Cerca de um ano atrás, o senador Aécio Neves (MG), então presidente do PSDB e um dos expoentes do governismo, dizia que era preciso “salvar a política”.
No contexto da época, tratava-se de fixar a distinção entre as práticas de fato corruptas e a aceitação costumeira de dinheiro privado para campanhas eleitorais, mesmo que por meio de caixa dois.
Se tudo o que se investigava pela Lava Jato parecesse o mesmo aos olhos da opinião pública, argumentava, haveria um descrédito geral que abriria caminho para alguma regressão populista —a ascensão de um “salvador da pátria”.
Sua tese, ainda que discutível, mostrava-se pertinente; sua conduta, entretanto, o desmoralizou.
Em maio de 2017 veio à tona a estarrecedora e controversa delação da JBS, da qual constava diálogo gravado em que o tucano mineiro pediaR$ 2 milhões a Joesley Batista, em 24 de março daquele ano.
Documentaram-se fatos incontestáveis, que cumpre recordar. Na conversa, enquanto se discute a transação, o empresário faz uma indicação para a presidência da Vale —que, embora seja companhia privada (desestatizada em 1997), tem fundos de pensão de estatais entre seus controladores.
O tucano responde que não poderia atender ao pleito, pois já teria cuidado de tal nomeação —o que já seria escandaloso. Mas parece deixar a porta aberta para outros favores: “a Vale é um mundo”.
Acertam-se os detalhes para a entrega do dinheiro, que é feita, em espécie, a um primo do político; alguns passos adiante, recursos chegam a empresa ligada à família de um colega de Senado.
Tanto tempo depois, permanecem insuficientes e pouco convincentes as justificativas apresentadas para tão tortuosa transação.
Aécio Neves afirma ter havido nada mais que um negócio privado, um empréstimo para o pagamento de advogados, como repete em artigopublicado na segunda (16) por esta Folha.
Se era assim, por que tantos expedientes heterodoxos, todos claramente destinados a acobertar a origem e o destino da soma?
Nem se fale na intimidade, demonstrada em risos e termos chulos, com procedimentos nada republicanos e um empresário sob investigação da Polícia Federal.
O Senado omitiu-se de modo vergonhoso ao não instaurar procedimento para esclarecer o episódio; o PSDB foi igualmente pusilânime, deixando de cobrar mais explicações de seu ex-dirigente.
Estas devem ser prestadas agora ao Supremo Tribunal Federal, cuja primeira turma decidirá se torna Aécio Neves réu sob as acusações de corrupção e obstrução da Justiça. Se o político mineiro deseja provar sua inocência, esta é a oportunidade de fazê-lo. O que não se pode mais é procrastinar o exame do caso gravíssimo.