terça-feira, 4 de setembro de 2018

Apocalipse - Humberto Werneck, O Estado de S.Paulo

O Jornal da República dispunha de um timaço, mas durou apenas 5 meses

04 Setembro 2018 | 02h00
Parecia doideira, e talvez fosse mesmo: trocar a redação da Veja, então ótimo lugar para fazer bom jornalismo, por um jornal que àquela altura nem nome tinha, e mais, pelo mesmo salário. Trocar trabalho pesado, porém semanal, por insana pauleira diária. Mas como resistir à tentação? A ditadura, em meados de 1979, dava sinais de arrefecer. Vinha aí uma anistia, não a de nossos sonhos, mas suficiente para trazer de volta os exilados. Bom momento, viu o Mino Carta, para criar um jornal ágil, moderno, disposto a refletir novos tempos. 
Para nós, jornalistas, havia um atrativo adicional, o de trabalhar num esquema diferente do que então imperava – impera ainda – nas redações, nas quais costuma haver abismo entre a reportagem e a edição; cada um de nós poderia atuar em todas as etapas do processo, da concepção da pauta ao fechamento das matérias. E nada daquele tom uniforme, impessoal, para o qual imaginei um dia um nome: vejez – velhice, em espanhol.
Num tempo em que os jornais iam às bancas seis vezes por semana, o Jornal da República não circularia às segundas-feiras – o que o desobrigaria de cobrir as vastidões do domingo futebolístico. Um só profissional da área daria conta do recado; e em nossas páginas, imaginou alguém, o futebol conviveria com uma federação de esportes minoritários, cujos adeptos, somados, supostamente não fariam feio num cotejo com as multidões futebolísticas. 
Jamais viemos a saber quais modalidades – críquete? patinação? badminton? – integrariam a tal miuçalha desportiva. Até porque o Jornal da República, formatado para não circular às segundas, acabou por estrear justamente nesse dia da semana, pois assim convinha ao tradicional diário paulistano em cujas oficinas era rodado. Posso ainda ver o Tonico Duarte, a cuja pessoa se resumia nossa editoria de esportes, grudado no rádio nas tardes de domingo, a garimpar substância para relatos aos quais não poderia faltar a avaliação de cada jogador. Tornou-se ele, assim, um caso singular de repórter de futebol que não nunca ia ao estádio.
No começo, tudo era esperança numa equipe que, comandada por Mino Carta, reunia profissionais como Claudio Abramo, Aloysio Biondi, Ricardo Kotscho, Roberto Pompeu de Toledo, Hélio Campos Mello (ainda exclusivamente fotógrafo) e Nirlando Beirão, a quem devo o convite para ser subeditor de Cultura e Esporte, numa redação espartana, porém animada, no 11.º de um prédio no início da Rua da Consolação. 
