sexta-feira, 26 de outubro de 2012

Recuperar o etanol, por Arnaldo Jardim


Sem contar com políticas públicas estáveis para incentivar e assegurar a produção, o etanol perde espaço na matriz energética brasileira. A competitividade desse estratégico combustível renovável sucumbe ao artificialismo do preço da gasolina que, importada em volume cada vez maior, aumenta a emissão de gases de efeito estufa e pressiona o déficit da conta de combustíveis.
A participação relativa do etanol caiu 34% nos últimos anos, enquanto a da gasolina e diesel, muito mais poluentes, dispararam no mesmo período.
A possibilidade do etanol da cana de açúcar conquistar outros mercados por sua vantagem competitiva e pelo seu diferencial de sustentabilidade ambiental vai ficando mais distante.  Em 37 anos de existência do Proálcool, o etanol combustível substituiu até o último mês de junho mais de 2,2 bilhões de barris de gasolina, o que contribuiu para a geração de emprego e renda e na redução do aquecimento do planeta. Imagine-se a atmosfera da cidade de São Paulo sem o nosso etanol. 
O etanol da cana é um patrimônio nacional. Com a importação em 2011 de 1,15 bilhões de litros de etanol anidro produzido nos EUA a partir do milho, criamos empregos lá e deixamos de movimentar o setor sucroalcooleiro aqui. O volume importando foi 15% além do necessário porque a mistura à gasolina foi reduzida para 20%, e mais de 500 milhões de litro “se transformaram” em etanol hidratado, numa virada brusca que evidenciou a falta de planejamento do governo.
O aumento da importação de etanol, gasolina e diesel está na contramão do discurso oficial de que o Brasil não pode e não deve abrir mão do uso de energias renováveis e limpas. Some-se a isso o fato de que a anunciada independência energética não se concretizou. Não conseguimos aumentar a oferta de combustíveis renováveis e fósseis de forma condizente com o aumento da demanda.
Para o setor sucroenergético recuperar fôlego e colocar o Brasil na vanguarda mundial dos biocombustíveis, depende-se muito mais da ação do governo do que propriamente do mercado. Os investimentos em inovação tecnológica aplicada à cultura da cana de açúcar, que em grande parte é responsável pelo boom que a agricultura brasileira vive nos últimos anos, são fundamentais para continuarmos avançando na produtividade e na qualidade do etanol. A pesquisa e a inovação podem avançar na consolidação do etanol de segunda geração.
A recuperação do preço do etanol hidratado, via desoneração de impostos cobrados pela União e estados, é a questão central, como a definição de seu padrão e fixação do percentual de mistura à gasolina, ou seja, sua participação na matriz de combustíveis.
A ANP (Agência Nacional de Petróleo) anuncia que o aumento do percentual de etanol anidro na gasolina voltará em maio ou junho de 2013. A redução foi a toque de caixa, o aumento é projetado a médio prazo e assim a referencia capaz de determinar a previsibilidade e cenários firmes fica indefinida.
Outra solução para retomar a competitividade desse combustível é a utilização da CIDE em seu aspecto regulatório, inclusive incorporando a sua dimensão ambiental. Sem contar que o regime de redução do IPI para indústria automobilística precisa ser estendido para os carros flex. Quem tem carro com esse tipo de motor precisa ser incentivado. As montadoras que conseguissem reduzir o consumo de etanol, com maior eficiência em seus motores, por exemplo, teriam uma redução mais substancial de IPI.
São necessárias também regras duradouras e a criação de linhas de crédito para estimular o setor ainda abalado pela crise de 2008 e por fatores climáticos que reduziram a produtividade dos canaviais. Na safra 2011/2012, a produção do biocombustível recuou 17%, o que representa algo em torno de 5 bilhões de litros a menos de etanol no mercado que tem de ser compensado por importações.
A recuperação do setor tem que levar em conta a ampliação do parque de moagem e a renovação de canaviais. Neste sentido, o aperfeiçoamento do Prorenova  (Plano de Recuperação dos Canaviais),  bem como a sua flexibilização, é essencial para aumentar o nível de financiamento e reduzir a burocracia excessiva na contração de recursos.
O setor sucroenergético precisa de um conjunto de medidas de curto, médio e longo prazo para ampliarmos e renovarmos os canaviais, aumentarmos a eficiência das unidades produtoras existentes e estimularmos a construção de novas plantas.
O setor passou por grande transformação nos últimos anos, tornou-se heterogêneo. Novos players se integraram e com isso criou-se visões diferentes. Por isso precisamos buscar o consenso em torno de um conjunto de medidas, pois temos acumulo para tanto. É preciso defendê-las com a consciência de que somos um setor essencial e estratégico ao país. O governo ajuda no que for seu papel e o setor com sua capacidade empreendedora. O que se busca é uma política de Estado para o etanol e não benesses.
O governo tem que assumir se o etanol é ou não prioridade e adotar medidas coerentes e urgentes a respeito. Não podemos perder mais tempo e abdicar da enorme vantagem apresentada pelo biocombustível em relação aos fósseis. O País pagará um preço se a indefinição e omissão persistirem.

