Depois de terem se levantado contra Luis XVI em 1789, os sans cullotes elaboraram uma declaração dos direitos universais do homem e do cidadão. A Grande Armée de Napoleão marchava não só pela glória da França, mas também por liberdade, igualdade e fraternidade. Já o nacionalismo que nasceu décadas mais tarde, com a unificação da Alemanha, apelava para o Blut und Boden – sangue e solo –, a ideia romântica de que raça e tradição seriam o fundamento da união nacional. As legiões alemãs lutavam por seu Volk (povo), contra o restante do mundo.
Todas as sociedades recorrem a algum tipo de nacionalismo para definir as relações entre Estado, cidadãos e mundo exterior. O sociólogo americano Craig Calhoun diz que as elites cosmopolitas, que vez por outra sonham com uma ordem pós-nacionalista, subestimam “o papel central desempenhado pelas categorias nacionalistas na teoria política e social – assim como nas reflexões mais cotidianas sobre a democracia, a legitimidade política e a própria natureza da sociedade”.
Em razão disso, é motivo de preocupação que tantos países estejam trocando seu nacionalismo de orientação universalista e cívica por uma variedade de inspiração étnica, pautada pela noção de sangue e solo. Com o patriotismo positivo descambando em nacionalismo negativo, a solidariedade se metamorfoseia em desconfiança em relação às minorias, cujos contingentes são cada vez mais numerosos. O amor benigno do cidadão por seu país dá lugar à má vontade para com o estrangeiro.
É importante colocar a coisa em perspectiva. As comparações com a década de 1930 são descabidas. O nacionalismo de tipo totalitário atualmente subsiste apenas na Coreia do Norte, onde a dinastia Kim prega uma mistura esdrúxula de marxismo e purismo racial, escorada em campos de trabalho forçado para dissidentes. A esse caso isolado talvez se possa acrescentar o da Eritreia, ditadura cruenta, mas minúscula. Apesar disso, não há como negar que o mundo assiste ao avanço de um nacionalismo excludente, com frequência de fundo étnico. Em democracias desenvolvidas, o fenômeno vem ganhando força eleitoral. Em autocracias, os governantes o empregam como subterfúgio para desviar a atenção da população da falta de liberdade e, às vezes, de alimentos. A questão é: onde isso está acontecendo e por quê?
O exemplo mais recente é o de Donald Trump, que, prometendo construir um muro na fronteira com o México, deportar em massa imigrantes ilegais e fazer a “América grande de novo”, conquistou o voto de 61 milhões de americanos. Apelos nefastos à solidariedade étnica ou racial estão longe de ser novidade na política americana. E tampouco são exclusividade de um partido. Em discurso em 2012 para uma plateia majoritariamente negra, o vice-presidente Joe Biden disse que o então candidato republicano à presidência, Mitt Romney, iria “acorrentar vocês todos de novo”. Mas nenhum presidente moderno se elegeu com uma plataforma semelhante à do ufanismo belicoso de Trump. O fato de que ninguém saiba até que ponto ele acredita no que diz não é exatamente tranquilizador.
A vitória de Trump deve animar outros líderes de tendências nacionalistas. Nigel Farage, do Partido pela Independência do Reino Unido (Ukip), principal responsável pelo Brexit, já esteve com o presidente eleito dos EUA, tendo saudado o republicano com um sorriso estupidamente largo no rosto, capaz de meter medo até no gato de Alice no País das Maravilhas. Viktor Orban, o primeiro-ministro húngaro para quem os imigrantes são um “veneno”, regozijou-se: “Agora podemos retornar à verdadeira democracia. Que mundo maravilhoso”.
Para a União Europeia (UE) as consequências podem ser desastrosas. Na França, os institutos de pesquisa já não descartam a possibilidade de que Marine Le Pen, a carismática líder da Frente Nacional (FN), vença a eleição presidencial do ano que vem. Em comparação com outros europeus, os eleitores franceses são particularmente avessos à globalização e ao comércio internacional; e poucos deles consideram que os imigrantes oferecem contribuição positiva para a economia. Le Pen promete tirar a França da zona do euro e submeter a permanência do país na UE a referendo. A moeda única não resistiria sem a França. A UE tampouco teria como sobreviver se os franceses decidirem abandonar o barco.
