domingo, 5 de janeiro de 2014

O ETERNO RETORNO, depois de assistir ao terno "Quando Nietzsche Chorou" de Irvin D. Yalom


 

               Durante as férias eu li um livro muito interessante, de uma categoria que agora está sendo chamada de "romance de idéias", é Quando Nietzsche Chorou (de Irvin D. Yalom, editado pela Ediouro no fim do ano passado). É de uma passagem do livro e do pensamento de Nietzsche que saíram o título e o assunto nuclear deste artigo, mas antes quero falar um pouco mais sobre o livro. O romance se baseia num encontro hipotético entre o filósofo alemão e o Dr. Josef Breuer, mentor e amigo de Freud.
               Apesar de o encontro nunca ter acontecido, os personagens existiram e são retratados com a fidelidade possível neste tipo de obra (além dos dois principais, outros secundários são o próprio Sigmund Freud e Lou Salomé, que está irresistível). No entanto, para além da descrição das personalidades dos pensadores, está uma forma criativa e inteligente de mostrar um tanto do pensamento da fase inicial de Nietzsche e um pouco do método psicanalítico. A rica e, por vezes, divertida descrição das agruras matrimoniais de Breuer abre o caminho para entendermos, também, a nós mesmos e o caminho psicológico para o pensamento de Nietzsche que valem a leitura. Mas agora quero falar do tal eterno retorno.
               Devo confessar que este é um pedaço do mundo intelectual de Nietzsche que nunca me atraiu muito, não via muito sentido na coisa. Mas aí é que estava a chave que eu não via, buscar na idéia não um significado (parado), mas um sentido, uma direção! Antes, uma introdução para os que não estão familiarizados com o conceito. Para Nietzsche nossas vidas continuarão se repetindo infinitamente para todo o sempre, exatamente da mesma maneira como as estamos conduzindo agora.
               Não se preocupem com as bases da proposição, mas pensem no seguinte: será que eu quero passar a eternidade fazendo o que estou fazendo agora? Será que a decisão que estou tomando hoje merece ser tomada sempre e infinitas vezes? A chave não está na base (até certo ponto inconsistente) da afirmação, mas nas suas conseqüências: desde que aceita a idéia de que cada decisão tomada por nós vai continuar produzindo resultados, para sempre a responsabilidade por nossos atos aumenta tremendamente! Fazer um trabalho que você não gosta, com pessoas burras e num ambiente horrível, isto significa não só perder estes meses ou anos de sua vida, mas fazer esta mesma besteira para sempre. Ver um filme ótimo e que pode te ajudar a entender a si mesmo e se relacionar melhor com os outros significa que sua vida inteira vai melhorar - para sempre!
               Não se preocupem em questionar se suas vidas vão voltar, se você vai viver efetivamente esta mesma vida para sempre, mas aceitem a idéia por uma causa fundamental: minha vida é satisfatória o suficiente para eu querer viver de novo? Cada decisão vale para sempre! Não vou ter inúmeras vidas futuras para ser feliz, para fazer algo que me satisfaça e me sinta bem, para me realizar ou me tornar um ser humano melhor, para tentar viver de forma diferente e mais rica. O agora é de verdade e o futuro não vai mudar sem que eu faça algo já! Notem que o juiz não está fora. Que, ao contrário de outras fantasias em que o julgador é um terceiro, na de Nietzsche o juiz é você mesmo. É você quem deve decidir se vale a pena a sua vida ou não. É mais uma tremenda responsabilidade, mas sobre ela prefiro não falar agora. É como dizem na minha terra, assunto para mais de metro.
               Como eu disse antes, o importante não é tanto a possibilidade material de viver novamente, num futuro remoto, a mesma vida, o importante é o peso quase insuportável que isto dá às pequenas decisões do dia-a-dia. A fantasia de viver para sempre a mesma vida é um exercício que torna presente a urgência do cotidiano, pois, afinal de
contas, é nele que existimos.
© Copyright 2001 - Prof. Luis Marcello de A. Pereira - Advogado, Mestrando pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e professor de Direito Constitucional da Universidade São Marcos.


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