Dados do Ministério da Justiça apontam para o crescimento de 133%, em quatro anos, do número de detentos por delitos como corrupção ativa e passiva e peculato
04 de maio de 2013 | 22h 16
José Roberto de Toledo e Rodrigo Burgarelli - O Estado de S.Paulo
O número de detentos no sistema penitenciário brasileiro por crimes contra a administração pública, como corrupção e peculato, cresceu 133% entre dezembro de 2008 e dezembro de 2012 - sete vezes mais que o aumento da população carcerária total. Atualmente, 2.703 pessoas cumprem pena no Brasil por esses motivos, entre funcionários públicos e particulares sem ligação com o governo. Ainda assim, ocupam menos de 1% das celas do País.
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Os dados são do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), órgão do Ministério da Justiça que compila dados prisionais das 27 unidades federativas. Entre todos os crimes contra a administração pública, o que registrou maior crescimento foi o peculato - cometido por servidor que se apropria de bem público no exercício do cargo. O aumento de prisões por esse crime foi de 220% desde 2008.
Segundo o Depen, os números levam em conta apenas condenações, e não prisões temporárias. A série histórica começa em 2005, mas foi só em 2008 que os registros começaram a ser informados com detalhes pelo órgão. Antes disso, o número só havia ultrapassado a barreira dos 2 mil presos em 2007.
No ano seguinte, as prisões desabaram, mas voltaram a crescer constantemente até chegar aos atuais valores.
"É nítido que houve um aumento no número de condenações por esse tipo de crime", afirma o professor de Direito Público da Universidade de São Paulo (USP) Floriano de Azevedo Marques. Para ele, houve um aprimoramento nas técnicas de investigação e uma mudança na postura do Judiciário. "Você tem identificado mais as condutas criminosas contra a administração pública. Além disso, o Judiciário passou a ser mais rigoroso contra esses delitos."
Cerco. Dados de outros órgãos federais reforçam a tese de aumento nas punições de funcionários públicos. A Controladoria-Geral da União (CGU) expulsou 564 servidores acusados de irregularidades em 2011, mais que o dobro que no início da década passada. E as prisões de servidores feitas pela Polícia Federal atingiram o auge entre 2006 e 2008, quando quase 400 pessoas por ano foram presas nas operações do órgão.
"Vários desses processos podem estar chegando agora aos tribunais superiores e rendendo condenações. O próprio Judiciário está se cobrando para que os processos não fiquem estacionados sem julgamento", afirma a coordenadora do Centro de Estudos e Pesquisas sobre Corrupção da Universidade Estadual Paulista (Unesp), Rita de Cássia Biason.
Entre as mudanças apontadas por especialistas como responsáveis pelo aumento nas punições, estão a criação de novos órgãos de controle, como a própria CGU (nascida em 2001), além de aprovação de leis mais rígidas, como a da Ficha Limpa e a da compra de votos. Além disso, há novas técnicas para descobrir crimes, como o monitoramento do patrimônio dos servidores para detectar enriquecimentos incompatíveis com a renda, adotado na cidade de São Paulo.
Para Rita, porém, o mais importante foi a criação do Conselho Nacional de Justiça, em 2004. "Uma das principais metas do CNJ determina que todos os processos de crimes contra a administração pública distribuídos antes de 2011 sejam julgados até o fim deste ano", diz. Em 2012, metade das 27 mil ações que esperavam decisões foram julgadas. "A tendência é que o número de presos aumente."
Se há avanços, também existem desafios para combater a corrupção endêmica no Brasil. "Ainda temos muito o que fazer na área das licitações, no financiamento das campanhas e no funcionamento de órgãos de controle, principalmente os Tribunais de Contas", afirma ela.