Buscando uma porta de saída. Até não muito tempo atrás, as elites europeias imaginavam que as identidades nacionais acabariam por submergir no caldo continental. Mas quem está em alta agora são partidos como a FN, incluindo o húngaro Fidesz, o polonês Lei e Justiça e o austríaco Liberdade. A retórica de Le Pen é típica. A líder francesa explora nostalgia, ansiedade e antipatia em relação à ordem internacional liberal. (“Não a Bruxelas, sim à França”, diz um dos slogans.) Lamentando o declínio de um povo orgulhoso, ela promete fazer a França grande de novo.
Ao contrário de Trump, Le Pen jamais propôs impedir a entrada de muçulmanos no país. Fala só em conter a “gigantesca onda” de imigração. Advogada de formação, ela defende a proposta aludindo às leis francesas que proíbem manifestações de religiosidade em público. Mas seus eleitores sabem quem são os imigrantes que Le Pen desaprova e quem, em sua opinião, são os indivíduos que contam como franceses. Nas eleições regionais de 2015, um cartaz da FN exibia a foto de duas mulheres, uma delas de cabelo liso, com a bandeira francesa pintada no rosto, a outra escondida por uma burca. A imagem era acompanhada dos dizeres: “Escolha a sua vizinhança: vote na Frente Nacional!”.
Segundo Dominique Moïsi, do Institut Montaigne, a França vive uma onda de “nacionalismo defensivo”, que explora “a falta de confiança e o ufanismo negativo: a ideia de que a pessoa precisa se defender da ameaça dos outros”.
Algo parecido acontece em outros países europeus. Em 2010, o partido nacionalista Democratas Suecos veiculou na TV um anúncio que capturava bem o receio de que o generoso Estado de bem-estar social sueco não comporte a chegada de um grande contingente de refugiados muçulmanos, em sua maioria pobres e com altas taxas de natalidade: uma senhora avança com um andador ortopédico por um corredor, quando é ultrapassada por um grupo de mulheres de burca, empurrando carrinhos de bebê, que acabam chegando antes que a anciã ao pote em que estão reunidas as economias de sua aposentadoria.
Na Holanda, Geert Wilders, líder do Partido da Liberdade, é acusado na Justiça de “incitamento à intolerância” por ter estimulado os participantes de um comício a gritar palavras de ordem que exigiam “menos marroquinos” no país. As pesquisas colocam seu partido em primeiro ou segundo lugar nas intenções de voto para o pleito de março de 2017. Ao invés de prejudicar Wilders, o processo judicial o tornou ainda mais popular.
A vitória do Brexit em junho foi fruto da maré nacionalista. Cartazes da campanha defendendo que o Reino Unido deixasse a UE retratavam uma multidão de migrantes do Oriente Médio pedindo para entrar no país. Um dos slogans era: “Queremos nosso país de volta”. Com o resultado, o primeiro-ministro David Cameron, de inclinação cosmopolita, renunciou e foi substituído por Theresa May, que diz: “Quem se considera cidadão do mundo é cidadão de lugar nenhum; não entende o verdadeiro significado da palavra ‘cidadania’”.
A saída da UE ainda não se concretizou, mas os britânicos já estão mais pobres: a libra perdeu 16% de seu valor ante o dólar. Mesmo assim, são poucos os que se arrependem do voto a favor do Brexit. Em Margate, cidade litorânea onde há grande número de aposentados, é difícil encontrar quem tenha votado pela permanência no bloco europeu. O taxista Clive não mede palavras: “Os europeus vivem se aproveitando de nós. Não conseguem nem vencer as guerras deles”. Ele está mais satisfeito depois que May se comprometeu a reduzir a imigração: “Não temos mais espaço a eles. As escolas estão transbordando com estrangeiros”. E, apesar de reconhecer que alguns imigrantes se dedicam com afinco ao trabalho, ele se queixa de que em Cliftonville (cidade vizinha a Margate), “a impressão é de estar na Romênia. Muitos são ciganos”. Indagado que importância ele dá ao fato de ser britânico, Clive é ainda mais restrito: “Para mim o importante é ser inglês. Inglês”.
O presidente da Rússia, Vladimir Putin, ainda não sabe como lidar com Trump. Por mais que veja com bons olhos a reaproximação entre os dois países defendida pelo republicano, o fato é que, se não puder mais pintar os americanos como inimigos, terá de arrumar outro adversário para hostilizar. O líder russo acredita num Estado forte, liderado por ele mesmo. Desde que assumiu o poder em 2000, o nacionalismo étnico é um dos instrumentos que Putin explora para realizar esse objetivo. Em 2011, enfrentou grandes manifestações, promovidas por uma classe média urbana insatisfeita com a corrupção e a imigração descontrolada de grupos populacionais não eslavos. Sua resposta foi incitar o fervor imperial: quando a Ucrânia tentou se aproximar do Ocidente, anexou a Crimeia e invadiu o leste da ex-república soviética. Segundo a mídia estatal, o presidente russo estava salvando os russos étnicos dos “fascistas ucranianos”.
