O Estado de S.Paulo - 02/11
Uma casa não cai de um dia para o outro. Vai dando sinais. É um pedaço de reboco que repentinamente despenca lá de cima, uma rachadura na parede do banheiro, a instalação elétrica que derruba disjuntores, uma inclinação no piso observada quando a água escorre só para um lado.
Os últimos dez dias foram abundantes em sinais assim. O rombo das contas externas se alarga mês a mês e, ontem, os números pouco animadores da balança comercial também foram nessa direção (veja o Confira).
As contas públicas divulgadas quinta-feira revelam rachaduras perigosas. Mesmo através de suas lentes sempre tão róseas, o ministro Guido Mantega já começa a enxergar o rombo preocupante nas contas públicas. Ele passou a admitir que não há saída senão cortar despesas em áreas onde, até outro dia, entendia impossível cortar.
Seu diagnóstico também inspira cuidados porque só agora identifica paradoxal vazamento de R$ 47 bilhões (0,9% do PIB) no seguro-desemprego, num ano de pleno-emprego. Não seria, por si só, um grande sinistro se uma seguradora tivesse de pagar indenizações recordes, num ano sem grandes sinistros para sua carteira de coberturas?
A inflação não dá tréguas. Caiu temporariamente alguns centímetros abaixo dos 6% ao ano, mas prepara novos avanços, que apenas a política de juros não consegue impedir.
Os números ontem divulgados pelo IBGE sobre o desempenho da indústria ficaram aquém do esperado. A produção do setor cresceu 0,7% em setembro (sobre o mês anterior), mas no trimestre acusou recuo de 0,6%. É nova indicação de mais um fiasco do PIB, desta vez no terceiro trimestre do ano.
Como até mesmo os mais compulsivamente otimistas do governo federal começam a admitir problemas, a presidente Dilma não pode retomar o mantra de que é o catastrofismo corrosivo dos analistas da economia que contamina o ambiente dos investimentos.
Não são apenas as opções de política do governo que são improvisadas, parciais, incompletas, como a transposição do Rio São Francisco, que não termina nunca, e a desoneração da folha de pagamentos da indústria que levou R$ 50 bilhões da arrecadação embora essa meia-entrada só tenha sido concedida aos mais chegados. O modelo adotado pela presidente Dilma, a tal "Nova Matriz Macroeconômica", baseada na turbinagem do consumo, na derrubada inexorável dos juros e na flexibilização do resto, deu errado, apesar das profissões de fé em contrário.
Ainda não é o desastre, o que tem o lado bom de permitir conserto, desde que providenciado a tempo. Mas a disposição do governo não é essa. É empurrar as coisas com a barriga até as eleições, para ver depois como fica. Falta saber se a casa se mantém em pé até lá.
A presidente Dilma precisaria de uma Carta ao Povo Brasileiro, a proclamação de 2002 que conquistou confiança das classes médias e garantiu a eleição do então candidato Lula à Presidência da República. Mas não é o estilo dela.
Uma casa não cai de um dia para o outro. Vai dando sinais. É um pedaço de reboco que repentinamente despenca lá de cima, uma rachadura na parede do banheiro, a instalação elétrica que derruba disjuntores, uma inclinação no piso observada quando a água escorre só para um lado.
Os últimos dez dias foram abundantes em sinais assim. O rombo das contas externas se alarga mês a mês e, ontem, os números pouco animadores da balança comercial também foram nessa direção (veja o Confira).
As contas públicas divulgadas quinta-feira revelam rachaduras perigosas. Mesmo através de suas lentes sempre tão róseas, o ministro Guido Mantega já começa a enxergar o rombo preocupante nas contas públicas. Ele passou a admitir que não há saída senão cortar despesas em áreas onde, até outro dia, entendia impossível cortar.
Seu diagnóstico também inspira cuidados porque só agora identifica paradoxal vazamento de R$ 47 bilhões (0,9% do PIB) no seguro-desemprego, num ano de pleno-emprego. Não seria, por si só, um grande sinistro se uma seguradora tivesse de pagar indenizações recordes, num ano sem grandes sinistros para sua carteira de coberturas?
A inflação não dá tréguas. Caiu temporariamente alguns centímetros abaixo dos 6% ao ano, mas prepara novos avanços, que apenas a política de juros não consegue impedir.
Os números ontem divulgados pelo IBGE sobre o desempenho da indústria ficaram aquém do esperado. A produção do setor cresceu 0,7% em setembro (sobre o mês anterior), mas no trimestre acusou recuo de 0,6%. É nova indicação de mais um fiasco do PIB, desta vez no terceiro trimestre do ano.
Como até mesmo os mais compulsivamente otimistas do governo federal começam a admitir problemas, a presidente Dilma não pode retomar o mantra de que é o catastrofismo corrosivo dos analistas da economia que contamina o ambiente dos investimentos.
Não são apenas as opções de política do governo que são improvisadas, parciais, incompletas, como a transposição do Rio São Francisco, que não termina nunca, e a desoneração da folha de pagamentos da indústria que levou R$ 50 bilhões da arrecadação embora essa meia-entrada só tenha sido concedida aos mais chegados. O modelo adotado pela presidente Dilma, a tal "Nova Matriz Macroeconômica", baseada na turbinagem do consumo, na derrubada inexorável dos juros e na flexibilização do resto, deu errado, apesar das profissões de fé em contrário.
Ainda não é o desastre, o que tem o lado bom de permitir conserto, desde que providenciado a tempo. Mas a disposição do governo não é essa. É empurrar as coisas com a barriga até as eleições, para ver depois como fica. Falta saber se a casa se mantém em pé até lá.
A presidente Dilma precisaria de uma Carta ao Povo Brasileiro, a proclamação de 2002 que conquistou confiança das classes médias e garantiu a eleição do então candidato Lula à Presidência da República. Mas não é o estilo dela.