quarta-feira, 17 de dezembro de 2025

Maria Hermínia Tavares - Nem crise, que dirá institucional, FSP

 "Os rumores sobre minha morte foram muito exagerados", protestou o escritor americano Mark Twain (1835-1910) em um bilhete ao jornalista que publicara a "barriga".

A ironia vem à mente quando se multiplicam os vaticínios sobre o destino do sistema vigente de governo —o presidencialismo de coalizão. A cada embate mais duro entre o Executivo e o Congresso, ou a cada medida do Supremo Tribunal Federal a exorbitar de suas atribuições, decreta-se a crise, —talvez irreversível— de nosso arranjo institucional, promessa certa de ingovernabilidade.

As análises mais bem acabadas apontam para a possível perda de capacidade do Executivo de ditar a agenda legislativa. Esse desfalecimento seria provocado, seja pela expansão dos poderes do Legislativo, propelida por emendas parlamentares e vultosos recursos do Fundo Partidário; seja ainda pela expansão imoderada do ativismo da Suprema Corte.

O enfraquecimento da Presidência e sua incapacidade de coordenar os outros dois Poderes estariam desarticulando as engrenagens do governo, o que entregaria o país ao deus-dará. O cenário contrasta com o período 1994–2014, quando o predomínio da Executivo teria proporcionado funcionalidade ao sistema, ao longo dos mandatos de Fernando Henrique e de Lula e ainda, pelo menos, nos anos iniciais do primeiro governo de Dilma Rousseff.

O diagnóstico é de desarranjo institucional a indicar, na opinião de alguns cientistas políticos e da maioria de respeitados comentaristas da imprensa, o esgotamento do presidencialismo multipartidário. Talvez essa conclusão seja algo exagerada, diria Mark Twain.

Várias pessoas em terno e roupas formais se abraçam e comemoram em plenário de assembleia. Muitos seguram celulares para registrar a celebração, enquanto alguns erguem os punhos. Bancadas de madeira e cadeiras pretas compõem o ambiente.
Deputados na sessão sobre a cassação do deputado Glauber Braga (PSOL-RJ) - Pedro Ladeira/Folhapress

É certo que o Executivo viu minguar seus instrumentos para manter curta a rédea de sua coalizão de apoio no Congresso. Tampouco se negará que a Corte Suprema se tornou bem mais atuante, embora sempre provocada pelos partidos, organizações da sociedade, governos subnacionais ou ainda em sintonia com o Palácio do Planalto.

Mas dois fatores que pouco têm a ver diretamente com o desenho institucional da República tornam as relações entre Executivo e Legislativo especialmente complicadas nesta quadra.

O primeiro é a dissintonia entre as preferências do Executivo, com sua agenda de centro-esquerda, ante um Congresso de maioria conservadora, com estridente minoria de extrema direita e lideranças menos tarimbadas nas duas Casas. O segundo fator é a incerteza diante das eleições presidenciais de 2026, o que afeta o comportamento da direita pragmática, dominante no Senado e Câmara: nem ela rompe com o governo nem embarca nos planos de reeleição de Lula.

De toda forma, apesar das circunstâncias, as decisões do Congresso não avalizam o diagnóstico de ingovernabilidade. Sim, o Executivo sofreu derrotas e viu derrubados muitos de seus vetos em 2025. Mas tem a perspectiva de vitórias importantes com a aprovação da reforma do Imposto de Renda —o maior programa redistributivo já concebido no país; com o Plano Nacional de Educação; com o projeto de Lei Antifacção, todos tramitando; e da Lei do Devedor Contumaz, à espera de sanção presidencial.

O presidencialismo de coalizão, tão antigo quanto a democracia brasileira, parece longe do definhar. Ele está se transformando.

Lula diz que ministros terão que definir lado na eleição e que 2026 será 'hora da verdade, FSP

 Catia Seabra

Brasília

O presidente Lula (PT) afirmou nesta quarta-feira (17) que seus ministros e respectivos partidos precisarão decidir de qual lado estarão na eleição de 2026, chamada por ele de "hora da verdade".

Durante reunião ministerial, o petista também disse que o governo ainda não conseguiu construir a narrativa correta para alcançar a população e que a polarização política dificulta o convencimento do eleitorado.

