sábado, 2 de fevereiro de 2019

Executivos da Vale podem ser acusados de homicídio doloso, dizem analistas, FSP

Crime, em que autor assume o risco de suas ações, tem pena mais alta e pode levar a Tribunal do Júri

Anaïs FernandesFilipe Oliveira
SÃO PAULO
O conhecimento que a Vale tinha sobre a dimensão do risco em caso de rompimento da barragem do Córrego do Feijão, em Brumadinho (MG), pode levar ao indiciamento de profissionais da empresa por homicídio doloso, na avaliação de especialistas em direito.
O desastre, ocorrido há uma semana, deixou até agora 115 mortos e 248 desaparecidos.
Homicídio doloso, em que o autor quer ou assume o risco de suas ações, tem penas maiores que o homicídio culposo, quando uma pessoa mata outra sem intenção por negligência, imprudência ou imperícia.
A acusação se basearia no argumento de que técnicos e executivos da companhia assumiram um risco elevado ao optar por um modelo de barragem sabidamente mais perigoso e barato.
Além disso, a empresa tinha em mãos um plano de emergência que apontava que a propagação da lama em caso de rompimento poderia ser de até 65 quilômetros, como revelado pela Folha.
O refeitório dos funcionários da mineradora e a área administrativa, onde estava parte das vítimas, seriam atingidos em até um minuto.
Para o juiz aposentado Wálter Maierovitch, pode ser aplicado ao caso o entendimento de dolo eventual, ou seja, em que a pessoa conhece e assume o perigo de suas ações.
"Evidente que os responsáveis não queriam o resultado morte, mas assumiram o risco", afirma ele.
Segundo Maierovitch, é preciso que a investigação aponte qual a participação de cada um para que a tragédia acontecesse, o que pode ou não envolver a cúpula da empresa.
"Será que os membros do conselho de administração foram enganados ao permitir a construção dessa barragem? Ou deram um voto que assumiu o risco?"
Sérgio Salomão Shecaira, professor titular de direito penal da USP, concorda ser possível haver responsabilizações penais, tanto para a empresa como para profissionais, mas ressalva ser difícil especificar o dolo em uma companhia com milhares de funcionários.
"É como acidente aéreo. Tem o avião cheio, a chuva, o tamanho da pista, uma série de coisas que se somam e dificultam estabelecer a individualização da responsabilidade."
Para o professor, o caso seria de homicídio culposo, pois os profissionais da empresa não tinham a intenção de cometer um crime, o que, em sua avaliação, seria necessário para configurar o dolo.
A desembargadora do Tribunal de Justiça de São Paulo Ivana David afirma que há previsão da responsabilização penal dos administradores da empresa na legislação de crimes ambientais. Em sua avaliação, o indiciamento por homicídio com dolo eventual é mais adequado ao fato.
A individualização das responsabilidades, segundo ela, dependerá das investigações que mostrarão o padrão de trabalho dentro da companhia e como foram assinados os laudos que atestaram a segurança da barragem.
José Damião Cogan, desembargador da seção criminal do TJ-SP, pondera que a responsabilização só deve acontecer após uma análise técnica sobre os motivos da tragédia.
Ele critica a prisão temporária de cinco engenheiros (três da Vale e dois terceirizados). "Para essa prisão, seria necessária uma prova técnica de que, na época em que o laudo foi feito, aquilo era inverídico", afirma.
A existência de um plano de emergência não implica, necessariamente, que houve dolo, avalia Heloisa Estellita, especialista em direito penal econômico e professora da FGV Direito SP.
Ela afirma que "todas as barragens oferecem risco". A lei determina sua mensuração. "Tudo bem que a Vale tenha tido conhecimento do risco. O que não sabemos é se a empresa cumpriu todas as normas para lidar com ele", pondera.
Christiano Jorge Santos, professor de direito penal da PUC-SP e promotor, lembra que no caso do desastre de Mariana (MG) houve denúncias de executivos por homicídio com dolo eventual.
Na prática, especialistas apontam que é comum a Promotoria apresentar esse tipo de acusação para levar o caso ao Tribunal do Júri, espaço em que a comoção dos jurados pode favorecer a condenação.
Para o criminalista Alberto Toron, se houve dolo eventual, ele diz respeito ao rompimento da barragem, e não às mortes. "Entendo como um crime de inundação agravado pelo resultado morte", diz.
Com esse argumento, Toron já conseguiu na segunda instância uma decisão favorável para atenuar as acusações contra um executivo da Samarco no caso de Mariana.
Procurada, a Vale não se manifestou sobre a responsabilização de executivos.
Sobre o plano de emergência, a empresa já havia dito que todas as suas barragens têm o documento, construído com base em estudos técnicos de cenários hipotéticos.
"A estrutura possuía todas as declarações de estabilidade aplicáveis e passava por constantes auditorias externas e independentes."

