quarta-feira, 17 de abril de 2013

Produtos inspirados pela natureza dobram a cada ano no mercado


Por Karina Toledo
Agência FAPESP – A planta de lótus (Nelumbo nucifera) virou símbolo de pureza espiritual por sua capacidade de se manter impecavelmente limpa apesar do ambiente lamacento em que vive. Tal façanha pode ser explicada pela presença de nanocristais de cera na superfície de suas folhas capazes de repelir a água de maneira muito eficaz. As gotas que ali caem assumem uma forma quase perfeitamente esférica, deslizam com facilidade e levam consigo a sujeira e os microrganismos.
Tal fenômeno, batizado pelos cientistas de “efeito lótus”, serviu de inspiração para o desenvolvimento de tintas, vidros e tecidos autolimpantes, que dispensam o uso de detergentes, além de equipamentos eletrônicos à prova d’água.
Já a superfície única da pele do tubarão de galápagos (Carcharhinus galapagensis), repleta de minúsculas protuberâncias que funcionam como um repelente natural de bactérias, inspirou o desenvolvimento de biofilmes para revestir camas hospitalares, entre outras aplicações.
Esses e outros exemplos de tecnologias inspiradas pela natureza foram apresentados pela bióloga norte-americana Janine Benyus durante o Simpósio Internacional Biomimética & Ecodesign, realizado pela FAPESP e pela Natura no dia 11 de abril.
Benyus é pioneira em um campo de pesquisa emergente, a biomimética, que propõe aos cientistas usar a biodiversidade não como fonte de matéria-prima para a indústria, mas como fonte de ideias para o design e o desenvolvimento de produtos e de sistemas.
“O número de produtos inspirados pela natureza dobra a cada ano no mercado e o número de publicações científicas na área duplica a cada dois ou três anos. É um campo do conhecimento que cresce muito rapidamente”, contou Benyus.
Durante a palestra, a bióloga mostrou de que forma a biomimética pode ajudar a superar desafios globais, como garantir o acesso à água potável, à alimentação e à energia, além de reduzir as emissões de carbono. Entre os casos citados, está um dispositivo capaz de capturar a umidade do ar e usá-la para irrigar plantações de forma dez vezes mais eficiente que as redes coletoras de neblina tradicionais.
O autor original da ideia é o besouro da Namíbia (Stenocara gracilipes), morador de áreas desérticas que, durante a madrugada, coleta o sereno com a ajuda de microcanais na superfície de seu corpo feitos de materiais hidrofóbicos (como as folhas de lótus) e hidrofílicos (que, ao contrário, atraem a água). As microgotículas fluem pelos microcanais do dorso e unem-se para formar gotas grandes, que chegam até a boca do animal.
“Existem duas formas de fazer biomimética. Uma delas é partir de um desafio de design e buscar um modelo biológico capaz de realizar aquela função que você precisa. A outra é observar um fenômeno interessante do mundo natural e procurar aplicações para ele”, afirmou Benyus.
O princípio não serve apenas para o desenvolvimento de produtos. Pode inspirar, por exemplo, o planejamento de cidades sustentáveis, que funcionem como um ecossistema natural. “Ecossistemas naturais, como as florestas tropicais, são generosos. Limpam o ar, limpam a água, fertilizam o solo. Produzem serviços que beneficiam também outros habitats. É isso que as cidades deveriam fazer”, opinou.
Construir pontes
Antes de trabalhar como consultora de empresas interessadas em encontrar soluções para criar produtos sustentáveis, Benyus era escritora de livros de história natural.
“Como bióloga, eu via muitos pesquisadores estudando como as folhas fazem fotossíntese e como os ecossistemas trabalham tão bem em conjunto. Por outro lado, havia um interesse crescente das empresas por soluções mais sustentáveis. Mas os designers não enxergavam as pesquisas produzidas pelos biólogos. Era preciso construir uma ponte entre eles”, contou em entrevista à Agência FAPESP.
