quinta-feira, 27 de junho de 2024

Esquema bilionário de fraude da Americanas envolveu mais de 60 pessoas só para esconder rombo, OESP

 


A fraude bilionária descoberta em 2023 e que virou alvo da operação deflagrada nesta quinta-feira, 27, pela Polícia Federal contra a Americanas envolveu dezenas de funcionários e executivos da varejista ao longo dos últimos anos. Investigações internas da empresa, segundo apurou o Estadão/Broadcast, apontavam que a lista de pessoas com algum envolvimento nas operações fraudulentas era extensa. Pelo menos 60 pessoas (que deixaram a companhia ou foram demitidas) fariam parte das práticas irregulares.

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Segundo fontes ligadas à Americanas, muitos executivos gastavam mais tempo cuidando diariamente de esconder o rombo e fraudar as contas do que trabalhando na gestão da empresa. Diante desse desvio de funções, a empresa já se prepara para buscar um ressarcimento bilionário relativo às inconsistências. Em nota, a Americanas afirmou que confia nas investigações e diz que foi vítima.

A fraude consistia ainda em repassar dados maquiados e modificados às auditorias, que não tinham acesso pleno aos sistemas do grupo. Apesar disso, a sócia de auditoria da KPMG Carla Bellangero afirmou, em depoimento à CPI, que durante o trabalho com a Americanas foi chamada a atenção para “as deficiências e a necessidade de melhoria nos controles de verbas de propaganda cooperadas” da empresa.

Nova gestão da varejista informou que foram pagos R$ 700 milhões em salários e bônus à diretoria em 10 anos
Nova gestão da varejista informou que foram pagos R$ 700 milhões em salários e bônus à diretoria em 10 anos Foto: Pedro Kirilos/Estadão

À época, Bellangero afirmou que manteve os gestores da varejista conscientes dos processos que se passavam na companhia. “Foi insinuado pelo CEO (da Americanas, Leonardo Coelho, em depoimento à mesma CPI) que a mudança de ‘conselho de administração’ para ‘administração’ (em documento da auditoria à gestão da companhia) impedia a tomada de conhecimento. Isso é falso.” Bellangero informou que manteve 50 reuniões com os representantes da governança da Americanas.

Em depoimento feito na CPI, a nova gestão da varejista informou que foram pagos R$ 700 milhões em salários e bônus à diretoria em 10 anos. Comprovado que os resultados foram forjados propositalmente, as remunerações variáveis pagas com base no desempenho falso teriam de retornar ao caixa da empresa.

O Conselho de Administração da empresa criou um comitê independente de investigação para apurar as suspeitas de fraude contábil informadas ao mercado pelo grupo. O processo de apuração do comitê independente se estendeu por 17 meses e a análise dos documentos foi feita por amostragem, segundo apurou o Estadão/Broadcast.

Executivos foram chamados para prestar depoimentos e houve resistência por parte de alguns, segundo fontes. O ex-presidente do grupo, Miguel Gutierrez, que teve hoje o pedido de prisão decretado, está entre os que teriam colaborado com o processo, com três depoimentos e cerca de 16 horas de gravação.

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A estratégia de defesa de Gutierrez era se concentrar nas potenciais faltas de clareza nas conclusões da apuração, segundo disseram fontes ao Estadão/Broadcast, e quaisquer tentativas de responsabilizar a antiga diretoria também deve ser motivo de processos. Membros da antiga diretoria também veem espaço para possíveis reparações referentes a danos morais e de imagens, caso acusações não se confirmem.

A defesa do executivo disse por meio de nota que não teve acesso aos autos das medidas cautelares deferidas nesta quinta-feira e por isso não tem o que comentar sobre a operação da Polícia Federal, com pedido de prisão preventiva do ex-executivo. “Miguel reitera que jamais participou ou teve conhecimento de qualquer fraude e que vem colaborando com as autoridades, prestando os esclarecimentos devidos nos foros próprios”, complementa a defesa em nota.

O escândalo veio à tona em janeiro de 2023 com uma comunicação da varejista de que havia encontrado inconsistências contábeis da ordem de R$ 20 bilhões. A revelação se deu menos de 15 dias após a entrada de Sergio Rial, ex-presidente do Santander, na presidência do grupo.

Em nota, a Americanas afirmou que reitera sua confiança nas autoridades que investigam o caso e reforça que foi vítima de uma fraude de resultados pela sua antiga diretoria, que manipulou dolosamente os controles internos existentes. “A Americanas acredita na Justiça e aguarda a conclusão das investigações para responsabilizar judicialmente todos os envolvidos.”

Presidente da Câmara de SP quer polícia para fechar Jockey até sábado: ‘Tirem seus cavalos de lá', OESP

 

O presidente da Câmara Municipal de São Paulo, Milton Leite (União Brasil), declarou nesta quinta-feira, 27, que irá ao Jockey Club acompanhado de agentes do Controle de Zoonoses e da polícia para impedir competições de turfe neste fim de semana. O projeto de lei que proíbe a realização de corridas de animais para apostas e jogos de azar foi recém-sancionado pelo prefeito Ricardo Nunes (MDB), um dia após a aprovação pelos vereadores.

