quarta-feira, 1 de janeiro de 2025

Henri Bergson, o grande filósofo que desafiou Einstein sobre a natureza do tempo e mudou para sempre discussão sobre o tema, FSP BBC News

 

BBC NEWS BRASIL

Depois de brilhar no ensino primário, repetiu a dose no ensino médio.

No último ano, aquele adolescente se especializou em matemática e ganhou um concurso nacional, ao resolver um problema formulado, ninguém mais, ninguém menos, por Blaise Pascal (1623-1662), em uma carta escrita para Pierre de Fermat (1607-1665).

Não estamos falando de Albert Einstein (1879-1955), mas de Henri Bergson (1859-1941). Ele tinha grande talento para a matemática, mas preferiu desenvolver carreira em ciências humanas.

Henri Bergson em foto com expressão serena em close em preto e branco
Henri Bergson (1859-1941) foi um dos mais eminentes filósofos do início do século 20 - Corbis/VCG via Getty Images

Bergson se transformou em um dos filósofos mais eminentes do início do século 20. De fato, ele chegou a ser uma espécie de celebridade global.

Conta-se que uma das suas apresentações na Universidade Columbia, em Nova York (Estados Unidos), gerou tanto entusiasmo que causou o primeiro engarrafamento de trânsito na Broadway, como registra o escritor Mark Sinclair, no seu livro "Bergson".

Em 6 de abril de 1922 e em um mesmo recinto, Einstein e Bergson trocaram suas ideias —opostas— sobre o tempo.

Einstein era famoso e já havia publicado sua teoria da relatividade. Mas "Bergson tinha bons motivos para se sentir mais poderoso do que seu rival", destaca Jimena Canales em seu livro "The Physicist and the Philosopher" (o físico e o filósofo).

O pensador francês, quase 20 anos mais velho que Einstein, era renomado pela sua teoria sobre o tempo.

Canales é historiadora de ciência. Ela conta à BBC News Mundo (o serviço em espanhol da BBC) que, naquele dia, o grande físico conheceu "um homem que nunca mais iria esquecer".

O ENCONTRO

Einstein havia chegado a Paris, na França, procedente de Berlim, na Alemanha. Ele iria participar de vários eventos, incluindo o promovido pela Sociedade Francesa de Filosofia, que o convidou para expor seu ponto de vista sobre o espaço e o tempo.

Aquele dia 6 de abril foi uma "data extraordinária" para o físico, indica Canales. Ela destaca que havia motivos para que ele ficasse nervoso.

Einstein andando pela rua com casaco preto e chapéu
Einstein caminha por Berlim, na Alemanha, em 1920 - Ullstein bild via Getty Images

Depois da Primeira Guerra Mundial ( 1914-1918 ), as relações entre as comunidades científicas da Alemanha e do exterior eram quase inexistentes. E a situação sociopolítica era ainda mais delicada.

"Mas, sobretudo, estava no público de uma das suas palestras uma pessoa mais reconhecida do que ele", conta a historiadora. "Atualmente, o nome de Einstein é mais conhecido, mas, naquele momento, era o contrário."

Outro fator era o idioma. O físico falava bem francês, mas não se sentia totalmente confortável naquela língua.

Einstein falou primeiro. Bergson havia planejado não intervir, mas foi praticamente empurrado por um de seus alunos.

"Concretamente, parece-me que o problema do tempo não é o mesmo para Einstein e para Bergson", disse o filósofo francês Édouard Le Roy (1870-1954), que convidou Henri Bergson a tomar a palavra.

Bergson "respondeu com relutância", disse a historiadora. "Ele insistiu que estava ali para ouvir", como havia feito no dia anterior, na conferência que o físico havia oferecido no Collège de France.

A FRASE

Bergson estudava a teoria da relatividade há uma década. Ele estava a ponto de publicar o livro "Duração e Simultaneidade", sobre a teoria de Einstein.

Sua intervenção durou cerca de 20 minutos. O filósofo elogiou e felicitou Einstein. Sua intenção não era criticar sua teoria, nem mesmo levá-lo a debater com ele.