TIPOS DE ACUSAÇÕES NO DIREITO PENAL

Dolo direto 
A pessoa comete uma infração sabendo e desejando fazer isso
Dolo eventual
O acusado prevê o resultado de sua ação, assumindo um alto risco, apesar de não querer que a infração aconteça
Culpa consciente
O agente prevê os riscos de sua ação, mas acredita sinceramente que isso não acontecerá
Culpa inconsciente
A pessoa não tem consciência de que comete uma infração nem tem intenção de fazê-la
Penas
Homicídio doloso
Reclusão de 12 a 30 anos
Homicídio culposo
Detenção de 1 a 3 anos
Inundação
eclusão de 3 a 6 anos e multa, no caso de dolo, ou detenção de 6 meses a 2 anos, no caso de culpa
TÓPICOS

sobre aposentadoria dos militares no valor

O candidato do PSL à Presidência da República, Jair Bolsonaro, afirmou que pretende iniciar a reforma dos regimes previdenciários lutando contra o que considera privilégios dos servidores públicos. Mas parece que eles só se referia aos civis. Para os militares, o candidato informou, em entrevista ao SBT na noite de terça-feira, que pode propor "alguma mudança", lembrando que eles não poderiam ser igualados a quem tem direitos trabalhistas diferentes, como FGTS, hora extra, direito a greve e repouso remunerado. Os números sugerem uma leitura diferente daquela feita pelo candidato do PSL, que é capitão reformado do Exército. Basta ler a mensagem do presidente Michel Temer ao Congresso Nacional que acompanha a proposta orçamentária para 2019. Lá está dito que o déficit nominal com os militares inativos e os seus pensionistas está crescendo, em termos nominais, enquanto o "buraco" do regime próprio dos servidores civis da União (RPPS) projetado para o próximo ano está caindo, na comparação com o previsto para 2018. O déficit com militares inativos e seus pensionistas em 2019 está projetado em R$ 43,3 bilhões, contra R$ 42,6 bilhões previstos para este ano. No caso do RPPS, o "rombo" passará de R$ 45,4 bilhões neste ano para R$ 44,3 bilhões em 2019. Um é quase igual ao outro, embora o número de servidores civis aposentados e seus pensionistas seja bem superior ao de militares inativos e seus pensionistas. Em 2016, último dado disponível, havia 683.560 aposentados e pensionistas do RPPS e 378.870 militares inativos e pensionistas. A receita obtida com as contribuições dos civis ativos foi de R$ 30,69 bilhões, enquanto que as contribuições dos militares para as suas pensões ficaram em R$ 2,93 bilhões. Por Ribamar Oliveira PUBLICIDADE inRead invented by Teads Ver novamente Saiba mais 3 Ribamar Oliveira formou-se em jornalismo pela Universidade de Brasília (UnB). Já trabalhou nos principais jornais e revistas do país. Foi chefe de redação da sucursal de "O Globo" em Brasília, repórter do "Jornal do Brasil" e coordenador de economia, repórter especial e colunista do jornal "O Estado de S. Paulo". Trabalhou nas revistas "Veja" e "Isto é". Foi assessor de imprensa do Ministério do Planejamento em 1994, ano de lançamento do Plano Real, e assessor de imprensa do Banco Central. Ganhou vários prêmios, entre eles o Prêmio Esso de Economia pela reportagem “O escândalo dos precatórios”. É coautor do livro “A Era FHC, um balanço”. Fale com Ribamar Oliveira Ribamar Oliveira Sonoma Entrega em 90 Minutos* Brasil Últimas Lidas Comentadas Compartilhadas Maioria dos economistas aposta em alta da Selic apenas em 2020  01/02/2019 às 18h18 Itamaraty pede que China e Rússia "vejam a realidade" sobre Venezuela 01/02/2019 às 17h42 Indústria do trigo defende política nacional para incentivar produção  01/02/2019 às 19h36 Ministério admite não saber se fiscalização de barragens era adequada 01/02/2019 às 16h15 Ver todas as notícias g1 ge gshow vídeos 02/02/2019 Rombo da Previdência dos militares cresce | Valor Econômico https://www.valor.com.br/brasil/5933623/rombo-da-previdencia-dos-militares-cresce 2/4 A mensagem de Temer separa os gastos com pensões militares e com a inatividade remunerada (reserva e reforma). Haveria uma razão legal para isso, de acordo com parecer da Consultoria-Geral da União da Advocacia Geral da União (CGU/AGU): a Constituição não prevê um plano de benefício de aposentadoria para os militares nem de custeio. A legislação exige apenas a contribuição para o pagamento de pensões. O entendimento que predomina nas Forças Armadas é que o militar não se aposenta. Ele ingressa na reserva, mantendo vínculo com a profissão militar, podendo ser mobilizado a qualquer momento. Depois de certa idade, ele é reformado. Ele contribui para a pensão com 7,5% (podendo chegar a 9%, em alguns casos) sobre a remuneração bruta, mesmo na inatividade. Ainda há o desconto obrigatório de 3,5% para o custeio do sistema de saúde e de assistência social. A realidade dos números, no entanto, é preocupante. As despesas