segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Peruas de natal

Por Fernando de Barros e Silva, in Opinião FSP 20/12/2010

SÃO PAULO - Chama atenção, nos estacionamentos dos 
shoppings paulistanos, abarrotados nesta época, a quantidade de carrões,
 daqueles que mal cabem numa vaga normal. Estão ali, 
exibindo a sua força, com seus traseiros enormes, apertados 
como um brutamontes numa cadeira de avião. São Paulo está cheia 
desses jipões high tec, dessas superperuas modernosas.
São conduzidas frequentemente por mocinhas, 
ou jovens senhoras esquálidas e assustadiças, 
numa esdrúxula combinação de fragilidade e truculência, 
de poder e desamparo. Não se sabe se representam 
a realização de um sonho ou antes a proteção de um pesadelo. 
Sonho de consumo e pesadelo de viver nesta cidade.
 É quase impossível não enxergar esses carros 
como versões civis dos blindados de guerra.
Um amigo que morou em Londres conta que o governo 
está patrocinando a isenção do IPVA local para carros pequenos ou 
movidos a eletricidade. Lá o Estado faz o que pode 
para dificultar a circulação de veículos. Há pedágio urbano
 e as pessoas só podem estacionar sem custos 
em seus próprios bairros. A contrapartida é um transporte 
público que funciona. Mais ou menos o oposto do que temos 
por aqui.
A tara pelas superperuas é o sintoma mais flagrante 
de nossa opção histórica pelo transporte individual. 
Ela está nos levando ao limite da irracionalidade. 
Cada carro, em São Paulo -de uma frota de quase 6 milhões- 
carrega, em média, menos de 1,5 passageiro. Já o sistema público
 vive superlotado e ainda é muito precário. Acordamos muito tarde 
para a importância do metrô, e as obras de expansão da rede vão
 a passo de tartaruga.
Há pouquíssimas restrições ao uso do carro em São Paulo. 
Temos, isso sim, uma indústria avançada de multas de trânsito 
(cerca de 600 mil por mês na capital) 
e uma rede de estacionamentos privados faturando loucuras. 
O carro é tão inviável quanto lucrativo. Por isso temos tantos carrões 
e nenhuma política de transporte digna do nome.

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

São Paulo tem 290 mil imóveis sem moradores, diz IBGE


07 de dezembro de 2010 | 11h 34
    - Agência Estado
O número de domicílios vagos na cidade de São Paulo seria suficiente para atender toda a população paulistana que vive hoje em áreas de risco, cerca de 130 mil famílias. Há na capital paulista cerca de 290 mil imóveis que não são habitados, segundo dados preliminares do Censo 2010 divulgados ontem. O déficit habitacional, no entanto, é bem maior - são 712 mil famílias, incluindo habitações irregulares ou precárias, como favelas e cortiços.
Os recenseadores do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) encontraram 3,9 milhões de domicílios residenciais na capital, onde vivem 11,2 milhões de pessoas. "Foram contabilizadas cerca de 107 mil casas fechadas, que são aquelas em que alguém vive lá e não foi encontrado para responder ao questionário, mesmo após exaustivas tentativas", diz a coordenadora técnica do Censo 2010, Rosemary Utida. Já as 290 mil residências classificadas como vazias não têm moradores.
O Censo de 2000 já mostrava que a capital tinha mais casas vazias do que gente precisando de um lugar para morar, segundo a urbanista Raquel Rolnik, relatora especial da Organização das Nações Unidas (ONU) para o direito à moradia adequada e professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP). "Em 2000, tínhamos cerca de 420 mil domicílios vagos para um déficit de pouco mais de 203 mil moradias. A oferta de casas vazias era quase o dobro", afirma Raquel.
Moradia popular
A relatora da ONU avalia que, mesmo que parte desses imóveis precisasse passar por reforma antes de ser destinada à moradia popular, seria possível, pelo menos, reduzir o número de sem-teto. Outros especialistas discordam. "Esses imóveis vagos, mesmo que sejam reformados, não seriam destinados para habitação popular, não seriam para essa faixa da população, mas para renda mais alta", diz a arquiteta Heloísa Proença, ex-secretária de Planejamento Urbano da Prefeitura.
O secretário municipal de Habitação, Ricardo Pereira Leite, afirma que os imóveis vazios se devem a "um fenômeno que os urbanistas chamam de vacância de equilíbrio". "Quando você se muda, seu imóvel antigo está vazio, e o novo também. No Brasil, urbanistas da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) estimam que a vacância de equilíbrio deve ser em torno de 8%. Se for analisar, os 290 mil imóveis vão dar 7,9% do total de domicílios da capital. Em Nova York, uma cidade em que todo mundo quer morar, essa taxa é de 6%", diz. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo. 


quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

O lixo mais rápido da Europa


Barcelona tem 113 km de tubulações por onde o lixo é transportado a mais de 70 km por hora para ser reciclado ou tratado