A primeira edição do Jornal da República circulou, fez agora 39 anos, em 27 de agosto de 1979 – um dia antes da promulgação da anistia. Na véspera, exaustos, descemos todos ao 8.º andar para um coquetel a que não faltaram representantes da alta finança. Ao ver ali Olavo Setúbal, dono do Itaú, e Severo Gomes, da Tecelagem Parahyba, o já citado Tonico Duarte salmodiou, provocando gargalhadas: “O Senhor é meu pastor: / temos banco e cobertor”. O n.º 1 chegou ali às 2 da manhã. Nas horas seguintes, enquanto os 70 mil exemplares da estreia sumiam das bancas, o diretor responsável, Armando Salem, entrou jubiloso na redação e anunciou que podíamos, sem risco, abrir crediário por aí.
Ainda bem que não o fiz, pois dias mais tarde o barco começou a fazer água: o sócio de Mino na aventura, Domingo Alzugaray, da Editora Três, farejou iceberg à frente e saltou fora. A princípio escondida de quem não pertencesse ao primeiro escalão, a notícia de que as coisas iam mal não demorou a correr, e ao longo dos meses acompanhamos, no início apreensivos, depois à beira da raiva e do pânico, as tentativas do nosso capo de remendar a desmilinguida embarcação. Nas semanas finais, não havia um dia em que o repórter Chico Malfitani não se empoleirasse numa mesa e dali cocoricasse – para então se ouvir um coro: “O galinho cantou!/ – e o jornal não acabou!”.
Antes fosse assim. Mas não: em apavorante contagem regressiva, a circulação não parou de despencar, e perto do fim patinava nos 3 ou 4 mil exemplares diários, tiragem para a qual talvez fosse mais indicado o uso de um mimeógrafo.
A última edição do Jornal da República, de n.º 124, circulou em 22 de janeiro de 1980. A notícia, na véspera, ainda não tinha sido comunicada à redação quando um telex de Brasília trouxe repercussões do fechamento do jornal. No outro sentido do verbo, coube a mim fechar a última página, por ironia dedicada a um acontecimento tantas vezes anunciado e desmentido – a primeira visita de Frank Sinatra ao Brasil. Estava eu ainda às voltas com título e legendas quando Mino reuniu a redação para um comunicado, numa sombria assembleia que o fotógrafo Wagner Avancini registrou para jornal nenhum. 
Muitos de nós seguimos para um bar na Henrique Schaumann, o Quincas Borba, e ali dávamos cabo de inumeráveis chopes quando, já madrugada, chegou Nirlando com o último Jornal da República, cujo editorial, na verdade autonecrológio, Ricardo Carvalho leu de pé sobre a cadeira. “Nós voltaremos”, prometia o texto.
Meu desemprego não durou mais que 10 dias. Dele me salvaram generosas iniciativas – de Mino Carta, para começar. Logo me veio convite de Gilberto Mansur para trabalhar na Status, experiência já contada aqui. Relendo agora anotações da época, me pergunto se foi só um ato falho eu ter entrado num cinema, dois dias depois do naufrágio do Jornal da República, para ver Apocalypse Now, de Francis Ford Coppola.

