Hoje boa parte dos brasileiros escolhe seus representantes para os próximos quatro anos. Do ponto de vista do comportamento jovem e da saúde pública, algumas questões ganharam destaque no debate eleitoral, mas outras ficaram em segundo plano.
Se você ainda não foi às urnas, vale a pena pensar em como seus candidatos se posicionaram em relação a alguns desses temas durante a campanha ou, caso já tenha votado, é bom ficar atento para quais rumos esses pontos vão migrar nos próximos quatro anos.
A lista é grande: métodos contraceptivos mais efetivos na prevenção da gestação na adolescência (que ainda é da ordem de quase uma em cada cinco meninas engravidando antes dos 18 anos), discussão da legislação do aborto (hoje uma das principais causas de morte de mulheres jovens e pobres no País), atenção à saúde emocional (a depressão atinge quase 30% das garotas e o suicídio cresce entre os mais jovens no Brasil), o trabalho mais efetivo na prevenção do consumo precoce de álcool e outras drogas (e na associação do uso das diversas substâncias com comportamento de risco), além de uma postura mais ativa no controle do bullying nas escolas, talvez um dos motores mais fortes de violências, preconceitos e intolerância, principalmente na esfera sexual. Além disso, medidas de como garantir emprego e perspectiva para a população jovem e oferecer alternativas que diminuam a criminalidade, a campeã das mortes entre os garotos jovens.
Homofobia. Não há dúvida de que homofobia foi o tema que explodiu na semana passada. Em parte, em função da ausência de uma posição mais clara dos principais candidatos, que ficam em cima do muro para não se comprometer, os nanicos deitaram e rolaram. Em pleno século 21, soam como atrocidades as declarações contra os direitos igualitários para a população homossexual. Pior, isso impacta diretamente sua saúde e comportamento.
Quer alguns dados? Hoje temos um dos maiores índices de violência do mundo contra gays, lésbicas e transgêneros. Não bastasse isso, pela dificuldade em lidar com os setores mais conservadores do Legislativo, os governos têm tido dificuldade de pautar uma discussão e campanhas de saúde focadas nesse público. Assim, só para citar um exemplo, a prevalência do vírus HIV tem crescido de forma preocupante na população de homens jovens que fazem sexo com outros homens. Em algumas cidades, o índice de contaminação é de 10 a 20 vezes maior do que na população em geral. Não falta foco nessa abordagem? Não seria importante falar de prevenção de uma forma despida de preconceitos?
O bullying motivado pela orientação sexual diversa começa forte ainda na escola, que raramente tem se ocupado de forma séria e proativa para prevenir esse fenômeno.
Um estudo da Universidade do Missouri, publicado na semana passada no Journal of Child and Family Studies, mostra que uma intervenção mais estruturada no combate ao bullying surtiu efeito entre as garotas que gostam de falar mal dos outros. O método girlss (sigla em inglês para aprimorando relações interpessoais por meio de aprendizado e suporte sistêmico) merece uma avaliação cuidadosa pelas áreas de saúde e educação. Outro método estruturado que tem tido bons resultados no mundo desde 2007 é o finlandês KIVa, já comentado nesta coluna. Vale a pena checar! Desconstruir preconceitos é um trabalho fundamental na escola.
Excreção e excrescências. E só para corrigir, do ponto de vista biológico, o candidato mais equivocado sobre essa discussão: o aparelho excretor, de fato, na espécie humana, não reproduz. Quer dizer, se formos ser precisos, parte do sistema excretor reproduz, sim, uma vez que os órgãos do gênito-urinário são integrantes do nosso sistema excretor.
Além disso, já há milhares de gerações, provavelmente desde que nossos antepassados começaram a caminhar em pé, sobre dois membros, eles perceberam que o sexo não servia apenas para reprodução. Ele é feito entre os humanos, na maior parte das vezes, porque dá prazer e é bom. E prazer, cada um descobre o seu! O Estado não pode e não deve decidir sobre isso.
Mais: se a gente for pensar na proporção de pessoas que fazem sexo anal no mundo, pode apostar que a população homossexual, também nesse caso, é uma minoria.
O candidato ficaria de bigode em pé se soubesse a quantidade de heterossexuais que apreciam e apostam nessa modalidade, da mesma forma que praticam o sexo oral (outra possibilidade que, em nossa espécie, não resulta em reprodução).
