segunda-feira, 6 de junho de 2022

Brasil virou paraíso dos golpes da internet, Ronaldo Lemos, FSP

 Você certamente conhece alguém que caiu em algum golpe na internet recentemente. Talvez você mesmo. O Brasil tornou-se o paraíso dos golpistas e o inferno da segurança online para todo o resto.

Um dos golpes mais comuns chega pelo WhatsApp. O golpista pega uma foto da pessoa na internet e cria uma conta no aplicativo com um número de telefone qualquer. A partir daí manda mensagem para os familiares, usualmente a mãe.

Ícone do WhatsApp em um smartphone - AFP

Nas mensagens diz ser o filho e que o celular quebrou, foi roubado ou que sofreu um acidente, e está precisando de um depósito urgente.

O parente olha a foto e, diante da situação, nem pensa. Transfere o dinheiro solicitado, que vai para uma conta de um laranja. O golpista fica no aguardo na boca do caixa e assim que o dinheiro chega, faz o saque e desaparece.

As vítimas ficam sem amparo e com total sensação de impotência. Na maioria absoluta dos casos não recuperam o dinheiro transferido. O impacto é financeiro e moral. Muita gente entra em depressão depois de cair em um golpe assim.

Outro golpe é o saque de FGTS no aplicativo da Caixa Econômica Federal. Nesse caso, o golpista usa os dados da pessoa (CPF, nome, endereço etc.) para se inscrever no app. Feito isso, consegue inserir um email ou telefone falso e a partir daí, com passos adicionais simples, consegue fazer o saque online para a conta de um laranja.

Se você tem FGTS a receber, verifique o seu cadastro imediatamente. Há boa chance de que se você ainda não o fez, algum golpista tenha feito por você com email e telefone falso.

Você deve estar se perguntando como os golpistas conseguem os dados das pessoas. Como saber quem é o pai, a mãe? O endereço, CPF, nome completo, número de celular deles? Aí está o problema. Todos os dados de todos os brasileiros e brasileiras vazaram na internet e estão neste momento disponíveis para qualquer golpista. Chamei isso aqui na Folha de "o vazamento do fim do mundo". Agora estamos vendo a razão.

É fácil descobrir quem é o pai e a mãe de alguém, o número do celular deles, a foto da pessoa, dos seus parentes e todas as outras informações cadastrais. Em outras palavras, o sistema de identidade e dados cadastrais brasileiro colapsou. Estamos todos expostos.

Os aplicativos da Caixa Econômica, por exemplo, foram desenhados como se o Brasil fosse a Europa, em que a proteção de dados é extremamente elevada. Eles ignoram que hoje é facílimo obter todos os dados de alguém e literalmente assumir sua identidade online.

O que fazer nessa situação? Uma solução possível é reinventar completamente o sistema de identificação do país, começando tudo de novo e do zero. O atual tornou-se um problema generalizado. Dados vazados não podem ser "desvazados".

Outra solução é investir em mecanismos de autenticação de identidade adicionais mais sofisticados (e caros). Até lá, de quem é a culpa? São múltiplos os fatores, mas é sobretudo do Estado negligente. O poder público deveria indenizar todas as vítimas de golpes no Brasil originados em vazamento de dados até que o problema seja um dia corrigido.


Já era – dados pessoais protegidos, controlados pelo indivíduo

Já é – todos os dados de todos os brasileiros expostos na internet

Já vem – uma temporada permanente e sem fim de golpes


Como envelhecer e manter sua mente ativa, OESP

 Um prédio histórico pode entrar em decadência pela ação do tempo. Ou então passar constantemente por um processo de manutenção e revitalização que lhe permitirá lidar melhor com o envelhecimento inevitável. É com essa imagem que o neurocirurgião Sanjay Gupta abre seu novo livro, Mente Afiada, que está sendo lançado no Brasil (Editora Sextante). O médico já ganhou prêmios como o Peabody e o Emmy por sua atuação na TV: ele é correspondente médico do canal de notícias norte-americano CNN. 

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Segundo Gupta, a solidão acelera o declínio cognitivo em adultos Foto: John Nowk/CNN

O objetivo do livro é mostrar que é possível manter, em qualquer idade, um cérebro ativo: basta apenas reforçar constantemente seus alicerces. Como? Ele sugere, ao longo da obra, alguns caminhos possíveis, desfazendo mitos sobre o envelhecimento. 

Nunca é tarde

A certa altura, o cérebro já não dá conta de aprender coisas novas? Bobagem, diz Gupta. “A combinação da memória com a possibilidade de gerar novos neurônios significa que continuamos a mudar as informações, a capacidade e a potência de aprendizagem do cérebro.”

Movimente-se!

Gupta afirma que o exercício é “a única atividade comportamental cientificamente comprovada que provoca efeitos biológicos benéficos para o cérebro”. Isso quer dizer na prática que realizar exercícios ajuda a preservar as funções do cérebro. E, além disso, pode ajudar a evitar pressão alta ou diabete, que aumentam a probabilidade de problemas como a demência.