Arnaldo Jardim  é deputado federal (PPS-SP) – membro da Comissão de Minas e Energia e presidente da Frente Parlamentar Mista em Defesa da Infraestrutura Nacional.

quarta-feira, 24 de outubro de 2012

O desafio do medicamento no Brasil



Coluna Econômica - 24/10/2012  Luis Nassif

Quais os limites para a fabricação de medicamentos por laboratórios oficiais? Este foi um dos pontos relevantes do Seminário Brasilianas Sobre Economia da Saúde.
Para Gonzalo Veccina, ex-superintendente da Anvisa (Agência Nacional de VIgilância Sanitária), falta foco nesse investimento em laboratórios oficiais.
Reconhece a excelência da Fiocruz (que administra alguns laboratórios) e do Instituto Butantã, entre poucos outros. Mas quando o Ministério da Saúde insiste em ampliar para outros laboratórios, menos capacitados, faltaria definir o principal: o que se pretende com isso, substituir a produção privada? É impossível, diz Veccina. O papel deveria ser o de coordenar.
Ele compara com as Farmácias Populares, operadas pela Fiocruz. Qual programa atinge mais brasileiros as Farmácias Populares ou o programa de distribuição de remédios para diabete e hipertensão através das 60 mil farmácias existentes no país? O segundo, é claro, conclui ele.
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Não há dúvida de que os laboratórios oficiais, especialmente em remédios mais críticos, têm exercido um insubstituível papel regulador de preços, impedindo abusos.
Mas Veccina propõe que se vá além, que se pense o novo. O desafio em Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação é deixar de fazer mais do mesmo, insiste ele. É discutir o do Estado, Universidade e indústria para que o país ocupe espaço no mundo, na produção mundial de medicamentos.
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Veccina considera "desastroso" a quantidade de recursos que o Ministério pretende colocar em laboratórios oficiais, porque não serão capazes de dar respostas eficientes.
Os laboratórios públicos nasceram nos tempos do conhecimento físico-químico, diz ele, e em que os diagnósticos eram tão precários que a eficácia dos medicamentos não era adequadamente avaliada. Por isso mesmo, havia espaços maiores para entrar no mercado global.
Hoje, com o conhecimento de farmacinético (o estudo de todas as etapas da droga no organismo humano), com equipamentos como espectrômetro de absorção atômica e outros, com a possibilidade de se identificar moléculas, é impossível que o conjunto de laboratórios públicos dê conta do recado.
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Veccina defende que se continue fazendo a farmaco química, o processo tradicional de produção de medicamentos, mas trabalhando em produtos essenciais, relevantes. Hoje em dia a linha de produção dos laboratórios oficiais é de baixo valor agregado. São praticamente laboratórios de manipulação que sequer conseguiram entrar no mercado de genéricos, diz ele.
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Em 2014, todos os medicamentos produzidos no Brasil terão que passar por provas de farmacocinética, diz ele. Com exceção da Farmanguinhos e da FURP, nenhum dos demais terá condições de atender às exigências, diz ele, que afirma não entender a razão da Marinha e do Exército ter sua própria fábrica de medicamentos.
Na área de biológicos e imunobiológicos, Veccina propõe repensar nossa indústria estatal. Hoje em dia existe uma competição entre a Biomanguinhos e o Instituto Butantã.
Não há razão para essa competição entre dois laboratórios estatais, diz ele. E pode-se destruir todo esse trabalho se se insistir em estender essa produção para outros laboratórios, menos capacitados.

O que e o como se quer
Veccina defende a política atual, de convivência e relacionamento com grandes multinacionais que participam do mercado de medicamentos imunobiológicos. Mas considera errático o caminho percorrido. Consegue avançar quem tem mais acesso aos favores das fontes de financiamento. Por isso insiste na importância de se definir o que se quer, antes de colocar o movimento o como fazer.

