terça-feira, 30 de abril de 2024

Sem juízes, você não pode dormir em paz’, alerta Cármen Lúcia, OESP

 


“Celebridade é celebridade.” A frase é de um advogado que aguardava com celular em punho a passagem da ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF), para tentar uma selfie. Ela esteve nesta segunda-feira, 29, em um seminário sobre os 40 anos das “Diretas Já” na seccional da Ordem dos Advogados do Brasil em São Paulo (OAB-SP).

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A participação da ministra gerou mais comoção na audiência especializada do que a presença de artistas como Fafá de Belém e Christiane Torloni. Quando o painel chegou ao fim, ela foi cercada no auditório e precisou da ajuda de seguranças e funcionários da OAB para atravessar o salão. Na porta do elevador, mais pedidos de fotos. Enquanto isso, a apresentadora do evento fazia apelos, em vão, para que todos voltassem aos lugares para dar sequência ao seminário.

As cenas contrastam com episódios recentes de hostilidades aos ministros do Supremo Tribunal Federal. Cármen Lúcia foi longamente aplaudida diversas vezes ao longo de sua fala. A plateia até ficou de pé para reverenciá-la.

Com a Constituição embaixo do braço, a ministra defendeu que o movimento pelas eleições diretas provou que a sociedade brasileira é capaz de se unir em defesa da democracia.

“Nós precisamos resgatar o que nos une para ser uma democracia. Não é o que nos separa que faz um povo viver junto. Não é o que nos isola um do outro, como se fosse uma pandemia de ódios permanentes. Superada a covid-19, nós temos um ‘covódio’, que é um corona de ódio, nos corações odientos de uns contra outros. Não se faz democracia com raivas, se constrói humanidade com afetos, com o que nos aproxima, que foi o que o movimento das Diretas nos trouxe.”

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Cármen Lúcia: "Precisamos resgatar o que nos une para ser uma democracia."
Cármen Lúcia: "Precisamos resgatar o que nos une para ser uma democracia." Foto: WILTON JUNIOR

Em contraponto às críticas recentes dirigidas ao Poder Judiciário, acusado de “ativismo” e de interferência indevida no exercício do Executivo e do Legislativo, Cármen Lúcia defendeu a importância da revisão constitucional para garantir direitos fundamentais previstos na Constituição.

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“Não adianta apenas proclamar direitos, as leis não bastam. Sem juízes para fazer o que a lei tenha, você não pode dormir em paz”, disse. “Constituição não é aviso, não é proposta, não é consulta, não é sugestão. Constituição é lei. A lei fundamental.”

A ministra também lembrou os ataques à democracia, que chegaram ao auge no dia 8 de Janeiro, e afirmou que o Brasil vive “tempos de desassossego”. “Naquele tempo, duas horas mais ou menos, eles (radicais do 8/1) estilhaçaram até o elevador de aço do Supremo Tribunal Federal, do teto até o chão.”

Cármen Lúcia, que vai dirigir o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) nas eleições municipais de 2024, terminou com um alerta: “A democracia é a planta mais segura no canteiro da nossa vida, é a planta mais necessária, é o fruto da igualdade e da liberdade, mas ela é frágil. A gente tem que cuidar dela todo dia, porque erva daninha, que é a tirania, o despotismo, toda forma de ditadura, é fácil de acontecer.”

Opinião |'Dias Perfeitos': a incrível beleza das coisas simples, Marco Antonio Spinelli - OESP

 


Um crítico de cinema do Youtube cita o cineasta Alfred Hitchcock, que dizia que “O cinema é como a vida, sem as partes chatas”, uma espécie de suco dos melhores momentos, ou, pelo menos, uma seleção de aventuras e tramas sem ter que mostrar as rotinas e chatices que compõe expressiva maioria em nosso dia a dia. Até o Big Brother, que supostamente deveria filmar horas infinitas de chatices de “jogadores” igualmente chatos, faz um corte e uma seleção e, muito provavelmente, um script dessas pessoas “comuns” numa casa onde fazem alianças, fofocas e barracos ante a torcida do país inteiro. Ainda assim, eles cortam as tais das partes chatas e fazem uma seleção de brigas, transas, e corpos atléticos à beira da piscina. Dificilmente gastam cinco minutos do programa mostrando alguém fazendo a cama ou limpando o banheiro.

