quinta-feira, 31 de janeiro de 2019

Raul Marcelo questiona governo sobre as condições de segurança das barragens de Itupararanga e CBA

Devido às graves consequências socioambientais em decorrência do rompimento da barragem da mineradora Vale em Brumadinho (MG), o deputado estadual Raul Marcelo (PSOL) questionou, em requerimento protocolado nesta terça-feira (29), quais medidas foram tomadas nos últimos três anos tanto da Secretaria Estadual do Meio Ambiente e quanto da Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb) a fim de reduzir os riscos de acidentes com barragens.

"Infelizmente, o território do Estado de São Paulo não está imune ao risco de acidentes com barragens. Com efeito, a barragem de resíduos da Companhia Brasileira de Alumínio (CBA), situada no município de Alumínio (SP), apresentou vazamentos em 2001 e 2004", relata. "Em relação à Represa de Itupararanga, há uma barragem construída há 107 anos, que também precisa de atenção por parte dos órgãos fiscalizadores", completa.

Sobre a situação em Brumadinho, Raul Marcelo manifesta profunda indignação e dor diante deste crime que conta com proporções inestimáveis em termos de vidas humanas. "Tudo isso a pouco mais de três anos após o rompimento da barragem de Fundão em Mariana – também sob responsabilidade da  Vale – que chocou o Brasil e o mundo com seu impacto que ainda apresenta consequências às populações que vivem na bacia do rio Doce. Cobramos a reestatização da Vale, investimentos na fiscalização de barragens e indenização a famílias de Brumadinho."

De acordo com a Agência Nacional das Águas (ANA), em relatório divulgado em 2018, no intervalo de um ano, o número de barragens no Brasil com de rompimento subiu de 25 para 45. O País possui mais de 24 mil barragens identificadas para difenretes finalidades, com acúmulo de água, de rejeitos de minérios, ou industriais e para geraçaõ de energia.

No requerimento, Raul Marcelo pontua questões que precisam ser colocadas à tona: há o risco de rompimento de alguma barragem de contenção no Estado de São Paulo e qual o grau desse risco; periodicidade das vistorias realizadas pelos órgãos ambientais vinculados à Secretaria nas barragens; há algum plano estadual de prevenção e mitigação de danos socioambientais decorrentes de acidentes com barragens; as populações situadas nas proximidades recebem informações e orientações a respeito dos procedimentos adequados diante de uma situação de acidente envolvendo barragens; entre outros questionamentos que foram encaminhados ao governo paulista.

O rompimento de uma barragem da Vale em Brumadinho, na sexta-feira (25), deixou ao menos 65 mortos. Há ainda outras 279 pessoas desaparecidas. A tragédia liberou cerca de 13 milhões de m³ de rejeitos de minério de ferro da mina do Feijão no rio Paraopeba. A lama se estende por uma área de 3,6 km² e por 10 km, de forma linear.


Valdinei Queiroz
Jornalista e assessor de imprensa

A reação a desastres pela (in)ação humana, FSP

Brumadinho exige ir até as últimas consequências

Fabio Feldmann e Suely Araújo
Estamos preparados para desastres? Como avaliar, com um mínimo de serenidade, Brumadinho? Em um desastre nas usinas de Angra dos Reis, qual seria a nossa capacidade de resposta?

No caso de Brumadinho, a responsabilidade direta é de uma das maiores empresas de mineração do mundo, a Vale S.A., com participação do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) em sua composição acionária e com o antecedente de envolvimento no rompimento da barragem em Mariana.

Não se trata de uma empresa de "fundo de quintal", mas de uma importante empresa no mercado de capitais nacional e na Bolsa de Nova York, que em suas campanhas publicitárias sempre afirmou seus compromissos com a sustentabilidade.

É líquido e certo que estamos diante de um crime, com o efeito doloroso da perda de vida de centenas de pessoas. Desta vez, teremos que dar conta do acontecido até as últimas consequências. Ou seja, assegurar a apuração rígida das responsabilidades, englobando a esfera penal e encontrando soluções jurídico-institucionais para evitar procedimentos processuais que se aproveitem da lentidão do Judiciário.

A responsabilização pode atingir dirigentes e técnicos da empresa, prestadores de serviço e também alguns agentes públicos.

Devemos aprender com Mariana e caminhar para acordos judiciais que fixem de forma mais clara, desde logo, o valor indenizatório, disponibilizando os recursos necessários para fazer frente aos prejuízos impostos às vítimas. Se é complicado fazer isso em relação a danos ambientais que levam tempo para serem tecnicamente qualificados, a reparação social necessita de agilidade.
A criação da Fundação Renova é um bom exemplo, mas o modelo carece de aperfeiçoamentos em termos de permitir uma governança que envolva, desde o início, representação de todas as partes interessadas, incluindo os atingidos, e que garanta uma gestão absolutamente independente em relação às empresas mantenedoras.

Nesse quadro, é preciso questionar as propostas que vêm sendo veiculadas de flexibilização do licenciamento ambiental e de redução da participação pública nesse processo, sob o pretexto de celeridade. A análise de risco das barragens necessita ser bastante fortalecida e estar estreitamente vinculada ao licenciamento. Cumpre resolver, também, a coordenação entre o licenciamento e o controle da segurança de barragens a cargo da Agência Nacional de Mineração (ANM).

Brumadinho exige uma postura firme do governo federal e dos governos estaduais na direção de real fortalecimento das organizações governamentais responsáveis pelo licenciamento ambiental. E a fiscalização deve ser, de uma vez por todas, entendida como um requisito essencial e obrigatório à atuação estatal, sem submetê-la a qualquer discricionariedade, notadamente em termos de alocação dos recursos necessários para a sua efetivação.

O setor empresarial, por sua vez, deve incorporar a dimensão ambiental em seu modelo de negócio, entendendo que não se trata, simplesmente, de gerenciamento de externalidades, mas sim de uma visão de médio e longo prazo.

Mariana e Brumadinho representarão um ônus econômico para a Vale centenas de vezes maior do que o que teria sido gasto em alternativas tecnológicas à utilização de barragens de rejeito. Nenhuma campanha publicitária torna qualquer empresa mais sustentável, mas sim ações concretas, amplas e efetivas.

O Brasil não merece esse mar de lama.
Fabio Feldmann
Ex-deputado constituinte, deputado federal por três mandatos (1986-1998) e ex-secretário de Meio Ambiente do Estado de São Paulo (1995-1998, governo Covas)
Suely Araújo
Ex-presidente do Ibama (2016-2019, governos Temer e Bolsonaro) e doutora em ciência política (UnB)
TÓPICOS