Com o petróleo em baixa e depois de um longo período de estagnação econômica, o nacionalismo é o único recurso de Putin para manter sua popularidade. Sua versão do sentimento xenofóbico inclui a rejeição aos valores universais promovidos pelo Ocidente. Daí seu apoio aos partidos nacionalistas da Europa Ocidental, como a FN de Le Pen. “Temos visto muitos países europeus se afastando de suas raízes e até de seus valores cristãos”, disse ele em 2013. A esse movimento se contraporia sua versão etnicamente definida de uma Rússia como “civilização estatal, unida em torno do povo russo, da língua russa, da cultura russa e da Igreja Ortodoxa Russa”.
Na China, o Partido Comunista vem explorando um nacionalismo igualmente étnico e não universal. Seus dirigentes tentam eliminar a distinção entre partido e nação, para reforçar sua legitimidade, agora que o crescimento econômico perdeu vigor. Pouco depois de assumir a presidência, em 2012, Xi Jinping lançou o slogan “Sonho Chinês”, para incentivar o “grande renascimento” do país. Dos primeiros anos da educação básica aos cursos de doutorado, os chineses são alvo de uma campanha de “educação patriótica”.
O governo chinês frequentemente responsabiliza as “forças estrangeiras hostis” pelas coisas de que não gosta, incluindo eventuais manifestações em Hong Kong e Xinjian, província no oeste do país, onde os uigures vivem em permanente estado de tensão com a maioria chinesa han. A televisão estatal tenta fazer com que os outros países pareçam idiotas, perigosos ou irrelevantes. A retórica antiocidental ganha força. Em 2015, o ministro da Educação sugeriu que os “livros e manuais didáticos que promovem valores ocidentais” sejam banidos do ensino superior.
A vitória da China sobre o Japão tornou-se ponto culminante do currículo de história (muito embora boa parte da guerra tenha sido conduzida pelo partido adversário dos comunistas, o Kuomintang). Em 2014, foram criados três feriados nacionais: um dia para homenagear as vítimas do massacre de Nanquim, onde, em 1937, cerca de 300 mil pessoas foram assassinadas pelos japoneses; um “Dia da Vitória”, para celebrar a rendição dos japoneses na 2.ª Guerra; e um “Dia dos Mártires”, dedicado aos que morreram lutando contra o Japão.
Tendo em vista a onda ufanista, não é de admirar que muitos chineses hoje vejam as relações exteriores como um jogo de soma zero, onde a ascensão da China teria como contrapartida necessária a queda de outras potências. Levantamento recente, conduzido pelo Pew Research Center, mostra que mais de metade dos chineses entrevistados acha que os americanos tentam impedir que a China ocupe posição internacional equiparável à dos EUA; cerca de 45% considera que a maior ameaça internacional ao país são o poder e a influência dos americanos. A antipatia em relação aos japoneses também cresceu bastante.
A propaganda é tão eficiente que o governo chinês já não sabe se é capaz de controlar as paixões que cultivou. Em 2012, eclodiram protestos em todo o país contra as pretensões territoriais dos japoneses em relação a ilhas no Mar do Leste da China: lojas foram saqueadas, carros japoneses destruídos e a tropa de choque da polícia teve de ser acionada para proteger a embaixada do Japão em Pequim. As autoridades chinesas agora censuram a veiculação na internet de mensagens agressivas com temas nacionalistas.
O presidente do Egito, Abdel Fattah Al Sisi, usa de todos os recursos do Estado para alardear a ideia de que é o pai da nação. Seu governo culpa os islamistas por tudo que acontece de ruim no país: quando fortes chuvas causaram enchentes em Alexandria no ano passado, o ministro do Interior acusou a Irmandade Muçulmana de ter obstruído os bueiros e as bocas de lobo da cidade. Há alguns meses, depois de gastar US$ 8 bilhões na ampliação do canal de Suez, Al Sisi decretou feriado e percorreu a hidrovia trajando uniforme militar de gala, enquanto aviões de caça cruzavam os céus. A emissora estatal de televisão transmitiu imagens do novo canal ao som do tema musical da série Game of Thrones.
