Faz tempo. Depois num baile, um rapazinho tímido e elegante foi agraciado com uma promessa maravilhosa. A mocinha que ele amava com um amor de fazer doer o coração perguntou depois de um longo e delicioso beijo: o que você quer de mim? "Queria que você gostasse de mim para sempre!", disse o moço encostando a perna no muro cúmplice do apoio que precisava para outros abraços. Selaram o juramento com um segundo e um terceiro beijo. Uma estrela cadente confirmou a eternidade da promessa.
Naqueles tempos antigos, a gente não dizia que amava. A gente dizia que gostava. O amor era uma palavra muito forte e tão removida das coisas do mundo diário que requeria controle e dava vergonha. Escrevíamos sobre o amor, mas usávamos o gostar nas nossas declarações. O amor era para os deuses, para as igrejas cheirando a vela e incenso e para as telas dos cinemas. O gostar era para aqueles rostos deliciosamente humanos, vermelhinhos de tesão e vergonha. Nas telas chatas dos cinemas, eles falavam um trivial "I love you"; nós falávamos tremendo: "Eu gosto muito de você!" Uma outra coisa: só víamos o rosto das nossas namoradas. Quando sentíamos seus corpos, era um atrapalho. A pressão dos seios, o arredondado das coxas e o sentimento do monte que margeava o vale e a fonte que desconhecíamos eram intrusos a serem imediatamente agasalhados nos abraços reveladores do maravilhoso desejo de se confundir com o outro.
É possível um amor eterno? Um amor infinito? Um gostar com perenidade inabalável pelo tempo cujo papel é desmascarar a nossa transitoriedade e a nossa finitude? Quantas vezes me fiz essa pergunta e quantas vezes eu me achei abençoado pelo amor? Um lado meu que, como dizia Shakespeare, eu não sei se é o lado que pergunta ou o que pretende ter uma resposta, diz: o amor eterno dribla a nossa mortalidade. Somos enterrados, mas o amor triunfa nos seus impulsos que tocaram os que conhecemos. Neles fica essa memória do amor que trás de volta um encontro precioso da alma com o corpo (jamais contra ele), tornando essa convivência uma bênção porque, finalmente, eles não estão mais em guerra ou negociação. No amor, um precisa do outro e um se realiza por meio do outro.
O que esperamos do amor e no amor? No amor físico há uma etiqueta e por isso ele seria, digamos, cordial na sua grata selvageria e milagrosa avidez. Todos experimentamos, como indicam os melhores pesquisadores dessa área - os grandes poetas e cantores -, uma coercitiva curiosidade própria do amor erótico. Esse amor que se prova a si mesmo na medida em que se vai realizando. Daí o sentimento que ele é, simultaneamente, céu e terra; fogo e água; pele e coração; suspiro e estertor. No amor eterno, que nada pede porque simplesmente deseja ter tudo, não há limite nem etiqueta. O outro é tudo e nele estamos perdidos com a intensidade do desejo que uma criança tem por um sorvete ou um político, por um cargo. Como regular um amor que sempre leva a perda e a resignação porque não pode se concretizar em rotinas? Pois a prova do amor não é o clímax, mas o dia a dia que transforma o beijo sequioso no beijinho suave com o qual o marido e a esposa dizem "boa noite" um para o outro. Esses beijinhos dados na porta do supermercado ou na hora de ir para o trabalho são o fim ou são a prova de um elo amoroso?
No recalque do amor pelos códigos morais e religiosos, há uma disputa entre o amor incondicional devido ao Criador, ao Partido ou ao Mantenedor da Vida, e o amor pronto a ser vivido na carne. Esse amor personificado em uma criatura. Dir-se-ia que a segunda forma é uma deformação da primeira, mas pode-se perfeitamente inverter o argumento. O amor a Deus é um substituto do amor sensual que estamos sempre dispostos a sentir, mas que passa muito depressa. A teoria de um amor eterno (ausente em muitas sociedades, diga-se logo) compensa essa velocidade dos encontros com o ser amado, sempre fugazes e muito breves porque o corpo limita e aprofunda aquilo que a mente estende aos céus e às estrelas.
Fly me to the moon - canta o poeta.
Leve-me para a lua e deixe-me "tocar" entre as estrelas.
Eis, na simplicidade enganadora da música popular, a fórmula que meus pais e tios usavam, quando falavam da visita a um dantesco "sétimo céu". Essa subida aos céus usando o próprio corpo e não a alma ou uma nave espacial sem morrer e, muito pelo contrário, sentindo o coração pulsar com intensidade inusitada, compete com os deveres coletivos, sobretudo com as tarefas mais duras que os cotidianos requerem. Amar ou cortar lenha? Beijar na boca ou estudar? Escrever ou sentir o corpo do outro junto ao nosso? Que relação pode haver entre prazer e dever, senão o do conflito, do recalque e do combate?
Uma última pergunta: por que raios estou eu a escrever estas mal traçadas, quando todo mundo fala de política e de economia, dizendo sempre o mesmo do mesmo? Não sei. Só sei que essas questões fazem de mim um "homem humano", como dizia Setembrini, aquele habitante de uma certa montanha mágica inventada por Thomas Mann.