domingo, 6 de novembro de 2011



O Tietê prateado: Despoluindo um esgoto a céu aberto

The Economist Sáb, 22/10/11 - 15h00 publicado no portal do governo sp
A transmissão de um programa de rádio brasileiro, em 1990, chamado "O Encontro das águas", fez uma comparação entre as condições do Rio Tâmisa de Londres e o Tietê de São Paulo. O Tâmisa foi revitalizado, quando Joseph Bazalgette, um engenheiro vitoriano, começou a construir canalizações que demoveram a sujeira ao longo do rio. O Tietê foi asfixiado por resíduos de 33.000 fábricas e esgotos de 13 milhões de pessoas, mais do que quatro quintos deles sem tratamento. O rio estava biologicamente morto desde Barra Bonita, a 260 quilômetros de São Paulo.

A ação ganhou apoio. Jornais e ONGs se juntaram a campanha para limpar o rio. Uma petição atraiu 1,2 milhões de assinaturas. Finalmente, em 1992, O Projeto Tietê foi lançado.

Ao contrário de outros projetos de infraestrutura no Brasil, este continuou em andamento mesmo com a hiperinflação, crises financeiras e a alternância dos chefes de governo. Empréstimos baratos ajudaram os grandes poluidores industriais a se tornarem limpos. Novas estações de tratamento de água foram construídas e redes de esgoto instaladas.

Vinte anos depois, o Tietê continua fedido e imundo ao passar com suas águas turvas por São Paulo. Mas não por muito tempo. Hoje 55% dos esgotos da cidade são tratados; em 2018, 85% deverão ser. O governador do estado, Geraldo Alckmin, está tentando mobilizar 35 municípios da bacia do Tietê para que cooperem: até 2010, Guarulhos, uma cidade satélite de 1,2 milhões de pessoas, não tratou uma gota de seu esgoto.

A poluição de São Paulo agora chega só até Salto, a 100 quilômetros de distância. Em 2018, diz Monica Porto, uma expert em qualidade da água da Universidade de São Paulo, as melhoras serão visíveis - e sentidas através do cheiro - na própria cidade.

A limpeza do Tietê é mais do que um problema habitual. São Paulo está a apenas 75 quilômetros de distância da nascente do rio, por isso há menos água para diluir o que nele se despeja. As serras bloqueiam as potenciais rotas do esgoto até o mar. A média anual de chuva é 150 cm e as tempestades de verão podem trazer 7 cm em apenas algumas horas. Ruas e calçadas impermeáveis agravam as inundações: este ano o rio já transbordou três vezes. A cidade se multiplicou em oito vezes desde 1950, e grande parte da população vive em favelas não planejadas. Algumas delas estão nas margens do rio: companhias de água muitas vezes pedem ao governo para remover pessoas que ocupam ilegalmente a área onde eles precisam trabalhar. E mesmo quando os esgotos são construídos, algumas famílias continuam desconectadas porque não são capazes ou não estão dispostas a pagar.

Mas as áreas virgens próximas à nascente do rio estão sendo transformadas no que oficialmente é considerado o maior "parque linear" do mundo, com 75 quilômetros de extensão, cheio de ciclovias para que ciclistas fiquem de olho em assentamentos ilegais. A Sabesp, uma companhia de água, está limpando 100 afluentes do rio, construindo áreas de recreação e plantando árvores ao longo das margens.

Paulistanos adoravam o rio, diz Janes Jorge, cujo livro, "Tietê - O rio que a cidade perdeu", conta a sua história. Artistas o retratavam; nadadores e remadores disputavam provas lá; famílias passavam os feriados nas ilhas e margens do rio. Hoje seria preciso ser corajoso para atravessar as marginais e tentar fazer um piquenique, ou ainda mais se arriscar a dar um mergulho. Adequar o esgoto da cidade é apenas um começo, diz Jorge: muito do que suja o Tietê é o lixo jogado na rua, além da fumaça e do óleo dos carros. "Os problemas do rio são uma expressão dos problemas da cidade - a pobreza e a degradação ambiental." Sua despoluição serve para mostrar que tudo isso pode ser lentamente superado.

quinta-feira, 3 de novembro de 2011


Lula, Dilma e o câncer

31 de outubro de 2011 | 3h 05
JOSÉ ROBERTO DE TOLEDO - O Estado de S.Paulo
O câncer tem 10% de chances contra Luiz Inácio da Silva, mas 0% contra Lula. Do ponto de vista da opinião pública, a doença tende a reforçar o mito, como o tiro no peito transformou Getúlio Vargas de suspeito em herói - com todas as simplificações que isso implica. Nunca é bom subestimar a empatia do brasileiro por quem está perdendo, mas demonstra garra para virar o jogo.
Lula intui isso ao dar transparência total à doença desde o diagnóstico. O jornal The New York Times comparou-o ao mistério com que Hugo Chávez tratou o próprio câncer no início. Mas o presidente da Venezuela ganhou popularidade desde que o tratamento o fez raspar os cabelos e tornou a doença de conhecimento público. Certamente não foi a nova aparência que fez Chávez somar pontos no eleitorado.
Nesse cenário de mitificação renovada, quais as consequências da doença de Luiz Inácio para Dilma Rousseff e para o jogo político-eleitoral? Para ensaiar uma resposta, só fazendo suposições. Mas convém calçá-las em fatos.
Como o gráfico que ilustra este texto mostra, o crescimento do consumo de massa esteve intimamente ligado à disparada de popularidade de Lula. As curvas que representam a confiança do consumidor (em cinza, medida pelo Inec da CNI) e o saldo de aprovação presidencial (em preto, medido pelo Ibope) correram paralelas, num trajeto cheio de altos e baixos, mas com coeficiente de correlação de 0,83 - num máximo de 1,0.
É uma correlação muito forte. Significa que se um dos indicadores sobe ou cai, o outro tem enormes chances de acompanhá-lo. Foi assim ao longo de todo o governo Fernando Henrique Cardoso e no primeiro mandato de Lula. Mas a partir da segunda metade do segundo mandato, a popularidade de Lula e a confiança do consumidor, embora mantivessem o mesmo rumo ladeira acima, se descolaram. A aprovação ganhou uma camada extra de cobertura.
Mitificação. Há vários nomes para esse exagero de doçura com que o eleitor avaliou o ex-presidente no último período de seu governo, um deles é mitificação: apesar dos ditos e feitos, nada de ruim cola na imagem presidencial. Foi nesse clima que Lula elegeu Dilma.
Início do conteúdo

