ANTONIO GONÇALVES FILHO - O Estado de S.Paulo
A teoria sem prática não existe para o casal de arquitetos Todd Williams e Billie Tsien. Eles estão juntos há 36 anos, dirigem um escritório que emprega 35 pessoas e dele nunca saiu um traço arbitrário, desses que arquitetos voluntariosos desenham no ar e depois deixam para assistentes resolver no mundo real. O maior exemplo da boa arquitetura da dupla é o recém-inaugurado museu da Fundação Barnes na Filadélfia, belo edifício que não apenas abriga uma coleção de arte inestimável (pinturas de mestres flamengos, italianos e de quase todos os impressionistas) como ilumina uma extensa área no corredor cultural ao norte da cidade. Para Todd Williams, um museu é isso, uma extensão da casa de cada um dos visitantes, cuja construção deve começar de dentro para fora - "pois é mais na área interna que externa onde se passa nossa vida".
Em maio deste ano, a Fundação Barnes abriu as portas de sua nova casa na Filadélfia, apresentando seu milionário acervo disposto de forma acessível ao público. Nesse novo edifício, o caráter íntimo das antigas galerias do museu original em Merion, na Pensilvânia, foi totalmente reproduzido. Ao mesmo tempo, a dupla fez bom uso da luz natural e vidros que deixam à vista os jardins externos. Tudo para ser fiel ao projeto educacional do velho Albert C. Barnes, químico que fez fortuna nos anos 1920 - com um remédio criado para curar doenças venéreas e prevenir cegueira infantil - adquirindo um acervo de 2.500 obras que tem gênios como Cézanne, Matisse e Picasso.
Barnes seguia os ensinamentos do filósofo John Dewey, um dos criadores da psicologia funcional que teve importante papel na reforma educacional americana. Para ele, um museu deveria ser, antes de tudo, uma instituição dedicada à difusão do conhecimento, não um depósito de obras. Todd Williams e Billie Tsien comungam desse credo, rejeitando o conceito de espetáculo que parece comandar a cabeça de Frank Gehry, arquiteto que projetou o Guggenheim de Bilbao. Williams, educadamente, diz que o respeita, mas não vê um museu como uma casa de shows. "Não é o papel dos governos cuidar dos museus no futuro e, portanto, é preciso criar condições para que essas instituições se mantenham de maneira autônoma, oferecendo serviços ao público". Isso inclui, no caso do museu Barnes, um generoso salão de café com 50 mesas, espaços para cursos, teatro e sala de concerto. "Um museu tem de ser caloroso, não um lugar frio de exposição", recomenda Williams.
Talvez sua observação tenha ressonância numa cidade onde o principal museu, que abriga o melhor acervo da América Latina, o Masp, tem um café de rodoviária com carpete vagabundo, uma rampa sebosa da gordura vinda de um restaurante no subsolo, grama crescendo solta no maior vão livre do Brasil e lixo circundando o prédio. Williams, educado, não faz comentários sobre a cidade, mas fica impressionado com a uniformizada arquitetura paulistana. "O mais incrível é que o Brasil tem uma variedade incrível de pedras". E madeiras de antigas construções que poderiam ser reutilizadas. No novo museu da Fundação Barnes, ele usou ipê. "Não consigo pensar num projeto sem desenhar tudo, do prédio aos móveis", diz Williams.
Sua mulher Billie confirma que o primeiro impulso da dupla ao aceitar um projeto é o desafio de criar prédios que sejam espaços de convivência e difusão cultural. "Fizemos poucas residências e aceitamos criar em espaços diferentes como o Museu do Folclore e o Museu de Arte do Arizona porque queremos fazer projetos íntegros, com bons propósitos, que resistam aos anos." Todd Williams acrescenta: "E que, sobretudo, não sejam gestos sem propósito, que saiam da prancheta só como desenhos bonitos ". Ter o nome em evidência não diz nada. Bom mesmo é ser respeitado, como ele.
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