quarta-feira, 30 de maio de 2012

Especialistas criticam projeto do TAV brasileiro



Ter, 29 de Maio de 2012 16:57
Abandonado há décadas, o transporte ferroviário de passageiros voltou ao radar do governo com o Trem de Alta Velocidade (TAV), obra cujo custo é estimado oficialmente em R$ 30 bilhões, mas que, acreditam analistas, pode chegar a R$ 60 bilhões. Mas o projeto — que quer ligar o Rio a São Paulo e Campinas em uma hora e meia a 300 quilômetros por hora e passagem por volta de R$ 200 — não sai do papel. A nova previsão, depois de diversos adiamentos, é que o primeiro leilão de licitação aconteça no primeiro semestre de 2013. O projeto, porém, é criticado pela maioria dos especialistas no setor.
— O trem-bala é fora da realidade. O trem de média velocidade, que chega a 180 quilômetros por hora, não é muito mais caro que o convencional, o que permitiria que tivéssemos ligação com mais cidades pelo mesmo custo do trem-bala — afirma Paulo Fleury, professor da UFRJ e diretor do Instituto Ilos.
Segundo Paulo Tarso Vilela de Resende, coordenador do Núcleo CCR de Infraestrutura e Logística da Fundação Dom Cabral, o trem de média velocidade, também conhecido como trem-flecha, poderia ter mais estações intermediárias.
— A linha de média velocidade seria muito mais eficiente, poderia ter mais estações, mais cidades, que o TAV não consegue. Quando dispara a 300 quilômetros por hora, não pode parar. Faria a ligação Rio-São Paulo em três horas.
Hostílio Xavier Ratton Neto, professor de Engenharia de Transportes da Coppe/UFRJ, discorda e diz que o TAV também seria indicado para os trechos São Paulo-Curitiba e Rio-Belo Horizonte.
— As classes C e D estão andando de avião e não vão querer voltar a andar de ônibus quando a capacidade do setor aéreo estourar. Por isso, pensar no TAV é a alternativa mais possível. Até 300 quilômetros é uma distância indicada para percorrer de carro e acima de mil é grande demais, o tempo gasto nos procedimentos em aeroportos compensa.
ANTF diz que trem-bala reabriu debate sobre modal
Rodrigo Vilaça, presidente-executivo da Associação Nacional dos Transportadores Ferroviários (ANTF), acredita que o debate sobre o trem-bala foi positivo para colocar o transporte de passageiros sob trilhos em destaque no Brasil. Ele lembra que diversos governos começam a retomar projetos urbanos de metrô, trens e VLTs, e que, em uma segunda etapa, deverão ser retomados os trens de passageiros de longa distãncia. Apesar disso, ele não acredita que o modelo da Vale, que compartilha os mesmos trilhos com carga e passageiros, seja o melhor:
— Isso até pode ocorrer em agumas linhas, mas, nos locais mais populosos, isso é um complicador. Temos problemas hoje na Grande São Paulo com o compartilhamento. E na Europa quase sempre há linhas dedicadas ao serviço de passageiros — comenta ele. (Fonte: O Globo)