24 de novembro de 2010 | 12h 
Gustavo Bonfiglioli - Especial para O Estado
Logo abaixo das ruas de Barcelona, existe uma outra malha de tráfego. A uma profundidade de 5 metros, o lixo de casas, escritórios e até hospitais da capital catalã viaja a uma velocidade de cerca de 70 quilômetros por hora por meio de 113 km de tubulações, rede a vácuo que literalmente suga os resíduos produzidos pela população. Todas as vias conduzem aos mesmos destinos, centrais de armazenamento onde o material é processado, estocado em contêineres e finalmente levado a estações de reciclagem ou de incineração.
A chamada coleta pneumática, desenvolvida pela empresa sueca Envac, transformou a gestão de resíduos de Barcelona desde que foi adotada, no início dos anos 90. Hoje a cidade tem 30% do lixo coletado em oito pontos. Cada uma dessas malhas subterrâneas é independente, conectada por dutos a uma central específica. Pode parecer futurista demais, mas existem 600 redes semelhantes espalhadas por 150 cidades de todo o planeta.
As vantagens ambientais são muitas: o fim dos caminhões de lixo, a diminuição das pilhas de sacos nas ruas e o estímulo à coleta seletiva, já que cada tipo de resíduo – reciclável, não-reciclável e orgânico – é lançado na rede subterrânea separadamente e vai para contêineres próprios.
"A ausência de caminhões de lixo evita odores, acúmulo de lixo e melhora o tráfego. Além das vantagens ambientais, o sistema proporciona um melhor aproveitamento do espaço urbano”, afirma Carlos Vazquez, chefe do Departamento de Gestão de Resíduos da prefeitura local. 
O bairro de Lesseps, no distrito de Gràcia, adotou a coleta a vácuo recentemente, em 2009. O presidente da associação de moradores, Josep Maria Flotats, é um dos entusiastas do sistema, que atende 5,6 mil pessoas em Lesseps. “O bairro está mais bonito, limpo e sem odores. Não há mais acúmulo de lixo pelas ruas à espera dos caminhões de coleta, cuja ausência também tornou o bairro menos barulhento”, conta o barbeiro de 65 anos, que organizou uma visita à central de coleta para os moradores no fim do ano passado. “É importante mostrar à população para onde de fato está indo o lixo que ela produz. Todos ficaram satisfeitos.” 
O vice-presidente da Envac Iberia, Albert Mateu, que administra os sistemas na Espanha e em Portugal, afirma que a coleta a vácuo deve cobrir 70% de Barcelona até 2018, ano em que a empresa espera concluir as outras redes de coleta projetadas para a cidade. “Infelizmente, não é possível chegar a 100% por conta de alguns bairros com pequenas colinas e irregularidades no terreno, que inviabilizam a instalação dos dutos”, explica.
Barcelona instalou o primeiro sistema de coleta subterrânea para os Jogos Olímpicos de 1992. O sistema criado para a vila olímpica construída com tecnologias sustentáveis no bairro Poblenou, a noroeste da cidade, atende ainda hoje a 4,4 mil residências. O exemplo da vila deu origem às outras sete redes de coleta, que, 18 anos depois, beneficiam aproximadamente 324 mil moradores.

Eficiente e caro
Segundo Mateu, a instalação da Envac tem quatro grandes turbinas que evitam obstruções na tubulação. Quando ocorrem, os problemas são logo identificados por uma central computadorizada que monitora todos os trajetos. “No caso de entupimento, acionamos as turbinas. Com o ganho de poder de sucção, em 90% dos casos desobstruímos o cano.” Nas demais emergências, o problema é resolvido manualmente.
O sistema é eficiente, mas não barato. Já foram investidos 156 milhões de euros em Barcelona. A instalação de uma rede capaz de atender a 18 mil famílias custa, em média, 50 milhões de euros.
Vasquez explica que o financiamento é feito de duas formas. Em áreas de urbanização nova ou recente, a iniciativa privada banca o equivalente a 57% do custo. Em áreas urbanas já consolidadas, o financiamento público chega a 92% do total. “O investimento público também vem de fundos (da União Europeia).” 
De acordo com Fábio Colella, gerente comercial da Envac no Brasil, o sistema diminui o custo da coleta entre 30% e 40%. “O investimento é alto, mas compensado a longo prazo.”

Apesar de parecer inovador, o recolhimento subterrâneo de lixo a vácuo existe desde 1961, quando foi instalado para atender a um hospital na cidade sueca de Sollefteå. Desde então, começou a ser aplicado em outras partes do país, mas só ganhou novos mercados na Europa a partir dos anos 90. “Acredito que o sistema ganhou visibilidade quando a gestão das cidades passou a ser pensada sob um ponto de vista sustentável”, afirma Colella.