Algo parecido está acontecendo na Turquia, país que há poucos anos parecia ter um futuro garantido no interior da UE. Agora o presidente Recep Tayyip Erdogan promete erguer uma “Nova Turquia”, capaz de resistir bravamente às investidas dos golpistas e de seus imaginários cúmplices ocidentais. Recentemente, Erdogan compareceu a um comício organizado para celebrar a conquista de Constantinopla, que data de 1453. Ele acusa os traiçoeiros aliados ocidentais do país de tentar “retomar as Cruzadas”. A retórica tem por objetivo justificar a prisão de 36 mil pessoas desde a tentativa de golpe ocorrida em julho.
Na Índia, o nacionalismo étnico, que jamais saiu totalmente de cena, ressurgiu de forma preocupante. O país é governado desde 2014 por Narendra Modi, do Partido do Povo Indiano (BJP, na sigla em inglês), de tendência nacionalista hindu. O BJP tenta se distanciar dos grupos nacionalistas hindus mais radicais, que criticam a moderação do partido em relação ao Paquistão, aos muçulmanos e àqueles que maltratam as vacas (animais sagrados para os hindus). Por outro lado, embora seja um político moderno e pró-mercado, Modi também faz parte da RSS (Organização Nacional de Voluntários), grupo fundado em 1925, nos moldes das associações de escoteiros. Seus 5 milhões de integrantes desfilam com fardas cáqui, exercitam-se pela manhã, ajudam idosos a atravessar a rua, recolhem lixo – e vez por outra fornecem recrutas para grupos extremistas que agridem fisicamente estudantes de inclinações esquerdistas. No ano passado, o ministro da Cultura, Mahesh Sharma, descreveu um ex-presidente do país como patriota, “apesar de muçulmano” e nem por isso perdeu o cargo.
Os grupos nacionalistas hindus pretendem representar todos os hindus, que compõem 80% da população indiana. Dizem-se comprometidos com a busca de um renascimento nacional, com o retorno a um passado idealizado e com a recuperação de uma identidade “autêntica”. Seus membros veem a si próprios como pessoas honestas que combatem uma elite cosmopolita corrupta. Acabaram por modificar o jargão político do país, desdenhando das injunções “politicamente corretas”, chamando a imprensa que os critica de “imprestituta” e seus adversários políticos de “antinacionais”. A RSS também exerce enorme influência na educação e na mídia da Índia. Alguns Estados e escolas adotam livros didáticos escritos por integrantes do grupo, que exaltam o papel de figuras nacionalistas hindus e relegam os líderes de tendência mais secular a um segundo plano.
O BJP vem se esforçando para controlar o Poder Judiciário, mas enfrenta forte resistência. O partido só domina pequena parte dos Estados do leste e do sul do país, e é visto com desprezo por muitos no interior da elite instruída. No ano passado, o excesso de hinduísmo e a falta de propostas econômicas custou à agremiação uma eleição no Estado de Bihar.
Isso indica que a Índia dificilmente degenerará de uma hora para a outra numa autocracia ao estilo turco. Mesmo assim, muitos indianos de orientação secular e progressista estão apreensivos. Acredita-se que a polícia favoreça o BJP. No mês passado, um repórter foi detido sob a acusação de ter cometido o “crime” de filmar uma multidão que protestava em frente a um banco, em Déli. Segundo o jornalista, os policiais ameaçaram agredi-lo e disseram: “Quem deu permissão para você filmar? Nosso governo mudou. Você não pode mais sair por aí tirando fotos a torto e a direito”.
Mais uma vez, nações. Indagar sobre as raízes do nacionalismo é como perguntar às pessoas por que elas amam suas famílias e têm medo de gente estranha. Os estudiosos dizem que a ideia de nação se constrói a partir de elementos como língua, história, cultura, território e política, mas ninguém é capaz de identificar uma causa única. Seria mais apropriado indagar o que faz com que o nacionalismo cívico dê lugar à versão mais intolerante e excludente do fenômeno. Há várias hipóteses.
Em países ricos, o pessimismo é importante. Os dados mostram que a desaceleração do crescimento econômico reduz o apoio à globalização. A desigualdade também é um fator a ser levado em conta. Os indivíduos com nível educacional mais alto vêm se saindo bem, mas os trabalhadores menos qualificados passam, de modo geral, por maus bocados. O desempenho de Trump foi particularmente bom entre os eleitores brancos de pouca qualificação profissional. Uma das variáveis mais fortemente associadas ao apoio ao Brexit e a Le Pen é a opinião de que as coisas eram melhores no passado.