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“Proprietários de cavalo, tirem os seus cavalos de lá, porque serão presos. É bom que o Jockey Club e outros comecem a preparar outro destino, a outro endereço, porque aquilo é da Prefeitura. E queremos tomar posse”, afirmou no início da sessão do Legislativo municipal.

Em nota, a diretoria do Jockey Club de São Paulo disse lamentar a aprovação do projeto. “Além de demonstrar total desconhecimento sobre o esporte, a proposta sinaliza para a população um claro interesse em tentar desconstruir a história centenária do Jockey Club de São Paulo, bem como de abrir espaço para absurda tentativa desapropriar o terreno do Hipódromo de Cidade Jardim para possível especulação imobiliária”, diz a entidade.

A diretoria afirma ainda que “adotará as medidas legais cabíveis para garantir seus direitos e das milhares de famílias que dependem das atividades turfísticas.”

Na nova lei, é apontado um período de 180 dias para a cessão das atividades. O hipódromo paulistano fica na Cidade Jardim, na zona sul, com as próximas corridas programadas para as tardes desta sexta-feira e do sábado, 30.

O entendimento da Prefeitura é, contudo, que o espaço passa a pertencer ao Município com o encerramento das corridas, “conforme cláusulas de inalienabilidade e impenhorabilidade previstas no registro do imóvel”. Em comunicado veiculado nesta quinta, também reafirmou a intenção de transformar o hipódromo em um parque.

A área foi incluída no quadro de parques com implantação preferencial da nova lei do Plano Diretor, que entrou em vigor no ano passado.

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Projeto de lei aprovado pode impactar permanência do Jockey Club de São Paulo
Projeto de lei aprovado pode impactar permanência do Jockey Club de São Paulo Foto: Felipe Rau/Estadão - 04/05/2018

Na Câmara, Leite ressaltou a intenção de que as corridas não ocorram já neste fim de semana. “Vou convocar todos os ambientalistas, para que nós façamos a ocupação daquilo e a apreensão dos animais que estiverem lá”, acrescentou. O projeto de lei é de autoria do vereador Xexéu Tripoli (União Brasil).

Ao Estadão, a Associação Brasileira de Criadores e Proprietários de Cavalo de Corridas (ABCPCC) criticou o projeto de lei recém-aprovado. “A cidade tem problemas muito mais urgentes nas áreas de saúde, mobilidade e segurança do que a proibição das corridas de cavalo, um negócio que gera empregos na cidade e no campo”, disse Julio Camargo, presidente da entidade.

O que diz o projeto de lei aprovado na Câmara?

Após a aprovação na Câmara, o vereador Xexéu Tripoli chamou a decisão de “um momento histórico para o Brasil”. Segundo o projeto, estabelecimentos desse setor terão prazo de 180 dias para cessar as atividades, contados a partir da publicação da lei.

Zoneamento do entorno do Jockey Club foi recentemente alterado, permitindo construção de prédios no entorno
Zoneamento do entorno do Jockey Club foi recentemente alterado, permitindo construção de prédios no entorno Foto: Felipe Rau/Estadão

Em caso de descumprimento, é determinada uma advertência inicial. No caso de primeira reincidência, é prevista multa de R$ 100 multiplicados pela capacidade de frequentadores do espaço. Além disso, se ocorrer demora superior a 30 dias para a regularização, determina-se a suspensão do alvará de funcionamento.

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De 2022, o projeto havia sido aprovado em 1ª (e preliminar) votação no ano passado. “Ficam proibidas atividades desportivas que utilizem animais, como corridas, disputas ou qualquer outra prova, com a respectiva emissão de pouleis de apostas, ainda que por meio digital ou virtual”, diz o texto.

Na nova lei do Plano Diretor, o parque proposto para o local aparece com o nome de João Carlos Di Genio, empresário fundador do grupo educacional Unip/Objetivo, que morreu em 2022.

Outra revisão recente na legislação permitiu a construção de prédios no entorno do espaço. Como revelou o Estadão, a mudança abrange quadras antes restritas a casas e comércios baixos, de Zona Exclusivamente Residencial (ZER) e Zona Corredor (ZCOR). A alteração causou estranhamento e, segundo especialistas, pode ser até interpretada como ilegal.

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Jockey Club realiza corridas principalmente nas tardes de sábado
Jockey Club realiza corridas principalmente nas tardes de sábado Foto: Felipe Rau/Estadão - 04/05/2018

Atualmente, o Jockey Club costuma abrir ao público e receber corridas principalmente aos sábados. O hipódromo envolve tanto apostas presenciais quanto online, ambas vetadas pelo projeto recém-aprovado.