O papel da Universidade, por Luis Nassif



Coluna Econômica - 30/05/2012
Participei na manhã de ontem de um seminário em São Paulo sobre universidade e empreendedorismo.
O expositor norte-americano trouxe um conjunto de informações sobre essas relações, nos Estados Unidos que, a rigor, batem em muito com a realidade brasileira – guardadas as devidas proporções.
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O questionamento ao papel da Universidade começou a se dar na segunda metade dos anos 90. O isolamento, a compartimentalização, os “papers”, como única maneira de avaliar desempenho, o distanciamento das empresas e do entorno, tudo isso deu margem a uma enorme discussão sobre o papel da Universidade.
A discussão se resolveu com um trabalho do físico Britto Cruz. Nele, definia que o papel principal da Universidade era o ensino. Depois, a pesquisa. Eventualmente, a inovação.
Mas o ambiente central para a inovação eram as empresas.
A partir dessa visão, verbas de pesquisa foram direcionadas para que empresas contratassem pesquisadores, comandando a inovação.
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Foi uma mudança importante, mas que exige alguns ajustes de rumo.
Na primeira fase – da Universidade fechada – havia pouca governança, pouca transparência de gestão e muitos donos do pedaço.
Na segunda fase – de aproximação com o setor privado – esbarra-se no mesmo problema de governança e em algumas características da economia brasileira diferentes do modelo de universidade norte-americano.
O primeiro, é o pequeno hábito de pesquisa das empresas brasileiras. Anos de câmbio apreciado tiraram a competitividade da pesquisa própria, em favor da importação de tecnologia. Hoje em dia, a pesquisa de ponta está apenas em grandes grupos, como Petrobras, Odebrecht, Embraer, no segmento de cosméticos e não muito mais.
Em que pese algumas iniciativas relevantes, como o MEI (Movimento Empresarial pela Inovação), pequenas e médias empresas ainda estão longe de avançar no campo da inovação.
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Para tentar reduzir o fosso que a separa do empreendedorismo, muitas universidades criaram agências visando estimular registro de patentes.
Mas o empreendedorismo no país padece de uma vulnerabilidade maior: não sabe trabalhar modelos de negócio.
O sucesso dos grandes campeões da Internet – Apple, Google, Facebook – está muito mais no modelo de negócio desenvolvido do que propriamente no diferencial tecnológico.
O caminho poderia ser abreviado com empresas de “venture capital” – investindo em empresas nascentes do setor de tecnologia. Há boas experiências, bem sucedidas, mas ainda sem escala para alavancar o setor.
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Com o advento das novas tecnologias da informação, no entanto, o grande mercado para a Universidade é o seu metier, a educação. Em breve a Internet acabará com os intermediários de conteúdo – editoras de livro didático, cursos apostilados etc. O diferencial será o conhecimento e os novos modelos pedagógicos.
E quem os têm ainda é a Universidade pública. E conseguirão desempenhar esse papel se houver políticas públicas capazes de viabilizar o novo modelo.
Pelo menos no campo da educação, a base continuará sendo a universidade pública. Caberá ao MEC definir conteúdo e adquirir o conhecimento diretamente de seus autores.

terça-feira, 29 de maio de 2012

Centenário de Walther Moreira Salles



Coluna Econômica - 29/05/2012
Ontem completou cem anos de nascimento do banqueiro e diplomata Walther Moreira Salles. Sua vida confunde-se com a própria história da República brasileira no século 20.
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Por muitas razões, Moreira Salles nunca foi um empresário típico brasileiro da sua época. Sua visão de mundo, de empresa, da própria política estava décadas à frente.
Havia dois personagens em Moreira Salles: o empresário e o homem público. E uma enorme influência do padrão norte-americano de embricamento empresarial-governo.
Essa visão foi-lhe passada pelo pai João Moreira Salles. Em uma carta endereçada ao filho, ainda adolescente, ele menciona o modelo americano, a economia voltada para  iniciativa privada, a responsabilidade do empresário na construção nacional.
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Esse modelo seria aprofundado com os contatos posteriores do jovem Walther com o mundo financeiro norte-americano: um estágio em bancos de Nova York, tendo por cicerone o norueguês Berent Friele, presidente da American Coffee, controlada pelo grupo Rockefeller. Foi Friele quem o aproximou dos irmãos Rockefeller, David e, especialmente, Nelson, de quem se tornou grande amigo e, posteriormente, sócio, em uma grande fazenda do Mato Grosso.
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Antes mesmo da visita aos Estados Unidos, Walther já tinha consolidado alguns princípios de gestão pouco comuns na época. Um deles, o da associação ou fusão, visando ganhar musculatura. Foi assim na fusão do Banco Moreira Salles com o Banco de Botelhos, de Pedro di Perna – que o liberou para tocar outros projetos.
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Em Poços de Caldas mesmo, Walther pode acompanhar modelos associativos, como os do Silva Prado na Companhia Melhoramentos de Poços. Ou as tentativas do famoso coronel Zeca da Pedra de construir uma ferrovia ligando Poços a Botelhos.
Foram ensinamentos preciosos. Os primeiros movimentos de Walther ocorreram nesse modelo, juntando grupos de amigos para investimentos em áreas pioneiras.
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Seu passo seguinte foi se mudar para o Rio de Janeiro, montando uma ampla rede de relacionamentos, graças a uma capacidade única de encantar pessoas, com seus modos afáveis e atenciosos.
Foi assim que percebeu a eminente explosão do rodoviarismo e conseguiu a concessão da Caterpillar no Brasil, através da Sotreq. A empresa estava sufocada pela burocracia brasileira de importação. Por conta da guerra, as guias de importação eram ferreamente controladas, gerando uma insegurança fatal para a empresa.
A aproximação com Augusto Frederico Schmidt e Lulu Aranha – irmão de Oswaldo Aranha -, foi fundamental. Ambos controlavam a alfândega.
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Assim como Barão de Mauá e os modernos financistas, grande parte da acumulação financeira de Walther se deveu a seus conhecimento do mercado internacional de dívidas.
A Segunda Guerra jogou no Rio de Janeiro parte da elite financeira mundial. Dois financistas foram fundamentais para seu aprendizado: o francês Andres Rueff (um dos controladores da Galeria Laffayette) e o húngaro Emeric Khan.
Com ambos, Walther aprendeu os segredos do mercado internacional de títulos e de moedas, que se formava após o acordo de Bretton Woods.