É PSIQUIATRA
Defensoria Pública de SP ingressa com ação contra Levy Fidelix e seu partido por homofobia
A Defensoria Pública de SP, por meio de seu Núcleo Especializado de Combate a Discriminação, Racismo e Preconceito, ingressou ontem (7/10) com uma ação civil pública por danos morais contra Levy Fidelix e o Partido Renovador Trabalhista Brasileiro (PRTB) em razão de manifestações homofóbicas proferidas durante debate entre os candidatos à Presidência da República.
Segundo a ação, houve clara manifestação de ódio e desprezo a um determinado grupo social, neste caso as pessoas lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais (LGBT). “Este discurso de ódio é incompatível com o respeito à dignidade da pessoa humana, não só da pessoa, individualmente considerada, mas da dignidade de uma coletividade”, diz o texto.
A ação solicita que Levy Fidelix e seu partido arquem com os custos da produção de um programa que promova os direitos da população LGBT, com a mesma duração de sua fala e na mesma faixa de horário da programação. Além disso, requer a reparação do dano moral coletivo através do pagamento de 1 milhão de reais a serem revertidos em ações de promoção da igualdade da população LGBT, conforme definição do Conselho Nacional de Combate à Discriminação LGBT. Exige, por fim, a fixação de pena de multa diária no valor de 500 mil reais por cada descumprimento da ordem judicial.
No dia seguinte às declarações do candidato, o Núcleo de Combate a Discriminação, Racismo e Preconceito recebeu uma série de denúncias, através do serviço disque-100, de pessoas que se sentiram discriminadas e agredidas psicologicamente por Levy Fidelix. Mais de 6,8 mil notificações e pedidos de providência ainda chegaram ao Núcleo encaminhadas pela Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos, órgão vinculado à Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República.
“A fala do candidato nitidamente ultrapassou os limites da liberdade de expressão para incidir em absurdo discurso de ódio, especialmente nos últimos trechos que incitam a maioria da população a ‘enfrentar’ a minoria LGBT e sugerem que essa população precisa ser tratada e segregada. Mais grave ainda é o dano moral ao verificarmos que ele compara pejorativamente a população LGBT a pedófilos”, afirmou a Defensoria Pública Coordenadora do Núcleo, Vanessa Alves Vieira. Para ela, “a externalização do preconceito, em especial por um meio de comunicação com ampla repercussão como a televisão, perpetua o tratamento discriminatório e pode produzir efeitos nocivos, como violações a direitos fundamentais e atos de violência”.
Levy Fidelix concorreu à Presidência da República no primeiro turno das eleições, realizado no último dia 5/10, pelo Partido Renovador Trabalhista Brasileiro (PRTB), agremiação que preside nacionalmente. Suas declarações de cunho homofóbico e discriminatório mencionadas na ação ocorreram no dia 28/9 em debate televiso entre candidatos à Presidência e foram reiteradas em outro debate televisionado no dia 2/10, além de veiculadas em sua página em rede social.
Outdoor homofóbico
No dia 2/9, sentença obtida pela Defensoria Pública confirmou decisão liminar que havia proibido a Casa de Oração de Ribeirão Preto de publicar mensagens similares à que publicara em outdoor em 2011, considerada homofóbica. A decisão foi proferida pela 6ª Vara Cível de Ribeirão Preto, em ação civil pública ajuizada pelos Defensores Públicos Victor Hugo Albernaz Junior e Aluísio Iunes Monti Ruggeri Ré.
O outdoor continha três citações bíblicas, destacando-se trecho do livro de Levítico: “se também um homem se deitar com outro homem, como se fosse mulher, ambos praticaram coisa abominável...”. A mensagem foi colocada poucos dias antes da 7ª Parada do Orgulho LGBTT na cidade, que ocorreu em 21/8/2011.
“Ante a tais fatos, é ainda mais difícil vislumbrar o mero regular exercício da liberdade de expressão e de crença. A requerida visava comunicar-se diretamente com indivíduos homossexuais, e passar, como já visto, uma mensagem de verdadeira repulsa. E mais: visa, através dessas mensagens homofóbicas, doutrinar, como se donos da verdade fossem, impondo uma orientação sexual ‘natural’ e ‘não pecaminosa’. Sob esse prisma, não há outra maneira de taxar a atitude perpetrada pela requerida se não como intolerante, preconceituosa, e odiosa”, afirmou a Juíza Ana Paula Franchito Cypriano em sua decisão.
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