quarta-feira, 8 de junho de 2022

Prefeitos optam pela ineficiência ao não basear políticas públicas em dados, FSP

 7.jun.2022 às 12h00

SÃO PAULO

Faz sentido receitar remédio para o estômago quando o paciente está com o pé quebrado? Dar um casaco a quem tem fome? Comprar um fogão para tapar uma goteira?

Como você corrige algo se nem sabe o que há de errado?

Parece óbvio que um diagnóstico é o ponto inicial para a solução de qualquer problema. Por que, então, continuamos fazendo políticas públicas no escuro?

Já é 2022, mas o setor público ainda anda na contramão do privado, que há muito entendeu que informação e conhecimento são a chave para desenvolver soluções e aplicar recursos de forma inteligente.

Imus (Índice de Mobilidade Urbana Sustentável) foi concebido pela arquiteta Marcela da Silva Costa, em sua tese de doutorado. Da forma como foi pensado, previa 87 indicadores para medir a situação da mobilidade urbana e seu caminho até a sustentabilidade nas metrópoles do país.

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A realidade, porém, bateu à porta. As prefeituras das capitais brasileiras não têm a maior parte dos dados necessários para pôr o Imus de pé da maneira como foi idealizado, e foram necessárias adaptações para que ele pudesse chegar à versão aqui publicada, no Índice Folha de Mobilidade Urbana. Vale lembrar: estamos falando de capitais, cidades grandes, que contam com recursos.

Há itens básicos que algumas prefeituras não foram capazes de fornecer, como um mapa detalhado das linhas de ônibus e a extensão da rede. Não possuem formas de mensurar e sistematizar o cotidiano do trânsito, do transporte, das ciclovias, dos pedestres.

Os gestores até sabem que há ônibus insuficientes e demorados, mas não sabem precisar quantos mais seriam necessários nem quanto tempo um cidadão espera no ponto. Sabem que há atropelamentos, mas não põem os boletins de ocorrência no mapa para saber onde seria possível evitá-los.

Fosse só uma questão de transparência e informação à imprensa (e consequentemente aos cidadãos), talvez fosse simples resolver. O que preocupa e expõe o tamanho do problema é o fato de que as prefeituras simplesmente não produzem grande parte desses números —não fazem muita ideia do que se passa nas cidades, portanto.

Não sabem se as crianças conseguem chegar às escolas de maneira adequada ou se a mobilidade dificulta a educação, que malabarismos os idosos precisam fazer para chegar ao posto de saúde e se isso prejudica o acesso a exames e medicamentos, quanto o gasto com transporte representa na renda local e se isso é um impasse para que o desempregado procure trabalho. Enquanto não sabem, não medem e não diagnosticam, também não resolvem.

Helio Beltrão Partido Novo entra em nova fase, menos personalista, FSP

 Com a saída, na segunda-feira (6), de dissidentes que representavam metade dos membros do diretório nacional, a governança do Partido Novo inicia uma promissora superação de um período turbulento de brigas internas, principalmente entre o fundador, João Amoêdo, e os mandatários.

Os mandatários legislativos do Novo —oito deputados federais e algumas dezenas de deputados estaduais e vereadores— têm sido determinantes para imprimir viés mais liberal às políticas públicas brasileiras. Como próximo passo, o partido —que governa Minas com Romeu Zema— pretende dobrar o número de deputados federais e alcançar a cláusula de barreira nas eleições deste ano, munidos de uma nominata de 900 candidatos e pelo menos 6 candidatos a governador.

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É um considerável desafio, pois uma eleição como a de 2022 exige preparação serena e contínua durante quatro anos, o que não ocorreu em razão dos conflitos internos. A boa notícia é que agora a tranquilidade tende a ser reestabelecida e a boa governança ganhou força. A má é que houve considerável estrago na gestão anterior, que causou grande perda de filiados (de 47 mil para 30 mil), e agora falta pouco tempo para o pleito.

Filiados do Partido Novo durante ação de campanha na eleição municipal de 2020, na cidade de São Paulo - Rubens Cavallari - 27.set.2020/Folhapress

O Novo enfrenta processo similar a todo empreendimento familiar que cresce: deixar de ser uma "eupresa" —integralmente dependente de seu fundador— para se tornar uma "empresa".

Um fundador —que tem a visão, a iniciativa e a capacidade de execução para gerar lucros— costuma achar que só ele sabe o melhor para a empresa. Com o crescimento, é comum que a excessiva centralização no fundador, sua obsessão por controle e sua desconfiança em estabelecer processos eficazes impeçam a empresa de se tornar grande e acabe contribuindo com as estatísticas de falência.

Embora houvesse saído do comando formal do Novo em 2020 para se dedicar à sua pré-candidatura, Amoêdo permaneceu com sólido controle do diretório nacional e dava as cartas no partido. Mas sua pré-candidatura sofreu resistência das bases, não prosperou, e surgiu o excelente nome de Luiz Felipe d’Avila.

