14/02/2017
Em 23/11/2016 o CADE homologou sete TCCs com as empresas processadoras de citros investigadas por formação de cartel em um processo iniciado em 1999. As empresas confessaram a prática de cartel e se comprometeram a cessar a prática; colaboraram com o órgão antitruste na elucidação dos fatos e vão recolher, no total, R$ 301 milhões a título de contribuição pecuniária ao Fundo de Defesa dos Direitos Difusos.
Este cartel foi denunciado pela primeira vez em 1976 e, apesar de enormes evidências de cartelização, o processo foi arquivado em 1981. Nova denúncia em 1992 foi arquivada em 1993. Em 1994, uma nova denúncia é apresentada, acrescentando à prática de cartel a verticalização da produção. A Secretaria de Direito Econômico-SDE acatou as denúncias e encaminhou ao CADE um parecer favorável à condenação das empresas, porém o CADE optou por celebrar um Termo de Compromisso de Cessação –TCC, que nunca foi cumprido.
Em setembro de 1999, chega à SDE a denúncia de cartel contra as empresas e é aberto o PA 08012.008372/99-14. Apesar dos documentos, informações e do acompanhamento constante por parte da Associtrus, poucas diligências foram realizadas. Em meados de 2003, a SDE sinalizou o interesse em formalizar o recebimento dos documentos e a realização do contrato de leniência com um ex-participante do cartel, porém a questão só foi retomada em agosto de 2005, quando a diretora da SDE foi a Bebedouro para uma reunião com a Associtrus, na qual ficou acertado o compromisso de promover o acordo de leniência com o denunciante.
O acordo foi assinado em dezembro de 2005 e em 24 de janeiro de 2006 foi desencadeada a denominada “Operação Fanta”, onde se procedeu à busca e apreensão nas dependências das empresas, da Abecitrus, e na residência de um dos diretores envolvidos.
O fato provocou uma enorme reação, as empresas iniciaram negociações com a Associtrus para discutir soluções para o conflito do setor. Logo a seguir, entrou em ação o Senador Aloízio Mercadante, que se propôs intermediar uma negociação entre as partes. Enquanto citricultores e indústria discutiam o setor, um acordo ilegal foi proposto para a SDE e o Cade para encerrar o processo e devolver os documentos apreendidos. A Associtrus tomou conhecimento da proposta de acordo e conseguiu, por meio de mandado de segurança e a efetiva cooperação do Ministério Público Federal, convencer o CADE de que os fortes indícios de prática de cartel por parte das empresas processadoras de suco de laranja, de forma reiterada, permanente, desde o início da década de 1990, impediam o acordo nos termos do que determinava o parágrafo 5º do art. 53 da Lei 8884/94[1].
Nesse período, um número enorme de fusões e aquisições foram submetidas e aprovadas pelo CADE, aumentando a concentração do setor e fortalecendo o cartel. Quase duas dezenas de processadoras foram inviabilizadas e muitas delas adquiridas e fechadas pela liderança do cartel. Apenas no estado de São Paulo, cerca de 20 mil citricultores foram eliminados do setor;a área plantada de laranjas que superava 860 mil hectares em 1999 foi reduzida a cerca de 400 mil ha em 2016. Cerca de 200 mil empregos diretos foram eliminados. O preço da caixa de laranja em dólares atualizado pelo CPI, índice de preço ao consumidor dos EUA, reduziu-se de US$5,92 no período de 1972 a 1990 para US$2,74 para o período 1991 a 2015, uma redução de US$3,18/cx.
Em decorrênciadisso, a produção brasileira de laranja e por consequência de suco de laranja vem sendo inferior à demanda nos últimos anos e os estoques que vinham suportando parte da demanda deverão zerar em junho, no final desta safra.
Uma parcela expressiva dos citricultores que sobreviveram até agora, não conseguiram renovar seus pomares e estão endividados,e, desta forma, apesar do aumento do preço da laranja nesta safra, deverão sair da citricultura e arrendar ou vender suas propriedades.
A negociação do acordo do CADE com os membros do cartel foi feita sem a necessária transparência e os termos do acordo estão sendo mantidos em sigilo, o que dificulta os processos para indenização dos citricultores.
A nosso ver osTCCs, nos termos em que estão, beneficiaram os participantes do cartel, que agora reduzido a praticamente três empresas, vai continuar a exercer o seu abusivo poder econômico e de mercado.
Flávio Viegas
Presidente da Associtrus
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