Barcelona tem 113 km de tubulações por onde o lixo é transportado a mais de 70 km por hora para ser reciclado ou tratado
24 de novembro de 2010 | 12h
Gustavo Bonfiglioli - Especial para O Estado
Logo abaixo das ruas de Barcelona, existe uma outra malha de tráfego. A uma profundidade de 5 metros, o lixo de casas, escritórios e até hospitais da capital catalã viaja a uma velocidade de cerca de 70 quilômetros por hora por meio de 113 km de tubulações, rede a vácuo que literalmente suga os resíduos produzidos pela população. Todas as vias conduzem aos mesmos destinos, centrais de armazenamento onde o material é processado, estocado em contêineres e finalmente levado a estações de reciclagem ou de incineração.
A chamada coleta pneumática, desenvolvida pela empresa sueca Envac, transformou a gestão de resíduos de Barcelona desde que foi adotada, no início dos anos 90. Hoje a cidade tem 30% do lixo coletado em oito pontos. Cada uma dessas malhas subterrâneas é independente, conectada por dutos a uma central específica. Pode parecer futurista demais, mas existem 600 redes semelhantes espalhadas por 150 cidades de todo o planeta.
As vantagens ambientais são muitas: o fim dos caminhões de lixo, a diminuição das pilhas de sacos nas ruas e o estímulo à coleta seletiva, já que cada tipo de resíduo – reciclável, não-reciclável e orgânico – é lançado na rede subterrânea separadamente e vai para contêineres próprios.
"A ausência de caminhões de lixo evita odores, acúmulo de lixo e melhora o tráfego. Além das vantagens ambientais, o sistema proporciona um melhor aproveitamento do espaço urbano”, afirma Carlos Vazquez, chefe do Departamento de Gestão de Resíduos da prefeitura local.
O bairro de Lesseps, no distrito de Gràcia, adotou a coleta a vácuo recentemente, em 2009. O presidente da associação de moradores, Josep Maria Flotats, é um dos entusiastas do sistema, que atende 5,6 mil pessoas em Lesseps. “O bairro está mais bonito, limpo e sem odores. Não há mais acúmulo de lixo pelas ruas à espera dos caminhões de coleta, cuja ausência também tornou o bairro menos barulhento”, conta o barbeiro de 65 anos, que organizou uma visita à central de coleta para os moradores no fim do ano passado. “É importante mostrar à população para onde de fato está indo o lixo que ela produz. Todos ficaram satisfeitos.”
O vice-presidente da Envac Iberia, Albert Mateu, que administra os sistemas na Espanha e em Portugal, afirma que a coleta a vácuo deve cobrir 70% de Barcelona até 2018, ano em que a empresa espera concluir as outras redes de coleta projetadas para a cidade. “Infelizmente, não é possível chegar a 100% por conta de alguns bairros com pequenas colinas e irregularidades no terreno, que inviabilizam a instalação dos dutos”, explica.
Barcelona instalou o primeiro sistema de coleta subterrânea para os Jogos Olímpicos de 1992. O sistema criado para a vila olímpica construída com tecnologias sustentáveis no bairro Poblenou, a noroeste da cidade, atende ainda hoje a 4,4 mil residências. O exemplo da vila deu origem às outras sete redes de coleta, que, 18 anos depois, beneficiam aproximadamente 324 mil moradores.
Eficiente e caro
Segundo Mateu, a instalação da Envac tem quatro grandes turbinas que evitam obstruções na tubulação. Quando ocorrem, os problemas são logo identificados por uma central computadorizada que monitora todos os trajetos. “No caso de entupimento, acionamos as turbinas. Com o ganho de poder de sucção, em 90% dos casos desobstruímos o cano.” Nas demais emergências, o problema é resolvido manualmente.
O sistema é eficiente, mas não barato. Já foram investidos 156 milhões de euros em Barcelona. A instalação de uma rede capaz de atender a 18 mil famílias custa, em média, 50 milhões de euros.
O sistema é eficiente, mas não barato. Já foram investidos 156 milhões de euros em Barcelona. A instalação de uma rede capaz de atender a 18 mil famílias custa, em média, 50 milhões de euros.
Vasquez explica que o financiamento é feito de duas formas. Em áreas de urbanização nova ou recente, a iniciativa privada banca o equivalente a 57% do custo. Em áreas urbanas já consolidadas, o financiamento público chega a 92% do total. “O investimento público também vem de fundos (da União Europeia).”
De acordo com Fábio Colella, gerente comercial da Envac no Brasil, o sistema diminui o custo da coleta entre 30% e 40%. “O investimento é alto, mas compensado a longo prazo.”
Apesar de parecer inovador, o recolhimento subterrâneo de lixo a vácuo existe desde 1961, quando foi instalado para atender a um hospital na cidade sueca de Sollefteå. Desde então, começou a ser aplicado em outras partes do país, mas só ganhou novos mercados na Europa a partir dos anos 90. “Acredito que o sistema ganhou visibilidade quando a gestão das cidades passou a ser pensada sob um ponto de vista sustentável”, afirma Colella.
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