Pegando o bonde atrasado
Considera ter havido avanços, como por exemplo na CNTBio (que analisa e libera pesquisas de transgênico). Se mantivesse o desenho do final do governo FHC, o Brasil teria perdido o bonde das biotecnologia agrícola. Mas tem que definir a posição brasileiro para outras áreas. Tem que avançar nessa área, além dos produtos naturais. Mas a área de farmoquimica foi destruída no início dos anos 90 e dificilmente terá condições de competir com mercados como os da China e Índia.

O papel da Anvisa
O desenho de uma política industrial teria que ser montado em cima das seguintes estratégias: A primeira é o Marco regulatório: Veccina defende repensar o papel da Anvisa. Ela deveria atuar quase como uma consultoria, acompanhando a produção da indústria e orientando-a para não fazer investimentos desnecessários. Considera que tem faltado ao Estado brasileiro e à Anvisa essa visão de política industrial.

A importância da metrologia
A metrologia (ou certificação) é fundamental para a colocação de produtos brasileiros no exterior. Há uma enorme rede de laboratórios operada pelo Inmetro. No entanto não existe uma rede de laboratórios de saúde pública no país. Como fiscalizar sem dispor desses laboratórios? A Anvisa fiscaliza sem ter competência legal. Há um enorme trabalaho de formação de especialistas na área para dar conta do recado.

As boas práticas
Os laboratórios públicos e muitos privados não trabalham seguindo as chamadas boas práticas de pesquisas clínicas. Sem boas práticas de pesquisa, não se faz desenvolvimento. Há a necessidade de um esforço importante na formação  de profissionais que dominem as boas práticas clínicas. É um movimento que Europa está fazendo, de formar milhares de novos pesquisadores.

A assistência farmacêutica
Tem que se pensar a assistência farmacêutica conjuntamente a indústria, para ter política de saúde mais inclusiva. Sem resolver a questão da hipertensão e da diabetes não se vai resolver a questão da saúde. E tem que se mapear os centros de excelência para incentivá-los. É o caso da UFSCAR (Universidade Federal de São Carlos), que pesquisa produtos naturais e a Universidade Federal da Paraiba, com fitoterápicos.

domingo, 21 de outubro de 2012

Um sucesso para ninguém botar defeito - ELIO GASPARI

A notícia pareceu uma simples estatística: entre 1997 e 2011, quintuplicou a percentagem de negros e pardos que cursam ou concluíram o curso superior, indo de 4% para 19,8%. Em números brutos, foram 12,8 milhões de jovens de 18 a 24 anos.
Isso aconteceu pela conjunção de duas iniciativas: restabelecimento do valor da moeda, ocorrido durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, e as políticas de ação afirmativa desencadeadas por Lula.
Poucos países do mundo conseguiram resultado semelhante em tão pouco tempo. Para ter uma ideia do tamanho dessa conquista, em 2011 a percentagem de afrodescendentes matriculados em universidades americanas chegou a 13,8%, 3 milhões em números brutos. Isso depois de meio século de lutas e leis.
Em 1957, estudantes negros entraram na escola de Little Rock escoltados pela 101ª Divisão de Paraquedistas.
Pindorama ainda tem muito chão pela frente, pois seus negros e pardos formam 50,6% da sua população e nos Estados Unidos são 13%.
O percentual de 1997 retratava um Brasil que precisava mudar. O de 2011, uma sociedade que está mudando, para melhor. Por trás desse êxito estão políticas de cotas ou estímulos nas universidades públicas e no ProUni.
Em seis anos, o ProUni matriculou mais de 1 milhão jovens do andar de baixo, brancos, pardos, negros ou índios. Deles, 265 mil já se formaram. Novamente, convém ver o que esse número significa: em 1944, quando a sociedade americana não sabia o que fazer com milhões de soldados que combatiam na Europa e no Pacífico, o presidente Franklin Roosevelt criou a GI-Bill.
Ela dava a todos os soldados uma bolsa integral nas universidades que viessem a aceitá-los. Em cinco anos, a GI-Bill matriculou 2 milhões de jovens. Hoje entende-se que a iniciativa foi a base da nova classe média americana e há estudiosos que veem nela o programa de maior alcance social das reformas de Roosevelt.