com pensões militares para este ano estão previstas em R$ 21,3 bilhões, enquanto as receitas com as contribuições deverão ficar em R$ 3,25 bilhões, de acordo com a mensagem de Temer. O déficit com pensões é de R$ 18 bilhões. Para 2019, as despesas subirão para R$ 21,72 bilhões e as receitas ficarão em R$ 3,32 bilhões. O "rombo" aumentará para R$ 18,4 bilhões. Os gastos com militares inativos (reserva e reforma) passará de R$ 24,578 bilhões neste ano para R$ 24,898 bilhões em 2019. No primeiro semestre de 2017, o Tribunal de Contas da União (TCU) realizou uma auditoria para levantar informações destinadas a qualificar o debate acerca do financiamento da Previdência. Na época, o governo Temer estava empenhado em fazer uma reforma dos regimes previdenciários. A auditoria do TCU considerou 2016 como ano-base. Naquele ano, as Forças Armadas tinham 369.690 militares na ativa e 154.144 inativos, além de 188.924 pensionistas. Nos três comandos (Exército, Marinha e Aeronáutica), portanto, o número de pessoas que recebiam benefícios previdenciários somava 343.068 (excluídos 35.802 pensões especiais e benefícios a anistiados militares). Com relação à idade, os dados coletados pelo TCU indicavam que a passagem para a inatividade ocorria, em média, por volta dos 50 anos. Mas 94,1% dos militares iam para a inatividade com menos de 54 anos. Na folha de pagamento de outubro de 2016, segundo o relatório do TCU, as pensões para filhas de militares maiores (de 21 anos) representavam 59% desses benefícios e consumiram 46% dos recursos dispendidos com pensões (exceto pensões especiais). O TCU informou que, em 2016, a despesa média anual com cada beneficiário militar inativo ou pensionista foi de R$ 97,6 mil. Com cada aposentado ou pensionista do Regime Geral de Previdência Social - o famoso INSS - o gasto foi de R$ 17,4 mil, enquanto com cada aposentado ou pensionista do RPPS foi de R$ 101,8 mil. No Brasil, o militar passa à inatividade com a remuneração integral do posto que ocupava e tem paridade com os da ativa. O déficit do RPPS está caindo em decorrência das várias reformas realizadas neste regime previdenciário, desde 1998, com a emenda constitucional 20. Depois, foram aprovadas as emendas constitucionais 41 e 47. E, em abril de 2012, a Lei 12.618 instituiu o regime de previdência complementar para os servidores. Com o advento das entidades fechadas de previdência, os servidores que ingressaram no serviço público a partir de 31 de janeiro de 2013 terão teto de aposentadoria igual ao dos beneficiários do INSS. Em todo esse tempo, os militares sofreram apenas uma mudança. Em 2001, o art. 31 da MP 2.215-10 facultou a eles contribuir com um valor adicional de 1,5% para que suas filhas (nascidas a qualquer tempo) mantivessem o direito à pensão independentemente de idade, na hipótese de não haver viúva ou companheira, se assim optassem até 29/12/2000. O relatório do TCU informa que em 2013, o Reino Unido fez uma reforma do sistema previdenciário para os militares. Em 2015, foi a vez de os Estados Unidos fazerem o mesmo. Com as mudanças, exceto em caso de morte em serviço ou aposentadoria por invalidez, os benefícios previdenciários pagos pelos governos dos EUA e do Reino Unido não são integrais como no Brasil, "havendo naqueles países significativa redução dos valores pagos aos inativos em relação àqueles da ativa". Videos Veja imagens da destruição em Brumadinho (MG) 28/01/2019      Indicadores Brasil Variação em % Indicador jan dez nov 12 m* IPCA 0,15 -0,21 3,75 IGP-M 0,01 -1,08 -0,49 6,74 IGP-10 -0,26 -1,23 -0,16 6,80 Prod. Industrial** 0,2 -0,1 1,1 IBC-BR** 0,29 1,59 Veja as tabelas completas no ValorData Fontes: IBGE, FGV e BC. Elaboração Valor Data. * Acumulado até o último mês indicado ** Dessazonalizado    Compartilhar Por Ribamar Oliveira O candidato do PSL à Presidência da República, Jair Bolsonaro, afirmou que pretende iniciar a reforma dos regimes previdenciários lutando contra o que considera privilégios dos servidores públicos. Mas parece que eles só se referia aos civis. Para os militares, o candidato informou, em entrevista ao SBT na noite de terça-feira,... 02/02/2019 Rombo da Previdência dos militares cresce | Valor Econômico https://www.valor.com.br/brasil/5933623/rombo-da-previdencia-dos-militares-cresce 3/4 De acordo com o relatório do TCU, outro ponto importante é que, nos sistemas estadunidense e britânico, "a política de benefícios pagos aos familiares do militar em caso de falecimento deste é de redução significativa do valor do benefício original, além de haver severas restrições à elegibilidade dos beneficiários". Talvez sejam exemplos a ser seguidos. Ribamar Oliveira é repórter especial e escreve às quintas-feiras E-mail: ribamar.oliveira@valor.com.br