Henri Bergson sentado em uma mesa
Bergson ganhou o Prêmio Nobel de Literatura em 1927 - Getty Images

"Não apresento nenhuma objeção contrária à sua teoria da simultaneidade, nem contra a teoria da relatividade geral", ele disse. "O que quero expor é simplesmente isto: quando admitimos que a teoria da relatividade é uma teoria física, nem tudo é fechado."

Ou seja, para Bergson, a filosofia ainda tinha seu espaço. Mas Einstein sentenciou: "O tempo dos filósofos não existe".

"Essa frase, este momento, marcou a passagem do bastão do estudo filosófico do tempo para o estudo científico", explica Canales.

"Abriu-se uma caixa de pandora sobre a relação entre a ciência e a filosofia. Aquele dia se transformou em um debate que durou o restante do século e reflete uma das divisões mais importantes do século 20: as ciências exatas e as humanas."

A pesquisadora escreveu que "durante o encontro pessoal entre o maior filósofo e o maior físico do século 20, o público aprendeu a ser 'mais einsteiniano do que Einstein'".

QUAL A DIFERENÇA ENTRE ELES?

Mark Sinclair, professor de filosofia da Universidade Queen's de Belfast (Reino Unido) explica à BBC News Mundo as concepções de tempo de Bergson e Einstein.

"Bergson se concentrou na experiência vivida do tempo e defendeu que esta experiência não pode ser reduzida ao tempo quantificado", segundo ele, "e, portanto, ao tempo medido pelos relógios."

Ilustração de relógios no espaço
As teorias de Einstein revolucionaram nossa visão do Universo e conceitos como o tempo e o espaço - Getty Images

"Existe uma experiência puramente qualitativa e subjetiva da passagem do tempo, antes de chegarmos a quantificá-lo, mas essa é a verdade do tempo e não uma mera deformação subjetiva de um fato originalmente objetivo."

A visão do tempo de Einstein, segundo o especialista, é quase diametralmente oposta à do filósofo.

O físico considerava que a experiência da passagem do tempo é "secundária, até ilusória, e a verdade do tempo residia além da experiência individual".

"O espaço e o tempo haviam sido considerados constantes", prossegue Sinclair.

"Mas, quando se descobriu que a velocidade da luz é um constante invariável, Einstein, para assegurar a objetividade da física, estava disposto a imaginar que o tempo e o espaço não são o que nós pensávamos que fossem. Eles se 'dilatam' conforme o marco de referência de cada um e segundo a velocidade em que se viaja."

Foi assim que o físico chegou à noção de "espaço-tempo", na qual o tempo é outra dimensão do espaço.

BERGSON SOBRE O TEMPO DE EINSTEIN

O professor destaca que, para Bergson, a concepção de tempo de Einstein era apenas "uma radicalização de uma tendência de sentido comum, ao tratar do tempo como espaço".

Marcel Proust, com olhar penetrante, sentado em uma cadeira
Autor de 'Em Busca do Tempo Perdido' (Ed. Nova Fronteira, 2017), Marcel Proust (1871-1922) foi influenciado pela filosofia de Henri Bergson - Fine Art Images/Heritage Images via Getty Images

"Acreditamos que o tempo consiste em passado, presente e futuro", prossegue Sinclair, "mas, quando separamos estes três aspectos e os representamos em uma linha do tempo, na verdade, nós espacializamos o tempo. No tempo, não há linhas, para isso é preciso ter o espaço."

O tempo de Einstein, destaca Sinclair, é um tempo que não podemos vivenciar.

"Não posso experimentar a dilatação do tempo", explica ele, "só posso pressupor que o espaço e o tempo estejam se dilatando para a pessoa que se afasta de mim a milhares de quilômetros por segundo."

Para Einstein, era preciso que ele se dilatasse, pois, do contrário, "a física ficaria em um emaranhado impossível".

Já Bergson reconhecia que aquela era uma teoria interessante, mas, para ele, continuava sendo exatamente isso: uma teoria.

MAIS DO QUE UM PONTEIRO

A resposta de que o tempo é o que marca o relógio parecia para Bergson "realmente absurda e infantil, pois os relógios foram feitos para medir o tempo", segundo Canales.

Ou seja, Bergson considerava esta definição uma circularidade.

