Se de fato se confirmar um segundo turno entre Fernando Haddad e Jair Bolsonaro, o PT tentará vender a disputa como um embate entre a civilização e a barbárie.
Concordo com uma das pernas do raciocínio. A candidatura do capitão reformado encontra-se, segundo a minha bússola moral e política, tão perto das trevas quanto é possível estar. Bolsonaro flerta com soluções extraconstitucionais, seu programa econômico é inconsistente e, mais importante, a pauta de valores que ele defende é diametralmente oposta à minha.
Não penso, contudo, que seja tão simples equiparar a candidatura petista à civilização. Embora eu considere Haddad um dos melhores quadros da sigla, ele não vem sozinho. O pacote petista traz vários senões, que, se não se equiparam às vicissitudes da candidatura adversária, não deixam de ser problemas.
Até hoje o PT não explicou seu ocaso ético. Acusa uma suposta injustiça da condenação de Lula, mas nada diz sobre o Petrolão, o megaescândalo de corrupção do qual foi fiador e que está comprovadíssimo. Bilhões de reais já foram ressarcidos aos cofres públicos. Eles vieram do nada?
Também na economia temos motivos para desconfiar do discurso petista, que convenientemente apagou a gestão Dilma de sua narrativa. É como se a crise tivesse surgido do nada, sem o concurso das políticas equivocadas da ex-presidente. Como o PT não apresenta um diagnóstico do que deu errado, não temos nenhuma segurança de que o partido não recairá nas mesmas falhas.
O segundo turno, em minha opinião, afigura-se como uma disputa não entre a civilização e a barbárie, mas entre o mal maior e um menor. Tenho minha escolha, mas ela só faz sentido à luz de meus valores. Quem parte de outros pressupostos pode legitimamente chegar a conclusões diferentes das minhas.
Até aqui, candidatos e apoiadores falaram muita bobagem, mas a democracia segue intacta. É fundamental que continue assim.
Hélio Schwartsman
Jornalista, foi editor de Opinião. É autor de "Pensando Bem…".