Não se sabia ainda, quando esta coluna foi entregue, se a fita "Ainda Estou Aqui" abocanharia um, nenhum ou mais de um Oscar. Certo é que o Brasil estaria já fervendo, em vários sentidos, quando o texto circular na edição impressa do jornal, segunda-feira, não importa o que acontecer no teatro Dolby em Los Angeles.
Há algo de sombriamente simbólico em que a cerimônia ocorra na meca cinematográfica da Califórnia. A cidade ardeu com incêndios há pouco mais de um mês, e decerto havia na plateia alguma celebridade milionária que perdeu a mansão em Palisades para chamas impelidas pelo aquecimento global.
Limusines, SUVs e speedsters beberrões de combustíveis fósseis estacionarão junto ao tapete vermelho para estrelas desembarcarem em roupas extravagantes, com preços que custariam anos de rendimentos dos manobristas. Hollywood, mesmo quando consagra filmes progressistas em defesa de direitos humanos, representa mais um sintoma da riqueza doentia que arruína o planeta.
Não se trata de estragar a festa, que terá sido bonita. Mas alguém precisa lembrar, mais e outra vez, que qualquer gala hoje em dia tem um quê daquele filme inesquecível de Sydney Pollack, "A Noite dos Desesperados" ("They Shoot Horses, Don’t They?", 1969), que rendeu um Oscar de ator coadjuvante para Gig Young.
Com ou sem Oscar, o Brasil ferve, porque é Carnaval. Além dos furtos, bêbados, arrastões, assédios e mijo nas ruas, a festa nacional enfrenta um perigo adicional: a onda de calor. Não parece prudente juntar tanta gente saracoteando na canícula, flertando com desidratação e insolação.
Autoridades acordaram enfim para a necessidade de adaptação à mudança do clima, ainda que por quatro dias. Em Sampa, a prefeitura vai distribuir 2 milhões de copos d’água. No Rio, desfiles de escolas de samba terão um dia a mais para que terminem antes do sol nascer, o que contribuirá para prevenir alguns desmaios.
O Brasil e o mundo precisam de muito mais. Por aqui, é a quinta onda de calor de 2025, em apenas dois meses. E nem era para estar acontecendo um calorão desses, pois El Niño de 2024 já se foi e cedeu a pista para La Niña, que deveria esfriar o clima, porém trouxe o janeiro mais quente desde a era pré-industrial.
Se fosse da folia, sairia fantasiado de Margem Equatorial: barba grisalha, chapéu panamá, camisa com fauna e flora dos mangues do Amapá, bermuda de plástico preto em homenagem à Petrobras, chinelos de dedo em verde e amarelo. Gritando roucamente contra o Ibama, abraçaria com uma mulher vestida de Transição Energética, ou seja, pelada (uma fantasia que ninguém consegue ver).
A marchinha da banda do Planalto canta que a renda do petróleo e do gás na bacia da Foz do Amazonas vai bancar, ha ha ha, o fim da queima de combustíveis fósseis. Na farra do pré-sal, todo mundo sabe, quem mamou nas tetas da estatal não foram as empresas de energias limpas.
Relatório recente orçou investimento de R$ 1,4 trilhão por ano para o Brasil alcançar a neutralidade em carbono, daqui até 2050. Mas o país continua incentivando combustíveis fósseis, que sugaram 82% de subsídios para energia, de quase R$ 100 bilhões em 2023.
Alalô, ôôô, ôôô, mas que calor, ôôô, ôôô.