sexta-feira, 6 de janeiro de 2017

A tragédia dentro da tragédia, Apamagis, OESP

Magistrados*
04 Janeiro 2017 | 19h11
O massacre perpetrado em Manaus, que ceifou covardemente a vida de dezenas de pessoas sob a tutela do Estado, revela outra tragédia: os diversos grupos que tentam ampliar sua influência, com soluções heterodoxas, que variam da proposta de terminar com as prisões cautelares, passam pela federalização de crimes e culminam na abertura de portões dos presídios. A última proposta, de tão absurda, não merece comentário.
A tragédia não aconteceu porque policiais prenderam, ou promotores acusaram, ou juízes estaduais condenaram. Ao contrário. Ocorreu porque os assassinos acreditam na impunidade decorrente de uma legislação falha; confiam na facilidade com que recebem e guardam armas; e contam com essa eterna e estéril divisão entre os entes do Estado.
É um verdadeiro desserviço ao cidadão não enfrentar essa triste realidade. Pior ainda é tentar usar o massacre em proveito de conceitos puramente corporativos ou movidos por sentimento de revanchismo.
Necessário delinear as responsabilidades no episódio. De modo estranho, propaga-se a confusão entre administração penitenciária e Judiciário. Registre-se de maneira cristalina: não é o juiz estadual o responsável pela administração dos presídios, tarefa delegada pela Constituição Federal ao Poder Executivo.
No que tange à federalização, defendida por aqueles que incessantemente buscam enfraquecer o juiz estadual, seria o caso de indagar se a alteração simplesmente faria com que os crimes deixassem de existir. Também seria conveniente que alguém explicasse onde os eventuais condenados cumpririam as eventuais penas aplicadas, principal causa da tragédia de Manaus. Certamente não nos pouquíssimos presídios federais já superlotados.
Parece óbvio que o momento exige coesão e busca de correções, nunca a cisão nos representantes do Estado que, caso se concretizasse, apenas reduziria a capacidade de lidar com um problema que se revela de altíssima complexidade.
O pretendido enfraquecimento da Justiça Estadual, com o devido respeito, oferece riscos palpáveis de aumentar a impunidade e, assim, elevar a violência a um nível sem precedente.
Igualmente oportuno lembrar que as medidas cautelares como prisão preventiva e provisória são absolutamente essenciais para a efetividade da tutela jurisdicional. Não é demasiado frisar que muitas vezes não é possível esperar o trânsito em julgado para segregar pessoas que, entre outros crimes bárbaros, cortam cabeças de seres humanos, estupram mulheres e crianças ou praticam latrocínio.
É preciso enfrentar o problema e combater o crime organizado com eficiência, agilidade, inteligência e, sobretudo, união. É chegado o momento de discutir instrumentos que realmente evitem a repetição dessa barbárie. E a magistratura estadual de São Paulo, como sempre esteve, estará no lugar certo. Ao lado da sociedade.
*A Diretoria da Associação Paulista de Magistrados

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