Para honrar o pagamento de títulos emitidos no exterior em abril, construtora conta com o recebimento de faturas de clientes e com a liberação pelo BNDES do dinheiro de obras já executadas em Angola
Renata Agostini e Renée Pereira, O Estado de S.Paulo
09 Fevereiro 2018 | 05h00
A construtora Odebrecht tem dois meses para garantir que haverá dinheiro suficiente em caixa para pagar seus credores internacionais. Em abril, a Odebrecht Engenharia e Construção (OEC) terá de honrar o pagamento de cerca de R$ 500 milhões referentes a títulos emitidos no exterior em 2013. A intenção da empresa é cumprir o compromisso, mas a conta está apertada, segundo relataram ao ‘Estado’ duas fontes a par dos números.
O comando da companhia fia-se no recebimento de faturas de clientes importantes, esperadas para os próximos meses, para quitar a fatura. E segue tentando convencer o Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) a liberar dinheiro de obras executadas em Angola. Mas executivos do alto escalão do grupo admitem sob reserva que há preocupação e outras soluções estão sendo pensadas para garantir o pagamento caso o dinheiro dos clientes não entre no caixa até lá.
O temor é compartilhado pelas agências de risco. As três principais – Fitch, Standard & Poor’s e Moody’s – rebaixaram as notas da Odebrecht Engenharia e Construção em 2017, deixando-as mais próximas da classificação de calote. A Fitch vê riscos para a empresa nos próximos vencimentos. “O desafio para o pagamento é grande e preocupa”, diz o analista da agência Alexandre Garcia.
Segundo ele, a empresa precisa adequar a dívida à sua nova realidade – e tamanho. “A construtora não tem conseguido repor o backlog e a qualidade da carteira é ruim. Parte dos projetos não está sendo executada e não gera caixa.” Hoje, a Odebrecht tem em carteira contratos que valem cerca R$ 45 bilhões (US$ 14 bilhões pelo câmbio atual). A dívida total – incluindo os títulos emitidos no exterior – é de R$ 11 bilhões (US$ 3,3 bilhões). Em tese, a conta fecha. O problema, conforme o analista da Fitch, é o casamento entre a execução dessas obras e os vencimentos das dívidas.
Além dos R$ 500 milhões em bonds, há mais cerca de R$ 650 milhões em juros e dívidas corporativas que terão de ser quitados ao longo de 2018. Em setembro de 2017, a empresa tinha R$ 2,2 bilhões em caixa (US$ 700 milhões), valor considerado apertado pela companhia frente às dívidas a pagar e o dinheiro para tocar a operação.
Nos últimos anos a carteira de obras só encolheu e a empresa ainda teve de ajudar a controladora. O estoque de projetos caiu quase R$ 9 bilhões (US$ 2,7 bilhões) em 2018. No mesmo período, foram remetidos para a holding Odebrecht, que passa por apuros, quase R$ 1,5 bilhão (US$ 450 milhões) – dinheiro que as agências não acreditam que retornará.
Os dois movimentos são reflexo da crise enfrentada pelo grupo baiano desde que a Lava Jato descobriu sua participação em crimes, como pagamento de propina. A companhia se viu forçada a confessar que havia montado um dos maiores esquemas de corrupção empresarial já vistos. Como consequência, clientes cancelaram obras. Novos contratos rarearam.
A holding, cuja dívida total é de R$ 75 bilhões, colocou uma série de negócios à venda, mas o caixa segue apertado – algumas negociações travaram e, em outros casos, o dinheiro de transações ainda não entrou. Por isso, não há planos por ora de injetar dinheiro na construtora.
Movimentação. Fontes ligadas à empresa avaliam que o grupo Odebrecht passa agora por um novo momento de estresse financeiro. Após renegociar empréstimos de R$ 7 bilhões da Agroindustrial em 2016 e refinanciar outros R$ 15 bilhões da Odebrecht Óleo e Gás em 2017, ela agora terá de passar pelo teste com os credores internacionais da construtora – os chamados bondholders.
Se honrar o pagamento, terá mais tempo para focar no reerguimento do negócio. Há outros vencimentos nos próximos anos, mas apenas em 2025 haverá um grande, de US$ 500 milhões, segundo a empresa.
Mesmo assim, alguns grupos de credores internacionais já se movimentam. Segundo apurou o Estado, escritórios no Brasil já receberam contato nas últimas semanas de representantes desses investidores, antecipando-se a uma eventual necessidade de negociação.
A queda no valor de títulos da Odebrecht é indicativo da preocupação, destaca a agência S&P em seu último relatório. “O fraco posicionamento nos mercados de capitais, como observado em seus bonds negociados a 30-35% (valor de face) afetaram a capacidade da OEC de resistir a um evento de liquidez imprevisto sem que necessite refinanciar sua estrutura de capital”.
A determinação da construtora é pagar o que deve agora e focar no plano de engordar a carteira de projetos, a despeito do ceticismo do mercado. Estimativa da companhia feita a investidores é que, em 2018, serão adicionados mais de R$ 10 bilhões ao estoque (US$ 3,2 bilhões).
Procurada, a Odebrecht não quis conceder entrevista. Em nota, reafirmou que, em setembro de 2017, tinha US$ 700 milhões em caixa.
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