quarta-feira, 11 de junho de 2014

Figueiredo estava certo - PAULO FIGUEIREDO FILHO


O GLOBO - 11/06

Menos da metade das obras de infraestrutura foi entregue


É verdadeira a história que circula na internet de que o presidente João Figueiredo recusou-se a promover a candidatura do Brasil à Copa do Mundo, sob o argumento de que o país teria outras prioridades. Dissera, ao então presidente da Fifa e seu amigo, João Havelange: “Você já viu uma favela no Rio de Janeiro ou uma seca no Nordeste? Acha que eu vou gastar dinheiro com estádio de futebol?” A estimativa de Havelange era de que toda a Copa custaria estrondoso US$ 1 bilhão da época, algo como R$ 6 bilhões em valores de 2014.

Foi por uma dessas peças do destino que eu, neto do presidente que recusara a Copa mais de duas décadas antes, recebi como uma das primeiras tarefas na minha passagem pelo setor público, em 2007, a coordenação da candidatura do Estado do Rio — e, consequentemente, do Brasil — para sediar a Copa do Mundo de 2014. Acabávamos de sediar, com sucesso, os Jogos Pan-Americanos, e a Copa do Mundo no país do futebol parecia um tremendo sonho. Foi um raro momento de convergência de interesses e união de todas as esferas de governo e da CBF, que mergulharam de cabeça na candidatura, com engajamento pessoal do presidente Lula.

Lembro-me da sensação de euforia quando conquistamos o direito de sediar o evento maior do futebol. Aquela seria uma Copa diferente, prometiam. A organização alardeava que os estádios seriam integralmente custeados pela iniciativa privada, incluindo a reforma do Maracanã, orçada à época em R$ 300 milhões. O Brasil assumiu, por escrito, um compromisso de resolver gargalos antigos de infraestrutura e mobilidade e teríamos até um trem-bala ligando as duas maiores cidades do país. Haveria tempo de sobra para a preparação. Era a grande chance do Brasil. Pesquisas mostravam que mais de 90% da população apoiavam a Copa do Mundo aqui. Talvez, então, Figueiredo estivesse enganado.

Hoje, sete anos depois, às vésperas da competição, eu e boa parte do país somos forçados a reconhecer a sabedoria do meu avô. Pesquisas recentes mostram que o apoio à Copa no Brasil caiu para 52% da população. Pudera: o custo total da competição deve chegar a R$ 30 bilhões. Menos da metade das obras de infraestrutura foi entregue e os estádios viram seus custos de construção quadruplicarem em alguns dos casos mais escandalosos de superfaturamento da história da República. Por pura ganância de alguns, gastamos cerca de R$ 11 bilhões do dinheiro dos contribuintes apenas na construção das arenas da Copa.

O sonho virou pesadelo e, como Figueiredo antecipara, tantos bilhões teriam sido suficientes para custear integralmente casas populares a quase 2,5 milhões de pessoas ou sete vezes e meia o orçamento original da transposição do Rio São Francisco. Mas, em vez disso, acabaremos com estádios de futebol vazios e um gosto amargo na boca do que a Copa poderia ter sido e da chance que desperdiçamos. É, parece que Figueiredo conhecia o Brasil melhor do que ninguém.