Quiroga em 4 de setembro

Pratica o que pensas
Acorda para este novo dia exorcizando tuas angústias e apreensões, as substituindo por uma visão alegre e leve, porque tens todo um dia ao teu dispor para fazer o que te aproximar aos teus anseios. Quanto mais ficares pensando sem nada fazer para criar uma ponte entre teus pensamentos e a realidade, mais angústia e apreensão experimentarás a respeito do teu futuro. Não importa se tuas ambições te propõem voos magníficos ou se tu te conformas com menos do que isso, o que importa é o quanto fazes uso do dia a dia para que a distância entre tua situação atual e os objetivos ansiados diminua de forma constante. Pratica, não te importes em obter sucesso de imediato, pratica o que for necessário para te aprimorar na atividade, dando o teu melhor a cada solitário instante de teu destino.

Google está nos deixando menos inteligentes?, DW , FSP

Há 20 anos era fundada a empresa que revolucionou a internet e o conhecimento

Vinte anos após criação do mecanismo de busca, neurocientista explica como o cérebro humano lida com enxurrada de informações e como o gigante da internet contribui para a polarização de opiniões. Há 20 anos, em 4 de setembro de 1998, era fundada a Google. Com seu mecanismo de buscas de mesmo nome, a empresa revolucionou a internet e o conhecimento.
Em entrevista, o neurocientista, Dean Burnett, afirma que, duas décadas após o advento da Google, "parece ser verdade que muitas pessoas não passam mais tanto tempo focando a atenção em alguma coisa como costumavam fazer".
Página de pesquisa do Google
Há 20 anos, em 4 de setembro de 1998, era fundada a Google - REUTERS
Ao mesmo tempo, o especialista – que trabalha atualmente no Centro de Educação Médica da Universidade de Cardiff e é autor dos livros The Idiot Brain (O cérebro idiota, em tradução livre) e The Happy Brain (O cérebro feliz, em tradução livre) – aponta que, ao colocar mais informações à disposição, o Google força nossos cérebros a trabalharem para processá-las.
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O neurocientista comenta também o fenômeno da polarização online como resultado de uma tendência de se buscar informações que confirmem as próprias convicções.
O Google tornou as pessoas mais burras ao longo dos anos?
Dean Burnett – Não, não consigo ver como isso pode ter acontecido. O principal argumento que vejo a favor dessa visão é que as pessoas costumavam lembrar-se de longos ensaios, poemas ou peças e recitá-los facilmente, como era ensinado na escola.
Mas a capacidade de memorizar grandes blocos de texto não é um sinal de inteligência, e ser incapaz de fazê-lo não implica que alguém seja "burro". A inteligência depende de muitos fatores culturais e genéticos e, na maior parte do tempo, resume-se a como se usa a informação, e não à capacidade de memorizá-la.
O Google coloca à nossa disposição mais informações do que nunca, as quais estamos constantemente acessando. Portanto, há argumentos de que, na verdade, estamos nos tornando mais inteligentes, obtendo mais informações e fazendo nossos cérebros trabalharem para processá-las.
Como o Google afetou a nossa capacidade de concentração?
É difícil dizer alguma coisa sobre isso em termos concretos, já que o Google não existe há tempo suficiente para que possamos "desenvolver" uma resposta neurológica a ele. Portanto, nossos sistemas de vigília e atenção continuam, em nível neurofisiológico, os mesmos.
Mas parece ser verdade que muitas pessoas não passam mais tanto tempo focando a atenção em alguma coisa como costumavam fazer. Normalmente, o cérebro humano prioriza a novidade frente à familiaridade quando se trata de atividades estimulantes e agradáveis, e o Google permite que você acesse uma infinidade de novidades com um clique.
Assim as pessoas estão mais tentadas do que nunca a procurar algo mais interessante do que concentrar-se naquilo que está à sua frente. Tecnicamente, você pode aplicar isso à grande parte da internet, como Facebook e Twitter, e não apenas ao Google.
Como os cérebros humanos estão lidando com essa enxurrada de informações disponíveis no Google?
A maioria das pessoas não tem ideia da capacidade de nossos cérebros de filtrar informações a partir da imensa quantidade que se recebe. Nossos sentidos, por si só, fornecem mais informações ao cérebro do que jamais possamos esperar processar minuto a minuto, e o cérebro desenvolveu muitos mecanismos para filtrar, priorizar e lidar com tudo isso.
O mesmo pode ser dito das informações do Google, mas são um pouco diferentes, já que sua natureza é mais abstrata e cognitiva. Infelizmente, os métodos do cérebro para lidar com o excedente de informação nem sempre são ideais.
Há a tendência de confirmação, por exemplo, o processo em que priorizamos informações que apoiam o que já pensamos/acreditamos enquanto ignoramos qualquer coisa que não corrobora com nossa crença. Esse processo é disseminado e persistente, sustentando claramente grande parte da dificuldade e da polarização que vemos online, particularmente na esfera política.
Os seres humanos estão se tornando mais dependentes do Google?
Eu posso ver como isso pode se tornar um problema. As pessoas podem estar procurando acessar o Google demasiadamente, em vez de tentarem resolver algo por conta própria. Obviamente, isso varia de pessoa para pessoa.
No entanto, esse tipo de processamento de informações é apenas uma pequena parte do que fazem nossos cérebros. Por isso, é difícil imaginar como o Google pode vir a ter precedência sobre o cérebro num futuro próximo.
Como o Google mudou você?
O Google revolucionou minha vida de várias formas. Sou um escritor científico com uma resposta rápida. Para mim e para o que eu faço, é vital a capacidade de checar instantaneamente qual estudo disse o que ou se há dados publicados que apoiem minhas teorias, assim como a capacidade de encontrar contra-argumentos e assim por diante.
DW