sexta-feira, 1 de fevereiro de 2019

OPINIÃO JOSÉ ANTUNES SOBRINHO Brumadinho não seguiu a lição, FSP

Em engenharia, improvisações dão muito errado

José Antunes Sobrinho, em depoimento à CPI dos Fundos de Pensão, em 2016 - Renato Costa - 23.fev.16/Folhapress
José Antunes Sobrinho

A origem da construção de barragens se confunde com as primeiras grandes civilizações, que as usavam para reservar água para consumo e fins agrícolas. Depois das revoluções industriais, seu uso se multiplicou, abrangendo áreas que vão do abastecimento de água, navegação, produção de energia elétrica à extração de minerais usados na fabricação do aço e até dos celulares que usamos. Infelizmente, são lembradas por tragédias, como a de South Fork (EUA), com mais de 2.000 mortos em 1889.

Como com quase todos os instrumentos civilizatórios, os benefícios viram ameaça quando se tem uma gestão mal feita. É, portanto, sob esse prisma que se devem avaliar os dois acidentes recentes de Mariana e Brumadinho, ambos envolvendo mineradoras vinculadas à Vale e barragens construídas para acumular dejetos, pela técnica de alteamento a montante.

Antes de entrar no mérito, é preciso lembrar que o arcabouço normativo do Brasil para a construção e manutenção de barragens é sólido.

Promulgada em 2010, a lei federal 12.334/10 criou a Política Nacional de Segurança de Barragens, que é regulamentada por resoluções e portarias das agências reguladoras de Águas, de Energia Elétrica e de Mineração.

Os regulamentos exigem vistorias periódicas, planos de atuação em emergência e de segurança. Além deles, há extensa bibliografia de engenharia, como os estudos da Comissão Internacional de Grandes Barragens (Icold), fundada em 1928 e cujo espelho nacional é o Comitê Brasileiro de Barragens. Guias para uma boa prática, com efeito, não faltam, mas precisam ser seguidos.
Apesar de a Vale ter comunicado oficialmente estar em dia com as revisões e inspeções periódicas, perguntas ainda carecem de respostas.

A principal delas é por que, mesmo tendo um plano para emergências, a mineradora manteve áreas com pessoas, como um refeitório e escritórios, sem considerar que, num caso extremo, estas seriam atingidas.

É de assustar que, após Mariana, não tenham sido feitos estudos exaustivos de ruptura de barragens --os "dam break"-- para Brumadinho e as barragens da Vale, cuja técnica de construção é sabidamente precária. Tais estudos demonstrariam áreas a jusante a serem preservadas de ocupação humana, com custos de eventuais realocações de propriedades e populações muito menores que o das vidas perdidas.

As investigações dirão como foram conduzidos os estudos de risco e por que não foram seguidos.

Os impactos de Brumadinho estão postos. Poderão significar recrudescimento da regulamentação e, fatalmente, obrigarão o mercado minerário a adotar nova postura, inclusive quanto ao compliance. Mas a lição que sobressai é que, em engenharia, improvisações dão muito errado.

É de se lamentar que, em um país referência mundial em barragens --como aquelas de empresas do setor elétrico, construídas a seco com materiais selecionados ou concreto, com grande controle de qualidade e os devidos cuidados nas fundações e ombreiras (nunca com rejeitos lançados)--, tenhamos sofrido dois acidentes de grandes dimensões num período de apenas três anos.
José Antunes Sobrinho
Acionista da Nova Engevix e engenheiro civil com especialização em obras hidráulicas na Holanda

Ruy Castro A grande família. FSP

Por que, com tanto poder, o Queiroz perdia seu tempo atrás de um volante?

Pode-se falar o que quiser dos Bolsonaros, mas eles são uma família. Uma grande família, composta do titular com seus filhos, mulheres e ex-mulheres, e de assessores, agregados e amigos idem, juntos por muitas afinidades. Posso imaginá-los aos domingos, no fim da tarde, em volta de uma grande mesa na casa de Jair Bolsonaro, na Barra, dividindo uma pizza também família. 
Fabrício Queiroz, motorista e ex-assessor parlamentar do então deputado estadual Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), é um querido membro honorário da família. Sua própria família se confunde com a dos Bolsonaros e eles dividem não apenas a pizza como nomeações, cargos e contas bancárias a ponto de, às vezes, nem a Fazenda saber o que é de um ou de outro. É bonito observar como eles se dão e se ajudam. Exemplos: 
Queiroz sugeriu pelo menos sete funcionários do antigo gabinete de Flávio na Assembleia Legislativa do Rio. Começou pela indicação de sua mulher, Márcia, e de sua enteada Mayara, e, para provar que poderiam ser personagens de um filme de Ingmar Bergman, indicou também Márcio, ex-marido de Márcia e pai de Mayara. 
Queiroz era colega de batalhão e amigo de Adriano Magalhães da Nóbrega, apontado como chefe da milícia que domina a comunidade de Rio das Pedras e cabeça do Escritório do Crime. Mas amigo é amigo, e Queiroz indicou a Flávio a filha de Adriano, Danielle, e a própria mãe de Adriano , Raimunda. Tão atencioso para com filhos alheios, Queiroz não poderia descurar dos seus, com o que indicou suas filhas Nathalia e Evelyn. 
Todos os indicados pelo motorista Queiroz foram nomeados por Flávioe alguns foram também para o gabinete do deputado federal Jair Bolsonaro. E, como nas melhores famílias, o dinheiro às vezes trocava de mão entre eles. O que me intriga é: com tanto poder para nomear, pagar e receber, por que o Queiroz perdia seu tempo atrás de um volante?
A relação dos Bolsonaros com Fabrício Queiroz e as milícias
A relação dos Bolsonaros com Fabrício Queiroz e as milícias - Folhapress
Ruy Castro

