quarta-feira, 25 de dezembro de 2019

Boas novas do BNDES, Mariana Piaia Abreu, FSP

Mariana Piaia Abreu
Quando se fala em alocação de recursos do BNDES em empresas de capital aberto, um dos grandes argumentos contrários é que estes poderiam ser aplicados em outras áreas prioritárias, como saúde, educação e segurança. Não venho argumentar contra essa ideia, mas sim alertar para outros efeitos deletérios de tal prática. O governo se colocando numa posição de acionista traz consigo outros reveses, com efeitos de longo prazo não facilmente percebidos.
O ano de 2019 teve o menor apoio a empresas via renda variável por parte do BNDES dos últimos 12 anos (o valor integralizado foi de R$ 170 milhões, praticamente 50% a menos do que no ano anterior). Hoje, compondo o portfólio do BNDESPar, há 30 empresas de capital aberto, no valor de R$ 114 bilhões, sendo as mais representativas a Petrobras, JBS e Vale. A boa notícia é que essa participação vem diminuindo e, segundo sinalizado pelo governo, deve ser extinta até 2020.
Logo do BNDES no Rio de Janeiro - Sergio Moraes/Reuters
A política discricionária pode ser fonte de considerável instabilidade, particularmente nos mercados financeiros. Uma série de fatores institucionais e extra-mercado podem influenciar os retornos do capital, alterando o padrão de investimento com base em modificações dos incentivos. Dentre essas influências, o comportamento dos “big players” afeta diretamente o processo de poupança e investimento, manipulando as instituições jurídicas, sociais e políticas.
A formação das expectativas acaba por ser direcionada para a determinação do que os grandes jogadores irão fazer, ao invés dos fundamentos do mercado. Para ser um “big player”, não basta apenas ser capaz de influenciar o mercado e estar imune a pressões competitivas. Um “big player” é qualquer agente que habitualmente exerce poder arbitrário para influenciar o mercado, permanecendo imune total ou amplamente à disciplina de lucros e perdas.
A Bolsa de Valores tem um importante papel agregador na coordenação das expectativas divergentes, funcionando como facilitadora da troca de conhecimento, tornando as expectativas dos indivíduos mais consistentes entre si, já que há perduráveis mudanças de capital decorrentes da constante reavaliação dos fluxos de rendimentos, gerando progresso econômico.
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A existência de um “big player” como o Estado brasileiro (fora o BNDES, há outras empresas que a União federal e Estado têm ações) distorce os mecanismos de mercado e não deixa com que uma instituição como a Bolsa de Valores desempenhe seu papel coordenador.
Como defendido por Friedrich von Hayek, Nobel de Economia em 1974, é necessária a eliminação completa dos obstáculos à evolução espontânea. 
A boa nova é que estamos no caminho!
 
Mariana Piaia Abreu é professora e pesquisadora do Centro Mackenzie de Liberdade Econômica  