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O cinema dito “de Arte” mostra as partes chatas. Wim Wenders, cineasta alemão consagrado, no seu último e maravilhoso filme, “Dias Perfeitos”, é capaz de passar cinco minutos mostrando um senhor japonês arrumando sua cama, escovando os dentes, colocando a roupa de trabalho, pegando uma lata de café na máquina e guiando a sua van pelas ruas de Tóquio. Quando ele coloca suas fitas cassete no inacreditável toca-fitas de sua van, percebemos que essas músicas anos 70 vão compor a narrativa do filme. Esse senhor, nosso protagonista, limpa os banheiros públicos de Tókio, com capricho e ritmo. Esperamos que alguém diga algo, ou ele encontre a droga perdida de um traficante, ou presencie um assassinato lavando a privada, mas não. Ele cata restos de papel e limpa sujeira nas paredes. Quando um bêbado entra no banheiro, para sujar tudo o que ele limpou, ele espera pacientemente fora da cabine, para retomar a limpeza depois. Demoram onze longos minutos para alguém falar. Chega um jovem colega, Takashi, atrasado e falando sobre como o turno da manhã é horrível. Hirayama, o senhor que estamos acompanhando, não responde e não dá confiança para o rapaz falante e preguiçoso, que limpa o banheiro olhando seu celular. Esse é o choque que o filme vai propor: o velho Japão, analógico, e as novas gerações, com os (maus) hábitos ocidentais. Parece que vai descambar para uma fábula melancólica, não é? Não. O filme não vai colocar o cara em alguma cilada digital. Hirayama vai continuar analógico: seus dias, seus hábitos, são sempre os mesmos. Na hora do almoço, come um sanduíche e fotografa a mesma árvore, com a sua câmera antiga. Ele passa na loja que ainda revela e vende rolos de filme. No final do dia, vai aos mesmos restaurantes e fala com as mesmas pessoas. Compra livros num sebo, onde a senhora tenta puxar assunto com ele, sem sucesso. Na seu pequeno e arrumadíssimo apartamento, ele rega suas plantas, lê os seus livros e toca suas fitas no mesmo som antigo. E o que acontece no dia seguinte? Alguma reviravolta de tirar o fôlego? Lamento o spoiler: não. A mágica do filme é a repetição. O dia a dia repetitivo e a forma que Hirayama saboreia essa repetição. E aí é que está o ponto: o prazer de contemplar a vida correndo nas ruas de Tókio sem planos, sem expectativas, sem drama. Só um olhar japonês pode sustentar isso? Parece que Wim Wenders vai buscar no velho Japão uma espécie de antídoto para nossa doença coletiva. A doença do próprio cinema, que parece uma sobreposição de cenas e estímulos de filmes de herói que parecem, sempre, os mesmos. Wim Wenders mostra a vida com suas partes chatas. E as torna maiores do que a chatice.

Lembro de uma matéria antiga de jornal, jornal analógico, em que entrevistaram uma senhora, faxineira, que se convertera ao Budismo. Ela contou, de uma maneira emocionante, que tinha aprendido que poderia ser feliz sendo uma faxineira. Deixou os sermões que pregavam que Deus queria que ela prosperasse e deveria montar um business no final de semana para alavancar sua renda, e se rendeu à incrível beleza das coisas simples. Encontrou a sua paz entre os esfregões, como o personagem de “Dias Perfeitos”. Espero que ela não abra alguma Rede Social, onde os gurus da Teologia da Prosperidade vão tentar convencê-la que, felicidade é ter maior capacidade de consumo. Felicidade é ter mais e mais dinheiro. Tenho certeza que ela não vai limpar o banheiro olhando o celular.

Temos uma sociedade digital que busca a excitação e a novidade. A ampla maioria não vai aguentar onze minutos de “Dias Perfeitos”. Será descrito como “um filme sobre nada, onde nada acontece”. Muito pouca gente vai perceber que é essa, exatamente a graça: tudo acontece dentro do personagem e dentro de quem assiste.