Contra o estresse

A prática de exercícios físicos também ajuda, diz o autor, a lidar com o estresse. E isso é importante por uma questão química. Quando identifica situações de estresse, o corpo libera o hormônio cortisol – e pesquisas têm mostrado que o nível elevado de cortisol afeta negativamente a memória e a aprendizagem. 

Palavras cruzadas

A ideia de que fazer palavras cruzadas ou atividades semelhantes mantém o cérebro jovem é, infelizmente, um dos mitos sobre o envelhecimento. “Elas só exercitam uma parte do cérebro, em geral a capacidade de encontrar palavras”, diz Gupta. Tudo bem, por manter a mente trabalhando, palavras cruzadas podem reduzir o declínio da capacidade de pensar. Mas não é uma receita que sirva para todas as pessoas. 

Ter um propósito

Manter a mente ativa é fundamental. Isso não significa jamais se aposentar ou seguir trabalhando para ocupar a cabeça. Mas é preciso “mexer o cérebro e exercitá-lo de forma a mantê-lo saudável”. Para Gupta, é preciso encontrar um propósito. Qual? Ele sugere um exercício: tente se lembrar da última vez que se sentiu tomado por uma sensação de energia intensa, bastante estimulado. A resposta pode lhe oferecer pistas.

A importância do sono

Muita coisa acontece – e precisa acontecer – durante o sono. O corpo se reabastece de várias maneiras que afetam todo o funcionamento do cérebro, do coração, do sistema imunológico e todo o metabolismo. O sono muda com a idade, mas isso não significa que ele deva ter pior qualidade. 

Como impedir que isso aconteça?

Gupta traz algumas sugestões. Tente dormir e despertar sempre no mesmo horário; acorde de preferência nos primeiros sinais de luz do sol; tome cuidado com o que bebe e come (café depois de certo horário, nem pensar); tome cuidado ao tomar remédios para dormir; elimine aparelhos eletrônicos do quarto; crie uma rotina que faça com que seu corpo se lembre diariamente de que é hora de dormir e vá se preparando para isso.

Saber relaxar

Sempre que possível, todos queremos relaxar. Mas é preciso aprender como fazer isso. E a principal lição é encontrar tempo e espaço para que isso aconteça. Mesmo durante um dia cheio de trabalho, passar alguns poucos minutos que sejam fora do computador, sem checar e-mails ou mensagens, já pode ajudar. E, se a mente começar a viajar, não apenas deixe: embarque com ela.

Mantenha-se conectado... em especial fora das redes

Uma pesquisa de 2016 mostrou que o isolamento aumenta em 29% o risco de doença cardíaca e em 32% o de AVC. A solidão acelera o declínio cognitivo em adultos mais velhos. Aqui, a sugestão é dupla: procure fazer parte de grupos, conecte-se a outras pessoas, e proponha-se, com elas, a realizar atividades desafiadoras.

O poder do toque

Estar com outras pessoas e compartilhar com elas um sorriso pode ser libertador, lembra Gupta. Assim como o toque: mãos dadas, abraços, um simples tapinha nas costas. Parece pouco. Mas o autor garante que não é. Tocar o outro, ele explica, é um modo de se conectar que evoca o desejo ancestral do ser humano de se proteger. E de se sentir parte de um grupo

500 mil influenciadores, Ruy Castro FSP

 Reportagem de Daniele Madureira na Folha (29/5) me informa que, segundo uma multinacional de pesquisa, o Brasil tem 500 mil influenciadores. Quase tanto quanto médicos (502 mil), mais que engenheiros civis (455 mil), muito mais que dentistas (374 mil) e mais do dobro que arquitetos (212 mil). De onde saíram e quem são? Há tempos ouço falar em influenciadores, mas, como não frequento redes sociais, nunca soube o que eram. Consultei as bases e descobri que são pessoas irresistíveis, que levam milhões de outras a adotar seus estilos de vida, preferências e aptidões.

No passado, já fui influenciado por muitos escritores e jornalistas. Admirava seu jeito de pensar, escrever, viver e queria ser como eles. Os grandes influenciadores de hoje não são tanto da área do pensamento, mas da moda, da tecnologia, do celebritismo. No fundo é a mesma coisa: seus seguidores querem ser como eles.

Como? Explicaram-me. Cristiano Ronaldo, digamos, tem 517 milhões de seguidores. Como não podem se tornar novos Cristianos Ronaldos, esses 517 milhões usam seu gel, copiam sua sobrancelha, adotam sua dieta de macarrão com granola e isso faz girar muito dinheiro. Ah, entendi. E é verdade que alguns dos hoje principais influenciadores do mundo são cachorros? Sim, responderam —não para ensinar seus seguidores a arfar, rolar no chão e pegar bolas, mas a comprar a ração, os brinquedos e roupinhas desses cachorros para seus próprios cachorros.

Então para isso servem os influenciadores, digo, influencers, em português —para vender produtos e serviços. Bem, menos mal. É só mais um ramo da publicidade.

Mas há influenciadores que operam também na área do pensamento. São os que usam esses canais para vender o ódio, a mentira, jogar irmãos contra irmãos, cupinizar a democracia e promover a morte. As instituições ainda não aprenderam a lidar com eles. E, quando for tarde demais, já não fará diferença.