Helio Beltrão Reflexões natalinas, FSP

Devemos romper o ciclo do mal em vez de retaliar a ofensas; o amor tudo suporta

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A ciência evoluiu muito nos últimos dois séculos, mas perguntas fundamentais permanecem. Como viver uma boa vida? O que é o justo? Qual é meu propósito? Como ser virtuoso? Por meio da arte, da literatura e das ciências humanas, buscamos compreender tais questões fundamentais.
A atual geração Z (nascidos entre 1995 e 2010) se ocupa principalmente da busca da verdade pessoal e comunitária.
No Brasil, a geração Z já corresponde a 20% da população. São jovens que buscam propósito, se mobilizam em causas e têm desapego material mais pronunciado que as gerações anteriores. O que importa no consumo é o acesso, e não a posse material.
Enquanto o sonho de minha geração X (nascidos entre 1965 e 1980) era seu primeiro carro, a geração Z não faz questão e prefere aplicativos de mobilidade.
A atual geração, portanto, pode apreciar aquilo que Edmund Burke denominava “imaginação moral”, uma espécie de percepção ética que nos informa sobre dignidade e virtude, tanto interior quanto em sociedade.
Essa imaginação moral é depreendida diretamente por estórias que transmitem aquilo que T. S. Eliot denominava de “coisas permanentes”. Por meio de analogias e alegorias, os grandes clássicos transmitem a lição sobre o que é ser verdadeiramente humano.
A maior estória de todos os tempos, que sobreviveu ao cruel teste de dois milênios e cativou meio mundo, é a de Jesus Cristo, cujo nascimento se celebra hoje. Há em circulação mais de 5 bilhões de exemplares da Bíblia, mais de dez vezes a circulação de “Dom Quixote”, o livro não religioso mais vendido.
Não convém descartar a totalidade dessa sabedoria preservada sob o rótulo de puro misticismo. Afinal, a Bíblia é o documento que funda os valores e concepções de moral que caracteriza a civilização mais bem-sucedida da história humana, a que chamamos de Ocidental.
A Bíblia é considerada anacrônica, pois reflete valores de outrora. Sem dúvida costumes foram alterados, mas não a natureza humana. Em todos os tempos e lugares, o ser humano elabora regras, leis e costumes. Há sempre um sistema moral, ordenando o legítimo e o ilegítimo.
A estória de Jesus vai além das regras sociais e descreve o caminho ideal para nossa jornada individual. Sua mensagem nos auxilia a alcançar algo mais precioso que a felicidade, que, em razão da natureza de nossa existência, tende a ser fugaz e momentânea.
Mais preciosa e, para muitos, inacessível é a paz interior. Esta é perturbada em razão de atitudes das quais não nos orgulhamos em seguir tomando, ou ao não sabermos lidar adequadamente com o mal dentro de nós. 
Jesus representa o Bem Absoluto, aquilo que devemos buscar ser sem jamais conseguir. É o norte de nosso propósito e potencial, e nenhuma outra autoridade além do Bem Absoluto é aceitável. Sua recomendação principal é o amor. Sua estória ensina que esta jornada depende de nossa iniciativa, de nosso livre arbítrio para errar e aprendermos a ser melhores, a lidar com nosso mal e confiar na bondade de nossos corações.
Como a geração Z percebeu, nosso propósito deve prevalecer sobre o apego por riquezas na Terra. Porém, sinalizar virtude bradando tolerância e compaixão em troca de curtidas nas redes sociais não é propriamente virtude. 
Outra lição atual é que o ato de caridade, se propagandeado, é hipócrita e nulo. Deve se dar por meio de seu próprio esforço e posses, não por recursos de terceiros direcionados por um político.
Finalmente, a lição mais revolucionária de Jesus é a de oferecer a outra face em lugar de evocar o “olho por olho, dente por dente”. Devemos romper o ciclo do mal em vez de retaliar a ofensas. O amor tudo suporta. Feliz Natal!
Helio Beltrão
Engenheiro com especialização em finanças e MBA na universidade Columbia, é presidente do instituto Mises Brasil.

Disciplina militar, Hélio Schwartsman, FSP

É especialmente na infância e na juventude que as pessoas devem ser livres para experimentar

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Antes mesmo de o programa do governo federal de militarização de escolas públicas engrenar, a moda se espalhou e fincou raízes Brasil afora. Como mostrou reportagem da Folha, só na Bahia já são 83 as instituições que adotaram esse modelo, em que a parte pedagógica da escola segue sob comando de professores, mas policiais militares aposentados recebem um ordenado complementar para cuidar das questões disciplinares.
Para mim, o tipo de disciplina imposto aos alunos, com continências, uniformes, padrões para corte de cabelo e maquiagem, além da vigilância extrema, é um cenário de pesadelo. É especialmente na infância e na juventude que as pessoas devem ser livres para experimentar. É claro que escolas precisam de um pouco de ordem para funcionar, mas não penso que seja necessário convocar militares para estabelecê-la. Um bom diretor é em tese capaz de fazê-lo.
Também me parece preocupante que muitas dessas escolas exijam que o aluno arque com o custo das fardas, quando não pedem uma contribuição voluntária às famílias. Isso, aliás, explica parte dos tão propalados efeitos acadêmicos positivos da militarização. A correlação entre renda e performance educacional é conhecida e robusta. Assim, um modo eficaz para melhorar o desempenho de uma instituição é aumentar suas mensalidades, excluindo os alunos mais pobres.
Não sou, contudo, um xiita. Não pretendo que as minhas preferências pessoais sejam universalizáveis. Quem gosta de uma educação mais rígida e vê valor no corte escovinha deve ter a opção de matricular seus filhos num colégio com essas características.
O que me incomoda é a proliferação dessas instituições, pois cada escola militarizada significa uma escola normal a menos. E sou daqueles que pensam que o ensino público básico deve ser universal, gratuito, civil, laico e, dada a impossibilidade da neutralidade, tão plural quanto possível.
Hélio Schwartsman
Jornalista, foi editor de Opinião. É autor de "Pensando Bem…".