quinta-feira, 4 de julho de 2013

O sucesso do carro flex e a miopia governamental, por Arnaldo Jardim



03/07/2013
Em março o Brasil comemorou dez anos do lançamento dos carros flex, que hoje somam 92% dos veículos novos do País. A Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) estima que já tenhamos fabricado mais de 20 milhões deles. Em poucos anos essa experiência se transformou em um dos mais efetivos programas de redução de emissões de gases de efeito estufa do mundo.
A inovação tecnológica deu aos consumidores brasileiros o poder de comandar a maior experiência de substituição em massa de combustíveis fósseis por renováveis do planeta: de escolher entre gasolina ou álcool, na hora de abastecer. A inserção dessa tecnologia em nosso mercado também trouxe novo alento para o setor sucroenergético, que passou por um ciclo de notável crescimento em cenário econômico que por vários anos permitiu uma competição saudável entre o etanol e a gasolina.
Os debates sobre os novos rumos desse programa no futuro próximo foram uma das marcas da quarta edição do Ethanol Summit, onde estive presente, na semana passada.
Lançado em 2007 pela União da Indústria de Cana-de-Açúcar (UNICA) e realizado a cada dois anos, o evento, um dos mais importantes do mundo, é voltado para as energias renováveis, especialmente o etanol. Reuniu representantes da indústria, academia e governos de todos os continentes.
Entre os temas de discussão, sustentabilidade, mercados e investimentos, tecnologia, cenários para 2020, mobilidade e o novo ciclo de crescimento para o setor sucroenergético nacional e seus impactos. Destaco uma inovação revolucionária, a do etanol de segunda geração, ou celulósico, produzido a partir de restos de plantas, como palha e bagaço de cana, e outros tipos de biomassa.
Com o surgimento das primeiras usinas de porte comercial, o interesse pelo tema se reforça. Os Estados Unidos são o principal investidor, com cerca de 70 projetos celulósicos distribuídos por 20 estados. E a primeira usina comercial brasileira, da empresa GranBio tem inauguração programada para 2014, em São Miguel dos Campos, a 60 quilômetros de Maceió (AL).
O futuro aponta para os novos usos e produtos oriundos da cana de açúcar: bioplásticos, química fina, resinas especiais, embalagens e querosene para a aviação. Todos alinhados com a economia de baixo carbono. E situa na cooperação entre os países consumidores e produtores a mais eficiente forma de avançarmos em uma agenda global para a consolidação do etanol como uma commodity internacional.
Mas é preciso que todos façam a lição de casa, começando pelas questões regulatórias, que definem as regras do jogo, condição fundamental para garantir e orientar investimentos setoriais. Hoje, por exemplo, apenas um terço dos veículos flex utiliza etanol hidratado. No último ano, enquanto o PIB cresceu menos de 1%, o aumento do consumo de combustíveis leves no Brasil chegou perto de 8%. Até 2020, estima-se incremento da ordem de 50% neste consumo, volume que terá que ser atendido, em boa medida, pelo aumento da oferta de etanol, se não quisermos que seja coberto por gasolina importada. 
Recentemente também, o Governo Federal lançou um programa de inovação para o mercado automobilístico, denominado Inovar Auto, com o objetivo de incentivar a produção de veículos com tecnologias mais avançadas e com menor consumo de combustível. Mas o programa tem uma lacuna: a falta de estímulos claros e fortes à maior competitividade para o etanol em relação à gasolina.
Correção importante de rumos – voz corrente, e recorrente, dos participantes do Ethanol Summit à qual me integro – é a definição de políticas públicas que, de fato, reconheçam as externalidades econômicas, sociais e ambientais positivas que a produção e o uso em larga escala do etanol trazem para o País. Políticas públicas bem estruturadas são um ingrediente essencial para gerar condições que incentivem um novo e longo ciclo de desenvolvimento para o setor sucroenergético.
Hoje, como bem lembra Elizabeth Farina, presidente da UNICA, certamente o setor sucroenergético está entre os mais importantes da economia brasileira, com faturamento superior a 36 bilhões de dólares, geração de divisas da ordem de 16 bilhões de dólares e mais de 1 milhão de empregos em cerca de 20% dos municípios brasileiros. O setor pode ser um dos mais importantes vetores do desenvolvimento sustentável do País, desde que balizado por incentivos corretos.
É fundamental também – ao contrário do que tem acontecido por miopia governamental – que os preços de mercado não sejam distorcidos, na direção contrária do indicado pelas externalidades positivas do etanol quando comparadas às externalidades negativas da gasolina e fator que precisa ser definitivamente amparado pelas políticas públicas tão necessárias para o nosso etanol volte a crescer!