Há 15 anos, Benyus publicou o livro Biomimicry: Innovation Inspired by Nature, no qual reuniu diversas pesquisas sobre o tema e introduziu o termo “Biomimética”. Desde então, além de prestar consultoria empresarial, a americana oferece um serviço sem fins lucrativos para instituições acadêmicas e cursos de especialização para biólogos, químicos, engenheiros, arquitetos e demais cientistas interessados em se aprofundar no tema. Todos os serviços estão reunidos no Instituto Biomimicry 3.8.
Benyus também mantém o portal Ask Nature , que reúne um enorme banco de dados taxonômicos e permite aos pesquisadores interessados em biomimética realizar gratuitamente buscas de estratégias do mundo natural para lidar com um determinado desafio.
“Tudo que os organismos naturais fazem para saciar suas necessidades – comer, respirar, acasalar – contribui de alguma forma para a fertilidade do habitat em que vivem. Os dejetos dos animais adubam o solo, o dióxido de carbono que expiram é usado pelas plantas na fotossíntese. A vida criou um sistema generoso e essa é a razão pela qual esse material genético existe há 10 mil gerações. A única forma de garantir o futuro de nossos filhos, netos e bisnetos é cuidar do lugar em que vão viver. Tem de aprender a ser generoso. É o que a vida faz”, defendeu.
Design sustentável
Ainda durante o Simpósio Internacional Biomimética & Ecodesign, Tim McAloone, professor do Departamento de Engenharia Mecânica da Danmarks Tekniske Universitet, na Dinamarca, falou sobre outra estratégia que permite às empresas criarem processos e produtos ambientalmente adequados: o ecodesign.
“Design para o ambiente é um conceito que permeia todas as fases do ciclo de vida de um produto, desde a escolha do material, do processo de manufatura e dos meios de transporte,até a distribuição e o descarte”, explicou.
Como exemplo, citou uma cadeira de escritório desenvolvida pela empresa americana Steelcase. Com um número menor de peças e materiais diferenciados, foi possível reduzir 15% o peso de transporte e o volume, além de tornar o processo de reciclagem mais fácil e de aumentar a durabilidade.
Além de apresentar aos cientistas critérios-chave para o design sustentável, McAloone falou sobre meios para implantar essa forma de planejamento nas organizações e divulgou um guia gratuito para o desenvolvimento de produtos disponível para download no site:www.kp.mek.dtu.dk/Forskning/omraader/ecodesign/guide.aspx. 
Parceria
Na abertura do simpósio, o diretor de Ciência e Tecnologia da Natura, Vitor Fernandes, afirmou que o objetivo do evento era unir dois temas considerados pela empresa “bastante complementares”. “Queremos discutir com a comunidade científica de que forma isso pode ser aprofundado, expandido e gerar valor para a sociedade, as empresas e a ciência”, disse.
O diretor científico da FAPESP, Carlos Henrique de Brito Cruz, ressaltou que a parceria com a Natura faz parte dos esforços da FAPESP para promover a interação entre pesquisadores de instituições acadêmicas paulistas e aqueles que atuam em empresas.
“No Estado de São Paulo existe um grau de interação entre empresa e universidade comparável ao de qualquer lugar do mundo onde há boas pesquisas e boa ciência”, disse Brito Cruz.
Segundo dados da National Science Foundation, em 2010, aproximadamente 6% do dinheiro investido em pesquisa nas universidades norte-americanas veio de empresas. “Na Europa esse percentual varia entre 3% e 10%. Em universidades paulistas, como USP, Unesp e Unicamp, está entre 5% e 10%. São percentuais comparáveis em termos de volume de recursos e de quantidade de projetos”, disse Brito Cruz.
Mas, para que a parceria dê certo, ponderou o diretor científico da FAPESP, é preciso que a empresa tenha sua própria atividade de pesquisa. “Assim conseguirá perceber onde precisa de ajuda e montar uma pauta de pesquisa. A colaboração com a universidade não substitui a pesquisa interna da empresa”, destacou.
 