Para o grupo amoedista no controle, deveria haver uma visão única e purista no partido: todos deveriam praticar oposição obcecada ao governo, independentemente de a pauta em questão ser boa ou ruim para o país. Imbuído por tal missão dogmática —incompatível com o preceito fundamental do partido em defender a diminuição da intrusão estatal—, seu foco foi torcer o braço dos mandatários, procurando comandá-los centralmente, como em uma empresa centralizada que emite memorandos vinculando os funcionários da linha de frente.

Se em uma empresa tal lógica já é destrutiva, no caso de um partido é muito pior. Os dirigentes e filiados ativos são voluntários, e os mandatários são preparadíssimos, estão nas trincheiras de negociação da política e, diferentemente dos dirigentes, possuem a legitimação de centenas de milhares de votos. A participação política robusta exige saudável descentralização.

A investida não vingou, e começou então a tentativa de travar decisões e de expurgar do partido os supostamente mais desobedientes, tachados injustamente de bolsonaristas, como o governador Zema e o brilhante deputado Marcel van Hattem, entre outros.

No fundo, havia duas filosofias em conflito: a) todos no partido deveriam pensar como a liderança, ainda que a custo de permanecer um pequeno partido de nicho, e b) é fundamental permitir a pluralidade de vertentes e uma governança menos personalista e centralizada, precondição para o crescimento e para fazer cada vez mais diferença em políticas públicas.

Depois de longo conflito, que muitas vezes veio a público, a segunda visão saiu vencedora. É boa notícia para o país, e para o liberalismo.


A conta do Tribunal de Contas, Elio Gaspari, FSP

 Deve-se ao repórter Tácio Lorran a revelação de que alguns ministros do Tribunal de Contas da União custam mais com viagens e diárias do que com os salários que remuneram seu trabalho. Bruno Dantas, por exemplo, tem vencimentos de R$ 37,3 mil brutos e custou R$ 43.517 entre 25 de fevereiro e 14 de março, indo à Polônia, Arabia Saudita, Áustria e França.

Ele não é o único, nem o TCU está sozinho nessas prebendas. As viagens de instrução, bem como seminários de curta duração, geralmente coincidindo com os feriadões nacionais, ganharam até o apelido de "farofas".

Fachada da sede do TCU (Tribunal de Contas da União) - Antônio Molina - 14.abr.22/Folhapress

O TCU é encarregado de vigiar as despesas feitas com dinheiro da Viúva. Logo ele, mete-se em turismo de primeira e se explica com argumentos de segunda: "Os preparativos para a gestão brasileira exigem contato constante com instituições de outros países e, naturalmente, isso exige deslocamento de autoridades da Casa para reuniões de trabalho e compromissos de cunho científico".

Contem outra. O TCU brasileiro nada tem a aprender na Arábia Saudita ou na Polônia. O trabalho de instituições francesas e austríacas pode ser acompanhado sem a necessidade de viagens.

O ministro Vital do Rêgo custou R$ 92,7 mil entre fevereiro e maio (R$ 53,8 mil em passagens), inclusive para ir ao Congresso da Carosal. A sigla significa Caribbean Organization of Supreme Audit Institutions.

Ganha um fim de semana num carimbo ilegal quem for capaz de dizer o que as instuições caribenhas têm a ensinar, hospedando milionários e paraísos fiscais. O Congresso aconteceu em Aruba, jóia do veraneio do andar de cima. O Haiti fica no Caribe, mas ninguém vai para lá.

Nos últimos cinco meses, o ministro Bruno Dantas esteve em oito países. Admita-se que havia o que fazer no Paraguai, Uruguai, Argentina, México, Peru e Equador. Restam a Índia e o Egito, capitais às quais quase sempre se chega passando por Paris.

É comum que profissionais liberais endinheirados usem congressos e seminários em locais aprazíveis para enforcar feriados. Como eles fazem esse turismo com seus recursos, noves fora a Receita Federal, ninguém tem nada a ver com isso. O caso dos hierarcas é outro, pois usam dinheiro público, faltam ao serviço e, em alguns casos, são acompanhados por assessores.

O Tribunal de Contas da União presta inestimáveis serviços. Foi ele quem matou a maluquice do Trem Bala e quem destampou a panela das diárias dos procuradores da Operação Lava Jato. Um deles chegou a receber R$ 506 mil em diárias e R$ 186 mil em passagens. Os pagamentos eram impróprios, mas os doutores sempre poderiam dizer que estavam trabalhando em Curitiba.

Já os hierarcas do TCU, bem como os magistrados que recorrem ao mesmo expediente, raramente poderão usar o mesmo argumento. (Deixe-se de lado o fato de alguns seminários remunerarem palestras, pois esse é outro capítulo do volume dos mimos oferecidos a diversas atividades profissionais.)

Vá lá que o TCU seja independente e se chame de tribunal sem integrar o Poder Judiciário. Vá lá que seus integrantes se intitulem ministros. Mas, pelo menos, não deveria produzir contas que ofendem o bom senso dos contribuintes.