Talvez a maior perda de um mundo em que tudo acontece apenas dentro de uma tela é que as pessoas perdem o caminho de seu mundo interno. Haja terapia, ou meditação, para trazê-lo de volta. O nosso analógico Mundo Interno.

Jerson Kelman - Energia solar e hídrica são complementares, FSP

 Fazenda solar evoca um lugar onde consumidores de eletricidade se consorciam para "plantar" e compartilhar placas fotovoltaicas capazes de produzir eletricidade limpa, renovável e barata. Energia que, embora gerada remotamente, goza dos benefícios da geração distribuída, originalmente concebidos para estimular a produção de energia no local do consumo.

Todos os usuários de geração distribuída, na forma local ou remota, puxam energia da rede elétrica quando necessário. A desconexão seria impossível na forma remota. Na forma local sim, seria possível. Porém, é tão caro instalar baterias para uso à noite ou num dia nublado que ninguém faz isso.

Imagem mostra uma série de placas solares em um campo aberto de terra, com a cidade ao fundo
Fazenda solar em Hortolândia (SP) que terá cerca de mil placas - Adilson Lucena e Reginaldo Prado

Anos atrás, quando os telhados com placas fotovoltaicas eram raros e caros, a Aneel adotou a regra do "net metering", que também se aplica às fazendas solares. Funciona assim: quando a placa gera mais eletricidade do que o consumo, o consumidor exporta para a rede. E vice-versa. A conta de luz considera apenas o consumo "líquido". Por exemplo, se a energia mensal importada da rede for 300 kWh e a exportada 200 kWh, o consumidor só paga 100 kWh à distribuidora. No exemplo, a redução de 2/3, que só deveria ser aplicada ao custo de geração, é na realidade aplicada a todas as parcelas que somadas resultam na "conta de luz" (geração + transmissão + distribuição + encargos + tributos).

Como o custo das instalações de transmissão e distribuição necessárias para prover o consumidor com 300 kWh (e não 100 kWh) continuam a existir, a conta de luz dos consumidores comuns, sem instalações fotovoltaicas em suas residências e sem participação em fazendas solares, é aumentada para compensar a diminuição das despesas dos que têm esses recursos. Trata-se de uma transferência de renda não apenas injusta mas também desnecessária e desproporcional.

Desnecessária porque a geração solar seria economicamente viável sem subsídio. Desproporcional porque, mesmo quando o consorciado recebe desconto de 20% na respectiva conta de luz, a parte do leão fica com o empreendedor da fazenda solar, que chega a conseguir taxa de retorno desalavancada superior a 20%.

Isso posto, é preciso não deixar que regras ruins empanem o papel virtuoso da fonte solar em nossa matriz elétrica. O contínuo barateamento das placas fotovoltaicas pode ocasionar uma superoferta de energia, mesmo sem subsídios, que torne desnecessário o uso de fontes fósseis para a produção de eletricidade, mesmo durante as secas. Ou seja, a emissão de gases de efeito estufa decorrente da produção de eletricidade, que no Brasil já é muito baixa —3% do total de emissões—, pode chegar a zero.

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Nessa hipótese, é necessário ter uma fonte flexível para complementar a geração solar. As usinas hidrelétricas são talhadas para isso, porque são aptas a sair do repouso à plena potência quase instantaneamente. Porém, mesmo que fossem corretamente remuneradas por esse serviço, e não são, haveria ainda uma dificuldade: bruscas flutuações de produção causam variações de vazões às vezes inaceitáveis para outros usuários de recursos hídricos.

Já as usinas hidrelétricas reversíveis a ciclo fechado não têm esse problema, porque dependem apenas do vaivém da água entre o reservatório superior e o inferior, como se fosse um elevador. Quando há excesso de energia solar, a água é bombeada do reservatório inferior para o superior. Ao revés, nos períodos sem insolação, a água despenca do reservatório superior para o inferior, passando por uma turbina para produzir energia.

A usina hidrelétrica reversível (UHR) La Muela, na região de Valência, Espanha
A usina hidrelétrica reversível (UHR) La Muela, na região de Valência, Espanha - Iberdrola