terça-feira, 16 de abril de 2013

Dilma quer tornar viável uso do gás natural



Presidente considera combustível produzido em terra no Brasil fonte de energia pouco competitiva e com potencial desperdiçado

16 de abril de 2013 | 2h 07
SABRINA VALLE, FERNANDA NUNES / RIO - O Estado de S.Paulo
O governo, a mando da presidente Dilma Rousseff, vai usar a rede de transmissão elétrica para suprir a carência de gasodutos no País e tornar viável o uso do gás produzido em terra no Brasil, hoje uma fonte de energia pouco competitiva e com potencial desperdiçado. A ideia, encampada pela Petrobrás, é transformar o gás em energia elétrica por meio de termoelétricas ao lado do poço de produção, usando posteriormente a rede de linhas de transmissão para escoá-la. A estratégia replicaria a nova e bem-sucedida experiência da OGX/MPX no Maranhão.
"É um modelo mais barato do que o de gasodutos. Hoje, já é uma necessidade. O gás só tem viabilidade comercial se puder ser monetizado (transformado em dinheiro)", disse o superintendente de Planejamento, Pesquisa e Estatística da Agência Nacional do Petróleo (ANP), Elias Ramos de Souza.
A diretora-geral da ANP, Magda Chambriard, disse que a agência vai mapear as linhas de transmissão do País e apresentar o estudo ao mercado antes do leilão de áreas focado na exploração de gás em terra, em outubro. Gasodutos são investimentos caros, viáveis para grandes volumes. Já as térmicas podem servir à produção em menor escala, abrindo espaço para que depois seja expandida. "Foi uma ideia da presidente Dilma", destacou Magda.
A Petrobrás montou um programa de produção de gás onshore (Prongás) com uma equipe dedicada a estudar o potencial de gás das bacias brasileiras. A presidente da estatal, Graça Foster, disse que blocos próximos à rede elétrica estão na mira.
"O objetivo desse gás em terra é para geração de energia elétrica. Acreditamos que podemos repetir um projeto, muito conhecido no mundo, de produzir o gás e transformá-lo em energia elétrica na boca do poço, injetando esses elétrons nas linhas de transmissão sem precisar de gasodutos", disse Graça, após evento sobre os planos da companhia.
Outras empresas também estudam a malha de transmissão elétrica, segundo fonte do governo. A ideia ganhou força depois que a ANP marcou para três aguardados leilões de áreas exploratórias, após cinco anos sem rodadas. O primeiro, em um mês, terá 123 blocos em terra (além de 166 áreas marítimas), parte com potencial para gás. O de outubro será focado em gás em terra. O terceiro será em novembro, o primeiro do pré-sal.
Magda não descarta que o potencial de gás ainda inexplorado no País possa superar os 50 bilhões de barris de óleo equivalente do pré-sal. Segundo a fonte do governo, a malha de gasodutos do País também será expandida, por exemplo, em Minas Gerais e no recôncavo baiano.
Hoje, apenas 16% da produção nacional de gás vêm de terra, segundo o Ministério de Minas e Energia. Dois terços da demanda total de quase 60 milhões de m³/dia de gás são consumidos pela indústria. É uma fonte usada para produção de cerâmica, vidro e outros produtos com alto consumo energético.
Outra opção para transformar o gás em negócio é a criação de consumo perto da produção, como a unidade de fertilizantes nitrogenados que a Petrobrás constrói em Três Lagoas (MS).
Gasoduto. Magda lembrou que a OGX produz na bacia do Parnaíba volume insuficiente para garantir a construção de um gasoduto. Mas, com a termoelétrica, viabilizou a produção e agora já tem condições de expandi-la.
Os números, segundo fontes, justificam o negócio. O gás natural líquido é importado a cerca de US$ 15 por milhão de BTU. Chega pelo gasoduto da Bolívia entre US$ 10 e US$ 11 por milhão de BTUs. Já a OGX vendeu para a MPX o gás entre US$ 5 e US$ 6.
O presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Maurício Tolmasquim, disse que deverá ser avaliada a proximidade da rede de transmissão e sua capacidade ociosa. "Precisa ser caso a caso. Mas sem dúvida é uma alternativa".

