quarta-feira, 2 de abril de 2025

Deirdre Nansen McCloskey - Os homens do sistema não sabem, FSP

 Um otimismo maluco sobre a "política industrial" parece nunca deixar a humanidade em paz.

Nos anos 1700, o soberano inglês e o Parlamento tinham esse otimismo. Aplicaram impostos para proteger seus navios e as perturbações ligadas ao açúcar nas Índias Ocidentais. Adam Smith chamou aquilo de "sistema comercial", também conhecido como imperialismo, e escreveu longo livro em 1776, atacando-o.

Em um livro anterior, ele já havia desdenhado com razão da ideia de que a política industrial funciona para o bem. O "homem do sistema", encarregado da política, escreveu, "parece imaginar que pode organizar os diversos membros de uma grande sociedade com a mesma facilidade com que a mão organiza as diferentes peças em um tabuleiro de xadrez".

Os brasileiros infelizmente estão familiarizados com a política industrial. Mas está por toda parte essa suposição de que o "homem do sistema" sabe.

Mark Carney, por exemplo, primeiro-ministro interino do Canadá, que provavelmente terá o mandato completo após as eleições, propõe uma política industrial para alcançar a "autonomia" contra as agressões bizarras de Trump. Ele quer mover as peças de xadrez para proteger o aço e o alumínio canadenses, a fabricação de carros, a extração de madeira e vários outros produtos "estratégicos".

Carney é, ao menos na superfície, plausível, como o "homem do sistema", capaz de fazer esse trabalho. Ele presidiu o Banco do Canadá e depois o Banco da Inglaterra. Mas altos cargos na política não tornam a política industrial sensata.

Mark Carney em pub em Ontário, Canadá - Cole Burston/Getty Images via AFP

Peter Navarro, conselheiro de Trump em comércio exterior, é Ph.D. em economia por Harvard. O doutor Navarro, porém, acredita que o comércio de autopeças EUA-Canadá é ruim para os dois países.

Ele acha que o déficit da "balança comercial" que uma pessoa tem com o mercadinho do seu bairro é ruim para ela e que o papel importado do Canadá é ruim para os EUA. Ele não estudou "Introdução à Economia". Estou tentando reunir outros economistas com Ph.D. em Harvard para devolver seus diplomas em protesto contra ele.

Meu único encontro com Carney foi quando me pediram, anos atrás, para comentar uma tese sua. Fiquei surpresa com seu pequeno entendimento de economia, apesar do doutorado em filosofia em Oxford e do bacharelado no Harvard College (ele era o goleiro do time de hóquei no gelo de Harvard). Mas ele é muito bom ao articular a afirmação dos "homens do sistema" quando estes dizem saber, melhor que você, o que você deve comprar no mercadinho. As pessoas comuns têm uma fé comovente na sabedoria dos mestres. É como a fé das crianças em seus pais —até elas se tornarem adolescentes.

Brasil, Canadá, EUA, qualquer país, de Mianmar à Suécia, não se livrará das más políticas até que seus cidadãos percebam que os "homens do sistema", e mesmo a maioria das mulheres, não sabem. Por razões profundas, uma economia é imprevisível e não pode ser dirigida. Se não pode ser dirigida, uma política de direção nos levará para fora da estrada.

A melhor política é tirar o "homem do sistema" do volante. É o que Javier Milei tenta fazer aí ao vosso lado e o que o Canadá deveria fazer aqui ao meu lado.

Carta aos bispos católicos do Brasil, por Frei Betto

 O catolicismo era, no Brasil, a confissão religiosa majoritária na década de 1950, abraçada por 93,5% da população (IBGE). No censo de 2010, declararam-se católicos 64,6% da população. Os evangélicos, 30%. Em 2030, segundo prognósticos, os católicos serão de 35 a 40% da população e os evangélicos, de 38 a 40%. Enquanto os católicos declinam 1 ponto percentual ao ano, os evangélicos crescem na mesma proporção.

Por que o catolicismo retrocede? São várias as razões. A hierarquia católica cometeu dois pecados capitais nos últimos 60 anos: fragilizou o apoio às comunidades eclesiais de base  o movimento eclesial mais expressivo da história da Igreja no Brasil e de maior capilaridade nacional.