"Ano que vem é o ano em que a gente tem a oportunidade, não só porque estaremos em disputa, mas porque cada ministro, cada partido que vocês participam vai ter que estar no processo eleitoral e vai ter que definir de que lado tá. Será inexorável as pessoas definirem o discurso que vão fazer. Eles vão ter que defender aquilo que eles acham que podem elegê-los", disse.

Quarenta e uma pessoas posam para foto oficial em área gramada com árvores ao fundo. A maioria veste ternos escuros, com algumas mulheres usando vestidos ou terninhos coloridos. Três palmeiras altas estão atrás do grupo.
Lula posa com ministros na última reunião com sua equipe, na Granja do Torto - Adriano Machado/Reuters

"Importante que a gente tenha noção que nós precisamos fazer com que o povo saiba o que aconteceu nesse país. Eu tenho a impressão que o povo ainda não sabe. Eu tenho impressão que nós ainda não conseguimos a narrativa correta para fazer com que o povo saiba."

Em sua intervenção, a ministra das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, recomendou a exoneração dos ocupantes de cargos de segundo e terceiro escalões que trabalhem por uma candidatura adversária nas próximas eleições.

Segundo relatos, a ministra afirmou que, em um primeiro momento, para garantir a governabilidade, foi admitida a permanência desses indicados. Mas, com a proximidade das eleições, não será possível manter quem estará em outras trincheiras.

Ela também condenou apoio ao projeto que prevê redução de pena para participantes de atos golpistas. Segundo ela, seria um estímulo a futuras tentativas de golpe à democracia.

Para dar ênfase à disputa do ano que vem, Lula e seus ministros apresentaram quadros comparativos críticos ao governo Jair Bolsonaro (PL).

O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), filho mais velho do ex-presidente, lançou sua pré-candidatura ao Planalto, e o governo quer reforçar o enfrentamento contra o bolsonarismo.

"O dado concreto é que o ano eleitoral vai ser o ano da verdade. Ou seja, temos que criar a ideia da hora da verdade para mostrar quem é quem nesse país, quem faz o que nesse país, o que aconteceu antes de nós", declarou Lula na reunião.

O presidente também afirmou que determinou que fossem feitos estudos a respeito de programas sociais de "possíveis adversários", citando os governadores de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), de Goiás, Ronaldo Caiado (União), do Paraná, Ratinho Jr. (PSD), e de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo).

"Eu não tenho nenhuma preocupação de competir. Sinceramente, perto de nós, eles [governadores] não fizeram nada. Esse é o dado concreto", declarou. Ele defendeu que é preciso discutir o que a gestão pretende construir "no próximo período".

"O que nós precisamos é construir um projeto. Eu, de vez em quando, me pergunto: para que que eu vou ser candidato outra vez? Para fazer o mesmo que eu estou fazendo ou eu tenho que ser candidato para fazer outra coisa? Eu vou ser candidato para todo mês ficar discutindo déficit fiscal? Para todo mês ficar discutindo corte no Orçamento? Não preciso disso. Qual é o salto de qualidade que a gente vai dar? Onde é que a gente quer chegar?", declarou.

O recado do presidente ocorre após meses de ruídos com os partidos do centrão, grupo que tem ministros na Esplanada e que pode apoiar adversários de Lula na disputa, como os governadores Tarcísio e Ratinho Jr.


A reunião ministerial foi realizada na Granja do Torto, a casa de campo oficial da Presidência. Neste encontro periódico, que costuma ocorrer pelo menos duas vezes por ano, o presidente reúne seus ministros para fazer um balanço das entregas do governo.

Esta é a terceira reunião ministerial do ano. A primeira, foi realizada em janeiro e a última, em agosto, quando as tarifas impostas pelos Estados Unidos ao Brasil estavam entre as principais preocupações da gestão.

Comunicação

No encontro, Lula também cobrou que seus ministros adotem uma comunicação mais clara e criticou a divulgação de informações com documentos que "ninguém vai entender".