Relógio sobre tecido marrom
Para Bergson, 'o tempo é o que se faz e até o que faz com que tudo seja feito' - Getty Images

Como fazemos com qualquer outro instrumento de medição, nós "lemos" os relógios. E Bergson compreendia esta leitura de forma filosófica.

"Não era simplesmente uma agulha apontando para um número, como diz a definição de Einstein", explica a historiadora.

O pequeno ponteiro do relógio marcando o número 7 representava para Bergson "uma leitura que exigia educação e memória —recordar o que é o número 7, o que é a agulha".

Canales explica que Bergson se aprofundou nas bases filosóficas e metafísicas por trás da teoria da relatividade. Mas Einstein não queria falar dessas bases.

Para o filósofo, não seria possível ter uma sociedade baseada em "acreditar na Ciência como tal, sem um olhar crítico, histórico, social e político". Bergson escreveu que "o tempo é o que se faz, e até o que faz com que tudo seja feito".

Canales destaca que, para o pensador, o tempo dos relógios é um aspecto do tempo real e o tempo compreendido de forma mais profunda faz com que este tempo surja.

OS GÊMEOS

Em "Duração e Simultaneidade", Bergson abordou o paradoxo dos gêmeos, uma chave da teoria de Einstein.

O físico teórico Carlo Rovelli explica o paradoxo no seu livro "E Se o Tempo Não Existisse?" (Ed. 70, 2022):

"Se um dos gêmeos viajar a grande velocidade, afastando-se do outro, e depois regressar, eles terão idades diferentes quando se encontrarem: o que nunca mudou de velocidade será o mais velho."

"Foram realizados experimentos concretos (não com gêmeos, mas com relógios idênticos muito precisos, a bordo de aviões rápidos) e, todas as vezes, foi comprovado que o mundo funciona exatamente como entendeu Einstein: os dois relógios marcam horas diferentes, quando se reúnem novamente."

Inúmeros círculos um dentro do outro
'O tempo é próprio de cada objeto e depende do seu movimento', segundo o físico teórico Carlo Rovelli - Getty Images

Mas voltemos ao filósofo. Bergson defendeu no seu livro que este atraso de um relógio em relação ao outro não existia.

"Mas seu ponto era muito mais profundo que um comentário simplesmente técnico", explica Canales.

"Seu ponto era que, neste exemplo, Einstein confundia relógios com pessoas, com viajantes, e confundia o tempo marcado por um relógio com o tempo vivido e, para pensar na relação entre o tempo vivido e o tempo do relógio, seria preciso pensar na relação entre as máquinas, o material, e o ser humano, o ser vivo."

"Ao considerar que o que marca um relógio e o que vive temporalmente um ser vivente é o mesmo, Einstein caía no mesmo erro cartesiano de equiparar os seres humanos com as máquinas."

Bergson não questionou as afirmações científicas de Einstein sobre a relatividade. O que ele contestou foi a forma de interpretação do físico, segundo a pesquisadora. Ele acreditava que era "uma metafísica enxertada na ciência".

Para o filósofo, o tempo não deveria ser entendido unicamente através da ciência.

EINSTEIN SOBRE O TEMPO DE BERGSON

A posição de Einstein em relação a Bergson era que a Filosofia tinha outra visão do tempo que "por não ser objetiva, também não era real", segundo Jimena Canales. "Ela tinha a ver com as ideias e, portanto, não se limitava à realidade."

Segundo Mark Sinclair, o físico se opunha à ideia de que a filosofia tivesse direito legítimo a um tempo que só ela pudesse abordar.

"Para Einstein, o tempo do físico não é radicalmente diferente do tempo psicológico e, segundo sua explicação, a ciência pode nos informar sobre a natureza do tempo de forma muito simples."

A polêmica ocorrida no encontro de Paris e o livro de Bergson fizeram com que os seguidores de Einstein passassem a ser fortes críticos do filósofo.

Bergson sentado em cadeira em área externa
Entre os vários livros escritos por Bergson, destacam-se 'As Duas Fontes da Moral e da Religião' (Ed. 70, 2019), 'Matéria e Memória' (Ed. Martins Fontes, 2010) e 'A Evolução Criadora' (Ed. Unesp, 2010) - Corbis via Getty Images

O professor destaca que, na segunda edição de "Duração e Simultaneidade", Bergson afirmou que havia sido mal interpretado e esclareceu a questão.