Mas o primeiro pecado foi, após o golpe militar de 1964, levar a Ação Católica à agonia e morte. Onde se encontra, hoje, o laicato participativo, crítico, apostolicamente ativo entre operários, universitários e intelectuais? Aliás, nossas universidades católicas evangelizam? Em muitas delas se formaram notórios políticos corruptos e legitimadores da opressão social.

De fato, o clero sempre temeu o protagonismo dos leigos. Devem ser apenas cordeiros cuja lã serve para ser tosquiada pelos pastores, como declarou o papa Inocêncio III.

Por que, em nossas missas dominicais em paróquias de classe média, os patrões comparecem, mas seus empregados (cozinheiras, faxineiras, porteiros de prédios etc.) vão para a igreja evangélica? Diz-se que a Igreja Católica fez opção pelos pobres, e os pobres, pelas igrejas evangélicas...

Aponto algumas causas da redução de nossa grei. Uma delas, com frequência denunciada pelo papa Francisco, é o clericalismo. Vide uma missa dominical. Tudo centrado na figura do sacerdote. Quando muito, um leigo ou leiga lê um dos textos litúrgicos. Os fiéis ignoram uns aos outros. No “abraço da paz” saúdam os vizinhos de banco sem nem sequer perguntar pelos nomes deles. Na hora da homilia, por vezes suportam a pregação aborrecida de um celebrante que nunca fez curso de oratória, não tem conteúdo (não lê e teve formação medíocre em filosofia e teologia), adota um discurso moralista. Procura se salvar com evocações emotivas porque não sabe como abastecer “as razões de nossa esperança”.

Sei que a maioria dos senhores jamais participou de um culto evangélico. Nosso ecumenismo não ultrapassa os limites de algumas igrejas protestantes históricas. O que é uma lástima. Os seminaristas não são incentivados a abraçar o diálogo inter-religioso e, em geral, têm visão preconceituosa das outras confissões religiosas. O que sabem de nossas religiões indígenas? Alguma vez foram a um terreiro de candomblé ou umbanda? Ou a um centro espírita? A maioria ignora as matrizes da religiosidade brasileira.

Se os senhores bispos fossem a um culto evangélico veriam os motivos do crescimento exponencial desse segmento cristão. Há cultos que duram duas ou três horas sem aborrecer os fiéis, ao contrário de muitas de nossas missas. Sabem por quê? Porque os fiéis têm participação ativa. Dão testemunhos de vida, vídeos atrativos são exibidos, os músicos e cantores aprimoram seus talentos, há escolas bíblicas. Os fiéis se conhecem pelo nome, o aniversário de cada um é comemorado em comunidade, há forte corrente de entreajuda (um dentista ou médico atende irmãos e irmãs). Ali as pessoas não são anônimas; ganham autoestima. Um cuida de arrumar emprego para o outro. Há entre eles forte vínculo afetivo. E a pauta de costumes leva-os a conhecer a prosperidade, pois abandonam os vícios e, assim, aumentam a poupança familiar.

Não me sinto afinado com a teologia da maioria das igrejas evangélicas, porque enfatizam mais o Antigo que o Novo Testamento; o diabo mais que Deus; o Deus da punição mais que o Deus do amor; o pecado mais que a graça. E muitas igrejas estão politicamente alinhadas ao conservadorismo, à naturalização da desigualdade social, à exaltação das riquezas. Incutem nos fiéis a “servidão voluntária”. Fazem uma leitura equivocada da Bíblia ao retirar o texto do contexto, como também acontece entre nós, católicos. Porém, conseguem criar forte senso de pertença e comunidade, imprimindo sentido à vida de todos.

Não escrevo aos senhores para suscitar espírito de competição entre igrejas. Temos muito a aprender com nossos irmãos evangélicos. Escrevo porque me inquieta o retrocesso da Igreja Católica, a perda do profetismo de nossos pastores, o esvaziamento de nossas paróquias, essa nova geração de seminaristas e padres apegada à batina, aos símbolos religiosos, às imagens sacras. Sacerdotes próximos às classes média e rica, e distante dos excluídos e vulneráveis, apegados ao conforto e à acumulação de bens. Escrevo porque sinto que Francisco, como João Batista, é um papa que clama no deserto...

Será que dentro da Igreja Católica ainda há salvação para o Evangelho de Jesus?

Deus nos encoraje e ilumine!