"Precisamos ter um esforço muito grande, todos os ministros têm que conhecer todas as políticas", disse. "Se a gente tiver o conhecimento do todo, fica muito mais fácil de a gente trabalhar para o governo, que não é o governo do Lula. Vocês falam 'o governo do presidente Lula', dá a impressão que vocês não são governo", declarou.

Mauricio Stycer - Descrição de chapéuSBT SBT News, canal de notícias em nome do pai, FSP

 Com enorme atraso em relação a seus concorrentes, o SBT estreou nesta segunda-feira (15) um canal na TV por assinatura dedicado exclusivamente a notícias. O SBT News chega para buscar espaço num mercado que vem diminuindo de tamanho há anos e já conta com pelo menos cinco canais dedicados ao mesmo nicho. Quem acompanha tanta notícia?


Não surpreende ninguém que o lançamento do novo canal só tenha ocorrido após a morte de Silvio Santos (1930-2024) –um ano e quatro meses depois, exatamente. Ao longo de toda a sua trajetória como empresário de comunicação, ele raramente fez investimentos significativos em jornalismo.

Silvio achava que o custo do jornalismo e a audiência alcançada não compensavam o investimento. Também entendia que era um fator de aborrecimento, em função das reclamações e pressões que recebia. Diferentemente de outros empresários do ramo, não tinha prazer em usar o noticiário como uma ferramenta de poder. Como sempre deixou claro, Silvio achava mais conveniente elogiar políticos e empresários do que criticá-los.


Seu mantra era: "Jamais, na minha televisão, enquanto eu mandar, enquanto eu for dono, vai ter crítica. Só elogio. Só notícia, o fato. Não gosto que critiquem o presidente, o pedreiro, o farmacêutico, o faxineiro. Por que procurar só defeitos?". Ou, na formulação mais famosa, feita nesta Folha: "Eu sou um concessionário, um 'office boy' de luxo do governo".

Sem Silvio, o SBT está sob o comando de uma de suas filhas, Daniela Beyruti. Foi ela que deu sinal verde ao bem articulado Fábio Faria para desenvolver o projeto do SBT News. Casado com Patrícia Abravanel, outra filha de Silvio, Faria foi deputado federal de centro-direita por quatro mandatos e, em junho de 2020, assumiu o Ministério das Comunicações do governo Bolsonaro.

O então presidente, na ocasião, entregou: "Vamos ter alguém que não é um profissional do setor, mas tem conhecimento até pela vida que tem junto à família do Silvio Santos. É uma pessoa que sabe se relacionar e vai dar conta do recado".

Como se sabe, Silvio Santos cultivou a imagem de apolítico e bajulou, desde Médici, todos os presidentes da República. Mas é fato que manifestou um entusiasmo acima da média com Jair Bolsonaro. Pouco depois da eleição de 2018, falou na TV que esperava oito anos de governo com Bolsonaro e oito anos com Sergio Moro. "O país vai ter 16 anos de um bom caminho. Peço a Deus que isso se realize."

Silvio recebeu Bolsonaro em casa algumas vezes, participou de um Sete de Setembro ao lado do presidente, em Brasília, e abriu o SBT para participações de toda a entourage governista, incluindo largo espaço para os filhos 01 e 02 e todos os ministros.


A festa de inauguração do novo canal, na sexta-feira passada (12), causou espanto pela exibição de um holograma com a imagem e a voz de Silvio, criadas por IA, atribuindo a ele elogios públicos a essa iniciativa de seus herdeiros, algo difícil de acreditar que ele faria: "Hoje, a informação correta e profissional é essencial para ajudar as pessoas a crescerem, a conviverem bem umas com as outras e deixar o país mais forte".

Como ocorre sempre em eventos desse porte, a inauguração do SBT News contou com a presença de autoridades de todos os Poderes. O presidente Lula e o ministro Alexandre de Moraes, vice-presidente do STF, discursaram, fazendo menções a um fato ocorrido naquele dia, a revogação do nome de Moraes da lista de sancionados pela Lei Magnitsky.

Para os bolsonaristas mais fanáticos, a cerimônia causou enorme dor. Foi vista como uma traição do SBT ao ex-presidente. Freud explica. Na verdade, se houve alguma traição, foi a Silvio Santos.