sábado, 18 de janeiro de 2014

Procurador-geral diz que existe 'forte indício de propina' no caso do cartel


Investigação. Afirmação de Rodrigo Janot consta de um documento enviado neste mês ao Supremo Tribunal Federal, que analisa inquérito sobre a ação combinada de empresas multinacionais para obter contratos de trens e metrô em São Paulo de 1998 a 2008

18 de janeiro de 2014 | 2h 06

FAUSTO MACEDO, FERNANDO GALLO - O Estado de S.Paulo
O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, afirmou, em um parecer enviado ao Supremo Tribunal Federal, que há "fortes indícios de existência do esquema de pagamento de propina pela multinacional alemã Siemens a agentes públicos vinculados ao Metrô de São Paulo".
A afirmação consta de documento enviado em 7 de janeiro ao ministro Marco Aurélio Mello, relator do inquérito 3815, que apura ação de cartel no setor de trens e metrô em São Paulo entre 1998 e 2008 - governos Mário Covas, Geraldo Alckmin e José Serra, todos do PSDB.
Nesse documento em que Janot faz as considerações, ele pede a Marco Aurélio que envie à Procuradoria-Geral o depoimento do ex-diretor da Siemens Everton Rheinheimer, único elemento que justifica a manutenção do caso no Supremo por citar envolvimento de quatro deputados federais, que têm foro privilegiado, com o cartel.
Em delação premiada, Rheinheimer acusa de receberem propina os hoje secretários estaduais e deputados federais licenciados Edson Aparecido (PSDB), José Aníbal (PSDB) e Rodrigo Garcia (DEM), assim como o deputado federal Arnaldo Jardim (PPS-SP).
Quando os autos foram encaminhados a Janot, para que ele desse seu parecer a respeito da manutenção ou não do caso no âmbito do Supremo, Marco Aurélio não enviou a delação. Por isso Janot escreveu a Marco Aurélio e fez as considerações a respeito da gravidade do caso. O parecer do procurador-geral da República sobre a continuidade da investigação no Supremo ainda não foi dado.
No documento em que pede o conteúdo da delação, Janot disse que precisava dela para poder opinar, uma vez que não havia como apreciar, "com a segurança devida, os elementos que supostamente indiquem a participação de detentores de prerrogativa de foro nas práticas delitivas".
Em 11 páginas, ele faz um resumo dos principais trechos do inquérito. Lista as denúncias de cartel e corrupção envolvendo a Siemens e a multinacional francesa Alstom nos setores elétrico e metroferroviário, relata as quebras de sigilo bancário e fiscal que constam do processo, os depoimentos e os bens já bloqueados.
Para fundamentar a afirmação de que "há fortes indícios de corrupção", Janot usa três dos depoimentos colhidos pela Polícia Federal. Um deles é o do ex-diretor da CPTM Benedito Dantas Chiaradia, que disse ter ouvido de pessoas do setor metroferroviário relatos de pagamento de propina a agentes públicos. Segundo Chiaradia, os relatos davam conta de que o consultor Arthur Teixeira intermediava a formação de cartéis e viabilizava a propina.
O procurador usa o relato do secretário de Transportes Metropolitanos de São Paulo, Jurandir Fernandes, titular da pasta durante parte do período do cartel, que disse ter ficado "indignado" com a descoberta de que o ex-diretor da CPTM João Roberto Zaniboni tinha dinheiro não declarado em contas bancárias na Suíça. Fernandes declarou que Teixeira é lobista do setor metroviário.
Janot destaca o depoimento do doleiro Marco Antonio Cursini, que contou ter feito diversas operações de dólar cabo para Teixeira, por meio das quais internalizava valores de contas dele na Suíça. O procurador diz que documentos da Suíça apontam o trânsito de valores por paraísos fiscais, "tudo para ocultar a origem e destino das transações financeiras ilícitas".
O ministro Marco Aurélio sempre decide pelo desmembramento dos casos com detentores de foro privilegiado. Com isso, apenas os quatro citados com foro devem continuar a ser investigados em Brasília. A investigação contra os outros citados voltaria a ser feita por São Paulo. "Tenho procedimento que é único. Na ação penal 470 (mensalão) insisti até o fim pelo desmembramento." Ele prega a publicidade. "Neste caso os autos correm na totalidade em segredo de Justiça. Não cabe o sigilo linear, mas sobre peças. O restante do inquérito deve correr com publicidade, inclusive quanto ao lançamento dos nomes dos investigados. É um erro a imprensa não ter acesso."

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