segunda-feira, 9 de junho de 2014

EXPORTAR PELO NORTE COMEÇA A SER REALIDADE


Complexo portuário no Pará impulsiona outros projetos

Renée Pereira (texto)
Sérgio Castro (fotos)
Terminal de grãos da Bunge começou a operar no fim de abril
MIRITITUBA (PA). O estrangulamento do sistema portuário das Regiões Sul e Sudeste acelerou os planos da iniciativa privada para abrir um novo corredor de exportação, mais curto e até 35% mais barato. Sonho antigo dos empresários do agronegócio, a chamada “saída pelo norte” começou a virar realidade no fim de abril, quando a americana Bunge inaugurou o complexo portuário em Miritituba e Barcarena, no Pará. Daqui para a frente, uma série de outros projetos estão programados para sair do papel.
Dados da Secretaria de Portos (SEP) mostram que há mais de R$ 5,5 bilhões de investimentos na Amazônia, entre áreas que serão arrendadas pelo governo federal e Terminais de Uso Privativo já autorizados. Há ainda uma série de projetos aguardando autorização da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) ou ainda em estudos que não estão computados nessa conta, como os projetos da Cianport, Odebrecht, Unirios e Caramuru Alimentos. “O corredor norte é a maior obra de expansão do País”, afirma o ministro de Portos, Antonio Henrique Pinheiro Silveira.
A busca por novas alternativas logística virou prioridade com a mudança geográfica do agronegócio. Com os maiores produtores de grãos instalados no norte de Mato Grosso, a saída natural eram os portos do Norte. Mas, com a falta de capacidade dos terminais, quase toda a safra era – e ainda é – escoada pelos portos do Sul e Sudeste, em especial Santos e Paranaguá (distantes 2.250 km e 2.350 km, respectivamente, de Sorriso). Cansados de conviver com congestionamentos gigantes, que todo ano se formam nas rodovias que ligam esses portos, várias empresas deram início a uma série de projetos.
Em três anos, o volume de movimentação de grãos pelo Norte deverá quadruplicar, saindo de 5 milhões de toneladas para até 20 milhões de toneladas, afirma o ministro de portos. Segundo ele, os sistema do Sul e Sudeste não vão perder carga, mas todo o acréscimo de safra será transportado pelo novo corredor, que consolida no País o conceito de intermodalidade. A rota de exportação pelo Norte interliga rodovia, rio e mar.
Miritituba e Santarenzinho, na beira do Tapajós, são os locais com maior número de projetos, afirma o coordenador executivo do Movimento Pró Logística, Edeon Vaz Ferreira. Segundo ele, a lista de empresas inclui Cianport, Hidrovias do Brasil (do Pátria), Cargill, Unirios, Amaggi, Dreyfus, Odebrecht e Bertolini. Alguns desses investidores também apostam em terminais na ponta final.
O complexo da Cianport, empresa formada por Agrosoja e Fiagril, prevê uma estação de transbordo em Miritituba e um terminal em Santana, no Amapá. O projeto, de R$ 350 milhões, aguarda autorização da Antaq e licença de instalação para iniciar as obras, diz o diretor-presidente da companhia, Cláudio José Zancanaro. A previsão é que cada comboio de barcaças transporte 32 mil toneladas de grãos, o que representa tirar 850 caminhões das estradas. “De Miritituba, as barcaças vão percorrer 300 km pelo rio Tapajós e 550 km pelo Amazonas até Santana.”
A Hidrovias do Brasil optou pelo Porto de Vila do Conde. No momento, a empresa aguarda a assinatura do contrato com a Antaq para começar a construir o complexo, com terminais em Miritituba e Vila do Conde, em Barcarena. A frota para navegação já foi encomendada. São 140 barcaças e 5 empurradores, afirma Bruno Serapião, presidente da companhia. Segundo ele, a expectativa é que o sistema esteja pronto para entrar em operação em fevereiro de 2016. “Na primeira fase, que vai durar entre 3 e 5 anos para maturar, o complexo terá capacidade para transportar 4,4 milhões de toneladas.”

A gigante americana ADM também escolheu Barcarena para instalar seu terminal, com capacidade para 1,5 milhão de toneladas na primeira fase. O empreendimento já foi concluído e aguarda as últimas licenças para iniciar operação. Na segunda fase, prevista para 2016, o terminal poderá movimentar 6 milhões de toneladas. A multinacional disse que está finalizando um projeto na região de Miritituba para fazer o transporte pelo Rio Tapajós.
Na opinião do consultor Frederico Bussinger, diante de tanta prosperidade o País não pode cair na mesma armadilha do último ciclo de investimento da Amazônia. “É preciso ter uma visão de médio e longo prazos para incluir a população nesse desenvolvimento. Por enquanto, as cidades não participam desse avanço.”