País poderia economizar R$ 500 mi com eólicas



Usinas paradas por falta de conexão ajudariam a manter nível de reservatórios 

Terça, 15 de Abril de 2013, 21h55
Renée Pereira e Wellington Bahnemann, de O Estado de S. Paulo
O Brasil poderia ter economizado cerca de R$ 500 milhões em 2012 se os parques eólicos construídos no Nordeste estivessem em operação. Desde meados do ano passado, novas usinas com capacidade para gerar 622 megawatts (MW) - potência suficiente para abastecer 1,1 milhão de residências durante um mês - estão paradas por falta de linha de transmissão.
Se estivessem funcionando, o País poderia poupar mais água nos reservatórios e usar menos termoelétricas a óleo combustível e diesel, caras e poluentes. Segundo cálculos da Associação Brasileira de Energia Eólica (Abeeólica), apenas em dezembro, as centrais eólicas em operação foram responsáveis por evitar outros R$ 500 milhões em Encargos por Razão de Segurança Energética (ESS) para cobrir o custo das térmicas.
Responsável pela construção das linhas de transmissão, a Companhia Hidro Elétrica do São Francisco (Chesf) argumenta que não conseguiu as licenças ambientais a tempo para tirar os projetos do papel. Resultado disso é que vários parques eólicos ficaram prontos em julho do ano passado e até agora não têm linha de transmissão para escoar a energia produzida.
Os prejuízos são enormes. Mesmo sem produzir, o contrato garante receita às geradoras. São R$ 370 milhões pagos pelo consumidor sem que um único MW seja gerado - ou seja, o consumidor paga a receita da usina parada e ainda ajuda a pagar o encargo maior pela geração térmica. A presidente da Abeeólica, Elbia Melo, alerta que neste ano outras usinas eólicas vão enfrentar o mesmo problema. Segundo ela, que lançou ontem o Boletim Anual de Geração Eólica, a expectativa é que até o fim do ano cerca de 1.300 MW de energia estejam instalados sem linha de transmissão para permitir o início de operação das usinas.
"Para o empreendedor, embora esteja recebendo, ficar parado não é bom. Além do custo alto, ele perde prazo de garantia dos equipamentos. Quando começar a operar, se o equipamento der problema, ele pode estar fora do prazo de garantia e ter mais prejuízo", afirma o presidente do conselho de administração da associação, Otávio Silveira.
Leilão. O atraso na entrega das linhas de transmissão criou ainda outros contratempos para a indústria eólica a ponto de reduzir a oferta de usinas nos leilões de 2013. O motivo é a decisão do governo de não permitir a participação dos projetos que dependem da construção de sistemas de transmissão para escoar a energia. "No ano passado, tínhamos oferta de 14 mil MW em novos projetos. Com a restrição, o volume pode cair para algo em torno de 2 mil MW", afirmou Elbia.
A executiva disse, entretanto, que há sinalização do governo de que a regra possa ser flexibilizada, desde que o próprio gerador se comprometa a realizar o investimento para a conexão da usina à rede elétrica. Há a possibilidade de que os geradores formem um "pool" para realizar os investimentos, o que reduziria os custos de conexão. "Nessa configuração, não sabemos qual seria a oferta dos leilões." Hoje, o gerador já realiza o investimento de conexão da usina eólica com a rede elétrica.
Mas o tamanho da linha de transmissão que será construída para a conexão com a subestação mais próxima será muito maior do que no passado. "O empreendedor pode ter de construir uma linha de transmissão de 100, 200 ou 300 kms."
Recentemente, o presidente da Empresa de Pesquisa Energética, Maurício Tolmasquim, reconheceu que não haveria tempo suficiente para realizar um leilão de transmissão para construir a infraestrutura para os projetos eólicos que venham a disputar o leilão de energia nova deste ano, que contratará a demanda do mercado cativo em 2016. Por essa razão que a quantidade de empreendimentos da fonte eólica deverá ser significativamente menor nos leilões deste ano. "Para o médio e longo prazo, a sinalização da EPE é de que o problema está resolvido", afirmou Elbia.