MANGUINHOS, JOIA DA COROA OU GUARDANAPO
A desapropriação dos 500 mil metros quadrados da refinaria de Manguinhos pode se tornar uma das joias da coroa da administração do governador Sérgio Cabral. Tudo bem se a indenização tiver que cobrir os impostos que a empresa deve (só de ICMS são R$ 675 milhões, bem como seu passivo trabalhista).
Se os donos de uma refinaria obsoleta que contamina o ambiente e envenena o solo embolsarem algo como R$ 200 milhões, será um caso de guardanapo na cabeça. Essa decisão, contudo, caberá ao Poder Judiciário.
Manguinhos fica dentro da cidade e degradou a região de tal forma que está cercada por comunidades miseráveis.
A ideia de usar seu terreno para recuperar a região poderá resultar na pacificação urbanística do que hoje é a favela de Ramos. Seria uma intervenção do tamanho da revitalização da zona portuária, mesmo sem o seu charme.
Não se deve subestimar os poderes da turma de Manguinhos, estabelecida quando o presidente Getúlio Vargas alavancou seu primeiro dono, o empresário Peixoto de Castro. Recentemente, os novos controladores tiveram novos anjos da guarda, os comissários Marcelo Sereno e José Dirceu, mais a bancada dos precatórios do PMDB.
Nos anos 50, a turma do refino privado foi incomodada no Conselho Nacional do Petróleo por um economista e um coronel. Deram um trato ao economista (Jesus Soares Pereira) cassando-o em 1964. Ao coronel, ofereceram a presidência da Petrobras no governo JK, desde que ficasse quieto. Como ele não ficou, derrubaram-no.
Faltou-lhes a sorte. O coronel Ernesto Geisel tornou-se presidente da Petrobras e da República. Ele gostava de contar como foi atrás deles.

ARQUIVO
José Roberto Arruda, ex-governador de Brasília e ícone do mensalão do DEM, voltou a falar:
"Só digo uma coisa: não apareceu nem metade da missa".
Como diria Camila Pitanga: "Fala, Arruda".

O CONTRADITÓRIO
A revista "Retrato", dirigida pelo repórter Raimundo Rodrigues Pereira, chegará às bancas nesta semana com uma capa intitulada "A vertigem do Supremo". Ela afirma que os ministros do STF deliraram ao aceitar a tese segundo a qual houve um desvio de R$ 76,8 milhões do Banco do Brasil para a turma do mensalão. A reportagem sustenta que não há trabalho contábil de fé que ampare essa acusação e coloca no site da revista 108 documentos (cada um com cerca de 200 páginas) da auditoria feita pelo banco.
Com mais de 40 anos de carreira e obsessões investigativas, Raimundo já contrariou a sabedoria convencional em duas ocasiões. Há dois anos, provou que o banqueiro Daniel Dantas foi satanizado pelo delegado Protógenes Queiroz na Operação Satiagraha. Nenhum dos fatos que mencionou foi desmentido.
Em 1996, ele investigou as denúncias de má conduta profissional feitas contra a cientista brasileira Teresa Imanishi. Tinha do outro lado um Prêmio Nobel e o governo americano. Prevaleceu e depois de dez anos a cientista foi inocentada, com pedidos de desculpas do "New York Times" e do "Washington Post".

AVISO AMIGO
Quando o ministro Joaquim Barbosa assumir a presidência do Supremo deverá ter uma preocupação. Ele sabe que não é estimado pelos colegas. O que talvez não saiba é que muitos deles não pretendem levar desaforo para casa.

PESADELO AMERICANO
Sempre que a eleição americana marcha para um final apertado ressurge o fantasma do empate no colégio eleitoral.
Desta vez existe a remota possibilidade de Barack Obama e Mitt Romney empatarem, cada um com 269 votos, no colégio eleitoral.
Nesse caso, a escolha irá para uma assembleia de 50 eleitores (um para cada Estado) e tudo indica que Romney saia vitorioso, pois os republicanos tendem a manter a maioria na Câmara dos Representantes.
Se esse cenário improvável ocorrer, a crise de 2000, quando George Bush 2º prevaleceu sobre Al Gore, será vista como uma mixaria, sobretudo se o companheiro Obama conseguir mais votos populares.
A democracia americana sairá mal da foto. Olhando-se para seus últimos oito presidentes, três passaram por processos anômalos. Bush 2º ganhou a Casa Branca na Corte Suprema, Richard Nixon foi obrigado a renunciar, e John Kennedy foi assassinado.
(A possibilidade do empate e a discussão do processo eleitoral estão descritos no site "Sabato's Crystal Ball". Apesar de ter escolhido nome bobo, o professor Larry Sabato, da Universidade da Virgínia, é um respeitado estudioso das eleições americanas.)

EREMILDO, O IDIOTA
Eremildo é um idiota e muda de opinião a cada dia.
Às segundas, quartas e sextas é favorável ao "kit anti-homofobia". Às terças, quintas e sábados é contra.
Em todos os casos, por idiota, acredita que essa discussão criará mais escolas, creches e hospitais na cidade de São Paulo . Por quê? Eremildo não sabe, mas está procurando quem saiba.