Arnaldo Jardim - Deputado federal e
Membro da Comissão Mista Permanente do Congresso Nacional sobre Mudanças Climáticas 
Site oficial: www.arnaldojardim.com.br

quarta-feira, 3 de julho de 2013

Pesquisa do Ipea mostra que faltam médicos no país


  • Carreiras no topo do ranking têm indicadores, como a jornada de trabalho, que refletem escassez de profissionais
CRISTIANE BONFANTI (EMAIL·FACEBOOK·TWITTER)
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Na média brasileira, os médicos ganham R$ 6.940,12 e trabalham 42,03 horas por semana
Foto: Marcelo Carnaval
Na média brasileira, os médicos ganham R$ 6.940,12 e trabalham 42,03 horas por semana Marcelo Carnaval
BRASÍLIA - A medicina é a carreira de nível superior com maior desempenho trabalhista, considerando os fatores salário, jornada de trabalho, nível de ocupação e cobertura previdenciária. Na média brasileira, os médicos ganham R$ 6.940,12 e trabalham 42,03 horas por semana. A taxa de ocupação nessa profissão é de 91,81% e a de proteção trabalhista, de 90,72%. Os números fazem parte da edição especial Perspectivas profissionais – nível técnico e superior da publicação Radar, divulgada nesta quarta-feira pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
Depois de medicina, em um ranking de 48 formações de nível superior, estão odontologia; engenharia civil; engenharia mecânica e metalúrgica; serviços de transportes; estatística; engenharia elétrica e automação; engenharia (outros); setor militar e de defesa. Na base do ranking, com pior desempenho trabalhista, estão religião, filosofia, educação física e turismo.
O presidente do Ipea e ministro-chefe interino da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE) da Presidência da República, Marcelo Neri, afirmou que as carreiras no topo do ranking têm indicadores que refletem escassez de profissionais. Se a jornada é alta, disse, esse é um sinal claro de que faltam trabalhadores, o que prejudica o bem-estar dos profissionais.
- Se tudo (indicadores) é alto, esses são sinais inequívocos de que faltam aqueles profissionais. As instituições, sejam privadas, sejam públicas, deveriam direcionar esforços para essa área. Tanto é que é isso que tem sido feito tanto no caso de engenheiros quanto de medicina - afirmou.
O ministro disse que o Brasil vive um “bom problema”, o de falta de profissionais.
- É um problema melhor do que a crise de desemprego. Pleno emprego, entre aspas, é um problema, só que um bom problema. A gravidade é que para formar pessoas demora tempo - disse.
Neri afirmou que o estudo – baseado em dados do Censo Demográfico 2010 do IBGE – vem sendo desenvolvido há algum tempo e não busca subsidiar a política do governo Dilma Rousseff de atrair médicos. No entanto, ressaltou a escassez de profissionais no setor.
- Basicamente, ele mostra que, de todas as 48 carreiras consideradas, a de medicina é aquela onde há maior escassez de mão de obra. Então, é basicamente esse o resultado do estudo - afirmou.
O ministro destacou que há um desafio agora no país para a área de mobilidade urbana e que o mercado precisará de profissionais capacidades nos próximos anos.
- Profissionais ligados a serviços de transportes são sim com mais escassez. Então, é um sinal de que precisamos desses profissionais - disse.
No ranking, serviços de transporte aparecem na quinta posição. O salário médio é de R$ 4,4 mil e a jornada de trabalho, de 41,91 horas semanais. O índice de ocupação é de 89,14% e a cobertura previdenciária, de 91,47%.
Segundo Neri, o pico de ocupação no Brasil, considerando todas as carreiras e níveis de formação, se dá aos 41 anos e o de salário, aos 51 anos.
- A taxa de ocupação é mais ou menos de 80% aos 41 anos de idade. Quando (o trabalhador) tem 16 anos, é em torno de 30%. Quando tem 65 anos, é em torno de 35% - disse.
- O salário médio aos 51 anos é de R$ 1,3 mil. Na medida em que (o profissional) fica mais velho, o salário aumenta e depois cai. Mas cai muito mais a ocupação do que o salário - observou.


Leia mais sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/emprego/pesquisa-do-ipea-mostra-que-faltam-medicos-no-pais-8899950#ixzz2Y1k2rOAf
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A inútil derrubada da PEC 37, por Ives Gandra Martins