CAMINHÕES INVADEM RUAS DE BACARENA

Falta de planejamento causa dias de caos na cidade

De um dia para o outro, a cidade de Barcarena, localizada a uma hora da capital Belém, foi invadida por centenas de caminhões graneleiros. As ruas da cidade e a estrada que cruza o município ficaram lotadas de carretas aguardando para descarregar no recém-inaugurado terminal da americana Bunge, conta o consultor do Instituto de Desenvolvimento, Logística, Transporte e Meio Ambiente (Idel), Frederico Bussinger, que estava na região para um trabalho na área. “Só no posto do entroncamento da rodovia tinha cerca de 150 carretas. Novos pátios surgiram em terrenos recém-desmatados aqui e acolá.”
O caos durou alguns dias e foi provocado pelo descasamento entre a entrada em operação do terminal em Barcarena e da Estação de Transbordo de Miritituba. Sem licença de operação (que só foi obtida em 19 de maio), o terminal não pode começar a funcionar simultaneamente ao de Barcarena. Assim, toda a carga, que iria por hidrovia, foi transportada por caminhão até a cidade, de 99 mil habitantes.
O morador de Barcarena, Benedito da Barra, diretor da Câmara de Dirigentes Lojistas de cidade (CDL), conta que, por causa do excesso de peso dos caminhões, o asfalto das ruas e das estradas ficou danificado. Segundo ele, por enquanto, os investimentos feitos no Porto de Vila do Conde e nos terminais de uso privativo não trouxeram grandes benefícios para o município, onde menos de 30% dos domicílios são abastecidos por rede de água e, em 88% deles, o esgoto não é tratado.
“Infelizmente, não vemos os benefícios desses empreendimentos. O emprego está mais difícil e o comércio piorou”, conta o morador. Ele destaca que uma empresa de alumínio, programada para se instalar em Barcarena, desistiu do investimento. “A expectativa é que geraria muitos empregos para o município. Os novos terminais exigem pessoas qualificadas, que não tem aqui.”
Para Bussinger, é preciso tomar cuidado para não criar novamente ilhas isoladas das cidades, como ocorreu no passado com o ciclo de investimentos na Amazônia. “É preciso ter uma integração entre os projetos e as cidades”, destaca o consultor.

TERRAS SOBEM DE R$ 50 MIL PARA R$ 2 MILHÕES

Corrida para construir terminais na beira do Rio Tapajós inflaciona terras

A corrida de grandes empresas para construir terminais na beira do Rio Tapajós tem inflacionado as terras em Miritituba e Santarenzinho, pertencentes à Itaituba. Ali terrenos que há dois anos eram vendidos por R$ 50 mil agora não saem por menos de R$ 2 milhões. Os números enchem os olhos de proprietários antigos da região, que compraram terras com o dinheiro do garimpo.
Maria de Lourdes da Silva, de 75 anos, tem três lotes na área onde estão sendo construídos os terminais. Com medo de ser enganada, ela não quis intermediário na venda dos terrenos. Sozinha, atravessou o Rio Tapajós de balsa para tratar da venda diretamente com os interessados. “Dizem que a minha área vale mais de R$ 1 milhão. Mas os corretores querem pagar menos.”
A relação entre proprietários e corretores tem sido difícil. Com os valores milionários, os donos das terras se recusam a pagar comissões altas. A solução tem sido fazer acordos, como fez o corretor Ivenildo Cohen Claudio Rodrigues. O dono dos lotes pediu R$ 4 milhões por 680 hectares de terra. “O que conseguisse acima disso, era meu.” Ninguém imaginava que ele conseguiria uma oferta de R$ 8 milhões. Ou seja, se o acordo for cumprido, ele se tornará o novo milionário de Itaituba, com R$ 4 milhões no bolso.
Além das área na beira do rio, terrenos mais afastados, localizados na margem da Transamazônica, também são disputados. Vislumbrando a demanda com a construção dos demais terminais, os endinheirados de Itaituba decidiram construir hotéis, estacionamentos e áreas de convivência.
O engenheiro Nilson Guerra conta que está elaborando o projeto de um complexo de estabelecimentos comerciais voltados para motoristas e visitantes da região. “Haverá um estacionamento para 800 carretas, um hotel com 150 apartamentos e uma área de convivência para os caminhoneiros, com restaurantes e banheiros.”
Esse não deve ser o único empreendimento. Há outros em estudo. O que a administração de Itaituba reclama é que toda a economia vai movimentar do outro lado do rio. Com os hotéis e restaurantes, quem for para Miritituba nem precisa atravessar o rio.

