dragão (4x)

É a verdade o que assombra
O descaso que condena
A estupidez o que destrói
Eu vejo tudo que se foi
E o que não existe mais

Tenho os sentidos já dormentes
O corpo quer, a alma entende
Esta é a terra-de-ninguém
Sei que devo resistir
Eu quero a espada em minhas mãos

Eu sou metal: raio, relâmpago e trovão
Eu sou metal: eu sou o ouro em seu brasão
Eu sou metal: quem sabe o sopro do dragão

Não me entrego sem lutar
Tenho ainda coração
Não aprendi a me render
Que caia o inimigo então

Tudo passa
Tudo passará (3x)

E nossa história
Não estará
Pelo avesso assim
Sem final feliz
Teremos coisas bonitas pra contar
E até lá
Vamos viver
Temos muito ainda por fazer
Não olhe pra trás
Apenas começamos
O mundo começa agora, ahh!
Apenas começamos.



Link: http://www.vagalume.com.br/legiao-urbana/metal-contra-as-nuvens.html#ixzz46bLBKR96