quinta-feira, 31 de janeiro de 2019

Não foram dados os primeiros passos, Celso Ming, OESP

Uma vez completados os primeiros 30 dias de governo Bolsonaro, ainda não temos nenhum anúncio de providências na política econômica

Celso Ming, O Estado de S.Paulo
30 Janeiro 2019 | 21h15
Pouco antes da mudança de governo, o ministro da Economia, Paulo Guedes, avisou que, a partir de janeiro, novidades na política econômica seriam anunciadas quase diariamente.
Uma vez completados os primeiros 30 dias de governo Bolsonaro, ainda não temos nenhum anúncio de providências na política econômica. O que há são declarações de intenção: de levar adiante a reforma da Previdência; de reduzir a carga tributária para as empresas; de simplificar o sistema tributário; de reduzir a burocratização; de fechar novos acordos de comércio exterior; de recolocar em marcha leilões de concessão de serviços públicos; e de privatizar grande parte do setor estatal.
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Brazil's Privatization Secretary Salim Mattar speaks at Credit Suisse Latin America conference in Sao Paulo, Brazil January 29, 2019. REUTERS/Amanda Perobelli
Essas declarações se repetem desde as eleições e foram reafirmadas em Davos, por ocasião do Fórum Econômico Mundial. Mas, por enquanto, não há novidade, tampouco a formulação de um plano de prioridades ou detalhamento do projeto de reforma da Previdência.
O clima geral ainda é de confiança, como demonstram a redução da percepção do índice de risco (queda do CDS de 5 anos) da economia, a relativa estabilidade das cotações do dólar no câmbio interno e a alta da Bolsa, de 10,36% nestes 30 primeiros dias do mês.
Os levantamentos do Boletim Focus, do Banco Central, esperam avanço do PIB neste ano de 2,5%; retomada da produção industrial da ordem de 3,0%; inflação anual de 4,0%, abaixo da meta, que é de 4,25%; e entrada de investimentos estrangeiros diretos de US$ 80 bilhões. São números que refletem otimismo, à espera de que o novo governo anuncie seus projetos e não faça nenhuma grande besteira em política econômica.
Mas as incertezas continuam aí. Ainda não se sabe como o rombo das contas públicas e a dívida serão equacionados. Os governadores de nada menos que seis Estados decretaram estado de calamidade financeira, à espera do socorro da União. E, em alguns casos, o governo continua reforçando a percepção de que ainda não sabe o que quer. O último dos casos são as declarações de que estudava intervir na diretoria da Vale, para todos os efeitos uma empresa privada.
A privatização de empresas estatais, tal como novamente anunciada pelo secretário de Desestatização e Desinvestimento do Ministério da Economia, Salim Mattar, é providência saneadora, na medida em que, além de conter a ineficiência e a roubalheira, reduz a drenagem de recursos públicos para atividades não essenciais.
O Tesouro está quebrado e não pode seguir sustentando empresas públicas carregadas de distorções e de má governança. O Boletim de Participações Societárias da Uniãomostrou que, apenas de 2012 a 2017, o Tesouro despejou R$ 142 bilhões em empresas estatais e teve como retorno apenas R$ 96 bilhões.
No entanto, mesmo se muito bem feita, a privatização intensiva por si só não recuperará as finanças públicas. É a venda das joias da família que pode até reduzir o endividamento federal hoje de R$ 3,9 trilhões, mas não pode ser entendida como decisão estratégica de política econômica. Ela não é instrumento de alavancagem do sistema produtivo e de criação de empregos.
Enfim, sabemos, em suas grandes linhas, o que pensam os responsáveis pela política econômica. Mas ainda não temos decisões.
CONFIRA
» Subvenções a estatais
O gráfico mostra a evolução das subvenções do Tesouro a empresas públicas. Não se trata de injeção de capital novo, mas apenas de despesas com pessoal e outros custeios. A estatal que mais recebeu vitaminas no período 2012 a 2017 (inclusive) foi a Embrapa (R$ 15,9 bi). A segunda foi a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (R$ 9,1 bi). E a terceira, o Hospital Nossa Senhora da Conceição (R$ 5,8 bi). Vêm a seguir o Hospital das Clínicas de Porto Alegre (R$ 5,7 bi) e a Conab (R$ 4,8 bi).