RODOVIAS PRECÁRIAS SÃO UM PROBLEMA PARA OS MOTORISTAS

Estradas sem manutenção dificultam acesso

Com a precariedade e falta de manutenção da estrada, basta um chuvisco qualquer para interromper o t
Estreia. Muitos motoristas cruzam a Transamazônica pela primeira vez
MIRITITUBA (PA). Uma ladeira de menos de 100 metros de distância virou o grande entrave a ser superado pelos caminhoneiros que chegam ao terminal da Bunge, em Miritituba (PA). Basta um chuvisco para interromper o tráfego de caminhões na BR-230, mais conhecida como Transamazônica. Ali, a poucos quilômetros do destino, as carretas bitrens, de 70 toneladas, carregadas de soja, só passam se forem rebocadas por retroescavadeiras, que ficam de plantão no local à espera de ajuda.
A rota é nova e os motoristas também. Muitos têm entre 28 e 30 anos e fazem a viagem pela primeira vez. A recente inauguração da Estação de Transbordo de Miritituba, da Bunge, atraiu vários caminhoneiros acostumados a fazer viagens menores, entre a fazenda e os pátios da ferrovia, em Rondonópolis, em Mato Grosso.

Maurivan Severiano de Almeida, de 28 anos, por exemplo, estava na sua primeira experiência pela BR-163 e Transamazônica. Ele era um dos dez motoristas que aguardavam na manhã daquela sexta-feira – quando a reportagem esteve na região – para ser rebocado pela retroescavadeira. “Não dá para arriscar. O caminhão não consegue subir esse trecho e posso provocar um acidente.” Apesar de o preço do frete ser mais vantajoso que a remuneração local, ele reclamou das condições da rodovia e da falta de infraestrutura para os motoristas.
A BR-163 é a única via de acesso entre Mato Grosso e Miritituba. Saindo de Sorriso, a maior cidade produtora de soja do Brasil, são 1.100 km de estrada. Em Mato Grosso, toda a extensão da rodovia está pavimentada, segundo informação do Ministério dos Transportes. Nos 676 km entre a divisa de Mato Grosso e Pará até Miritituba, há 184 km concluídos e 492 km em obras. A previsão é que 427 km estejam concluídos até o fim do ano e 65 km sejam finalizados em dezembro de 2015.

“Tem um monte de estrada com asfalto e um monte sem asfalto. É essa parte sem asfalto que dá uma dor de cabeça danada pra gente”, afirma Welton Soares da Silva, de 30 anos, que está na terceira viagem para Miritituba. Ele conta que, mesmo na parte pavimentada da BR-163, recém construída, há trechos delicados. Como não existe acostamento e as chuvas nessa época do ano são constantes, parte do asfalto já foi corroído. Ainda não há sinalização vertical ou horizontal, nem faixas centrais dividindo as pistas.
A pavimentação da BR está no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), e seu cronograma já foi revisto inúmeras vezes. Alguns trechos deveriam ter sido concluídos em 2010, mas continuam em obras. Para o início de operação da nova rota de transportes, algumas empresas produtoras de grãos se reuniram para recuperar o trecho sem asfalto. “Elas compraram o material e o Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes) entrou com a mão de obra”, afirma o presidente da Associação dos Produtores de Soja e Milho de Mato Grosso (Aprosoja), Ricardo Tomczwk. “Não está 100%, mas não tem atoleiro.”
Em comparação com o passado, houve melhorias indiscutíveis. A rodovia, aberta na década de 70, durante o governo militar, mais parecia uma trilha, com lamaçais intermináveis, atoleiros e pontes de madeira improvisadas com troncos de árvores. Ali, durante anos, donos de terras cobravam pedágio para carros e caminhões passarem em suas propriedades, com a justificativa de que o caminho era melhor. Na realidade, era tão ruim quanto a rodovia.
A nova geração de motoristas não chegou a viajar pela BR-163 nessa época, mas conheceu a fama negativa da estrada. Hoje, mesmo com a melhora, eles não estão contentes com o estado da rodovia nem com a falta de estrutura para comer e tomar banho. As refeições, por exemplo, são feitas na chamada “caixa” do caminhão. “Mas quando chove nem isso dá pra fazer”, diz Emerson Davi Aguiar, de 32 anos.
Nos 30 km da Transamazônica, que dão acesso a Miritituba, também há trechos com problemas. Curiosamente, eles surgem nas partes mais perigosas, nas descidas e subidas próximas de pontes, algumas de madeira. Quando são surpreendidos pelo fim do asfalto e início da rodovia de terra, molhada e lisa, muitos caminhões freiam e acabam atravessados na pista. Aí vão horas para serem removidos e a estrada fica interditada.
Enquanto o acesso terrestre ainda carece de modernização, na outra ponta, a Estação de Transbordo, nesse caso da Bunge, prima pela automatização das instalações. Os grãos são descarregados dos caminhões e armazenados em grandes silos. Mais tarde, quando for formado o comboio para o transporte via hidrovia, a soja ou o milho são transferidos para as barcaças via esteiras automatizadas que exigem pouca mão de obra.
No terminal, o controle é total. Para manter a ordem na região, os caminhões aguardam a sua vez num enorme estacionamento construído à beira da Transamazônica. Quando chega a vez, eles seguem para o terminal para descarregar – método que vem sendo testado em Santos e já funciona em Paranaguá. A dúvida é se tanta organização vai funcionar quando os demais projetos forem tirados do papel.

