Foram as mudanças institucionais aprovadas pelo Congresso Nacional que deram ao Ministério Público e à Polícia Federal os instrumentos para realizarem com eficiência as suas missões. Eles são produtos da atividade política. Revelaram-se importantes para a desmontagem do incesto entre “políticos” do Executivo e do Legislativo e gigantescas organizações do setor privado.
A Operação Lava Jato é um processo de aprendizado da utilização concreta daqueles instrumentos, o que talvez explique alguns dos seus excessos. Mas não se deve esquecer que foi por obra da política e dos mecanismos que ela criou que a operação pode transformar-se em um ponto de inflexão na história do Brasil. Depois dela, o país nunca mais será o mesmo.
Causou alguns inconvenientes de curto prazo, mas abriu uma ampla avenida de cooperação legítima e ética entre o Estado e o setor privado em um jogo cuja soma, a experiência histórica mostra, é positiva. Adicionou um elemento permanente à nossa capacidade de construir um desenvolvimento econômico robusto, inclusivo e sustentável.
É lamentável que na situação em que nos metemos passou-se a condenar o exercício da política, e não os “políticos” que a produziram. Isso é um erro que pode dar lugar a aventureiros e propostas de mudanças radicais que sempre terminam no caos.
É evidente que todas as acusações devem ser tecnicamente analisadas com a presunção de inocência e amplo direito ao contraditório. E, se houver provas objetivas, os malfeitos deverão ser adequadamente apresentados ao juízo.
Não se discute: na República ninguém é inimputável, nem delatores nem delatados. Nem mesmo os acusadores de ofício, se for provado algum abuso de conduta.
O momento é grave. Parece plausível, portanto, que o Supremo Tribunal Federal —que sacralizamos na Constituição —, como o “garante” do equilíbrio da independência e harmonia entre os Poderes da República e da paz social da nação, paute a sua ação ponderando cuidadosamente as consequências de longo prazo de suas decisões, pois, como ensinou Tomás de Aquino, “a prudência é mãe de todas as virtudes”.
A teatralização exagerada da judicialização da atividade política e a consequente politização da Justiça das últimas duas semanas aumentaram de tal maneira a pressão sobre o Executivo que nenhum burocrata se dispõe a assinar um papel sem antes submetê-lo a uma consulta ao Ministério Público ou ao Tribunal de Contas da União, uma séria ameaça à democracia.
Suspeito que esse “imbróglio” pode nos levar à estagnação econômica e tornará o Brasil ainda mais precariamente administrável do que já é hoje.
Antonio Delfim Netto