Um dos aspectos mais citados por aqueles que defendem a transformação em parque municipal é a dívida de IPTU do Jockey Club com a cidade. Segundo a plataforma de Dívida Ativa da Prefeitura, o montante é de ao menos R$ 532,6 milhões, acumulados há mais de uma década.

Em audiência pública na Câmara sobre a transformação do espaço em parque, no fim de 2022, representantes do Jockey Club afirmaram que o funcionamento já tem essa característica e que a mudança não teria interesse público. Também questionaram o cálculo da dívida com a Prefeitura, o qual é tema de disputa judicial há anos.

São Paulo tem um caso recente de espaço do Jockey Club transformado em parque. Trata-se do Parque Chácara do Jockey, inaugurado na Vila Sônia, na zona oeste, em 2016. Historicamente, a área era utilizada para treinamentos e outras atividades com cavalos.

O hipódromo da Cidade Jardim data de 1941. O espaço ocupa cerca de 600 mil m². Parte das instalações é tombada como patrimônio cultural./ COLABOROU GONÇALO JUNIOR

Doença holandesa e produtividade, André Roncaglia, FSP

 Liderado pelo professor Luiz Carlos Bresser-Pereira, o Novo Desenvolvimentismo (ND) oferece uma teoria econômica que explica a doença holandesa. É uma espécie de vício da estrutura produtiva em extrativismo de recursos naturais ou de rendas financeiras que aprisiona os países no subdesenvolvimento de seu potencial produtivo.

Esta condição afeta, por exemplo, países ricos em petróleo —como Venezuela, Noruega e Brasil— e se manifesta como uma tendência à sobreapreciação cíclica e crônica da taxa de câmbio, que asfixia a lucratividade das empresas industriais na fronteira tecnológica de seus setores. O resultado é a desindustrialização prematura e acelerada.

Refinaria da PDVSA, em Punta de Mata, na Venezuela
Refinaria da PDVSA, em Punta de Mata, na Venezuela - Leonardo Fernandez Viloria/Reuters

Para o ND, a taxa de câmbio tem papel central na decisão de investimento de empresas exportadoras competentes por afetar a taxa de lucro das mesmas. Uma pauta de exportações dependente de commodities —no Brasil, elas somam 70% do valor exportado— produz uma taxa de câmbio que equilibra as contas externas, mas inibe a inovação tecnológica de ponta.

Como um interruptor, a taxa de câmbio liga e desliga o acesso da indústria a uma fonte importante de demanda: o mercado externo. Por isso, um câmbio apreciado inibe investimentos industriais. A obsolescência tecnológica que se segue mantém as empresas fora do mercado internacional. Com efeito, a produção industrial e os bons empregos dão lugar a importações financiadas com abundantes capitais externos que perseguem nossa elevada taxa de juros.

Nesta semana, o Centro de Estudos do Novo Desenvolvimentismo da FGV (FGVcnd) divulgou a atualização da Taxa de Câmbio de Equilíbrio Industrial. O gráfico mostra que a nossa taxa de câmbio observada está abaixo do equilíbrio industrial. Se for mantida, a tendência de apreciação será nociva à produtividade da nossa economia.

Dois estudos recentes, publicados em revistas acadêmicas internacionais, utilizam dados no nível das empresas para ilustrar os efeitos persistentes da sobrevalorização cambial sobre a produtividade, como defende o ND.

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O caso chileno é explorado por Rodrigo Heresi (BID), em que a doença holandesa tirou dinamismo do país com a governança macroeconômica da América Latina mais alinhada à ortodoxia, com política fiscal anticíclica e fundo soberano. O boom de commodities nos anos 2000 levou a uma apreciação cambial que elevou a taxa de retorno exigida ao capital.

O sistema de preços da economia deslocou recursos das empresas exportadoras chilenas com uso intensivo de capital para empresas menos sofisticadas e que exportavam menos. O resultado foi que o maior produtor mundial de cobre perdeu entre 13% e 32% da produtividade observada entre 2004 e 2012.

Branstetter e Laverde-Cubillos (2024) analisam o caso colombiano em "The dark side of the boom: Dutch disease, competition with China, and technological upgrading in Colombian manufacturing". Entre 2003-2010, o câmbio real efetivo colombiano se valorizou, deslocando recursos para setores intensivos em recursos naturais e de serviços.

Contudo, a subsequente depreciação cambial, ao final do boom, não reverteu os efeitos sobre a composição do PIB, persistindo os efeitos deletérios sobre os manufaturados comercializáveis. O efeito de uma década de falta de competitividade industrial levou à redução de gastos em pesquisa e desenvolvimento, deixando cicatrizes no sistema produtivo.

Educação, burocracia e tributação são restrições relevantes aos ganhos de produtividade, mas é a inovação ligada à indústria e aos serviços sofisticados que os gera e sustenta. A sobreapreciação cambial inibe este mecanismo e, por isso, deve ser evitada antes que altere permanentemente a estrutura produtiva.

Parabéns ao prof. Bresser-Pereira, que completa 90 anos de vida neste domingo!