PRODUTORES AGUARDAM INÍCIO DE OPERAÇÃO DE TERMINAL NO MARANHÃO

Primeiro dos quatro terminais do Tegram deverá ser inaugurado entre agosto e setembro

Fora do eixo Miritituba Vila do Conde (PA) ou Santana (AP), outro empreendimento tem sido esperado com ansiedade pelos produtores do chamado Matopi (Mato Grosso, Tocantins e Piauí). Trata-se do Terminal de Grãos do Maranhão (Tegram), no Porto de Itaqui. O empreendimento, de R$ 600 milhões, está sendo tocado por um grupo de empresas que inclui Glencore, CGG Trading, Consórcio Crescimento (formado pela francesa Louis Dreyfus Commodities e a Amaggi Exportação) e NovaAgri.
O primeiro dos quatro terminais do Tegram deverá ser inaugurado entre agosto e setembro. Até o fim do ano, os outros três terminais entram em operação, sendo um por mês. Inicialmente vão movimentar 5 milhões de toneladas de grãos, podendo atingir futuramente 10 milhões de toneladas. A operação será feita por esteiras que levarão os grãos até os carregadores (shiploaders) dos navios.
“Como as condições do porto são boas, com uma profundidade de 15 metros, poderemos receber navios de 75 mil a 80 mil toneladas”, afirma o diretor de Logística da CGG Trading, Luiz Claudio Santos. Ele conta 80% dos grãos que chegarão ao terminal serão transportados pela ferrovia Norte Sul e o restante por rodovia.
Além dos investimentos no terminal, as empresas também vão gastar cerca de R$ 300 milhões para construir estruturas de armazenamento nas cidades do interior. “Com o Tegram, será possível explorar áreas que hoje estão ociosas. Há cerca de 2 milhões de hectares no Tocantins e outros 2 milhões de área de pastagem degradada que podem ser usadas para plantação de grãos.
Cabotagem. A expansão de terminais na região deve fortalecer a cabotagem no Brasil. Hoje muitos produtos feitos na Zona Franca de Manaus vão até Santa Catarina, por exemplo, de caminhão. “Estamos tentando convencer esses clientes de que a cabotagem é mais vantajosa. Temos conseguido grandes avanços”, afirma o diretor da Santos Brasil, Mauro Salgado. A empresa tem um terminal de contêineres em Vila do Conde, no Pará, desde 2008. “Vivemos o melhor momento desde que compramos o terminal. Neste ano, já crescemos entre 30% e 40% comparado ao período anterior, muito em função da cabotagem.” Mas a exportação de madeira, carnes, pescado e pimenta também reagiu e impulsionou o desempenho positivo, diz o executivo.

Tilápias ‘se mudam’ por causa da seca


MARIANA GAZZONI - ENVIADA ESPECIAL/ SANTA FÉ DO SUL (SP)
07 Junho 2014 | 14h 52

Empresas que criam peixes nos reservatórios de hidrelétricas levam viveiros para áreas mais cheias; perdas chegam a 30% da produção