Prefeitura cria lei de calçadas que nem os prédios públicos respeitam

Buracos e obstáculos estão entre os problemas flagrados em passeios de órgãos municipais; multas devem começar no próximo mês

31 de outubro de 2011 | 3h 03
Adriana Ferraz - O Estado de S.Paulo
Quando a nova lei das calçadas entrar em vigor, no próximo mês, a gestão Gilberto Kassab (PSD) vai ter de fazer a lição de casa, se quiser dar exemplo. Em toda a cidade, há buracos e obstáculos que dificultam a passagem na frente de escolas municipais, postos de saúde, prédios de subprefeituras e calçadões históricos, como o do Vale do Anhangabaú. Até na frente da sede da Prefeitura, uma tampa de bueiro vazada pode surpreender os pedestres, especialmente mulheres de salto alto.
Os exemplos mostram que caminhar pelas calçadas de endereços que abrigam equipamentos públicos não é tarefa fácil em São Paulo, apesar de a nova legislação ter como foco apenas imóveis particulares, que poderão ser fiscalizados até por funcionários terceirizados.
Em novembro, o morador que não consertar um buraco na frente de sua casa correrá o risco de pagar multa mínima de R$ 300.
Na última semana, a reportagem do Estado constatou que, se a lei valesse para todos, a Prefeitura teria de desembolsar uma boa quantia para seguir as regras. A calçada da Escola Municipal de Educação Infantil (Emei) Alberto de Almeida, no Cambuci, zona sul, por exemplo, oferece obstáculos às crianças que estudam no local. Canteiros de árvores a cada metro empurram o pedestre para o muro e impedem passagem de cadeirante.  
"Não dá para andar por aqui. O jeito é ir para a rua", reclama a aposentada Regina Inês Marianno, de 65 anos. Moradora da região, ela não defende a derrubada das árvores, mas pede a redução dos canteiros. "Eles são muito grandes, reduzem o espaço que temos para caminhar. A Prefeitura deveria ter vindo aqui antes de fazer essa nova lei. Não se pode exigir as coisas certas só dos moradores", diz.
A nova legislação prevê que todos os obstáculos sejam retirados das calçadas. Na lista estão incluídos ainda telefones públicos, lixeiras, bancos e caixas de correios. Outra novidade é a ampliação do espaço mínimo dedicado exclusivamente à passagem do pedestre - subiu de 0,9 m para 1,2 m. Mas no entorno do Sambódromo do Anhembi, na Marginal do Tietê, zona norte, a calçada praticamente desaparece. E, do outro lado, na Avenida Olavo Fontoura, postes colocados bem no meio do passeio fazem o pedestre andar em zigue-zague se não quiser dividir espaço com os carros. Em determinados pontos, ainda é preciso pular os buracos.
Na região central, usuários do Atendimento Médico Ambulatorial (AMA) Sé também precisavam na terça-feira desviar de seu trajeto. Na frente da unidade, duas poltronas abandonadas atrapalhavam os pedestres, que ainda precisavam superar sacos de lixo. Pela nova lei, passeios sujos serão autuados em, no mínimo, R$ 4 por m².
Remendos. O calçadão do Vale do Anhangabaú, nas proximidades do Teatro Municipal, tem remendos por toda a parte. Buracos e placas de metal tornam a passagem mais lenta. A aposentada Ruth Pereira de Campos, de 75 anos, é dona de uma banca de jornal e diz que para andar ali só com sapato adequado.
"A sola tem de ser emborrachada para não escorregar. Já caí andando pelo centro. Na minha idade, o risco é maior", diz. O filho, Runio Frank de Campos, de 52, defende a nova lei, mas diz que a população deve ter um prazo para se preparar. "Deveria haver uma campanha. A maioria das pessoas não sabe que a multa vai aumentar", afirma.
A campanha de conscientização está nos planos da Prefeitura, mas não tem data para ser iniciada. Já a aplicação da multa mais pesada -hoje a mínimo é de R$ 96,33 - será imediata.
Vistoria. A Prefeitura informou que vai vistoriar os pontos destacados pela reportagem e providenciar os devidos reparos. No caso do AMA Sé, as poltronas já haviam sido retiradas na sexta-feira. Sobre o calçadão do Anhangabaú, o Município informou que realiza obras de manutenção diárias no local.