É a candidatura que visa interditar, no grito, as investigações contra ele
Vera Magalhães
05 Março 2017 | 03h08
A semana promete ser tomada pelo “lançamento” da sexta candidatura de Luiz Inácio Lula da Silva à Presidência. O pontapé inicial foi um manifesto “espontâneo” assinado pelos intelectuais de cabeceira do petismo, e que dará origem a um site e um road show do ex-presidente e réu na Lava Jato pelo País. O título do abaixo-assinado é “Por que Lula?”.
Está aí uma boa pergunta, mas a resposta está longe de ser o misto de ingenuidade, desonestidade intelectual e manipulação contidos no documento.
Por que Lula? Por que o Brasil precisa dele ou por que ele precisa dessa candidatura como escudo para se defender das acusações de que, no exercício da Presidência e depois de deixá-la, praticou corrupção passiva, tráfico de influência, lavagem de dinheiro e outros crimes investigados no petrolão?
O calendário do lançamento de Lula coincide com a reta final de um dos processos nos quais o petista é réu, sob a acusação de ter recebido propina de até R$ 3,7 milhões na forma de “mimos” da OAS, que reformou um triplex no Guarujá que seria ofertado à sua família e pagou pela guarda das “tranqueiras” que ele carregou quando deixou o Alvorada.
Lula vai depor em maio diante do juiz Sérgio Moro. Até lá, deve rodar o País entoando a cantilena de que é vítima de perseguição política e de que os processos nada mais são do que uma tentativa de tirá-lo da vida pública e impedir uma nova candidatura.
Não será o contrário? Lula nunca desejou de fato ser candidato novamente à Presidência. Não o fez quando teve a faca e o queijo na mão: petistas como Rui Falcão e Marta Suplicy lançaram o “volta Lula” em 2014, e ele não o levou adiante.
Não foi em respeito a Dilma Rousseff que ele deixou de ser candidato. Lula desistiu porque não podia vislumbrar a possibilidade – na época, ainda bastante remota – de não ser eleito nem a perspectiva, esta bem concreta, de fazer um governo pior do que os anteriores.
Por que, então, teria mudado de ideia agora que é réu em cinco ações penais, o PT foi varrido do mapa nas eleições municipais, Dilma sofreu impeachment e a economia está em frangalhos? Altruísmo? Senso de dever para com aqueles que o PT diz ter incluído e que voltaram à miséria?
Talvez Chico Buarque ou Leonardo Boff acredite de fato nisso, embora seja espantoso.
A desigualdade social e o desemprego galopam no País por obra e graça dos governos Lula e Dilma. Ele por não ter aproveitado o vento favorável na economia mundial que vigorou até 2009 para fazer as reformas que eram necessárias. Ela por se lançar na tal “nova matriz econômica”, que nada mais era do que desculpa para abraçar a irresponsabilidade fiscal como se não houvesse amanhã.
A Lava Jato nada mais é do que a resposta da Justiça a um esquema de desvio de recursos públicos sem precedentes, montado de forma deliberada e reiterada pelos governos do PT – neste caso mais dele do que dela – para sustentar um projeto de poder que era para durar ao menos 20 anos.
O fato de Lula responder agora pelos crimes dos quais é acusado não é perseguição política, mas consequência do amadurecimento democrático e institucional do Brasil. Não à toa, os defensores do ex-presidente falam em “Justiça para todos e para Lula”, sem esconder a pretensão a que o cacique petista seja beneficiado por uma indulgência que não se destinaria a “todos”, só a ele.
É esse o desejo indisfarçado que transborda do texto dos “intelectuais” lulistas. O por que Lula, aqui, parece pressupor um complemento: por que Lula tem de responder como qualquer mortal perante a Justiça?
Portanto, não é a Lava Jato que quer impedir a candidatura do petista. É a candidatura que visa interditar, no grito, as investigações contra ele. Por que Lula? Por que não ele?