Dívida pública

Um dos instrumentos mais eficazes de acumulação financeira no Brasil, desde o século 19, foi o mercado internacional de títulos públicos. Credores emprestam aos países até o limite do default. Com a incapacidade de pagamento, há a moratória e uma renegociação da divida. No meio do processo, grandes oscilações nos preços dos títulos, indo do valor ínfimo ao valor de face.

Ignácio Rangel - 1

Esse movimento foi identificado pelo grande Ignácio Rangel, economista do BNDES, em seu clássico “A inflação brasileira”. Depois do processo de industrialização iniciado no período Vargas-JK, Rangel dizia que o último passo para o país se tornar potência residia na capacidade do setor financeiro em acumular capitais para alavancar os investimentos. E a instabilidade monetária era o caminho.

Ignácio Rangel – 2

Rangel era contra políticas monetárias ortodoxas porque via na instabilidade da moeda a grande alavanca para a acumulação de capitais. Faltava ao Brasil apenas grandes bancos e grandes investidores, dizia ele, por isso a política monetária deveria estimular esses ganhos, tornando o país capaz de gerar seu próprio capital para investir em novos setores, uma tese ousada mas que se mostrou verdadeira.

O empreendedor – 1

Coube a Walther o papel de pioneiro em várias áreas. Sua atuação foi fundamental para salvar o projeto da Refinaria União – cujas ações eram vendidas de porta em porta -, depois de uma primeira rodada fracassada. Depois, entrou na petroquímica, através do maior lançamento da época, o da Petroquisa, que mobilizou o mercado de capitais de maneira pujante. Entrou em pecuária, mineração, financeiras.

O empreendedor – 2

Com Rockefeller e outros banqueiros nacionais, criou o BIB, segundo grande bancos de investimentos brasileiro que, ao lado da Delta – de dois americanos que enriqueceram com compra de títulos de dívida – inovou o mercado de capitais brasileiro. Até o início dos anos 2.000, o Unibanco ainda era o líder inconteste de lançamento de ações de novas empresas, herdando o pioneirismo de Walther.

O único fracasso

O único fracasso de Walther foi nos anos 80, na era da reserva de mercado de informática. O Brasil apostou em quatro fabricantes de minicomputadores. Pioneiro do moderno mercado de capitais brasileiro, Roberto Teixeira da Costa montou a Brasilpart para investir em novos setores Apostou em uma empresa que não deu certo e demorou para sair. Pelo que me contou, foi das poucas vezes que viu o embaixador perder a calma.