Gabriel Amaral da Rocha Ferreira - ODS: impactos nas práticas ESG e os benefícios fiscais para as empresas, FSP

 A implementação dos ODS (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável), estabelecidos pela ONU (Organização das Nações Unidas) em 2015, trouxe novos horizontes para o mundo corporativo, alavancando práticas de governança ambiental, social e corporativa (ESG). Os 17 ODS propõem metas globais para erradicação da pobreza, preservação ambiental e promoção de crescimento econômico inclusivo até 2030, gerando impactos significativos nas estratégias empresariais.

Nos últimos anos, a integração dos ODS nas práticas de ESG evoluiu de uma tendência para um imperativo estratégico. O mercado reconhece que empresas comprometidas com o desenvolvimento sustentável atraem mais investidores, reduzem riscos e aumentam sua competitividade.

Um levantamento recente da PwC indica que 72% dos investidores globais afirmam que a gestão de questões ambientais e sociais influencia suas decisões de alocação de capital. Além disso, os fundos ESG representaram mais de 50% das entradas líquidas em investimentos sustentáveis em 2023, superando a marca de US$ 1 trilhão em ativos sob gestão.

Um homem com barba e cabelo curto está posando para a foto. Ele usa um terno escuro e uma gravata clara. Ao fundo, há uma estante com livros de várias cores. A iluminação é natural e suave.
Gabriel Amaral Rocha Ferreira, mestre em Direito Constitucional pela UFMG, e doutorando em Direito Constitucional pela UFMG, do escritório Renata Franco Advogados, especializado em Direito Ambiental - Divulgação

O potencial de crescimento para negócios sustentáveis é vasto. O relatório "Business and Sustainable Development Commission" estima que atingir os ODS pode liberar US$ 12 trilhões em oportunidades econômicas globais e criar até 380 milhões de empregos até 2030. Setores como energia renovável, infraestrutura sustentável, saúde e agricultura inteligente são alguns dos maiores beneficiários.

No Brasil, a adoção de práticas alinhadas aos ODS impacta positivamente o mercado de capitais, incentivada pela Resolução CVM 59/2021, que exige maior transparência em relatórios ESG. Empresas comprometidas com os ODS podem acessar mercados de crédito verde, títulos sustentáveis e incentivos fiscais.

Empresas que incorporam os ODS e práticas ESG em suas operações demonstram maior resiliência e retornos consistentes a longo prazo. Um estudo do MSCI ESG Research revelou que as empresas com melhor desempenho em ESG têm uma volatilidade de mercado 20% menor e apresentam retornos médios anuais superiores em 4% comparadas às suas concorrentes.

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O alinhamento aos ODS, além de proteger contra riscos regulatórios e reputacionais, abre portas para benefícios fiscais. No Brasil, iniciativas sustentáveis podem ser incentivadas por meio de deduções fiscais vinculadas a projetos de energia limpa, reflorestamento e inovação tecnológica sustentável, conforme previsto em legislações específicas para o setor de infraestrutura e tecnologia verde.

Entre os incentivos fiscais, destacam-se:

Isenções e deduções tributárias para projetos de energia renovável: empresas que investem em energia solar e eólica podem se beneficiar de redução de ICMS e exclusão de PIS/Cofins sobre equipamentos;

Créditos de carbono e deduções de IRPJ: projetos que promovem a redução de emissões de gases do efeito estufa podem gerar créditos de carbono negociáveis, além de deduções na base de cálculo do IRPJ.

Financiamentos com taxas subsidiadas: o BNDES e outras instituições oferecem linhas de crédito a juros reduzidos para projetos alinhados aos ODS.

O fortalecimento da relação entre sustentabilidade e finanças é um fator determinante para o sucesso da agenda ESG. A transição para uma economia de baixo carbono exige um fluxo contínuo de capital, e as diretrizes dos ODS fornecem um framework claro para alinhar metas corporativas aos princípios de sustentabilidade global. Fundos de investimento sustentável e "greenbonds" captam recursos diretamente atrelados a projetos verdes e sociais, promovendo um ciclo virtuoso de desenvolvimento econômico e preservação ambiental.

A incorporação dos ODS nas práticas empresariais de ESG representa não apenas um compromisso ético, mas também uma estratégia de negócios economicamente viável e financeiramente lucrativa. Empresas que lideram essa transformação já colhem os frutos de uma reputação fortalecida, acesso facilitado a capital e maior retorno aos acionistas, enquanto contribuem para um futuro sustentável.