SANTA FÉ DO SUL
MÁRCIO FERNANDES/ESTADÃO
Com a seca, reservatório de Ilha Solteira opera no volume mais baixo desde 1986, prejudicando produtores de tilápia na região; Santa Fé do Sul é o maior polo de produção de tilápias do país
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A Piscicultura Carbone, produtora de tilápia no reservatório da hidrelétrica de Ilha Solteira, está de mudança. A empresa deslocou 150 tanques-rede cheios de peixe lago adentro por 2 km. O trajeto teve de ser percorrido lentamente e durou cerca de cinco horas. Antes disso, mergulhadores trabalharam por dez dias para cortar os tocos que estavam no caminho e liberar a passagem para os peixes. A medida foi tomada depois que o reservatório atingiu o nível mais baixo desde 1986, provocando uma queda de cerca de 30% na produção de peixes neste ano.
 “Paguei pela concessão de uma área de 2 hectares no lago, que não vou mais usar”, lamenta o produtor Oswaldo Carbone Junior. “Tive que gastar R$ 100 mil para transferir os viveiros e começar do zero em outro local. Era isso ou parar de produzir. Essa área vai secar nos próximos meses”, diz, apontando para um lago esvaziado. 
Os peixes já estão na “casa nova”, mas a mudança ainda não acabou. Carbone ainda tem de transferir contêineres de ração e atualizar o endereço da empresa na Receita Federal para uma nova sede. O empresário teve de gastar R$ 40 mil no arrendamento de um terreno mais próximo ao novo local dos viveiros para montar a infraestrutura de suporte à produção. 
 Assim como Carbone, uma série de aquicultores donos de concessões para cultivar peixes em reservatórios de usinas estão transferindo os viveiros para áreas mais profundas. A “mudança” foi autorizada pela primeira vez pelo Ministério da Pesca e Aquicultura no fim de maio. Foi uma medida emergencial para minimizar prejuízos com a redução do volume do reservatório de Ilha Solteira, que encerrou o mês passado operando com 4,6% do volume útil para geração de energia, segundo dados do Operador Nacional do Sistema Elétrico. No lago da usina está o maior polo produtivo de tilápias do País, com produção anual de 25 mil toneladas, cerca de 10% do total nacional, segundo estimativas da ABTilápia, associação do setor.
Os prejuízos aos pescadores são mais uma dentre muitas dores de cabeça ocasionadas pela atual seca, que também encarece a produção de energia e ameaça o abastecimento de água em diversas cidades, especialmente na região Sudeste. Dos 22 maiores reservatórios de hidrelétricas, 19 tiveram queda no volume de água em maio, na comparação com o mesmo período do ano passado, e dez deles operam abaixo de 30% da capacidade (veja quadro abaixo), de acordo com dados do ONS.


 Investimento. A seca pegou os aquicultores desprevenidos e reverteu um movimento de expansão da atividade. O cultivo de peixes começou a se desenvolver de forma profissional na região há menos de dez anos e a produção de tilápia no polo de Santa Fé do Sul (SP), município vizinho a hidrelétrica de Ilha Solteira, crescia historicamente cerca de 25% ao ano.
O produtor Fabio Brandão pretendia ampliar de 90 para 240 o número de tanques de criação de tilápias em sua propriedade. Ele já tinha encomendado 80 deles quando viu o reservatório secar, a ponto de não ter espaço na água que restou nem para os tanques em operação – parte deles ficou na parte do lago que secou.
“Suspendi o projeto de ampliação e só vou colocar os tanques na água quando o reservatório subir”, disse Brandão, que estima um prejuízo de cerca de R$ 300 mil no ano com a seca. 
Brandão e os demais produtores querem uma sinalização do governo sobre qual, exatamente, é o fundo do poço em Ilha Solteira. A ABTilápia entregou na semana passada um ofício para o Ministério da Pesca pedindo informações. “Precisamos dessa resposta para saber quanto vamos produzir”, disse o produtor Tito Capobianco Junior, presidente da ABTilápia. A perspectiva na região é que o reservatório seque ainda mais, já que o período de secas vai até setembro ou outubro. 
A Cesp, dona da concessão da usina, disse, em nota, que a decisão de esvaziar mais ou menos o reservatório é do ONS, mas estima que deve chegar a níveis mais baixos até o fim do período de seca. Já o ONS informou que faz recomendação técnica sobre o volume de operação e a decisão é tomada no Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico, presidido pelo Ministério de Minas e Energia. A próxima reunião será quarta-feira.


Seca pode brecar concessões em lagos de usinas

A atual escassez de água pode fazer o governo segurar as licitações para conceder novas áreas para aquicultura em reservatórios de usinas hidrelétricas.
 
O projeto da construção de parques aquícolas nessas regiões, uma espécie de condomínio para cultivo de peixes, foi criado em 2009, mas a maioria dos contratos foi fechada a partir de 2012. Só neste ano, o governo pretendia oferecer 428 áreas em seis Estados, capazes de produzir 6 mil toneladas de pescado ao ano. “Estamos atentos a questão da seca e podemos segurar as concessões em áreas que se mostrarem inviáveis. Já fizemos isso em alguns reservatórios do complexo Furnas”, disse Maria Fernanda Nince, secretária nacional de planejamento e ordenamento da aquicultura. / M.G,