terça-feira, 29 de maio de 2012

Centenário de Walther Moreira Salles



Coluna Econômica - 29/05/2012
Ontem completou cem anos de nascimento do banqueiro e diplomata Walther Moreira Salles. Sua vida confunde-se com a própria história da República brasileira no século 20.
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Por muitas razões, Moreira Salles nunca foi um empresário típico brasileiro da sua época. Sua visão de mundo, de empresa, da própria política estava décadas à frente.
Havia dois personagens em Moreira Salles: o empresário e o homem público. E uma enorme influência do padrão norte-americano de embricamento empresarial-governo.
Essa visão foi-lhe passada pelo pai João Moreira Salles. Em uma carta endereçada ao filho, ainda adolescente, ele menciona o modelo americano, a economia voltada para  iniciativa privada, a responsabilidade do empresário na construção nacional.
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Esse modelo seria aprofundado com os contatos posteriores do jovem Walther com o mundo financeiro norte-americano: um estágio em bancos de Nova York, tendo por cicerone o norueguês Berent Friele, presidente da American Coffee, controlada pelo grupo Rockefeller. Foi Friele quem o aproximou dos irmãos Rockefeller, David e, especialmente, Nelson, de quem se tornou grande amigo e, posteriormente, sócio, em uma grande fazenda do Mato Grosso.
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Antes mesmo da visita aos Estados Unidos, Walther já tinha consolidado alguns princípios de gestão pouco comuns na época. Um deles, o da associação ou fusão, visando ganhar musculatura. Foi assim na fusão do Banco Moreira Salles com o Banco de Botelhos, de Pedro di Perna – que o liberou para tocar outros projetos.
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Em Poços de Caldas mesmo, Walther pode acompanhar modelos associativos, como os do Silva Prado na Companhia Melhoramentos de Poços. Ou as tentativas do famoso coronel Zeca da Pedra de construir uma ferrovia ligando Poços a Botelhos.
Foram ensinamentos preciosos. Os primeiros movimentos de Walther ocorreram nesse modelo, juntando grupos de amigos para investimentos em áreas pioneiras.
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Seu passo seguinte foi se mudar para o Rio de Janeiro, montando uma ampla rede de relacionamentos, graças a uma capacidade única de encantar pessoas, com seus modos afáveis e atenciosos.
Foi assim que percebeu a eminente explosão do rodoviarismo e conseguiu a concessão da Caterpillar no Brasil, através da Sotreq. A empresa estava sufocada pela burocracia brasileira de importação. Por conta da guerra, as guias de importação eram ferreamente controladas, gerando uma insegurança fatal para a empresa.
A aproximação com Augusto Frederico Schmidt e Lulu Aranha – irmão de Oswaldo Aranha -, foi fundamental. Ambos controlavam a alfândega.
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Assim como Barão de Mauá e os modernos financistas, grande parte da acumulação financeira de Walther se deveu a seus conhecimento do mercado internacional de dívidas.
A Segunda Guerra jogou no Rio de Janeiro parte da elite financeira mundial. Dois financistas foram fundamentais para seu aprendizado: o francês Andres Rueff (um dos controladores da Galeria Laffayette) e o húngaro Emeric Khan.
Com ambos, Walther aprendeu os segredos do mercado internacional de títulos e de moedas, que se formava após o acordo de Bretton Woods.

Dívida pública

Um dos instrumentos mais eficazes de acumulação financeira no Brasil, desde o século 19, foi o mercado internacional de títulos públicos. Credores emprestam aos países até o limite do default. Com a incapacidade de pagamento, há a moratória e uma renegociação da divida. No meio do processo, grandes oscilações nos preços dos títulos, indo do valor ínfimo ao valor de face.

Ignácio Rangel - 1

Esse movimento foi identificado pelo grande Ignácio Rangel, economista do BNDES, em seu clássico “A inflação brasileira”. Depois do processo de industrialização iniciado no período Vargas-JK, Rangel dizia que o último passo para o país se tornar potência residia na capacidade do setor financeiro em acumular capitais para alavancar os investimentos. E a instabilidade monetária era o caminho.

Ignácio Rangel – 2

Rangel era contra políticas monetárias ortodoxas porque via na instabilidade da moeda a grande alavanca para a acumulação de capitais. Faltava ao Brasil apenas grandes bancos e grandes investidores, dizia ele, por isso a política monetária deveria estimular esses ganhos, tornando o país capaz de gerar seu próprio capital para investir em novos setores, uma tese ousada mas que se mostrou verdadeira.

O empreendedor – 1

Coube a Walther o papel de pioneiro em várias áreas. Sua atuação foi fundamental para salvar o projeto da Refinaria União – cujas ações eram vendidas de porta em porta -, depois de uma primeira rodada fracassada. Depois, entrou na petroquímica, através do maior lançamento da época, o da Petroquisa, que mobilizou o mercado de capitais de maneira pujante. Entrou em pecuária, mineração, financeiras.

O empreendedor – 2

Com Rockefeller e outros banqueiros nacionais, criou o BIB, segundo grande bancos de investimentos brasileiro que, ao lado da Delta – de dois americanos que enriqueceram com compra de títulos de dívida – inovou o mercado de capitais brasileiro. Até o início dos anos 2.000, o Unibanco ainda era o líder inconteste de lançamento de ações de novas empresas, herdando o pioneirismo de Walther.

O único fracasso

O único fracasso de Walther foi nos anos 80, na era da reserva de mercado de informática. O Brasil apostou em quatro fabricantes de minicomputadores. Pioneiro do moderno mercado de capitais brasileiro, Roberto Teixeira da Costa montou a Brasilpart para investir em novos setores Apostou em uma empresa que não deu certo e demorou para sair. Pelo que me contou, foi das poucas vezes que viu o embaixador perder a calma.



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