Mas os questionamentos relativos ao filósofo continuaram. Estes e outros fatores fizeram sua figura começar a decair.

"De forma geral, considerava-se que Bergson havia perdido a discussão com Einstein", declarou o professor.

"Em outras palavras, considerava-se que, de alguma forma, a ciência havia triunfado sobre a filosofia. E chegou-se a pensar que, se quisermos aprender sobre a natureza do tempo, deveríamos recorrer aos físicos e não aos filósofos."

Canales garante que o que havia sido transformado em "uma espécie de concorrência entre dois titãs sobre quem tinha autoridade para falar do tempo" terminou no momento em que a ciência tomou o tema da filosofia para si.

PARADOXO PARTICULAR

Meses depois do debate, Einstein recebeu o Prêmio Nobel de Física pelo seu trabalho sobre o efeito fotoelétrico, não pela teoria da relatividade.

Na apresentação do prêmio, o presidente do Comitê do Nobel comentou: "Não é nenhum segredo que o famoso filósofo Bergson contestou esta teoria em Paris."

Quando era professora na Universidade Harvard, nos Estados Unidos, Jimena Canales escreveu "O Físico e o Filósofo". Ela achou fascinante resgatar o encontro entre os dois personagens que não conseguiram conciliar suas visões.

"Bergson continuou pensando da mesma forma e não voltou a fazer comentários públicos sobre Einstein ou sua teoria", disse a escritora. "Einstein continuou criticando Bergson em cartas que enviou a terceiros."

Albert Einstein sentado na casa dele, nos Estados Unidos
Einstein em sua casa, nos Estados Unidos - Getty Images

"Duração e Simultaneidade" se tornou uma espécie de "livro ruim" porque "a leitura comum" foi de que Bergson havia se equivocado na sua interpretação da teoria da relatividade e isso, segundo Canales, foi uma visão "simplista demais".

Aprofundar-se naquele livro foi revelador, bem como ler os escritos do físico.

"Einstein acaba lendo o livro de Bergson e escreve, no seu próprio diário de viagem, que acredita que Bergson entendeu a teoria perfeitamente bem", explica Canales.

"Como historiadora, eu me surpreendi muitíssimo ao ler a correspondência particular de Einstein, que sua descrição do tempo era muito bergsoniana. Para Einstein, frequentemente faltava o tempo e ele pensava que o tempo passava mais rápido do que ele queria."

"Fica claro que ele sentia este paradoxo de forma pessoal, muito íntima. Havia questões sobre o tempo que ele não conseguia compreender, nem explicar."

Fechamento de Carrefour do Center Norte é mostra do declínio dos hipermercados no Brasil, FSP

 Daniele Madureira

SÃO PAULO

O carrinho de supermercado parado em frente ao balcão da lanchonete Trio's Burger, às vésperas do Ano-Novo, é uma lembrança de que ali por perto já funcionou um comércio desse tipo. Outros carrinhos também permanecem parados no depósito do Empório Vignamazzi, vizinho à lanchonete, ambos situados no estacionamento do Shopping Center Norte, zona norte da capital paulista.

"O pessoal deixou para a gente", diz a funcionária do empório, que não quis se identificar.

"O pessoal", no caso, é o Carrefour, o maior grupo varejista do Brasil, que no último dia 21 fechou as portas de uma das suas lojas mais tradicionais na capital paulista, o hipermercado do Center Norte, inaugurado em 1987. A previsão era que a loja funcionasse até o dia 31 de dezembro, quando a reportagem visitou o local. Mas o ponto promoveu uma queima de estoque e encerrou as atividades dez dias antes.

"Eles fizeram promoção, venderam um monte, e fecharam. Só assim para essa loja apresentar preço bom", diz a atendente. O trabalhador do estacionamento do shopping, que também não quis dar o nome, disse que a oferta de eletroeletrônicos nos últimos dias de funcionamento do ponto compensou. A funcionária da farmácia que fica nas imediações também elogiou os preços de fim de loja. "Tinha uma air fryer por R$ 200. Mas eu estava sem dinheiro."