Nos países em desenvolvimento, o crescimento tende a ser mais acelerado, e o apoio à globalização, mais sólido. Mas as pessoas sofrem com problemas que vão da corrupção generalizada à poluição do ar. Para autocratas como Sisi e Putin, o nacionalismo é uma forma fácil e barata de gerar entusiasmo pelo Estado e se esquivar de responsabilidade pelas coisas que estão erradas.
Por trás do novo nacionalismo também há fatores culturais. No Ocidente, é grande o número de pessoas, em particular entre os indivíduos de mais idade, que sentem nostalgia pelo país em que nasceram e se criaram. As levas de imigrantes que tornaram a Europa mais muçulmana e os EUA menos brancos e protestantes geram desconforto, coisa que tende a ser desqualificada como simples racismo.
A elite progressista dá valor a duas fontes de identidade: ser um bom cidadão global (que se preocupa com as mudanças climáticas e com o uso de trabalho escravo em Bangladesh, por exemplo) e criar vínculos identitários com grupos que não têm nada a ver com a ideia de nação (hispânicos, gays, budistas, etc). Pertencer a certos grupos de identidade pode resultar em benefícios materiais e psicológicos. As políticas de ação afirmativa, como as adotadas nos EUA, conferem aos integrantes mais ricos dos grupos raciais que elas priorizam vantagens inacessíveis para os membros mais pobres dos grupos que escapam a seu raio de ação.
Os nacionalistas rejeitam a “balcanização” de seus países, em particular quando os grupos de identidade são bem vistos apenas na medida em que destoam da história até então dominante no país. Os americanos brancos começam a agir como se fossem, eles próprios, um grupo de pressão minoritário.
Por fim, algumas ferramentas de comunicação aceleraram a propagação do novo nacionalismo. O Facebook e o Twitter permitem que as pessoas contornem o filtro cosmopolitano da mídia tradicional, estabelecendo diálogos diretos entre si, compartilhando notícias, organizando manifestações. As mensagens postadas por Trump no Twitter durante a campanha eleitoral atingiam milhões de pessoas.
Para os “cidadãos de lugar nenhum” de Theresa May tudo isso é profundamente perturbador. Mas eles não devem se desesperar. As mídias sociais também estão à disposição dos progressistas. A popularidade dos demagogos despenca quando suas propostas não conseguem gerar prosperidade. E as tendências demográficas favorecem o pluralismo.
Em muitos países, é cada vez maior o contingente de indivíduos com ensino superior, que revelam tendência majoritariamente cosmopolita. No pós-guerra, cerca de 5% dos britânicos adultos frequentavam a universidade. Atualmente, mais de 40% dos jovens que concluem o ensino médio dão continuidade a seus estudos. Em 2005, havia na Alemanha 2 milhões de estudantes matriculados na educação superior. Dez anos depois, eram 2,8 milhões. Nos EUA, a proporção de indivíduos que têm entre 18 e 24 anos e frequentam a universidade subiu de 26%, em 1970, para 40%, em 2014.
Além disso, a imigração, que contribuiu tanto para fomentar o nacionalismo étnico, pode também concorrer para diminuir sua influência à medida em que, com o nascimento de novas gerações, as sociedades forem se tornando mais diversificadas. Entre 2000 e 2010, o número de americanos nascidos no exterior aumentou quase 10 milhões, chegando a 40 milhões. No Reino Unido, entre 2001 e 2011, o aumento foi de 2,9 milhões, totalizando 7,5 milhões de britânicos nascidos em outros países. Os eleitores ocidentais que têm 60 anos ou mais, entre os quais o apelo do nacionalismo é particularmente forte, passaram por mudanças culturais e econômicas mais aceleradas que as experimentadas por qualquer outra geração – e parecem ter chegado a seu limite de tolerância. Há poucos jovens entre os eleitores do Ukip e da FN, o mesmo vale para o partido Alternativa para a Alemanha, outra agremiação de tendência anti-imigrante.
Mas os jovens não parecem ter tanto medo das mudanças. Apesar de só 37% dos franceses considerarem que a “globalização é boa”, essa proporção chega a 77% entre os franceses que têm entre 18 e 24 anos. Os novos nacionalistas vêm angariando apoio com a promessa de fechar fronteiras e restaurar a homogeneidade social do passado. Mas, se a próxima geração resistir, o futuro pode voltar a ser cosmopolita.
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