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Sem apresentar resultados efetivos de melhoria nas obras, o
governo conseguiu ampliar o uso do Regime Diferenciado de Contratação para
quase todas as construções públicas do país.
Emenda incluída em uma medida provisória, que virou lei em
novembro, permitiu que prefeituras e Estados também contratem por esse regime.
O STF limitou os efeitos da lei às obras de segurança pública, mas essa medida
deverá ser revista em breve.
Criado em 2011, o RDC foi sendo ampliado aos poucos, sem
estudos mais aprofundados sobre sua efetividade.
Para o governo federal, o modelo —defendido por grandes
construtoras— acelerou licitações e obras públicas. Opositores, principalmente
empresas de projeto e pequenas e médias construtoras, dizem o oposto.
A grande polêmica do RDC é a possibilidade de a construtora
também fazer o projeto da obra, a chamada Contratação Integrada (RDC-CI),
proibida pela lei de licitações. Antes, uma empresa fazia o projeto, que é o
desenho e a forma de construir, e outra executava a obra. Só a Petrobras tinha
permissão de contratar uma só empresa para fazer todo o pacote.
Levantamento da Aneor (Associação Nacional de Empreiteiras
de Obras Públicas) nas licitações do Dnit (Departamento Nacional de
Infraestrutura de Transportes), principal contratador do RDC-CI no governo,
mostra que uma de cada três concorrências feitas seguindo esse formato no órgão
não termina.
Para o presidente da associação, José Alberto Pereira
Ribeiro, a falta de projeto na concorrência (é necessário apenas o chamado
anteprojeto) impede que as empresas saibam quanto de fato vai custar a obra e,
assim, apresentar um preço.
Nas obras da Copa, o RDC-CI não conseguiu acelerar as obras,
como o governo queria. Segundo Sérgio Magalhães, presidente do IAB (Instituto
de Arquitetos do Brasil), o RDC pode até acelerar a disputa, mas a fase de
projeto tem que ser feita, e o tempo será o mesmo.
"Para fazer uma casinha de cachorro ou uma usina
nuclear, tem que ter projeto", diz Magalhães, ao ressaltar que não há
modelo semelhante no mundo de contratação pública nessa forma.
Em trabalho ainda não concluído, o TCU indica que o RDC-CI
não ajudou a trazer melhor qualidade e efetividade para as obras públicas. O
tribunal é crítico da falta de projeto, apontando o fato como um dos motivos
para os bilionários superfaturamentos das refinarias da Petrobras.
EXEMPLO RUIM
Um exemplo de obra com RDC-CI é o VLT de Cuiabá (MT). Em
apresentação no CAU (Conselho de Arquitetura e Urbanismo), o governo de Mato
Grosso responsabilizou a falta de projeto pela desastrosa construção, que, se
ficar pronta, vai levar três vezes mais tempo e custar o dobro do previsto.
Tarcísio de Freitas, ex-diretor-geral do Dnit e hoje
consultor legislativo concursado da Câmara, diz que há exemplos bem-sucedidos
de obras do RDC-CI, como o túnel do Morro do Formigão (BR-101/SC), e
malsucedidos da lei de licitações, como o viaduto em Belo Horizonte que caiu
antes da Copa de 2014.
Para ele, os problemas nas obras licitadas nesse formato não
são decorrentes da contratação de projeto e obra juntos, mas da falta de
dinheiro e de estrutura dos órgãos públicos para fiscalizar.
OUTRO LADO
Em nota, o Ministério do Planejamento apoia o RDC dizendo
que o tempo de início da obra caiu pela metade.
"Os principais estudos demonstram que a Contratação
Integrada assegura maior integração entre projeto básico, projeto executivo e
execução de obra, garantindo maior celeridade, segurança de prazo e
custo", informa a nota, sem apresentar demonstrações de que isso ocorreu.
O debate sobre o RDC-CI se estendeu para a Câmara e o
Senado, que trabalham em dois projetos de lei para mudar a legislação de
contratação do país. A tentativa é unificar as várias leis em uma só.
No Senado, o projeto tende a limitar o RDC-CI a grandes
obras, acima de R$ 500 milhões. Na Câmara, a tentativa é por acabar com o
RDC-CI.
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