A imagem mostra a fachada de um shopping center com um design moderno. O edifício possui uma grande área de vidro na parte superior, permitindo a entrada de luz natural. Na parte inferior, há uma entrada principal com várias vagas de estacionamento visíveis na frente. O céu está parcialmente nublado.
Fachada do antigo hipermercado Carrefour no Shopping Center Norte, zona norte de São Paulo - Daniele Madureira/Folhapress

O fim do Carrefour Center Norte simboliza, na visão de especialistas em varejo, um ocaso do negócio de hipermercados no Brasil.

Segundo a consultoria Euromonitor International, o segmento teve queda de 25% no faturamento em 2023 em relação às vendas de 2019. No mesmo intervalo, os atacarejos saltaram 84%, para R$ 136,7 bilhões, enquanto os supermercados se fortaleceram e pequenos mercados locais —como hortifrútis e empórios— ganharam espaço.

"Nós estamos vivendo um processo de perda de relevância dos hipermercados no Brasil, que foram atropelados pelo atacarejo", diz Alberto Serrentino, sócio da Varese Retail.

Na opinião de Eugênio Foganholo, sócio da Mixxer Desenvolvimento Empresarial, são os hipermercados os que mais sofrem com a consolidação dos atacarejos. "Quando o hipermercado do Center Norte foi inaugurado, nos anos 80, época da hiperinflação, o modelo fazia sentido", diz Foganholo. "Hoje o hipermercado já não gera fluxo para o shopping."

Serrentino concorda: hoje os consumidores dão preferência aos atacarejos para o varejo alimentar, em busca de preços baixos, enquanto a compra de outras categorias, como eletro e roupas, ocorrem em lojas especializadas ou no ecommerce. "Para um shopping, não é necessário uma âncora de varejo alimentar desse tamanho. É mais interessante fatiar uma área dessa em diversas lojas, inclusive com um supermercado menor."

Foi a família fundadora do shopping, os Baumgart, que pediu o encerramento das atividades do Carrefour no Center Norte. Em nota, o grupo francês informou que o hipermercado "encerrou suas operações no dia 21 de dezembro de 2024, atendendo a um pedido da administração do empreendimento pelo imóvel."

Quanto à equipe, o Carrefour disse que, dos 168 funcionários da loja, "a maioria já foi realocada em outras unidades do grupo", e que a empresa continua "buscando espaços para o restante dos colaboradores". Conforme reportagem da Folha em dezembro, o Carrefour Brasil demitiu 2.200 funcionários às vésperas do Natal. Para fontes do setor, o movimento foi devido ao fechamento de lojas: entre janeiro e setembro de 2024, o grupo fechou 174 pontos de venda e abriu 27.

A empresa diz que os clientes da zona norte de São Paulo podem contar com outras 14 unidades do Carrefour na região e refuta a ideia de que os hipermercados estão desaparecendo. "O grupo acredita na força de todos os modelos disponíveis aos clientes –e seu poder de adaptação para atender mudanças de consumo, quando há necessidade", afirmou.

A imagem mostra a fachada de um supermercado Carrefour. A estrutura é moderna, com uma grande área envidraçada no andar superior e uma entrada ampla no térreo. Abaixo da área envidraçada, há uma faixa azul com o texto 'SEJA BEM-VINDO' em letras brancas. O céu está claro e azul ao fundo.
Fachada do antigo Carrefour Center Norte, em São Paulo. - Reproduçao Portal Vipzinho/Reproduçao Portal Vipzinho

Questionado pela reportagem, o Center Norte não respondeu o que deve fazer com a área, hoje repleta de tapumes. Há especulações sobre a criação de um espaço de lazer e até sobre a chegada de outro varejista alimentar, desta vez no formato de supermercado. "O shopping ressalta que a área já está passando por estudos e em breve trará novidades para a zona norte de São Paulo", disse, em nota.

No shopping, passam cerca de 24 mil visitantes por dia. No início de dezembro, o Center Norte anunciou uma expansão, de mais de 6 mil m² de ABL (área bruta locável), com investimentos de R$ 100 milhões e a chegada de novas bandeiras ao empreendimento, como as sofisticadas Diesel, Farm, Sephora e Zara.

