segunda-feira, 19 de outubro de 2015
Mudanças climáticas e inovação, JOSÉ GOLDEMBERG in OPINIÃO OESP
As perspectivas de
que a Conferência
do Clima a ser
realizada em Paris,
em dezembro,
leve a um
acordoentreosgrandesemissores
de gases responsáveis pelas
mudanças do clima são as melhores
desde 1992. Há várias razões
para isso, mas as mais importantes
são as mudanças estruturais
ocorridas na China,
nos Estados Unidos e no Brasil.
Os países da União Europeia
desde 1992 abraçaram a tese de
quedeveriamreduzirsuasemissões
e tomaram medidas práticas
para fazê-lo. Isso foi até relativamente
fácil de fazer melhorando
o isolamento térmico
dosedifícios,aeficiênciadoseletrodomésticos
e aumentando a
participaçãodeenergiasrenová-
veis na matriz energética. Os 27
países da União Europeia, porém,
são responsáveis por apenas
14% das emissões mundiais,
de modo que mesmo a sua meta
de reduzi-las ainda mais até
2030nãoé suficientepararesolver
os problemas globais.
OsEstadosUnidos,querepresentam
quase 20% das emissões,
apesar de não terem aderido
ao Protocolo de Kyoto – ao
qual os países da União Europeia
aderiram – têm adotado
medidasimportantesparareduzir
o consumo de carvão, graças
a ações do presidente Barack
Obama, que recebeu da Suprema
Corte norte-americana –
mas não do Congresso – autorização
para fazê-lo.
A China, que é hoje o maior
emissor mundial, contribuindo
com mais de 20% do total, resistiu
durante anos a adotar medidas
de redução – posição apoiado
pelo Brasil –, usando o argumento
de que o seu desenvolvimento
econômico era prioritá-
rio e os principais responsáveis
pelo aquecimento global eram
os países industrializados, de
modo que cabia a eles tomar as
medidasnecessárias.AChinaargumentava,
no fundo, que tinha
o direito de poluir como poluí-
ram os países industrializados
no passado.
Sucede que o crescimento
econômico da China mostrou
que esse caminho era insustentável
para os próprios chineses.
A poluição do ar em suas grandes
cidades, causada em especialpelo
consumodocarvão,estava
sufocando a população –
além de que o uso de carvãocom tecnologias obsoletas tinhaum
alto custoeconômico. A
necessidade de combater a poluição
do ar e de modernizar a
indústria chinesa levaram o governo
a decidir que antes de
2030 o consumo de carvão deixariadeaumentar.IssoabriucaminhoparaqueaChinaabandonasse
a posição de vítima e passasse
a colaborar com os demaispaíses
para evitaroaquecimento
global.
O Brasil demorou mais do
que a China para abandonar
uma posição insustentável e decidiu
assumir compromissos
mais realistas do que fez no passado.
Isto é, adotou metas e um
calendário para reduções das
emissõesquepoderãoseracompanhadas
e auditadas. Isso foi
possível graças aos progressos
na redução do desmatamento
da Amazônia e a medidas para
aumentar a participação de
energias renováveis na matriz
energética, que estava caindo.
A nova posição do governo
brasileiro em relação aos esfor-
ços para reduzir as emissões de
gases responsáveis pelo aquecimento
global é realmente uma
mudança de paradigma. Até então
a posição do governo era a
denegação pura e simplesda seriedade
do problema ou de que
o País tinha de contribuir para o
esforço comum.
Uma posição dessas poderia
até se justificar no caso de pequenos
países, que são, de fato,
pouco desenvolvidos e emitem
pouco. Mas não de um país com
grandeextensãoterritorial,altamenteurbanizadoecomboabase
industrial, como o Brasil.
Os compromissos voluntá-
rios que o País apresentou em
Copenhagen em 2009 (COP-
15) não eram realmente quantificáveis,
verdadeiras “pedaladas”,
como temos visto em outras
áreas.
Haveráumlongotrabalho para
cumprir essas metas, o que
não vai ser fácil por causa da
difícil situação atual da economia
brasileira. Mesmo assim,
esseesforço deverá ajudar a evitar
novos desastres, como os
que o próprio governo federal
provocou, tal como a desorganização
do setor elétrico brasileiro, a partir de 2012, que, entre
outros problemas, elevou a
“carbonização” da matriz elé-
trica nacional.
Um novo componente desses
esforços é o de modernizar
o setor industrial brasileiro, o
qual está localizado principalmente
no Estado de São Paulo.
A modernização significa adotar
inovações tecnológicas que
não só reduzam o consumo de
energia e outros insumos, mas
também levem a indústria a um
desempenho comparável ao
dos países industrializados.
Isso é mais fácil de fazer em
áreas como a agricultura, nas
quais temos vantagens comparativas com abundância de terra,
água e insolação. É graças a
essas vantagens que a produção
de etanol de cana-de-açúcartornouesse
produto o biocombustível
mais competitivo do mundo,
com custos menores do que
o etanol produzido do milho
nos Estados Unidos. Foi necessária,
todavia, a contribuição de
centenas de pequenas indústrias
e pesquisadores paulistas
para atingir a produtividade
atual de 6 mil litros por hectare,
o dobro de 30 anos atrás.
O desafio que temos agora para que o Brasil cumpra seus compromissos
apresentados na
Conferência de Paris é repetir
esse mesmo desempenho em
outros setores. Nesse sentido, a
Secretaria de Meio Ambiente
do Estado de São Paulo está mobilizando
vários setores industriais
que apresentaram compromissos
voluntários para reduzir
suas emissões por meio
de inovações científicas e tecnológicas,
para as quais os pesquisadores
das nossas universidades
serão essenciais. A Funda-
ção de Amparo à Pesquisa do Estado
de São Paulo (Fapesp) poderá
ajudar nesse processo.
A implementação dessas mudanças
poderá talvez servir de
exemplo aos outros países em
desenvolvimento e levar o Brasil
até a assumir uma posição
de liderança, como fez em
1992, quando sediou no Rio de
Janeiro a conferência internacional
que adotou a Convenção do Clima e a Convenção da
Biodiversidade.
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