IVES GANDRA MARTINS *
Em preciso, incisivo e gráfico editorial, o Estado de 30/6 (A3) sustentou que a derrubada da PEC 37 por oportunismo político terá efeitos desastrosos. Da análise dos argumentos lá expendidos, como das manifestações inúmeras de constitucionalistas, ministros do STF - na ativa ou aposentados - e do texto da Constituição federal (CF) se percebe que, efetivamente, a decisão foi, sem maiores estudos, tomada por um Congresso acuado pela multidão, que desconhecia o que a PEC propunha.
Pessoalmente, em palestras e artigos, sempre me manifestei no sentido de que aquela proposta de emenda era rigorosamente inútil. Afirmava o que já estava na Constituição e não tirava do Ministério Público (MP) poder que nunca teve.
A polícia judiciária não é um órgão subordinado ao MP, mas ao Poder Judiciário. O artigo 144, § 4.º, da CF - cuja redação é a seguinte: "às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares" - em nenhum momento estabelece que as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais pertencem, simultaneamente, ao Poder Judiciário e ao MP. Declara apenas que são do Judiciário.
Não sem razão, o presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, desembargador Ivan Sartori, em entrevista ao Estado, declarou que a PEC 37 não pretendia retirar nada do MP, pois não se retira de alguém algo que esse alguém não tem.
As competências do Ministério Público não são idênticas às do Poder Judiciário. A Constituição federal outorga ao Judiciário o dever de julgar, correspondente ao disposto nos artigos 92 a 126 da CF (capítulo III do Título IV). Para completar as "funções essenciais à Justiça" - é esse o enunciado do capítulo IV do Título IV da Lei Suprema - prevê que duas instituições conformam o tripé da prestação jurisdicional, a saber: o Ministério Público (artigos 127 a 132) e a advocacia (artigos 133 a 135).
Estão em igualdade de condições. Numa democracia, o MP tem a função principal de acusador, em nome da sociedade, e a advocacia, a função de defendê-la. Por essa razão, como cláusula pétrea, imodificável, o constituinte garantiu que a defesa, nos processos administrativos e judiciais, deve ser ampla (artigo 5.º, inciso LV). O uso de adjetivo com tal densidade ôntica não foi despiciendo, mas garantia absoluta de que tal direito, o de defesa, é um dos sustentáculos de um regime democrático, posto que inexistente nas ditaduras. Por isso tal disposição é cláusula pétrea da Carta Magna, não podendo ser alterada nem por emenda constitucional (artigo 60, § 4.º, inciso IV).
As funções dessas duas instituições são, pois, iguais (advocacia e Parquet) e dependem do Poder Judiciário para a solução dos conflitos.
Ora, o delegado é membro da polícia judiciária. Não é polícia do MP. Por essa razão, deve presidir o inquérito policial, devendo remeter suas conclusões ao magistrado, a que se subordina, e não ao titular do direito de acusar. Este, pela própria Constituição, pode requisitar investigações aos delegados e acusar os delegados suspeitos de prevaricação (artigo 129, incisos VII e VIII) - não mais que isso, visto que são parte nas investigações e não podem ser "parte" e "juiz" ao mesmo tempo.
Assim é que a própria Lei 12.830, de 20/6/2013, regulamentadora da investigação criminal, dispõe que as funções de polícia judiciária e de apuração de infrações penais são exercidas exclusivamente pelos delegados (artigo 2.º), cabendo-lhes a condução da investigação criminal (§ 1.º do artigo 2.º). Como se percebe, nunca estiveram os membros do MP incluídos entre os que podem dirigir a investigação. A própria lei mencionada diz que não estão, referindo-se apenas aos delegados. Até porque, se os tivesse incluído, a lei seria inconstitucional.
Por essa razão, constitucionalistas do porte de José Afonso da Silva, Nelson Jobim, Cezar Peluso e Marco Aurélio Mello já se manifestaram no sentido de que não cabem ao Ministério Público funções policiais, até porque não é preparado para tanto. Os delegados, sim. Os membros do Parquet têm outras funções - relevantíssimas -, que estão explicitadas no artigo 129 da Carta Suprema do País.
Como se percebe, a derrubada da PEC 37 nada representou, pois o artigo 144, § 4.º, da Lei Suprema não foi alterado, continuando a prever que a polícia judiciária - não o MP - é constituída apenas por delegados de carreira, os únicos com competência constitucional para conduzir as investigações criminais.
O acuado Congresso, que pouco antes aprovara lei na linha da PEC 37 a fim de atender ao clamor da multidão, que desconhecia o tratamento constitucional e legal do tema, derrubou a desnecessária proposta. Aprovada ou não, não modifica a clareza do artigo 144, § 4.º, da CF, ao estabelecer que apenas aos delegados cabe a apuração de investigação criminais.
Termino este breve artigo reiterando que o Ministério Público deve cuidar de suas relevantes funções, e não pretender invadir funções de outras instituições, para as quais não são devidamente preparados promotores e procuradores.
O povo foi às ruas contra a corrupção. O MP declarou que a PEC 37 era a PEC da Corrupção, como se todos os delegados fossem corruptos e todos os membros do MP, vestais. E o povo, contrário à corrupção, pensou ser verdade a marqueteira afirmação. Como o tempo é o senhor da razão, e como a Constituição não foi mudada, à evidência continuam os delegados a ser os representantes do Poder Judiciário e continuarão os membros do MP sem competência para conduzir as investigações criminais, a teor do que dispõe o artigo 144, § 4.º, da Lei Suprema. Cumpre-lhes, todavia, exercer suas relevantes funções, que não são poucas, em prol da sociedade. Mas apenas estas (artigo 129).
* IVES GANDRA MARTINS É PROFESSOR EMÉRITO DA UNIVERSIDADE MACKENZIE, DAS ESCOLAS DE COMANDO E ESTADO-MAIOR DO EXÉRCITO, SUPERIOR DE GUERRA E DA MAGISTRATURA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL – 1ª REGIÃO.