Com 40 anos completados em 2024, o Shopping Center Norte faz parte da chamada "Cidade Center Norte", um complexo multiuso com empreendimentos distintos, que inclui o shopping de móveis e decorações Lar Center, o centro de exposições Expo Center Norte, o hotel Novotel e em breve o condomínio residencial Bioma.

Antes de ser Carrefour Center Norte, o hipermercado era Eldorado Center Norte, um dos oito administrados pelo empresário João Alves Veríssimo Sobrinho, que vendeu as lojas para o grupo francês em 1997. Era um do principais centros de compras da zona norte da capital e ajudou a puxar fluxo de consumidores para o shopping nos anos 1980 e 1990.

Só quem tem alma pode contar o tempo, Sergio Rodrigues, FSP

 1º.jan.2025 às 16h08

Mais um ano está começando, e de novo a maior parte da humanidade vai ignorar aquela pequena parcela de realistas desencantados —também chamados de cínicos— que aponta a arbitrariedade dos inícios e dos fins numa linha do tempo em que todos os dias são iguais.

Acontece que, nesse caso, a maioria tem razão. Quem diz que todos os dias são iguais não leva em conta a necessidade humana de contar histórias a fim de dar sentido à escala desmesurada e opressiva —numa palavra, inumana— do tempo cósmico.

Como observa o crítico Frank Kermode no livro "O Sentido de um Fim", cabe às histórias que inventamos, com seus marcos temporais atravessados de cultura, dar sentido ao intervalo entre início e fim, transformando Chrónos, o tempo infinito e amorfo dos gregos, em Kairós, o momento cheio de significado.

A imagem mostra um espetáculo de fogos de artifício iluminando o céu noturno, com explosões de cores como rosa e roxo. A cena é refletida na água, e uma grande multidão pode ser vista na praia, observando o show. Estruturas e barracas estão visíveis na parte inferior da imagem.
Queima de fogos para comemorar o Ano-Novo na praia de Copacabana, no Rio de Janeiro - Eduardo Anizelli/Folhapress

virada do ano, em que se encontram o início e o fim do giro que a Terra descreve em torno do Sol, é por isso mesmo a mais significativa das marcas que nossa espécie se acostumou a salpicar no calendário, em vermelho ou em negrito, a fim de assinalar certos dias no mar indistinto dos dias.

A palavra ano veio do latim "annus", uma das descendentes do prefixo grego "amphi", isto é, "em torno, à volta". Isso faz do ano um parente distante de outros termos em que está presente a ideia de círculo, de algo que circunda, que envolve por todos os lados —como ambiente, anfiteatro, ânus e anel, entre outros.

Essa ambivalência (mais um parente de ano) de início e fim se materializa de modo inequívoco no próprio batismo do mês que está começando. Janeiro deve seu nome ao deus romano Jano, entidade de duas caras, capaz de olhar ao mesmo tempo para o passado e para o futuro —ou para dentro e para fora, o que explica que a janela seja outra de suas filhas.

Eis por que sabemos que tem raízes profundas em nossa alma, indo muito além de modismos midiáticos, o frenesi que nessa época nos leva a passar em revista o ano que se encerra, tentando apurar seu saldo de altos e baixos, ao mesmo tempo que fazemos listas de "resoluções" bem-intencionadas —que, na maior parte das vezes, já estarão desmoralizadas antes do Carnaval.

Essa contabilidade de fatos e sonhos também deixou marcas no mundo das palavras. O sentido original do substantivo latino "calendarium" era o de livro-caixa ou inventário, registro de entradas e saídas de dinheiro ou mercadorias. Só mais tarde a palavra ganharia no próprio latim o significado que passou ao português: o de registro do tempo.

Uma das seções de maior sucesso do blog de literatura que mantive por dez anos, o Todoprosa, chamava-se "Começos inesquecíveis" e trazia grandes aberturas de romances de todos os tempos. Coisas como "Muitos anos depois, diante do pelotão de fuzilamento, o coronel Aureliano Buendía havia de recordar aquela tarde remota em que seu pai o levou para conhecer o gelo" (de "Cem Anos de Solidão", de Gabriel García Márquez).

Moviam o sucesso de público daquela seção, creio eu, duas verdades paralelas: é mais fácil começar bem do que continuar bem, mas é muito importante começar bem. Bom começo de 2025 a todos.