Desmonte de prefeituras é foco de apuração no Ceará
04 de maio de 2013 | 22h 29
Lauriberto Braga - Especial para o 'Estado'
FORTALEZA - O Ceará é o campeão do Brasil em processos contra maus gestores públicos. De 1,3 mil presos no Brasil por peculato - quando há desvio de verba ou bem público -, 813 são do Ceará. Além de terem sido presos, esses gestores tiveram direitos políticos cassados e foram condenados a devolver o dinheiro desviado em valores corrigidos.
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O procurador-geral de Justiça do Estado, Ricardo Machado, atribui essa posição à persistência das instituições públicas, inclusive do Ministério Público Estadual (MPE), que estão mais atentas, e às novas leis, mais rigorosas. "Direito e lei estão se concretizando", afirma.
As operações para prender maus gestores contam com o apoio da Polícia Federal, Polícia Militar e Polícia Civil do Ceará. Em prefeituras como as de Trairi, Senador Pompeu, Quixeramobim e Pacajus houve prisões de secretários a prefeitos.
‘Matriz de risco’. Para se ter ideia, dos 184 municípios cearenses, 142 constituem a chamada matriz de risco, em que os atuais gestores municipais ou não se reelegeram ou não conseguiram eleger seu sucessor.
Para o presidente do Tribunal de Contas dos Municípios (TCM), Francisco de Paula Rocha Aguiar, a maioria das condenações propostas pelo Ministério Público Estadual tem origem em denúncias de desmonte nas prefeituras. "E somos muito rigorosos com isso. Daí este destaque nacional com o número de prisões", afirma Aguiar.
Um caso exemplar foi a investigação que provocou o "escândalo dos banheiros", em que recursos estaduais destinados à construção de kits sanitários para cidades cearenses foram desviados e acabaram resultando no afastamento do então presidente do Tribunal de Contas do Estado, Teodorico Menezes. Segundo o MPE, os atos de improbidade administrativa do caso envolveram recursos da ordem de R$ 2 milhões.
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04 de maio de 2013 | 22h 34
Análise: José Roberto de Toledo
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O Ceará é a exceção: o Estado tem 9 vezes mais presos por corrupção do que seria o esperado. Apenas 3,4% dos presos no Brasil estão cumprindo pena em presídios cearenses. Mas a proporção pula para 30% quando só se levam em conta os 2.703 corruptos e corruptores presos no País.
Nenhum outro Estado brasileiro tem tantos presos por corrupção quanto o Ceará. São 820, dos quais 813 são funcionários públicos acusados de cometer peculato. O segundo colocado no ranking, São Paulo, tem 42 corruptos presos a menos, embora tenha 11 vezes mais presidiários, de modo geral, do que o Ceará.
Metade dos presos por crimes contra a administração em São Paulo não são corruptos, mas contrabandistas.
Tende ao ridículo especular que os cearenses sejam 9 vezes mais corruptos, por natureza, do que o resto do Brasil. O mais provável é que falte nos outros Estados do País a mesma disposição de combater a corrupção encarcerando os condenados por crimes contra a administração pública. Mesmo o fenômeno cearense é recente. Vem de dois anos.
Os números mostram que o combate à corrupção depende de vontade política dos governantes, da capacidade investigativa do Ministério Público e da polícia, e da disposição do Judiciário de dar celeridade ao julgamento dos casos que envolvem o interesse público.
Se o grau de corrupção no Ceará é representativo do que acontece no Brasil, pode-se estimar o que aconteceria no País se todos os Estados tivessem o mesmo empenho cearense. Para começar, haveria 9 vezes mais presos por corrupção no Brasil, ou 21,5 mil a mais do que existem hoje nas cadeias, presídios e penitenciárias. No entanto, alguns Estados teriam que apenar mais do que outros.
O Rio teria de encarcerar 11 vezes mais corruptos do que tem hoje nas cadeias. O Maranhão teria de multiplicar por 27 os presos por corrupção; a Bahia, por 52; o Rio Grande do Norte, por 105. E Sergipe teria de, para começar, prender algum. O que será mais provável? Os outros 26 Estados prenderem mais corruptos, ou o Ceará voltar ao cenário anterior a 2011?
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