domingo, 8 de maio de 2016

Teori (Indiana Jones) Zavascki - ELIO GASPARI


O GLOBO - 08/05

Dizer que existe qualquer semelhança entre a figura publicamente sorumbática do ministro Teori Zavascki e Indiana Jones (Harrison Ford no filme) é coisa tão surpreendente quanto a notícia da manhã de quinta-feira de que ele suspendera o mandato de deputado do poderoso Eduardo Cunha.

Quem quiser usufruir 14 segundos de alegria poderá captar a essência do que aconteceu no Supremo Tribunal e na política brasileira. Basta ir à rede para ver (ou rever) a cena do confronto de Indiana Jones com o beduíno de roupas pretas. Pelo roteiro de George Lucas, Indiana Jones e o gigante duelariam. Um com seu chicote e o outro com uma adaga. Antes da filmagem, Harrison Ford propôs: "Vamos dar um tiro no otário". E assim produziu uma das melhores cenas da História do cinema.

Pelo roteiro de Brasília, o STF deveria dizer se Cunha, como presidente da Câmara, estava ou não na linha sucessória. Seria um duelo do chicote com a adaga. Para surpresa do país e até mesmo de alguns ministros do Supremo, Teori Zavascki sacou o revólver e suspendeu o mandato de Eduardo Cunha.

O voto de Teori teve 79 páginas e nele listou uma dezena de malfeitos de Cunha. Desde tramas complexas a episódios comezinhos. Por exemplo, a polícia achou no bolso de seu paletó cópias de boletins de ocorrências relacionados com o deputado que relatava seu processo na Comissão de Ética da Câmara. Essas minúcias apenas confirmam o que todo mundo sabe, mas dezenas de maganos fingem desconhecer: o relator da Lava Jato sabe muito, sabe coisas que o segredo de Justiça ainda protege. Teori construiu o cadafalso com paciência e método. Na hora certa, sacou e atirou. Se a bancada de Cunha na Câmara fosse menos audaciosa, teria apressado o seu julgamento no plenário. Agora marchará heroicamente para um vexame.

O beduíno da cena do filme podia ver que Indiana Jones tinha um revólver no coldre, mas acreditou na própria invencibilidade. No caso da turma de Cunha, acreditaram que em filme de Brasília ninguém mexe no roteiro.

Os dois mundos de Michel Temer

Na noite de quarta-feira o presidente da Câmara dos Deputado, Eduardo Cunha, estava na casa do Jaburu, onde o vice-presidente Michel Temer vivia o esplendor da expectativa do poder. Na manhã seguinte Temer soube que o condestável do PMDB fora mandado para o estaleiro. À tarde, por unanimidade, o STF confirmou o relatório do ministro Teori Zavascki.

Em menos de 24 horas Temer viu a diferença dos dois países em que vive. Num, é o príncipe de uma oligarquia política e empresarial. Noutro, chegará à Presidência levado por dois fatores estranhos e hostis aos marqueses. Nele estão a rua e a Operação Lava Jato.

No mundo das armações de Brasília, Temer poderá entregar o ministério da Ciência e Tecnologia ao pastor Marcos Pereira, presidente do PRB (a sigla significa Partido da República Brasileira). No Brasil real, a neurocientista Suzana Herculano-Houzel, da UFRJ, vai-se embora para a Universidade Vanderbilt levando o que sabe e seus cachorros. No mundo real, Temer assumirá um país com três epidemias (dengue, zika e H1N1). No das tramas, não conseguiu colocar o cirurgião Raul Cutait no Ministério da Saúde porque a pasta pertence ao Partido Popular, que não gostou da ideia. Ganha uma viagem a Porto Seguro quem achar o trecho da carta de Caminha em que ele diz que a saúde pertence ao PP.

Há uma mudança em curso no Brasil, e o ministro Teori Zavasckimostrou isso. Há pessoas que não percebem os tempos em que vivem. D. Pedro II foi banido, Washington Luiz, deposto, e João Batista Figueiredo, esquecido.

Erundina

Num dia em que aconteceram coisas inesperadas para a métrica da república de bananas, Eduardo Cunha foi afastado da Câmara e seu sucessor, Waldir Maranhão (PP-MA), decidiu suspender a sessão da Câmara dos Deputados. O doutor, ilustre freguês da Lava Jato, transformou o plenário no único lugar onde não se deveria discutir a decisão de Teori Zavascki.

A deputada Luiza Erundina, de 81 anos, sentou-se na cadeira de Eduardo Cunha e conduziu uma sessão que poderia ser chamada de informal.

Erundina tem estrela. Em 1988 ela disputava a Prefeitura de São Paulo. Paulo Maluf era favorito e o eleitorado descontente estava sem rumo. Uma semana antes da eleição ela estava em terceiro lugar na pesquisas. Na noite do dia 9 de novembro uma tropa do Exército invadiu a usina de Volta Redonda, matando três trabalhadores. No dia 15 Erundina foi eleita.

A senhora deverá ser candidata à Prefeitura de São Paulo pelo PSOL.

Brasil na boa

Nem tudo é má notícia a respeito do Brasil. O museu Metropolitan de Nova York abriu uma exposição de 60 porcelanas chinesas da coleção do empresário brasileiro Renato Albuquerque. São peças dos séculos XVI ao XVIII, uma pequena porção do tesouro de 1.600 itens do fundador da construtora Albuquerque Takaoka. Ela criou Alphaville, o primeiro grande condomínio para a classe média-alta nacional.

Colecionando por prazer, Albuquerque fica longe dos holofotes.

Até essa exposição falava-se apenas na "Coleção RA".

A exposição do Met vai até agosto.

Cuidado
O doutor Alexandre Tombini ou quem quer que venha a ser o novo presidente do Banco Central devem tomar todo cuidado com possíveis movimentos da instituição na área do câmbio.

A conta é simples. Se uma empresa jogou com a alta do dólar, por mais que a queda de sua cotação não interesse ao BC, a intervenção, por melhor intencionada no aspecto geral, acaba beneficiando especificamente quem apostou no dólar caro.

Grosseiramente, em 1998 o notório banqueiro Salvatore Cacciola estava nesse tipo de jogo, apostando no dólar barato. A ação do BC acabou dando-lhe um refresco e diretores de impecável honradez comeram o pão que Asmodeu amassou.

O passado ensina, o presente inquieta e o futuro frita.

Blindagem

Henrique Meirelles blindou sua posição no Ministério da Fazenda.

Se a escolha do doutor dará certo ou errado, não se pode dizer, mas é garantido que sem a blindagem ele não teria chance de êxito.

Teste

Saber o que vai acontecer é coisa de cartomante. Apesar disso, sempre pode-se medir a capacidade de uma pessoa de pensar o impensável.

Aqui vai um teste primitivo. Tem cinco afirmações. Quem previu uma delas, é ousado. Quem previu duas é um temerário. Quem previu todas pode abrir uma tenda de cartomante:

1- Dilma Rousseff não terminaria o mandato.

2- Eduardo Cunha perderia a cadeira.

3- Marcelo Odebrecht iria para a cadeia.

4- Leo Pinheiro da OAS colaboraria com a Lava Jato.

5- Alemanha 7, Brasil 1.

Quem foi surpreendido em todos os casos é apenas um brasileiro normal. Os tempos é que estão emocionantes.

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