WASHINGTON NOVAES, JORNALISTA. E-MAIL: WLRNOVAES@UOL.COM.BR - O Estado de S.Paulo
A rotina massacrante das metrópoles e das demais grandes cidades brasileiras já não chega a ser tema central das preocupações da sociedade, tal a sua frequência no noticiário do cotidiano, ao lado da ausência quase total de soluções. Acontecimentos recentes, como o desabamento parcial ou total de edifícios, explosões de bueiros e redes subterrâneas, entre outros, têm, entretanto, levado a cogitações e iniciativas mais que oportunas. Como a página em edição recente do caderno Aliás (5/12) deste jornal, em que o professor Vinicius M. Netto, da Universidade Federal Fluminense, entrevistado por Ivan Marsiglia, alerta, sob o título Cidades partidas, para o que considera sintomas de "um problema mais amplo e perturbador: a exaustão das estruturas e infraestruturas das metrópoles brasileiras".
Para o entrevistado, a dificuldade de entender os problemas de nossas cidades leva à ausência de planejamento estratégico e da mobilização de técnicos "em número e preparo suficientes". O Rio de Janeiro, nesse particular, já estaria mostrando esses "sinais de exaustão de suas estruturas e infraestruturas". E, o que é mais grave, essa degradação já afetaria todas as capitais brasileiras. Talvez um sinal claro esteja no desejo da Prefeitura paulistana de tornar obrigatórios vistoria e laudo técnico a cada cinco anos para edifícios não residenciais com mais de 500 metros quadrados (Estado, 7/2).
Preocupação semelhante parece estar levando a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), do Ministério da Educação, a programar para o início de maio próximo um seminário internacional - Metropolização Brasileira e os Desafios da Gestão Urbana - em que especialistas de vários ministérios discutirão com convidados de vários países os dramas das nossas grandes cidades e possíveis soluções. Para que questões como as da violência urbana, da insegurança coletiva, do transporte massacrante, da moradia precária, da ausência de serviços básicos deixem de ser apenas um item do noticiário rotineiro e consigam chegar ao plano das soluções efetivas.
O próprio setor imobiliário residencial analisa, em recente publicação - Condutas de Sustentabilidade (Secovi-SP) -, o peso desse segmento em várias áreas, como a demanda de 40% da energia total no mundo, o consumo de um terço dos recursos naturais planetários, a emissão de um terço dos gases que influenciam mudanças climáticas, 12% do consumo de água potável e 40% dos resíduos sólidos urbanos produzidos. E os 10% da mão de obra total empregados geram 10% do produto bruto mundial. Quando se fala em termos brasileiros, o setor responde por 16% do consumo de água, 9,4 toneladas de materiais por habitante/ano e 500 quilos de resíduos sólidos gerados por ano - ou 95 milhões de toneladas/ano totais. E com o emprego de 6,9 milhões de pessoas consome 10,8% da energia total e 22,3% da eletricidade. Números gigantescos, que aumentam a preocupação com as infraestruturas, que não param de crescer. Em São Paulo, por exemplo, as construtoras estimam em torno de 570 mil novos metros quadrados de escritórios classe A (cinco vezes mais que em 2011) o total para 2012, ou 28% de acréscimo.
Até quando suportaremos tal crescimento urbano?
Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), nossa taxa anual de natalidade já está abaixo da reposição (comparando com a de mortalidade). Mas ainda temos uma quantidade imensa de mulheres em idade fértil, que nasceram em outras décadas. E a expectativa de vida continua a subir. Por isso, só em 2010, mais 1,62 milhão de pessoas se acresceram à população brasileira, e esta chegou a 192,3 milhões. Nossas metrópoles não param de crescer - 11,3 milhões de habitantes em São Paulo, 6,4 milhões no Rio de Janeiro, 2,7 milhões em Salvador, 2,6 milhões em Brasília, 2,5 milhões em Fortaleza, 2,4 milhões em Belo Horizonte.
Mas se forem computadas as populações de regiões metropolitanas, São Paulo vai para 19,8 milhões; o Rio, para 11,7 milhões; Belo Horizonte, para 5,5 milhões; Porto Alegre, para 3,9 milhões; o Distrito Federal, para 3,8 milhões. As 15 maiores somarão 71,7 milhões de pessoas, ou 37,25% do total. Sem falar que o processo de metropolização, com repetição do modelo, avança a passos largos, seja no eixo São Paulo-Uberlândia, seja em outras regiões. Portanto, mesmo com as taxas de nascimento em decréscimo, ainda levaremos algumas décadas e teremos mais dezenas de milhões de pessoas antes de alcançar a estabilização.
Diante disso, como suportar o crescimento exponencial dos dramas do trânsito e das mortes que ele provoca (19 por 100 mil habitantes, ante 5 na Europa, por exemplo, menos ainda nos Estados Unidos)? Como admitir que até 2020 se calcule que haverá um crescimento de 62,3% na frota automotiva, e com a venda de motocicletas superando a de automóveis? Como pensar que o número de homicídios - que chegou a quase 50 mil em 2010 - continue a se elevar e já esteja em 137 por dia? E a tudo isso se vem somar a evidente obsolescência física das infraestruturas urbanas, que está levando setores importantes a reflexões aprofundadas.
Já há uns 30 anos o Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas, órgão da respectiva convenção da ONU, vem alertando para o número crescente de desastres que levam à destruição de pontes, aterros, cabeceiras de pontes, etc., em rodovias, em razão do volume maior de chuvas e de sua concentração em menor número de horas - o que agrava a pressão sobre as estruturas. Essa pressão tem chegado às cidades e suas estruturas por causa da redução das calhas de rios, como se tem visto muito em várias regiões brasileiras. Agora começa a ficar evidente a obsolescência das próprias estruturas físicas urbanas, provocando acidentes até aqui impensáveis.
É indispensável que o poder público se associe às preocupações acadêmicas e dê consequência aos estudos, transforme-os em soluções urgentes.
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